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2. AVALIAÇÃO EDUCACIONAL

2.3 Avaliação, gestão e processo decisório

A natureza da avaliação tem sido abordada por vários teóricos dedicados a este campo de atuação ao longo dos anos. A avaliação vista como um olhar prospectivo, negando a tendência de culpabilizar pessoas ou instituições (VIANNA, 1998) representa um desafio e um caminho alternativo a ser percorrido,

(re)construído e consolidado pela sociedade contemporânea. Assim sendo, é pertinente abordar o papel da avaliação vinculado historicamente à gestão e, consequentemente, ao processo decisório, uma vez que toda atividade de gestão pressupõe avaliações e a constantes decisões.

Gestão é o ato ou efeito de gerir, administrar, gerenciar. Para as considerações que se seguem, tomar-se-á a palavra gerenciar em sua acepção própria, qual seja “fazer gestão de”. Para Bonniol e Vial (2001), gerenciar é o ato de governar da melhor forma possível, com economia, aumentar o rendimento, melhorar a gestão contábil, a gestão de estoques e a gestão de pessoal. É nessa perspectiva que se insere a avaliação como meio de racionalizar os processos de uma organização e o acesso às informações necessárias aos tomadores de decisão. “Tomar decisões para enfrentar problemas e aproveitar oportunidade é um ingrediente do ato de administrar. É o que os gerentes fazem.” (MAXIMIANO, 2000, p.139). Cardinet (1990 apud BONNIOL; VIAL, 2001) corrobora essa posição quando afirma que a avaliação está entre os procedimentos essenciais de toda atividade de gestão, por constituir o núcleo do processo de regulação de um sistema, uma vez que este pressupõe um conhecimento da informação sobre a realidade (observação), um confronto com o objetivo (avaliação propriamente dita) e uma ação corretiva (a recuperação).

A emergência das práticas avaliativas de ordem organizacional recebeu influência dos modelos provenientes do mundo empresarial, referindo-se, por sua vez, à atitude de gestão ou de administração, segundo Berger (1986 apud BONNIOL; VIAL, 2001). Ocorre que tais modelos consolidaram-se a partir de uma crise econômica e também ideológica no que tange à noção de crescimento e progresso, fato que tornou os indivíduos ecônomos (BONNIOL; VIAL, 2001, p.107).

A partir daí questionou-se de forma intensa sobre as práticas de gestão a partir da premissa de que não há gestão de recursos e de administração dos meios, com vistas ao crescimento e ao progresso, se não houver uma capacidade permanente de análise e de avaliação das construções de dispositivos a partir dos quais se baseia a ação.

A avaliação desdobra-se no espaço aberto entre a dúvida e a certeza, pela vontade de exercer uma influência sobre o curso das coisas, de gerenciar

sistemas em evolução sendo que o homem constitui o primeiro desses sistemas. É a ferramenta da ambição humana de ‘pesar’ sobre o presente para ‘pesar’ sobre o futuro (BONNIOL; VIAL, 2001, p. 108).

A ambição humana pela ponderação acerca de algo converge para a afirmação de Stake (1967) sobre a gênese da avaliação presente no próprio homem, uma vez que este observa, em seguida julga e, consequentemente, avalia (VIANNA 2000). Além do mais, o desejo humano de exercer influência no curso das coisas traz à tona três aspectos importantes vinculados ao fenômeno da avaliação, cujo caráter é ideológico: o primeiro refere-se à exigência dos atores sociais em conhecer as práticas dos outros atores sociais, o segundo é o sistema de gestão focado no crescimento dos recursos e o terceiro é a legitimidade social dos grandes setores da vida coletiva, exigindo, constantemente, uma nova operação de legitimação (BONNIOL; VIAL, 2001).

