• Nenhum resultado encontrado

Bilhete: Empréstimo de Livros

No documento marcelabrasilgalvão (páginas 96-100)

4 ANÁLISE E REFLEXÃO DOS DADOS DA PESQUISA

4.1 DOCUMENTOS

4.1.3 Bilhete: Empréstimo de Livros

Este subtópico é destinado à análise do bilhete enviado aos pais referente ao empréstimo de livros realizado pela escola. Essa é uma ação importante, pois envolve as famílias no processo de formação do leitor.

Assim, para compreender a finalidade e as características desse projeto para então refletir sobre o bilhete enviado às famílias, recorri ao PPP (2017) da escola e às entrevistas com as professoras.

O projeto empréstimo de livros é uma das ações desenvolvidas pela escola a partir do “Projeto de Leitura” que foi implementado em 2004. Tem como público alvo os alunos da educação infantil do 1º ao 9º ano do ensino fundamental. Essa ação, assim como outras já citadas, já era realizada pela escola e com o projeto de extensão em interface com a pesquisa, se potencializou.

De acordo com o Projeto Político Pedagógico da escola, o objetivo principal do projeto empréstimo de livros é “incentivar a leitura e também despertar o interesse na participação da família na vida cotidiana do educando” (PPP E.M.T.F.M, 2017, p. 67). Assim, semanalmente, a professora da turma empresta um livro de literatura para cada aluno levar para casa. Na semana seguinte, a professora realiza a troca do livro. Conforme o PPP (2017), o empréstimo é realizado pela professora referência I e as trocas são realizadas às sextas- feiras. As professoras disseram nas entrevistas que entregam os livros às terças-feiras e os recolhem às sextas-feiras.

A partir da entrevista com as professoras, constatei que o projeto empréstimo de livros passou a ser uma ação implementada pela instituição a partir de meados de 2017. Anteriormente, os empréstimos aconteciam de maneira isolada e sem atenção quanto ao acervo ou não aconteciam. Nas entrevistas, indaguei as professoras se elas realizavam algum empréstimo de livro antes do projeto instituído pela escola. A maioria delas relatou que não realizavam, pois não tinham acervo suficiente e adequado para a faixa etária dos alunos. Duas professoras relataram que realizavam o empréstimo de livro com acervo próprio, assim como exposto no excerto:

Antes eu fazia, porque todos nós temos dentro do armário, um livro que pode perder que pode sumir que não tem muito problema. Porque precisa primeiro dar uma liberdade para as crianças e ir testando e todos os livros estão no armário, até aquele livro ‘encarecado’ chegou direitinho. Eles estão levando livro desde que eu entrei. (Professora M- 2º ano).

Assim, a partir de meados de 2017, a escola instituiu o projeto empréstimo de livro, sendo de responsabilidade da professora da Sala de Leitura separar o acervo, conforme o PPP aponta (2017, 67), ela “separa os livros de acordo com a faixa etária e o interesse dos alunos de cada ano, entregando-os as professoras juntamente com a ficha de controle dos empréstimos”. Segundo o PPP, a professora da Sala de Leitura mantém o contato com a

professora referência I de cada turma afim de obter informações relativas ao acervo de livros, assim como “a necessidade de renovação dos livros, interesse dos alunos pelos mesmos, receptividade e participação da família e interesse dos professores em elaborar projetos específicos utilizando algum desses livros (PPP E.M.T.F.M, 2017, p. 67-68).

Na entrevista, perguntei para as professoras se havia alguma orientação da escola em relação a esse empréstimo de livro. Uma das professoras relatou que faz uma “sessão” de apresentação do livro em sala de aula e conversa sobre como foi a leitura em casa. Outra aponta que realiza sequência didática em função de alfabetizar os alunos. As demais, apontam que não realizam nenhuma atividade posterior as leituras e compreendem esse momento para desfrute do texto literário.

O PPP (2017) destaca algumas sugestões de atividades a serem desenvolvidas após a leitura literária, como realizar a leitura compartilhada, feita pelo professor e pelos alunos; a leitura dramatizada; a contação de história; produção de murais para a divulgação dos livros lidos pelos alunos; técnicas diversas em relação ao livro, como ilustrações, pinturas, colagens; descrição de personagens e de cenários; utilização do livro de forma interdisciplinar; dentre outras propostas.

Em relação ao envolvimento das famílias nesse projeto, o PPP aponta que “é realizado com os alunos e com a família um trabalho de conscientização em relação à importância da leitura e do cuidado com o livro, por meio de conversas, bilhetes informativos e nas reuniões de pais” (PPP E.M.T.F.M, 2017, p. 69). A partir da minha participação nas reuniões de pais, observei que as gestoras mencionavam o projeto, ressaltando a importância da participação das famílias em relação à leitura.

