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Os caminhos da formação docente

CAPÍTULO 4: ANÁLISES DAS NARRATIVAS: PROBLEMATIZANDO A

4.1 Ser professor: da escolha pela profissão aos caminhos da formação

4.1.2 Os caminhos da formação docente

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não era letra de professor, e aí eu tive que fazer toda a minha letra desenhada, modificar toda, tanto é que hoje eu não sei trabalhar com a letra bastão, a letra de forma com eles no quadro. A minha letra é toda desenhada, toda cursiva. Se eu for escrever com letra bastão ela começa a descer, agora se eu escrever cursiva, ela vai direito e reto, mas também foi por causa que eu tive isso lá no Magistério, eu tive caderno de caligrafia, a professora disse que eu tinha que aprender a ter letra de professor (Prof.

R).

Ao observamos os relatos dos professores, percebemos que todos eles carregam consigo imagens de lembranças de alguns professores que marcaram suas trajetórias escolares, sendo estas imagens muitas vezes motivadoras da profissão que escolheram. De acordo com Arroyo (2011) reproduzimos, em parte, traços e lembranças desta profissão, visto que somos formados nas relações com os outros, assim, internalizamos e recriamos situações e lembranças, mesmo que de forma inconsciente, uma vez que “nosso ofício carrega uma longa memória”

(ARROYO, 2011. p. 17).

Baseando-nos em Tardif (2012), podemos afirmar que os saberes que compõe nossas práticas e constituem nossas identidades docentes são formados desde muito cedo, antes mesmo de atuarmos na profissão. Ainda que não tenhamos consciência, somos constituídos das experiências que tivemos enquanto estudávamos, recordamos dos nossos professores, de vivências e experiências que nos aproximaram da docência.

realmente ajudou”. Segundo afirma ainda, devido aos vestibulares serem muito concorridos,

Tu tinha que fazer a escolha certa, senão era um ano depois só pra fazer.

Eram vinte e cinco vagas, uma coisa bem seletiva. Se tu não estavas entre os vinte e cinco, não tinha nem lista reserva, só no outro ano. Então tu tinha que te dedicar muito e pegar alguma coisa que tu tinha afinidade, pra não ter perigo de desistir (Prof. A).

Assim como o “Prof. A”, o “Prof. R” também optou pelo curso de Letras, embora seu primeiro vestibular tenha sido para o curso de Pedagogia – Habilitação Educação Infantil, sendo que ficou como suplente, mas não houve desistências.

Hoje em dia ele comemora o fato de não ter sido aprovado, pois percebeu que trabalhar com a Educação Infantil não seria sua aptidão. No outro ano, após buscar conhecer mais sobre o curso de Pedagogia, considerou que como já possuía habilitação para atuar na Educação Infantil e nos Anos Iniciais, seria mais interessante ingressar em outro curso, sendo escolhido o curso de Letras, por causa de uma professora de Literatura do curso de Magistério, como relata,

[...] tanto é que toda minha caminhada dentro das Letras é na área da Literatura, não foi nem por causa do Português, foi por causa da Literatura, mas depois que me formei eu vi que não iria seguir porque eu não tenho muito gosto por trabalhar com adolescentes, com Ensino Médio e o Português não é uma área que me chama atenção no trabalho, o enfoque dos Anos Finais (Prof. R).

É muito comum nos estudos que buscam compreender o processo de construção identitária dos professores, em suas narrativas aparecer a lembrança de professores que serviram como inspiração ou modelo durante sua trajetória escolas.

Nessa direção, os autores Tardif e Raymond (2000) também assinalam que nas pesquisas biográficas essas fontes de influências aparecem como importantes referências no processo de constituição docente, ainda assinalam que essas lembranças são marcadas pelas relações de afetividade.

Os outros dois professores escolheram o curso de Pedagogia como área de formação. O “Prof. E”, narra que ao concluir o Curso Normal, logo em seguida foi aberto o curso de Pedagogia da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, a UERGS em Bagé. Foi então que ele prestou vestibular e ingressou no curso. No entanto, depois de formado em Pedagogia, o professor também formou-se em Letras, ao perceber, conforme suas palavras que “eu gosto de trabalhar com a questão da docência, mas não muito com a questão dos Anos Iniciais e com a

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questão da Educação Infantil, porque eu acho que quanto menor a criança mais ela te exige, mais ela depende de ti”.

Por último trazemos a experiência do “Prof. G” que ao pensar em fazer uma licenciatura e pesquisar um pouco sobre elas, optou pela Pedagogia, uma vez que considerava atender amplamente o que já vinha estudando e gostaria de aprofundar-se, complementando a formação iniciado no Curso Normal.

Em nosso contexto atual, torna-se mais comum vermos homens adentrando em cursos de formação em nível superior, onde havia antigamente a predominância era feminina, no entanto ainda são muito poucos. Com o avanço das discussões sobre gêneros e as conquistas que a educação tem possibilitado, atualmente temos rompido com o imaginário social de que as mulheres seriam as únicas capazes de atuar com crianças, deixando o discurso da vocação e do dom e apostando cada vez mais na profissionalização da carreira docente. Todavia, ainda que haja maior aceitação, ainda são poucos os homens que optam por licenciaturas, uma vez que ao tomarem tal decisão por

[...] uma profissão feminizada, sem prestígio e com baixa remuneração (o que é inadmissível para um homem que “deve sustentar a família”) os professores podem ter a necessidade de se afirmarem enquanto homens.

Tal necessidade pode converter-se em estratégias, como a busca pelos cargos de mais alta remuneração e status, que predominam nas representações como mais adequados aos profissionais do sexo masculino, porque neles exerce-se mais autoridade e respeito. Enfim, os estereótipos de gênero podem determinar esta busca por altos cargos (RABELO, 2010, p. 294-295).

Assim, ao concluírem os cursos de Pedagogia e Letras, os professores desta pesquisa, buscaram ingressar no serviço público, a fim de garantirem direitos e estabilidade, dando continuidade nos estudos e almejando, através dos cursos de pós-graduação, uma melhor remuneração e mais reconhecimento social. Esta realidade aponta para a afirmação da identidade profissional, “pelo criar e recriar, constantemente, que influencia o desenvolvimento profissional docente” (VOZNIAK;

MESQUITA; BATISTA, 2016, p. 287), processo este que não encerra-se com a formação inicial, mas que requer uma qualificação continuada e permanente. Ao encontro disso, Garcia (2005) apresenta que a docência é construída de modo muito singular para cada professor e professora, uma vez que está vinculada com os processos formativos pelos quais os sujeitos vivenciam.