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1 O começo

4.3 Binarismo

O exercício de radicalizar os nossos olhares sobre a Educação Ambiental permite recolocarmos o forte binarismo presente no conjunto desse campo sob outro foco. Concordamos com os autores referenciais da Educação Ambiental no que se refere à identificação majoritária de algumas das tendências dispostas na totalidade do campo. Por sua historicidade, sabemos que a Educação Ambiental espelha os debates

dispostos na sociedade que colocam, de um lado, conservadores e, de outro, críticos. Em nossa compreensão, há, certamente, uma divergência fundamental que separa ambas correntes e que nos permite afastarmo-nos de um debate educativo-ambiental circunscrito a categorias como a Economia Verde ou o Desenvolvimento Sustentável, as quais entendemos serem constituídas a fim de reafirmar os interesses da classe dominante. No entanto, conforme temos sustentado, há uma multiplicidade de olhares para a Educação Ambiental que não cabem nessas duas tendências que, assim como os autores, entendemos majoritárias. Não se pode, sequer na delimitação de Educação Ambiental Crítica, pressupor que há uma totalidade de consensos firmados e que todos pensamos e temos práticas sociais adequadas à totalidade dos que com essa corrente afinam-se.

Por maior obviedade que possa conter tal reflexão, ela faz-se ainda necessária dada a dificuldade na corporificação de nossos conceitos, de nossos posicionamentos e mesmo da radicalidade que talvez não seja tão frequente quanto gostaríamos. Se há, por parte dos autores referenciais desse corte específico da Educação Ambiental Crítica, um movimento de retomada de elementos centrais da realidade e uma tomada de posição que comumente aponta para a radicalidade que ensejamos, conforme se apresenta, por exemplo, nos estudos de Trein (2012), Tozoni-Reis (2008) e Layrargues (2012), há também um vasto cenário de apropriação do conteúdo dos escritos desses autores, apropriações que nem sempre se coadunam ao pensamento original dos autores. Já nos dedicamos anteriormente à abordagem dessa questão quando questionamos a utilização do pensamento de Descartes, Marx e também Foucault por diversos de seus comentadores. Esse movimento de apropriação e desenvolvimento do constructo dos autores, saudável e necessário, precisa estar aliado diretamente a um exame radical dos fundamentos que subsidiam os autores a fim de que não se produzam alguns cenários que consideramos, com muita infelicidade, presentes no cotidiano da Educação Ambiental Crítica.

Não é nossa intenção apontar responsabilizações individuais sobre a apropriação dos autores por seus comentadores, ou mesmo balizar, conforme a nossa própria vontade, as práticas de Educação Ambiental que se desenvolvem assumindo uma perspectiva crítica. Entretanto, a fim de que possamos realmente reconhecer os limites de nossas proposições, onde ainda precisamos avançar e em que elementos podemos pactuar, é necessário que coloquemos em questão o real binarismo que contrapõe algumas das posições assumidas nesse grande campo majoritário chamado

Educação Ambiental Crítica. A leitora (o leitor) emaranhada nas vivências da Educação Ambiental talvez já tenha visto, ou ouvido falar – normalmente queixosamente – sobre experiências de Educação Ambiental para ou sobre comunidades tradicionais. Também não se constitui em excrescência apontarmos para a grande quantidade de projetos de Educação Ambiental – e as consequentes pesquisas sobre – que dialogam com a temática da água, dos resíduos, da reciclagem e da reutilização, dentre outros, assumidamente postados no campo crítico, mas que pouco avançam no entendimento das condições em que se produz o desperdício da água, a gigantesca produção de resíduos e as dinâmicas particulares da reciclagem. Essa é a vinculação que entendemos mais profícua para este estudo. Não se trata de um apontamento dogmático do que pode e o que não pode ser classificado como Educação Ambiental, como Educação Ambiental Crítica e como, no caso em que nos interessamos particularmente, como Educação Ambiental Crítica que “bebe” na fonte da radicalidade marxiana. Mas apresentamos como questionamento teoricamente prioritário relacionado à afinidade de nossas práticas e estudos com a sociabilidade que efetivamente defendemos.

Reconhecemos, portanto, um cenário difuso em relação a uma definição binária plena sobre a totalidade da Educação Ambiental. Consideramos ser mais produtivo, em oposição a esse completo binarismo, um posicionamento de menor aderência ao conjunto do campo da Educação Ambiental Crítica do que propriamente aos referenciais que efetivamente utilizamos em nossa compreensão de mundo. Assim posto, pretendemos afirmar que talvez seja necessário um empenho coletivo das educadoras e educadores ambientais no sentido do fortalecimento dos fundamentos da Educação Ambiental, para que, com isso, possamos entender os limites de nossas compreensões e os caminhos que ainda precisamos trilhar.

Procuramos estabelecer, no capítulo 2 (dois), um espaço para que a leitora (o leitor) pudesse ter a oportunidade de um contato mais direto com excertos e categorias principais defendidas por alguns autores referenciais da Educação Ambiental. O nosso movimento subsequente foi o de, a partir dos indicativos dados por eles, procurar as correntes majoritárias do marxismo que influenciaram os delineamentos da Educação Ambiental Crítica tal qual a conhecemos. É um esforço que se fez necessário para entendermos esse cenário aparentemente contraditório que apontamos no campo do saber em que estamos nos detendo. De um lado, indicamos para uma justa posição dos autores referenciais em relação a categorias importantes da constituição do sistema e de apropriação privada em que nos constituímos. Ainda que tenhamos certas

ponderações quanto à circunscrição temporal de algumas críticas ou a secundarização de debates elementares, reconhecemos um esforço produtivo e salutar na produção dos autores. Por outro lado, identificamos que há um cenário amplo de práticas e teorizações críticas que se confunde – em alguns casos, com perfeição – com práticas e teorizações conservadoras. Essa contradição, entendemos, não pode ser deduzida apenas das ―brechas‖ apontadas no pensamento dos autores referenciais, qual sejam, a identificação de elementos secundários enquanto causas prioritárias da ascensão do sistema do Capital – um exemplo disso é a identificação do capitalismo, do industrialismo e da modernidade como causadoras da falência sócio-ambiental da atualidade –.

Consideramos necessário retornar às influências que chegam à Educação Ambiental para entendermos como, de fato, são produzidas essas contradições, se, por desconhecimento dos fundamentos ou por reflexo do amplo cenário de positivização, elitização e neopositivização das ciências humanas. Gostaríamos, neste ponto, de apresentar algumas das nuances que se mostram importantes em concepções influentes na Educação Ambiental Crítica, aquelas que, em um demorado período textual, dedicamo-nos a explicitar.