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C ONSIDERAÇÕES FINAIS

No documento CidadesSustentáveis (páginas 48-50)

Numa perspectiva pragmática, é possível distinguir no atual cenário brasileiro dinâmicas pró e contra os princípios da sustentabilidade urbana, bem como uma série de fatores que as impulsionam. Vários dos entraves à almejada conquista da cidade sustentável já foram apontados ao longo deste diagnóstico. Cabe ainda mencionar outros que, seja pela magnitude que adquiriram em um país continental como o Brasil, seja pela natureza estrutural que os caracterizam, desempenham um papel negativo, exigindo esforços redobrados para que não retardem os processos que visam a alcançar o desenvolvimento sustentável. São eles:

• A reforma inconclusa do Estado brasileiro, implicando ainda esforços significativos para a modernização das instituições e dos mecanismos de gerência que foram herdados do modelo estadonovista (década de 1930) e do Estado desenvolvimentista da década de 1970, quando a dimensão ambiental era sequer conhecida pelos gestores e o centralismo das decisões foi largamente praticado. A descentralização, administrativa e de recursos, como reza a Constituição Federal de 1988, tem sido lenta e não conta com um plano de metas.

• As dificuldades econômicas e, portanto, a baixa capacidade de investimentos em infra-estrutura urbana e serviços básicos. As projeções indicam, no curto prazo, um crescimento do PIB aquém da sua necessidade de fazer frente ao endividamento (interno e externo) e, no médio prazo, nenhum indicador seguro de que o desejado aumento da riqueza nacional far-se-á com base em critérios mais justos socialmente e mais responsáveis do ponto de vista ecológico. Está portanto configurada uma tendência de aumento do descontentamento social, intensificada pelos efeitos recessivos que o chamado ajuste fiscal está produzindo (desemprego, aumento da pobreza urbana, etc.).

• Reforma agrária incompleta e sem conexão com a inserção econômica competitiva nos mercados globalizados, o que pode significar, se não for acionada uma política de fixação dos assentados rurais, nova onda de migração para as cidades, de um lado, e do adensamento da desruralização do país, de outro.

• Reforma fiscal e tributária orientada para os problemas do déficit das contas públicas e não para as necessidades que o desenvolvimento sustentável coloca. Na reforma tributária em curso, a

discussão de tributos seletivos não vem considerando a tendência internacional de utilizar instrumentos econômicos da base tributária nacional para alavancar a nova economia.

Por outro lado, pode-se contabilizar uma série de fatores positivos, impulsionadores do desenvolvimento sustentável e que devem ser ampliados e fortalecidos. São eles:

• A estratégia de inserção econômica competitiva adotada pelo país coloca as questões ambientais no primeiro plano da agenda econômica, uma vez que crescem as barreiras não-tarifárias ligadas à certificação de produtos nos mercados regionais e globais. Essa tendência leva à aceleração da reconversão industrial e à adoção de procedimentos ambientais compatíveis.

• O aumento da consciência ambiental da população e a crescente institucionalização de organismos e de sistemas de gestão públicos do meio ambiente por todo o país. Amplia-se a base material de uma nova cultura, com a proliferação, sobretudo nestes últimos cinco anos, de cursos universitários, de pesquisas e de projetos ‘demonstrativos’ que para construir as bases do desenvolvimento sustentável no país. O ambientalismo tornou-se um movimento cultural importante e vem ampliando a sua base política por intermédio de centenas de organizações,10 a maioria com

atuação local.

• O adensamento da vida democrática, fenômeno relativamente recente mas que já contabiliza uma inegável ampliação da esfera pública e da demanda por participação. Atualmente, a emergência da ‘sociedade civil’, configurada quando opera instituições como ‘terceiro setor’, dá consistência a um novo conjunto de forças sociais, vitais para a sustentabilidade urbana. Os programas desenvolvidos pela Comunidade Solidária têm demonstrado que a sociedade brasileira está ativa e esperançosa. • A renovação significativa, ainda que lenta, do arcabouço legal que regula o controle e a gestão

dos recursos naturais no país. As novas leis nacionais, a dos Recursos Hídricos e a dos Crimes Ambientais, são peças fundamentais na gestão sustentável e têm uma aplicação direta nas cidades brasileiras, sobretudo no que diz respeito à disciplina do setor industrial.

Por fim, deve-se mencionar e valorizar as centenas de novas experiências em gestão urbana que vêm ocorrendo em todo o território nacional, mostrando a força das cidades e a importância de se fortalecer o protagonismo social e político local. Práticas de planejamento e orçamento público participativo, em que a população define prioridades para alocação de recursos; planejamento estratégico de cidades, em que a vocação e o futuro que se quer são desenhados pelos cidadãos em conjunto com gestores; Agendas 21 locais e Programas de qualidade de vida. Por todos os lados é possível ver a sociedade e os gestores públicos

empenhados na construção do novo desenvolvimento urbano. Sem um survey rigoroso, pode-se afirmar que mais de cinqüenta municípios brasileiros, congregando metrópoles, cidades médias e pequenas, já iniciaram processos de elaboração da Agenda 21.11 Essas experiências, pelo menos uma boa parte delas, têm sido

catalogadas por uma série de instituições com iniciativas que visam a divulgá-las. São as best practices, como as chamou a Conferência Habitat II. Elas reúnem um cabedal de conhecimentos, criatividade e soluções que, sem dúvida, irão desempenhar um importante papel na implementação da Agenda 21 brasileira.

10 Ver especialmente o catálogo de instituições e organizações ambientalistas brasileiras Ecolista, puiblicado

por iniciativa conjunta do Fundo Nacional de Meio Ambiente, ISER, WWF e Mater Natura, 1997.

11 Número fornecido pelo informativo número 14, Ações para um futuro sustentável, da Comissão Pró-

Agenda 21, do Rio de Janeiro, Iser, Rio de Janeiro, 1999. Entre as cidades mencionadas estão: Vitória, Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Juiz de Fora, Santos, Porto Alegre, Curitiba, Recife, Angra dos Reis, Niterói e Betim.

IV Estratégias prioritárias, diretrizes e propostas

Atendendo à orientação do Termo de Referência do Projeto Cidades sustentáveis, o Consórcio Parceria 21 procurou definir quatro estratégias prioritárias para avançar na direção da sustentabilidade das cidades brasileiras em um horizonte de dez anos, sistematizando e integrando as proposições de políticas urbanas e de ações, formuladas a partir da experiência das instituições parceiras, dos especialistas e dos cabeças-de-rede consultados na primeira etapa dos trabalhos, e das contribuições dos agentes governamentais, da sociedade civil e das universidades que participaram do workshop e do Seminário Nacional. Nesse sentido, as estratégias de sustentabilidade abaixo explicitadas refletem um esforço de sistematização do conjunto de proposições recebidas, segundo a metodologia antes descrita, e caracterizam-se por: a) potencial para assegurar a integração temática; b) importância estratégica para o desenvolvimento sustentável das cidades, segundo os preceitos estabelecidos pela

Agenda 21 e pela Agenda Habitat. A cada uma dessas quatro estratégias se associa um conjunto de diretrizes,

propostas e ações apresentado adiante.

No documento CidadesSustentáveis (páginas 48-50)

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