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CÉLULAS-TRONCO MESENQUIMAIS: Aspectos moleculares, características funcionais in vitro e emprego na terapia celular in vivo.

Células-tronco e progenitoras isoladas a partir do tecido adulto representam uma importante promessa na terapia de diversas condições patológicas. As células-tronco adultas detêm a capacidade de auto-replicação por longos períodos além da manutenção do potencial de diferenciação através da vida do organismo (CANCEDDA et al., 2003).

As células-tronco adultas foram inicialmente identificadas em tecidos caracterizados pela alta taxa de turnover celular, como a medula óssea. Recentemente, essas células têm sido isoladas a partir de órgãos adultos previamente conhecidos pela capacidade de auto- renovação limitada, o que oferece perspectivas de novas estratégias terapêuticas para reparo de danos teciduais (CANCEDDA et al., 2003).

As células-tronco adultas podem ser encontradas em diversos tecidos, como cérebro, pulmões, coração, rins e baço. Porém, a medula óssea permanece sendo a melhor fonte caracterizada e escolhida na obtenção destas células (THIEMERMANN; HUSEIN, 2010). A medula óssea adulta contém uma população heterogênea de células, incluindo células hematopoiéticas, macrófagos, eritrócitos, fibroblastos, adipócitos e células endoteliais. Além destas, a medula óssea contem um subtipo de células precursoras não-hematopoiéticas que apresentam como característica principal a multipotencialidade. Estas células são comumente denominadas células-tronco do estroma medular ou Células-Tronco

Mesenquimais (CTMs), no inglês Mesenchymal Stem Cells (MSCs) (THIEMERMANN; HUSEIN, 2010).

As células-tronco mesenquimais são um grupo de células clonogênicas, presentes no estroma da medula óssea, originadas a partir do folheto germinativo mesodermal, capazes de diferenciação em várias linhagens de células do tipo mesodérmico e possivelmente, mas ainda parte de assunto controverso, em outros tipos celulares não mesodérmicos, como células neurais ou hepatócitos (BYDLOWSKY et al., 2009).

Inicialmente as CTMs foram nomeadas como precursoras de fibroblastos da medula óssea por Friedenstein, o qual descreveu seu isolamento e suas propriedades como o caráter clonogênico, adesão ao substrato e aparência fibroblastóide ou em formato de espículas distribuídas em monocamadas in vitro, o que definiu como Unidades Formadoras de Colônias de Fibroblastos (CFU-F). As células aderentes eram heterogêneas e ficavam inativas por dois a quatro dias até iniciarem a rápida proliferação. Ao longo das passagens, as células se tornavam homogeneamente fibroblastóides e foram capazes de se diferenciar em adipócitos, condrócitos, osteócitos e mioblastos, ambos in vitro e in vivo (BYDLOWSKY

et al., 2009).

Na medula óssea, as CTMs são componentes importantes do nicho hematopoiético, contribuindo com o suporte estromal através da sustentação direta do microambiente e com a secreção de fatores parácrinos envolvidos na proliferação, função e diferenciação das Células-Tronco Hematopoiéticas (CTHs) (NARDI; MEIRELLES; CAPLAN, 2008). Constituem uma população rara na medula óssea, cuja freqüência varia entre 0,01% a 0,0001% do total de células nucleadas. Apesar da rara presença, estas células podem proliferar efetivamente, mantendo seu caráter de células-tronco in vivo. A perda progressiva do potencial de diferenciação devido à senescência ocorre após cerca de 40 duplicações (KRAMPERA et

al., 2007).

As células estromais da medula óssea são raras e heterogêneas, sendo uma mistura de progenitores em diferentes estágios de comprometimento com a linhagem mesodérmica e somente parte destas apresenta-se multipotentes e auto-renováveis (BYDLOWSKY et al., 2009).

Já foram descritas pelo menos três tipos celulares em cultura, identificadas conforme potencial proliferativo e morfologia. Assim existem as células tipo I, que são fusiformes e crescem rapidamente, as células tipo II que são achatadas e crescem lentamente e mais recentemente denota-se sobre as células RS (células pequenas rapidamente auto- renováveis). As células RS são progenitoras primitivas e possuem o maior potencial para auto-renovação e multipotencialidade. São distinguíveis das células maduras a partir da identificação de marcadores de superfície e proteínas específicas, tais como receptor-2 de

VEGF, receptor de tirosina-quinase, CD117 (c-kit) entre outros (PROCKOP, 2009 e BOBIS

et al., 2006).

