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AVALIAÇÃO PSICOSSOCIAL

No documento Adoção Intuitu Personae (páginas 177-183)

4. ADOÇÃO INTUITU PERSONAE

4.6. AVALIAÇÃO PSICOSSOCIAL

Muitos são os fatores que influenciam no perfil psicológico do adotando, como já visto antes: tempo de institucionalização, desagregamento familiar, carência econômica, heranças genéticas, discriminações socias, cultura ou costumes da família de origem, deficiências físicas, fatores que exigem especial atenção, havendo de se levar em conta também os sonhos e ideais que a criança, a partir da idade apropriada, passa a nutrir ou fomentar. Cada criança ou adolescente apresenta necessidades e interesses individuais, particularizados que precisam ser avaliados para que se identifique quem melhor possa atendê-los.

Os motivos que determinam o desejo e a intensidade com que um sujeito dedica sua atuação voltada ao atingimento dos seus objetivos são fundamentais para definir a permanência da conduta e a seriedade dos princípios morais que regram sua personalidade; entretanto a volatilidade do comportamento do adulto invariavelmente pode distorcer a percepção das reais intenções do agente.

São fatores intrínsecos que exigem especialização e treinamento para que o profissional possa detectar tais particularidades subjetivas na pessoa do candidato à adoção, tão ou mais importante que verificar seu perfil psicológico propriamente dito que o torne apto a dar orientação espiritual, amparo nas dificuldades e energia para corrigir o rumo diante das tentações e desvios típicos da juventude que irá vivenciar com o adotando.

Existem, ainda, fatores objetivos que precisam estar presentes para que o candidato possa atender às necessidades e interesses do adotando: ter condições sociais mínimas que permitam criar, no sentido de guarnecer alimentação, vestuário, lazer, convivência num lar estruturado e fornecer formação suficiente para garantir autonomia na fase adulta. Umas são necessidades emergenciais e imediatas, outras perduram no tempo e exige perspicácia e intuição profissional para estimar sua viabilidade.

As psicólogas Niva e Liana273, estudando a concepção de família idealizada no processo de adoção sob o ponto de vista dos profissionais técnicos que elaboram as avaliações psicossociais para inscrição, preparação e seleção de adotantes, obtiveram os dados de natureza objetiva (factuais, concretos) e subjetiva (valores, atitudes e crenças) a partir das falas dos psicólogos e assistentes sociais entrevistados, implicando na grande dificuldade em definir o melhor interesse da criança e do adolescente274:

• Não existem características, modelos ou perfis subjetiva e socialmente idealizados ou estabelecidos para as famílias adotantes;

• Para cada critério de seleção proposto pelos técnicos, há uma discussão e uma relativização do mesmo, sugerindo que cada caso e/ou situação estudada são

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COSTA, Liana Fortunato. CAMPOS, Niva Maria Vasques. A família nos estudos psicossociais de

adoção: experiência em uma Vara da Infância e da Juventude. São Paulo, Editora RT, vol. 813,

2003, cit., p. 114/128. 274

ALPA, Guido. I principi generali e il diritto di famiglia, in Diritto famiglia, vol. XXII, 1993, p.261/271; DIEREN, Benoît Van. L'intérêt de l'enfant: alibi, piège ou nécessité?, in RTDF – Revue

Trimestrielle de Droit Familial, 1994, p. 113 ss; DONNIER, Marc. L'intérêt de l'enfant, in Recueil Dalloz-Sirey, chr XXVI, 1959, p. 180.

particularizados, não existindo uma "família ideal", mas diversas possibilidades. Percebe-se a crença na existência de famílias contra-indicadas, ou seja, "algumas

características que não favorecem a adoção" indica a existência de critérios de

exclusão, como a desestruturação familiar e psicológica e, em contra-partida, a existência de determinadas condições de saúde mental, funcionamento, dinâmica e organização familiar que poderão propiciar um ambiente favorável ao bom desenvolvimento da criança, "mesmo porque, ela pode não ser indicada neste

momento e a partir de todo um trabalho de orientação, de esclarecimento, ela pode se tornar plenamente indicada ...".275

• Motivação para adoção: o aspecto volitivo e voluntário da adoção são os fatores mais importantes na avaliação, conquanto o engajamento e a vontade transpõem obstáculos,276 não se descuidando da possibilidade de manipulação ou condução das vontades expressadas pelos adotantes.

