• Nenhum resultado encontrado

Base objetiva do negócio

6 PRESSUPOSTOS DA REVISÃO DE CONTRATOS DE CONSUMO

6.2 ONEROSIDADE EXCESSIVA E ALTERAÇÃO DA BASE DO CONTRATO

6.2.1 Base objetiva do negócio

É possível, então, estabelecer como um dos pressupostos para a aplicação do instituto revisional, baseados na teoria da imprevisão, a ocorrência de certos fatos supervenientes ao momento da contratação, mas não de qualquer fato; este deve ser imprevisível (e não simplesmente imprevisto) e capaz de romper com a base do contrato.

Segundo Karl Larenz (1956, p. 37), a base do contrato ou base do negócio possui um duplo sentido. No sentido subjetivo, a base corresponde a determinação da vontade das partes como uma representação mental existente na conclusão do negócio, que influiu fortemente na motivação do mesmo. No sentido objetivo, a base do negócio corresponde ao conjunto de circunstâncias cuja existência ou persistência são fundamentais para a finalidade do contrato. Neste sentido, conclui o autor que o amparo para a revisão contratual deve estabelecer as mesmas conseqüências jurídicas derivadas do desaparecimento ou quebra da base do negócio.

Importante observação é feita por José de Oliveira Ascensão (2006, p. 60), ao alertar para a relação entre base do negócio (circunstâncias em que as partes fundaram sua decisão de contratar) e momento histórico da celebração da avença. Aduz o autor que, em virtude do negócio jurídico ser uma entidade histórica (possuir os “pés na terra”), a realidade do momento histórico da celebração é constitutivo de sua vinculatividade. Pensamos que o autor busca alertar para a importância da contextualização do negócio celebrado com o período em que foi concebido, como vetor interpretativo na busca de desequilíbrio entre as prestações, e, portanto, quebra da base do negócio.

Para haver quebra ou desaparecimento da base subjetiva do contrato, geradora da revisão ou resolução do mesmo, é necessário que haja erro relevante nos motivos fundamentais que levaram as partes a contratar. Segundo Karl Larenz (1956, p. 63), este erro

deve ser tão relevante para a motivação do pacto que, caso as partes tivessem conhecido sua inexatidão, não teriam concluído o contrato da forma que fizeram. Conclui-se que apenas o erro sobre os fatos que influenciaram decisivamente a motivação dos contratantes compromete a base subjetiva do negócio.

No tocante a base objetiva do contrato, ainda de acordo com Karl Larenz (1956, p. 97- 98), a interpretação de um contrato não depende apenas das palavras e do seu significado para as partes; depende também das circunstâncias em que o pacto foi concluído e das futuras. Algumas vezes, as circunstâncias de uma relação contratual existente são afetadas por uma variação imprevista com tal intensidade, que sua manutenção não encontra justificativa, a despeito do princípio da pacta sunt servandas. Tal fenômeno ocorre basicamente quando há quebra na equivalência das prestações de modo que se perde o fim originário do contrato, ou quando a prestação torna-se impossível ou demasiadamente onerosa (ao ponto de comprometer a equivalência das prestações e/ou a bilateralidade do contrato). Isto se justifica porque a execução de um contrato em circunstâncias totalmente modificadas não pode ser considerada cumprimento do sentido do contrato; quando se cumpre um contrato em moldes totalmente diversos dos inicialmente pactuados, é possível estar cumprindo um outro contrato diferente do originário.

Comentando a teoria de Larenz, aduz Fabiana Rodrigues Barletta que são elementos constitutivos da base objetiva do negócio jurídico a equivalência entre as prestações e a finalidade objetiva do contrato (BARLETTA, 2002, p.15). A despeito de alegar que, sem a presença de tais elementos o contrato pode não subsistir, a autora e grande parte da doutrina não oferece parâmetros para perquerir sobre a desproporção e a finalidade, tornando dando um caráter mais limitado e objetivo àquelas expressões. Ainda sob a interpretação da teoria de Larenz, Laura Coradini Frantz (2005, p.176) aduz que se configuram motivos da quebra da base objetiva do negócio a destruição da relação de equivalência entre as prestações e a impossibilidade de alcance do fim do contrato.

Quando os contratos assumem a forma de trato sucessivo, a questão se apresenta ainda mais relevante. Para Karl Larenz (1956, p. 105), as partes que optam por um contrato de trato sucessivo assumem os riscos ordinários de uma transformação prejudicial das circunstâncias, mas, quando ocorrem circunstâncias extraordinárias e imprevisíveis, que tornem a prestação tão onerosa a ponto de levar à ruína econômica o devedor, é possível um ajuste para recompor

o equilíbrio das partes e a finalidade do contrato Em resumo, a base objetiva do contrato só é atingida quando, por fatos imprevisíveis e supervenientes, não se possa cumprir a finalidade precípua do contrato.

Nota- se que, como demonstraremos adiante, a relação de equivalência deve levar em conta o valor de cada prestação no sentido axiológico, e não a estrita correspondência entre valores econômicos, pois, a despeito de numerários diferentes, as prestações podem guardar em si (principalmente por conta de especificidade do negócio) correspondência enquanto prestação e contraprestação. Neste sentido, aduz Laura Coradini Frantz (2005, p.176), a prestação que se tornou desproporcional, a despeito de ter valor pecuniário inferior ao mercado, pode ser tida como equivalente (como correta contraprestação) pela outra parte, não havendo quebra na base do pacto. Outrossim, frise-se que a doutrina mais atual considera a impossibilidade no cumprimento da prestação para o pleito revisional, como impossibilidade econômica ou relativa, e não, impossibilidade fática, temperando a rigidez do conceito de impossibilidade da doutrina clássica.

È mister considerar ainda que, a onerosidade excessiva, principalmente em função da exigência de reciprocidade da boa-fé, pode atingir ambos os contratantes, o que significa que pode recair tanto sobre a prestação (mais comum), quanto sobre a contraprestação. Para Laura Coradini Frantz (2005, p. 192), pode ser excessivamente oneroso para o credor receber uma prestação que nasceu ou tornou-se irrisória, em função da sua contraprestação. Por óbvio que, na seara consumerista, deve tal pensamento ser concebido através do filtro da vulnerabilidade do consumidor.