A mesma heterogeneidade é vista nas colônias celulares isoladas da medula óssea em ensaio clonogênico in vitro. Essa característica é notada desde a diversidade morfológica até o potencial de replicação celular numa mesma cultura.

Quando isoladas da medula óssea e cultivadas em baixa densidade, colônias discretas de células fibroblastóides aderentes são formadas e cada clone se origina de uma única célula precursora, caracterizando assim uma unidade formadora de colônia de fibroblastos (CFU- F). A enumeração das colônias in vitro, sugere a freqüência de CFU-F contidas entre as células estromais na medula óssea in vivo. Essas mesmas colônias se apresentam morfologicamente diferentes, contendo uma hierarquia de progenitores incluindo células- tronco esqueléticas multipotentes e progenitores comprometidos, impossíveis de distinção devido à ausência de marcador específico (KUZNETSOV; BIANCO, 2009).

Diversos órgãos adultos, além da medula óssea, podem servir como fontes de células- tronco mesenquimais, tais como o tecido adiposo, fígado, placenta, líquido amniótico, sangue do cordão umbilical, polpa dentária, tecido muscular e outros. Interessantemente, as características fenotípicas, capacidade proliferativa e multipotencialidade das células-tronco mesenquimais variam conforme o tecido original, e isto pode ser atribuído à influência dos fatores locais, refletindo a importância do nicho em estabelecer o fenótipo das células-tronco e suas interações (MEIRELLES; CHAGASTELLES; NARDI, 2006).

Apesar da relevância clínica atribuída às células-tronco mesenquimais, o entendimento completo sobre sua biologia ainda permanece inconsistente. Além disso, a ausência de um único marcador de superfície específico para identificação desta população celular aliada às inúmeras variações na terminologia limita o progresso das pesquisas relacionadas

(THIEMERMANN; HUSEIN, 2010).

Na tentativa de padronizar a caracterização das células humanas mesenquimais estromais multipotentes entre os diversos grupos científicos, a Sociedade Internacional para Terapia Celular (International Society for Cellular Therapy) propôs alguns critérios mínimos a serem seguidos para identificação desta população celular:

 Adesão celular a superfície (plástico) em condições padrões de cultivo;

 Expressão positiva dos marcadores CD105, CD90, CD73 em 95% da população

celular e ausência de marcação para CD34, CD45, CD14 ou CD11b, CD79α ou CD19 e HLA-II (células positivas ≤2%) através da técnica de citometria de fluxo.

 Serem capazes de se diferenciar em osteoblastos, condroblastos e adipócitos

Esses requisitos supracitados propostos por Dominici et al (2006) são adotados internacionalmente pelos diversos grupos de pesquisas científicas e permitem a padronização dos preparos celulares além de comparações diretas entre os diferentes estudos, facilitando o uso das células desde os testes pré-clínicos até o emprego na terapia celular.

A facilidade de isolamento e expansão destas células, in vitro, aliada à sua multipotencialidade, ação parácrina e propriedade imunossupressora torna as células-tronco mesenquimais, alvo para diversas aplicações na medicina regenerativa com vantagem sobre as células-tronco embrionárias em relação à ausência de considerações éticas e a não formação de teratomas.

Contudo, os mecanismos biológicos que elucidem esse papel terapêutico das células-tronco mesenquimais não estão totalmente esclarecidos. Na tentativa de explicar as atividades de diferenciação, proliferação, migração celular e secreção parácrina responsáveis pela regeneração e recuperação do dano tecidual, se faz necessário a criação de modelos in

vitro que simulem as patologias a serem tratadas in vivo pela terapia celular.

1.3.1. CARACTERIZAÇÃO ANTIGÊNICA DAS CTMs

As CTMs constituem uma população heterogênea de células quanto à morfologia, fisiologia e expressão de antígenos de superfície. Até o momento, nenhum marcador específico foi identificado (BOBIS et al., 2006 ; KRAMPERA et al., 2007).

Essas células apresentam um grande número de moléculas de adesão, proteínas da matriz extracelular, receptores para citocinas e fatores de crescimento, associados com sua função e interação com a matriz estromal (BOBIS et al., 2006).