• Indicação mútua: família/criança, criança/família, onde os perfis de ambas devem se encaixar ou compatibilizar.277 Um dos princípios gerais que devem pautar a assistência psicológica nos processos de adoção é o de realizar uma avaliação criteriosa das pessoas que se habilitam para adotar, procurando garantir que os

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No mesmo sentido, COELHO, Francisco M. Pereira. Curso de Direito de Família, Coimbra, Ed. Policopiada, 1986, p. 99; DOLTO, Françoise. Tout est langage. Paris, Le Livre de Poche, 1987, p.80; CORNEAU, Guy. Pai ausente, filho carente. O que aconteceu com os homens?. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1997, cit., p. 63/65; LAMMERANT, Isabelle. L'adoption et les droits de l'homme

en droit comparé. Bruxelles, Bruylant/ Paris, L.G.D.J., 2001, cit., p. 661.

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COSTA, Liana Fortunato. CAMPOS, Niva Maria Vasques. A família nos estudos psicossociais de

adoção: experiência em uma Vara da Infância e da Juventude. São Paulo, Editora RT, vol. 813,

2003, cit., p. 122. 277

GESELL, Arnold. A criança dos 0 aos 5 anos. São Paulo, Martins Fontes, 1996; MOTTA, Maria Antonieta Pisano. Mães abandonadas: a entrega de um filho em adoção. São Paulo, Editora Cortez, 2001; KNOBEL, Maurício. Orientação familiar. Campinas, Papirus, 1992; TULKENS, F.. Le placement des mineurs et le droit au respect de la vie familiale, in Rev. Trim. dr. h., 1993, p. 564.

pais adotivos possam oferecer à criança condições favoráveis ao pleno desenvolvimento de suas potencialidades. Simultaneamente, investigar as características psicológicas do adotando e do adotante, já que as personalidades da criança e dos pais adotivos influenciam o resultado do processo.278

• O momento vivido pela família é um importante critério de indicação da família para adoção, embora relativo porque uma crise momentânea não deve implicar em exclusão, podendo haver acompanhamento técnido e oportuna reavaliação279 – As circunstâncias se alteram tanto quanto os momentos vividos, razão pela qual parece-nos que a orientação dada não seja a mais adequada, não só em função das constantes alterações dos momentos, mas principalmente pelo tempo de expectativa durante a espera para uma nova reavaliação após os trabalhos de adequação, mantendo-se a criança sob guarda provisória do pleiteante da adoção e que certamente criará o vínculo afetivo, conforme abaixo abordado.

• O vínculo entre a família adotante e o adotando é de fundamental importância, que se sobrepõe a possíveis inadequações e dificuldades, impondo-se uma postura que permita a aceitação de diferenças existentes entre a família real e suas concepções de adequação ou sua família idealizada, a partir do reconhecimento da competência das famílias, enquanto sistemas que se auto-

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A respeito, vide BOULANGER, François. Droit civil de la famille. Paris, Economica, t. 1 (Aspects internes et internationaux), 2ª éd., 1992; t. 2 (Aspects comparatifs et internationaux), 1994, cit., p.80; NEVES, António Castanheira. O papel do jurista no nosso tempo, in Digesta – Escritos

acerca do direito, do pensamento jurídico, da sua metodologia e outros. Coimbra, Coimbra

Editora, vol. I, 1995, p. 9; do mesmo autor, O direito como alternativa humana. Notas de reflexão sobre o problema actual do direito, cit., p. 287/302.

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COSTA, Liana Fortunato. CAMPOS, Niva Maria Vasques. A família nos estudos psicossociais de

adoção: experiência em uma Vara da Infância e da Juventude. São Paulo, Editora RT, vol. 813,

organizam. Semelhantemente, no direito comparado sustenta-se que há a polarização de duas finalidades, que ainda hoje servem de base à adoção280 – por um lado, o estágio de convivência assegura a continuidade familiar e permite a concretização de uma paternidade ou maternidade desejadas e, por outro lado, garante aos menores uma assistência.

