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CAPÍTULO III CONTEXTUALIZAÇÃO DA TEORIA DO RECONHECIMENTO DO

3.1 Breve retomada histórica da Teoria Crítica

Ao mencionar Teoria Crítica, falei anteriormente de um grupo de intelectuais alemães que se embasaram no marxismo, salientando que esse grupo não seguiu o viés ortodoxo do marxismo, e que, na década de 1920, iniciou reflexões teóricas a respeito de temas filosóficos, sociais, culturais, tendo como ponto de partida os problemas sociais causados pelo capitalismo tardio. Esse grupo de intelectuais influenciou de maneira significativa o pensamento ocidental. Os pioneiros desse grupo foram Theodor Adorno e Max Horkheimer, e o nome do grupo por eles fundado é a chamada “Escola de Frankfurt”, “pelo fato de se estabelecerem enquanto um grupo de pesquisadores nesta cidade alemã, criando aí seu instituto de investigação” (PUCCI, s/d, p. 2).

Max Horkheimer, ao escrever o ensaio “Teoria tradicional e teoria crítica”, no ano de 1937, representou, a partir de então, a temática discutida por este grupo de intelectuais. Horkheimer buscou mostrar nesse texto que, além de pensar nas questões econômicas, de trabalho e do capitalismo, também era importante refletir sobre as questões filosóficas, culturais, sociais e políticas que envolviam os problemas da época (PUCCI, s/d).

Adorno e Horkheimer e demais teóricos do Institut für Sozialforchung, Frankfurt am Main, Deutschland (Instituto de Pesquisa Social - Frankfurt no Meno, Alemanha), a chamada Escola de Frankfurt, em suas proposições teóricas e críticas

buscavam romper com limitações impostas pela supervalorização do capital, portanto, do poder econômico. Em suas reflexões abordavam os limites atingidos pela união entre ciência e tecnologia, como forma de ampliar o poder e a geração de lucros e, em contrapartida, a desvalorização do que é humano e da sensibilidade. Um dos temas que se mostram mais recorrentes nas suas produções é o do Iluminismo ou o Esclarecimento.

Na obra Dialética do Esclarecimento8

Em algumas das entrevistas radiofônicas realizadas com Helmutt Becker, para as Rádios de Hessen e Frankfurt, Adorno buscou refletir sobre questões educacionais sob o aspecto filosófico, cultural e estético. Nessas entrevistas, percebe-se que o autor se preocupou em expressar suas ideias e conceitos de forma que os ouvintes pudessem compreender o que ele estava a comentar; o que permite vislumbrar um tom, até certo ponto não tão negativo ou pessimista quanto ele deixou transparecer em suas obras e demais escritos.

, os autores abordam a reflexão sobre a

dialética da razão, que inicialmente possibilitaria aos homens autonomia e autodeterminação, porém esse excesso de razão acabou por conduzir a um processo de instrumentalização do ser, como facilitadora da dominação e repressão dos homens. Segundo Horkheimer, a teoria cartesiana preocupava-se em formar sentenças de conceitos universais. Já, a teoria crítica busca analisar o homem e a sua relação com a natureza, considerando o contexto histórico e o social nos quais se encontrava inserido.

A simbiose entre ciência e técnica com a dominação econômica e política no capitalismo moderno mostra quão profundamente ambas estão comprometidas com os interesses das classes dominantes. A superação da moderna sociedade capitalista implica a transformação radical da ciência e da tecnologia que nela atuam, impondo-se a necessidade de reformular essencialmente o seu conceito (FREITAG, 1994). Ou seja, ciência e técnica transformaram-se em ideologia a serviço da legitimação do estado e da economia.

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Obra elaborada pela parceria existente entre Adorno e Horkheimer, a Dialética do Esclarecimento “[...] reflete a atitude crítica com a qual Adorno e Horkheimer encaram a evolução da “cultura” nas modernas sociedades de massa”. (FREITAG, 1994, p.20).

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Habermas, ao criticar Adorno e Horkheimer, não deixou as reflexões sobre a instrumentalização da razão ocasionada pela supervalorização da ciência e da tecnologia em nome de poder e capital. Habermas propõe a compreensão da sociedade através de duas esferas: o sistema e o mundo da vida. O sistema, regido pela lógica instrumental, manifesta-se nas relações de poder e de capital; e o mundo da vida, sendo a esfera na qual a linguagem se apresenta, manifesta concepções de mundo, sociedade e relações subjetivas. Assim, Habermas sugere o abandono da filosofia da consciência como possibilidade de redenção da teoria crítica, por meio de uma filosofia da linguagem intersubjetiva ou teoria comunicativa.

Já Axel Honneth foi assistente de Jürgen Habermas entre os anos de 1984 e 1990. Atualmente, Honneth é diretor do Instituto de Pesquisa Social e um dos autores de maior expressão na que atualmente é considerada a terceira geração da Escola de Frankfurt. Honneth, seguindo os passos dos mestres que o antecederam no Instituto de Pesquisa Social, realizou amplos estudos a respeito da Teoria Crítica e de seus precursores, e, do mesmo modo que Habermas fez com seu mestre Adorno, também ele estabeleceu críticas e questionamentos à tradição da Teoria Crítica, em especial ao seu próprio mestre.

Marcos Nobre, no prefácio do livro de Axel Honneth Luta por

Reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais apresenta uma retomada

histórica da teoria crítica dentro do Instituto de Pesquisa Social, como forma de facilitar a compreensão do caminho percorrido por ele e da inserção de sua teoria dentro da perspectiva da teoria crítica. Nesse sentido, a passagem abaixo relata o surgimento da ideia teórica defendida por Honneth:

Assim como Habermas apresentou sua teoria como solução para impasses, que detectou em Horkheimer e em Adorno, Honneth tentou mostrar que a solução de Habermas para essas aporias se fez ao preço de novos problemas. E isso porque Habermas enxergou apenas uma parte daquelas dificuldades presentes nos trabalhos de Horkheimer e de Adorno. Pode-se dizer que Honneth aplica a Habermas o mesmo remédio que este aos seus antecessores: partindo das consequências indesejáveis a que chega seu pensamento, procura encontrar em seus escritos pistas de um rumo teórico que não foi trilhado e que poderia ter evitado as dificuldades detectadas (NOBRE, 2003, p.10-11).

Assim, da mesma forma que Habermas propôs a Teoria da Ação Comunicativa como possibilidade de superação de certo pessimismo em que Adorno e Horkheimer haviam se enredado, Honneth busca mostrar as insuficiências da teoria desenvolvida por Habermas, apontando que a mesma poderia ser mais bem desenvolvida a partir do conceito de luta por reconhecimento.

Honneth afirma que há um déficit sociológico na teoria crítica, e mais especificamente na visão da teoria crítica defendida por seu mestre. Esse déficit sociológico está relacionado com o ponto a partir do qual a sociedade deveria ser interpretada. Para tal, ele recorre ao conceito de luta por reconhecimento já pensado originalmente por Hegel, no período em que este ainda permanecia na Universidade de Jena.

Honneth supõe que Habermas deveria ter direcionado suas reflexões no sentido de repensar o sentido do conceito de emancipação. Critica também a teoria crítica por justamente dividir a sociedade em dois polos contrários, ou seja, de um lado a dominação do capital e do outro a socialização do indivíduo. Já em Habermas, o déficit se manifesta na dualidade criada entre o mundo da vida e o sistema, divisão essa que Honneth julga ser o ponto culminante para o seu diagnóstico de déficit sociológico da teoria crítica.