O vínculo entre avaliação e processo decisório deve-se às necessidades dos tomadores de decisão, que precisam fazer escolhas frequentes, rápidas e o menos arbitrárias que possível, com base em dados de avaliações permanentes, assevera Maximiano (2000). Para o autor, toda avaliação deverá ser pensada em função do tipo de decisão a tomar a fim de validar o processo decisório. Contudo, Pelletier (1971 apud BONNIOL; VIAL, 2001) alerta para o risco de conceber a avaliação somente para a comparação de desempenho com relação a uma norma, como fundamento de uma decisão ou como modo específico de medição. Tal acepção é limitada e estática, uma vez que avaliar é um processo contínuo ao longo do desenvolvimento de um programa.

Nesse contexto, insere-se o modelo estruturado por Stufflebeam (1971), abordado em item anterior, cujo objetivo da avaliação não é provar, mas, sobretudo, melhorar, tomando as decisões adequadas (VIANNA, 2000; BONNIOL e VIAL, 2001). Trata-se de um dos modelos mais conhecidos mundialmente. Um dos grandes méritos do modelo CIPP (contexto, insumos, processo e produto) de Stufflebeam é o fato de este ser um método global de avaliação. Para este teórico, a avaliação deve ser planejada, realizada no contexto natural, em tempo dimensionado com precisão, deve ser realista, prudente, politicamente viável e realizada com parcimônia financeira, levando em conta preceitos legais e éticos, assevera Vianna (2000).

Na sociedade atual a avaliação está situada no que Ribeirolles (1992 apud BONNIOL; VIAL, 2001) chamou de trio vencedor: homem-desempenho-futuro. Trata-se de uma perspectiva de avaliação como uma solução adequada para abordar a nova configuração do mercado mundial. No entanto, ela provoca certo número de problemas:

- Problema técnico: somos capazes de realizar uma avaliação objetiva, dispomos de ferramentas adequadas que possam medir de forma correta o que desejamos medir?

- Problema de aplicação: existem práticos competentes dentro e fora da empresa, os superiores hierárquicos são capazes de efetuar avaliações, sentem-se cômodos nessa situação?

- Problema deontológico: que devemos medir, que critérios correspondem às necessidades da organização, onde estão os limites, onde está a fronteira entre indiscrição e ajuda à vida profissional?

- Problema funcional: qual é a função real da avaliação? Trata-se de selecionar pessoas, de levar em conta os desejos individuais de cada um, de garantir o bem-estar social ou de trocar informações de boa qualidade? Entre a função instrumental da empresa, quem visa a melhorar a organização cotidiana e sua função de regulação social, onde se situa essa apreciação? (RIBEIROLLES, 1992 apud BONNIOL; VIAL, 2001, p. 167).

Ocultam-se nessas indagações dois problemas consubstanciados nas práticas avaliativas: o de uma seleção mais ou menos dissimulada, com critérios contestáveis, e o da partilha de poder (BONNIOL; VIAL, 2001). Avaliação não é um território neutro, mas sim um campo de tensões e desafios, pois não gera verdades incontestáveis, mas, sobretudo busca formular argumentos plausíveis a respeito do objeto de análise para reflexão sobre determinada ótica. Em se tratando da especificidade da avaliação educacional, esta produz reflexões que permitem o surgimento de outros elementos teóricos, em cujos caminhos constroem-se novas ideias e novos conhecimentos. A avaliação educacional é uma autorreflexão sobre a origem e os condicionamentos sociais de um problema, aclara Vianna (2000).

Respostas para todas as questões suscitadas acerca do fenômeno avaliação não foram suficientemente clarificadas pelos estudiosos desta área, seja no âmbito educacional ou empresarial, dada a complexidade do tema. Mas, pode-se afirmar, com base na consulta da literatura especializada, que os avanços foram muitos, tanto do ponto de vista teórico, metodológico, como técnico. Nesse sentido, destaca-se a meta-avaliação, uma vez que se refere não somente à avaliação de estudos específicos, mas também à avaliação de todas as funções e práticas da

própria avaliação (WORTEN; SANDERS; FITZPATRIK, 2004, p. 594). Portanto, tomar-se-á a meta-avaliação como mote para as discussões do capítulo seguinte, que abordará a avaliação da educação superior, notadamente a autoavaliação institucional.