A diretora, brevemente, falou dos avisos gerais, como uniforme, alimentação saudável, material escolar, comportamento, reposição de aula e sobre o projeto “leituras e leitores”. Explicou aos familiares que era um projeto em parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora, e que era um projeto muito sério, muito rico. Ainda destacou que foi um projeto aprovado pela secretaria de educação da cidade. Mencionou as ações que estavam sendo realizadas como a modificação da Sala de Leitura, o empréstimo de livros e as oficinas literárias desenvolvidas pelos professores. Naquele momento a vice-diretora complementou o exposto dizendo: “E aí gente, chegou em casa pergunta qual o livro da semana você pegou emprestado? Leia junto, participa, pergunta, estimule o filho de vocês a lerem, porque a leitura é boa para ler pelo prazer de ler e não por obrigação. (NOTA DE CAMPO, 25/08/2017).

Diante desse excerto, verifica-se a importância do envolvimento da gestão na valorização do projeto de leitura e em relação aos temas pedagógicos. Destaco o movimento

da escola em estimular as famílias para compartilhar as leituras com as crianças. Das quatro reuniões de pais observadas, a equipe gestora realizou esse movimento de mostrar aos pais e/ou responsáveis a importância de vivenciarem as leituras junto com os filhos. Destaco os enunciados da coordenadora em duas reuniões de pais distintas: “Pede para que os pais deem atenção aos livros que vão para casa, leiam juntos, mostrem interesse, demonstrem encanto pelo livro” (NOTA DE CAMPO, 25/08/2017) e “disse que a leitura faz parte do contexto da escola, mas que não era para os alunos deixarem de ler nas férias. Pediu para que os pais incentivassem as crianças” (NOTA DE CAMPO, 20/12/2017). Em outra reunião, a vice- diretora pediu para que os pais ou responsáveis lessem junto com os filhos e que conversassem sobre as leituras e apontou que “a leitura é muito importante gente, quem não lê não sonha, não imagina. Livro é preciosidade, é como se saísse luz dele” (NOTA DE CAMPO, 26/05/2017).

Portanto, a partir do exposto, é notório o envolvimento da equipe gestora em relação à leitura, principalmente, no que se refere ao envolvimento com as famílias. Contudo, o bilhete enviado às famílias referente ao empréstimo de livros realizado pela escola rompe com essa dimensão do envolvimento, pois apresenta um tom prescritivo.

O bilhete, considerado como um tipo de enunciado, é um gênero do discurso que integra as práticas do cotidiano escolar e serve como meio de estabelecer comunicação entre escola e famílias. Assim, segundo Bakhtin (2011), todo enunciado tem autor e destinatário e, no caso específico desse bilhete, o autor é a escola e o destinatário são as famílias.

Esse bilhete tem o intuito de informar às famílias sobre o empréstimo de livros. Porém, junto dessa informação há também uma prescrição. A escola deixa claro que o livro deve ser devolvido em perfeito estado e que precisam ser cuidados, preservados e que não podem ser devolvidos amassados, rasgados e sujos. Essas prescrições muito enfatizadas podem afastar, tanto as crianças quanto as famílias, do real objetivo do projeto que é “incentivar a leitura e também despertar o interesse na participação da família na vida cotidiana do educando” (PPP E.M.T.F.M, 2017, p. 67).

O excerto a seguir da entrevista com uma professora é elucidativo dessa explanação:

P: E esse empréstimo é obrigatório? A: Não, ele é voluntário.

P: E os alunos que você citou que, às vezes, não querem ler? Eles fazem o empréstimo?

A: Isso, aí o quê que a gente ouviu, o que eu ouvi que eu fiquei horrorizada, um aluno falou: ‘A minha mãe não quer que eu leve livro para casa’. E aliás, uns dois alunos justificaram da mesma forma, ‘minha mãe não quer que eu

leve’. Aí fizemos o seguinte, pedi para a mãe escrever um bilhete explicando por que ela não quer que leve o livro para casa e tal. (Professora A- 5º ano).

Não se sabe as razões pelas quais essas mães não querem que os filhos levem livros para casa. Entretanto, o bilhete que apresenta tom prescritivo pode ser um indicativo do afastamento das obras literárias.

Para iniciar o empréstimo de livros, seria necessário construir um ritual não só com os alunos, mas também com as famílias, a fim de que compreendam o objetivo desse projeto. É imprescindível que conheçam a importância da experiência entre criança e famílias através do objeto livro. Uma vez que as famílias entendam a proposta e a intenção da instituição, esse empréstimo e as relações estabelecidas a partir dele podem se tornar cada vez mais parte do âmbito familiar.

No documento marcelabrasilgalvão (páginas 96-100)