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3. ESCOLARIZAÇÃO DA PESSOA AUTISTA

3.1 BREVE HISTÓRICO DOS CAMINHOS DAS POLÍTICAS DE INCLUSÃO

Um resgate histórico da educação no Brasil nos oferece elementos para compreender como um modelo educacional vem sendo constituído no país, principalmente acerca da escolarização da pessoa com diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Segundo Nabuco (2010), no Brasil a concepção de Educação Inclusiva é fortemente marcada pela noção de Educação Especial e pela categorização do comportamento dos alunos.

As primeiras escolas especiais segregadas no Brasil datam do Império, mas Galery (2017) traz em seus estudos que os movimentos segregadores dos familiares de pessoas com deficiência foram capazes de criar as escolas especiais e, por volta da década de 1950, o movimento da integração ampliou a participação dessas pessoas na sociedade, sendo assim incorporadas às leis.

A Constituição brasileira de 1988 é exemplo de uma política de integração no campo educacional, ao afirmar que os portadores de deficiência7 devem estar preferencialmente na rede regular de ensino. Entretanto, o melhor exemplo talvez seja o das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que reflete historicamente como a mudança de paradigma que se nas leis (GALERY, p. 44, 2017, grifo do autor).

O aprofundamento das discussões a respeito do acesso à escola por todos os estudantes ocorreu por volta de 1990 com a elaboração da Declaração Mundial sobre a Educação para todos (UNESCO, 1990), a qual apontava que, “apesar de esforços para se assegurar a educação para todos, diversos problemas de acesso, permanência e qualidade na educação persistem ao redor do mundo” (RODRIGUES, 2017).

Novos caminhos começaram a ser trilhados a partir dessa declaração, e em 1994 a criação da Declaração de Salamanca reforçou a ideia de que a diferença faz parte da humanidade e, por isso, não deveria ser utilizada a fim de classificar, patologizar e excluir

sujeitos (RODRIGUES, 2017). Dessa forma, firmou-se o compromisso com a educação de todos como direito fundamental.

Posteriormente, as Políticas Nacionais de Educação vinham caminhando para o sentido de uma educação inclusiva desde a assinatura da Convenção de Guatemala (através do Decreto no. 3.956), em 2001. Dessa forma, o decreto nº 7.611 derrubou o decreto anterior, retornando à possibilidade de educação segregada em escolas ou classes especiais. No entanto, a política do MEC mantém-se inclusiva, obrigando as escolas regulares a aceitarem as matrículas de alunos com deficiência.

Em 2008, o decreto nº 6.571 acaba com o financiamento público da educação especial segregada, modificando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996) e tornando obrigatória a matrícula das pessoas com deficiência em idade escolar na rede regular de ensino. Assim, as escolas brasileiras – em especial, as escolas públicas – passaram por uma mudança radical: viram-se obrigadas a aceitar, em seu corpo discente, alunos com qualquer tipo de deficiência, transtorno global de desenvolvimento e estudantes com altas habilidades.

A Política Nacional de Educação Especial na Educação Inclusiva (2008) fortaleceu as discussões sobre a inclusão, e trouxe para o cenário educacional a oferta de Atendimento Educacional Especializado (AEE)8, que é o campo de práticas interdisciplinares que herda seus saberes da educação especial. O AEE contribui para a promoção da inclusão no espaço escolar à medida que cumpre o papel de suplementação e/ou complementação, potencializando a autonomia, eliminando barreiras para a plena participação do sujeito público-alvo da educação especial na escola ou fora dela.

No entanto, como afirma Serra (2008), sabe-se que somente a legislação não é suficiente para garantir uma prática inclusiva nas escolas, que, historicamente, desenvolvem uma rotina que se pode chamar de excludente e pautada em diagnósticos. Reflexo disso é a dificuldade da efetividade da Lei Berenice Piana, nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012, na qual a pessoa com transtorno do espectro autista (TEA) é considerada pessoa com deficiência para todos os efeitos legais, e do seu histórico de vetos sofridos:

O primeiro veto foi o inciso IV do Art. 2o que estabeleceria a inclusão dos estudantes com transtorno do espectro autista nas classes comuns de ensino regular e a garantia de atendimento educacional especializado gratuito a esses educandos, quando apresentarem necessidades especiais e sempre que, em função de condições

8 O AEE deve ser organizado a partir de uma ação mediada e intencional planejada de acordo com as especificidades de cada sujeito público-alvo da Educação Especial. Implica o planejamento sistematizado, atrelado à sala regular e ações colaborativas de todos os envolvidos no processo de inclusão (ANJOS & SOUZA, 2016).

específicas, não for possível a sua inserção nas classes comuns de ensino regular, observado o disposto no Capítulo V (Da Educação Especial) do Título V da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) (BRASIL 2, 2012).

Isso é decorrente da perspectiva de produtividade e homogeneidade, frutos da lógica industrial inserida em nossa sociedade, que reflete diretamente na integração/segregação das pessoas com deficiências, e no funcionamento das escolas. Um discurso que revela os ideais de um determinado tipo de sociedade, e que no âmbito educacional, como Nabuco (2010) afirma, pode ser encontrado no pressuposto do aluno ideal e do professor idealizado, que tomados como objetos de satisfação de uma sociedade ideal.

Dessa forma, de acordo com Nabuco (2010), a Educação Especial, repousa sobre contradições sociais de categoria, por exemplo, sobre noções deficiência e de inadaptação e, também, sobre instituições e públicos específicos. Tendo a sua elaboração, com construções e reconstruções, muitas vezes pautadas nesta mesma lógica biologizante e de homogeneidade da vida. Logo, o discurso médico é incorporado nas práticas sociais como absoluto e com valor científico, respaldando ideais e ações de controle social.

O lugar do TEA no discurso biomédico é reduzido aos desvios de comportamentos, falta de interação e comunicação, pois buscam no organismo a normalidade ou a falta dela. No entanto, o que o diagnóstico do especialista tem feito na educação, nada mais é do que reafirmar a condição de excluído, na medida, em que, não se ocupa com os processos sociais e, dentro deles, o da sua escolarização, como constituidor de suas capacidades ou incapacidades (BUENO, 2008, p. 43).

3.2 EDUCAÇÃO INCLUSIVA: QUAIS PARADIGMAS PERMEIAM ESSA