• A intersubjetividade do profissional281

no processo de estudo psicossocial282. Este

aspecto fundamental diz respeito à preparação do técnico, que nos leva a pensar na importância de uma formação continuada, na possibilidade de estar sempre se renovando, estudando e se atualizando. Os esforços da Administração no sentido do oferecimento de cursos, supervisão, congressos, seminários, cursos e programas de especialização e pós-graduação são de extrema importância para uma melhor formação e preparação do profissional no contexto jurídico, a fim de que as diferentes vivências possam ser assimiladas pelos técnicos envolvidos na avaliação.

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NOVA, Rodolfo de. Adozione (diritto internazionale privato), in Enciclopedia del Diritto, vol. I, p. 601 ss. ; DIEREN, Benoît Van. L'intérêt de l'enfant: alibi, piège ou nécessité?, in RTDF – Revue

Trimestrielle de Droit Familial, 1994, cit., p. 111.

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GANNAGÉ, Pierre. La pénétration de l'autonomie de la volonté dans le droit international privé de la famille, in Revue Critique, vol. 81, 1992, cit., p. 432; CARLIER, Jean-Ives. Autonomie de la

volonté et statut personnel. Bruxelles, Bruylant, 1992, cit., p. 420; OVERBECK, Alfred E. Von.

Les quetions générales du droit international privé à la lumière des codifications et projets récents - Cours général de froit international privé, in Recueil des cours, . 176, vol. II, 1982, cit., p. 88; JAYME, Erik. Identité culturelle et intégration: Le droit internationale privé postmoderne – Cours général de droit international prive, in Recueil des Cours de l'académie de Droit International de la

Haye, 1995, cit., p. 152 – sustentam que os critérios subjetivos para avaliação psicossocial

justificam a escolha do adotante, como critério volitivo, segundo o conceito pessoal dos pais biológicos em melhor atender aos interesses do adotando.

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COSTA, Liana Fortunato. CAMPOS, Niva Maria Vasques. A família nos estudos psicossociais de

adoção: experiência em uma Vara da Infância e da Juventude. São Paulo, Editora RT, vol. 813,

• O reconhecimento da competência das "novas" organizações familiares e o processo de autoconhecimento a partir da relação com o objeto de estudo: a reflexão de cada profissional sobre suas próprias experiências em sua família e determinada classe social e cultural, em confronto com cada caso analisado, determinam a melhor capacitação para elaborar a avaliação técnica que autorize a adoção pretendida e o atendimento das necessidades e dos interesses do adotando283.

As avaliações psicológicas e sociais atualmente desenvolvidas para fins de adoção carecem de aprimoramento e de estrutura bastante que permitam a análise judicial necessária, urgente a melhoria neste aspecto, com maiores investimentos públicos para a formação e especialização dos profissionais encarregados pelos estudos conclusivos e desejável haja parceria e colaboração do setor privado sem fins lucrativos, visando aumentar o número de profissionais dedicados a este mister.

Entendemos indispensável a verificação da idoneidade do adotante para assumir a responsabilidade definitiva e irrevogável da adoção, imprescindível também quando se tratar de adoção intuitu personae de crianças e de adolescentes, mesmo que dispensável a prévia inscrição no cadastro de adotantes. Apenas na hipótese da avaliação psicossocial concluir pela comprovada e fundamentada incompatibilidade do perfil do adotante intuitu personae aos interesses e

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CARBONNIER, Jean. Les notions à contenu variable dans le droit français de la famille, in Les

notions à contenu variable en droit, études publiées par Chaïm Perelman et Raymond Vander Elst,

Bruxelles, Établissements Émile Bruylant, 1984, p. 99/112; BOULANGER, François. Droit civil de

la famille. Paris, Economica, t. 1 (Aspects internes et internationaux), 2ª éd., 1992; t. 2 (Aspects

necessidades de determinado adotando, autorizar-se-á a não homologação judicial da adoção como consentida e proposta.

No documento Adoção Intuitu Personae (páginas 177-183)