Conforme os critérios mínimos estabelecidos pela Sociedade Internacional par Terapia Celular, as células–tronco mesenquimais são identificadas pela presença positiva dos marcadores CD105, CD73 e CD90 e ausência dos antígenos CD34, CD45, CD14 ou CD11b, CD79a ou CD19 e HLA-DR (NARDI; MEIRELLES; CAPLAN, 2008). Além desses marcadores já conhecidos, as CTMS também expressam uma variedade de antígenos presentes em outros tipos celulares, tais como CD106, CD166, CD29, CD117, CD44, Sca-1 e Stro-1 (BOBIS et al., 2006).

O marcador Stro-1, atualmente considerado o antígeno mais apropriado para identificação da população de CTMS, não é específico para esse tipo celular e ainda apresenta a desvantagem da perda de sua expressão ao longo das passagens (NARDI; MEIRELLES; CAPLAN, 2008).

Outro antígeno em destaque é o CD146/MCAM (melanoma-associated cell adhesion molecule) presente em um subtipo específico de CTMS, classificadas como células

subendoteliais dos sinusóides da medula óssea ou células adventícias reticulares ou simplesmente pericitos. Essa molécula pertence à superfamília das imunoglobulinas, também expressa em subtipos endoteliais e outros tipos celulares restritos. Em trabalho realizado por Sacchetti et al (2007) , verificou-se que o marcador CD146 foi expresso pelas células clonogênicas estromais e esta expressão é retida em cultura pelas células progenitoras primitivas, mas perdida após diferenciação osteogênica. Células estromais

CD146+ são auto-renováveis, secretam angiopoietina-1 e conseqüentemente suportam

adequadamente o microambiente hematopoiético.

As CTMs são também conhecidas por apresentarem um conjunto de receptores de superfície associados com adesão célula-célula e célula-matriz, tais como as integrinas α5β3 e α5β5, ICAM-1, ICAM-2, LFA-3 e L-selectina (BOBIS et al., 2006).

As CTMs expressam receptores de citocinas : IL-1R, IL-3R, IL-4R, IL-6R e IL-7R. Essas células também produzem um arsenal típico de citocinas, quimiocinas e fatores de crescimento tais como IL-6, IL-7, IL-8, IL-11, IL-12, IL-14, IL-15, LIF (Fator Inibidor da Leucemia), G-CSF (Fator Estimulador de Colônias de Granulócitos), SCF (Stem Cell Factor), M-CSF (Fator Estimulador de Colônias de Macrófagos), flk-3L, a última implicada principalmente na hematopoese. Entre as quimiocinas produzidas se encontram CXCL4, CXCL9, CXCL10 e CXCL1. Outros receptores também identificados na superfície são βFGF-R, PDGF-R, TGF-βR, Thy-1, INF-yR e TNF-R (KODE et al., 2009).

O perfil fenotípico das CTMs pode variar, in vitro, conforme as condições de cultivo, origens das amostras e período de tempo (passagem celular/estágios de maturação). Alguns antígenos podem ser encontrados nas CTMS recém-isoladas, porém sua expressão desaparece em cultura. Esse fenômeno é visto para os receptores de quimiocinas, marcadores de superfície e algumas moléculas de adesão (BOBIS et al., 2006).

As CTMs de outras espécies animais não expressam obrigatoriamente as mesmas moléculas presentes nas células de origem humana. Alguns marcadores negativos para CTMs humanas, como CD34, têm expressão variável para população de células-tronco mesenquimais murinas. É importante notar também, que diferenças na expressão de muitas moléculas de superfície podem ser influenciadas por fatores secretados por células vizinhas nas passagens iniciais e a expressão in vitro de alguns marcadores pelas CTMs nem

sempre correlaciona com seu padrão de expressão in vivo (CHAMBERLAIN et al., 2007).

Diante da diversidade de moléculas de superfície e heterogeneidade celular, o uso de um único marcador não possibilita a identificação das CTMs. Logo, a associação de diferentes antígenos, formando um painel de anticorpos para detecção fenotípica é essencial para o isolamento, purificação e cultivo dessas células in vitro. Técnicas moleculares com

diferentes metodologias (citometria de fluxo, imunocitoquímica, análise gênica e outras) trazem maior especificidade e auxiliam na identificação mais precisa dessas células.

1.3.2. PROPRIEDADES BIOLÓGICAS E FUNCIONAIS DAS CTMs EM CULTIVO: multipotencialidade e ação parácrina.