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Camillo Boito

No documento Arquitetura do terror (páginas 100-102)

5. Preservação

5.1. Teorias da Preservação

5.1.2. Camillo Boito

Os Restauradores, de Camillo Boito (1836-1914) que fora apresentado na Conferência feita durante a Exposição de Turim, no ano de 1884, mostra com bastante clareza o quanto a teoria da reconstrução evoluiu, através de duas teorias completamente opostas, por um lado a de John Ruskin e por outro a de Viollet-le-Duc195. É ainda neste texto, que Boito chama à atenção para a confusão que existe entre duas palavras sinónimas, a reconstrução e a conservação. De certo modo, para cada uma das artes, escultura, pintura e arquitetura, existia uma forma de restauração em que cada uma tinha as suas particularidades e como tal as suas complexidades.

Porém, é sob a arquitetura que Boito se distancia dos outros dois autores mencionados anteriormente, de Ruskin porque não aceitava a morte certa dos monumentos e de le-Duc, porque não aceitava levar os edifícios a um estado que poderia nunca ter existido anteriormente. É pelo fato de se afastar destas duas teorias que cria, ao mesmo tempo, uma teoria intermediária entre ambas. Boito diz sobre as reconstruções que nestas não devem existir nem acréscimos, nem quaisquer supressões, o que por vezes fazia com que o autor admitisse contradições nas suas próprias teorias, pois estas ainda estavam em fase de experiência/formação196.

Apesar de na sua grande maioria a sua teoria se distanciar das outras duas, existiam pequenos ideias nas quais Boito concordava com Ruskin, principalmente de que a intervenção a ser feita no monumento deveria ser contida. Na verdade, esta aproximação refere-se no mesmo princípio fundamental da não alteração substancial do monumento, apesar de Boito acreditar na necessidade de determinadas restaurações197. Existe ainda outro ideal ou caraterística presente na teoria de Ruskin na qual o autor se encontra de acordo, como na valorização da ruína, onde deste modo deve ser entendido o reconhecimento da sua beleza, como um aspeto pitoresco dessa mesma ruína, não havendo uma vontade de que esta voltasse a ter o seu aspeto original, mas sim que permanecesse como ruína. O medo que sente em relação à reconstrução como um perigo, distancia o seu pensamento dos escritos de le-Duc, e aproxima-se cada vez mais de Ruskin198.

Mas por breves instantes é possivel reconhecer uma aproximação a le-Duc, expressa em seus textos através de uma nova forma de pensar a intervenção sobre o legado do passado,

195 Viollet-le-Duc, arquiteto e teórico francês que ficou conhecido pela sua teoria da reconstrução em edifícios medievais. Consultado em: http://othaudoblog.blogspot.pt/2013/07/viollet-le-duc-e-teoria- do-restauro.html, visitado a 20 agosto de 2017.

196 ARAÚJO, Denise Puertas de. O pensamento de Camillo Boito. Resenhas Online. São Paulo, Brasil. 2005. p. 1.

197 Deve ser lembrado que Ruskin aceitava pequenas obras de consolidação (“muletas” que aumentassem a sobrevida do monumento). Consultado em: ARAÚJO, Denise Puertas de. O pensamento de Camillo Boito. Resenhas Online. São Paulo, Brasil. 2005. p. 1.

198 ARAÚJO, Denise Puertas de. O pensamento de Camillo Boito. Resenhas Online. São Paulo, Brasil. 2005. p. 2.

pensamento este que é resultante de um equilíbrio entre as proposições deste e de outros, um pouco mais radicais, de Ruskin. A não aceitação da morte inevitável dos monumentos, faz com que em certos momentos haja uma proposta de reconstruções, que apesar de mínimas, acabavam por eliminar a arbitrariedade de determinadas ações.199 Foi através do pensamento do autor, que foi elaborada com precisão a distinção entre reconstruir e o significado de conservar.

“Foram enunciados sete princípios fundamentais: ênfase no valor documental dos monumentos, que deveriam ser preferencialmente consolidados a reparados e reparados a restauros; evitar acréscimos e renovações, que, se fossem necessários, deveriam ter um caráter diverso do original mas não poderiam destoar do conjunto; os complementos de partes deterioradas ou faltantes deveriam, mesmo se seguissem a forma primitiva, ser de material diverso ou ter incisa a data de sua restauração ou, ainda, no caso das restaurações arqueológicas, ter formas simplificadas; as obras de consolidação deveriam limitar-se ao estritamente necessário, evitando-se a perda dos elementos característicos ou, mesmo, pitorescos; respeitar as várias fases do monumento, sendo a remoção de elementos somente admitida se tivessem qualidade artística manifestamente inferior è do edifício; registrar as obras, apontando-se a utilidade da fotográfica para documentar a fase antes, durante e depois da intervenção, devendo o material ser acompanhado de descrições e justificativas e encaminhado ao Ministério da Educação; colocar uma lápide com inscrições para apontar a data e as obras de restauro realizadas.200

Em conclusão, Boito defende tal como Ruskin a importância de preservar a arquitetura. Mas para Boito, quando esta não tem mais nenhuma maneira de se preservar, este discorda com Ruskin no sentido de deixar as ruínas ao destino do eventual desaparecimento. É apenas quando não existe outra solução que o Boito fica do lado de le-Duc, querendo dizer com isto que Boito não tenta imitar o que já existira naquele local no passado, mas sim em fazer uma intervenção na obra arquitetónica de modo a que fique bastante explicito o que era original e o que era novo, fazendo uma combinação da memória do passado com a do presente.

199 BOITO, Camillo. Os restauradores; trad. Beatriz Mugayar Kühl. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003.
 200 O texto de recomendações encontra-se em Camillo Boito, Questioni Pratiche di Belle Arti. Milano, Hoepli. 1893. p. 28-29.

No documento Arquitetura do terror (páginas 100-102)

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