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CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE–CNEC (1970-1985)

CONTRIBUIÇÕES OFICIAIS DOS GOVERNOS ESTADUAIS À CNEG 1963-

ALUNOS EM CR$ Acre*

3. CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE–CNEC (1970-1985)

Nessa fase, que se inicia no ano de 1970, a Campanha vai manifestar, de forma mais evidente e elaborada, a fundamentação das suas atividades no tema da comunidade e uma maior diversificação, ambas relacionadas com a formação para o trabalho, na perspectiva da política governamental implementada no período. O tema da comunidade estará presente, também, na sua denominação, que passará a ser Campanha Nacional de Escolas da Comunidade – CNEC.

A CNEC, em 1970, elaborou um documento sob o título Exposição de Motivos ao Ministro da Educação e Cultura, versando sobre o efeito multiplicador de investimentos de recursos públicos na CNEC, no qual explicita o objetivo de atender às propostas da política educacional implementada no regime militar, com a vantagem de sua rede de 1.224 escolas em 984 municípios se inserir nas pequenas cidades e na periferia das grandes cidades, onde estavam localizadas as populações de baixa renda, com as quais a política

desenvolvimentista tinha especial preocupação, no sentido de integrá-las à produção (em ocupações de baixa renda), para amenizar as tensões sociais.

Para viabilização dessas propostas, o Departamento de Planejamento tinha, entre as suas atribuições básicas, o controle e a avaliação da transformação da rede de escolas em escolas para o trabalho, das experiências comunitárias e, nessa perspectiva, do projeto elaborado em acordo com a USAID.58

O projeto CNEC/USAID foi elaborado com assessoria do Ministério do Planejamento, tendo como prioridade o fortalecimento do sistema de planejamento e coordenação, transformação dos ginásios acadêmicos em polivalentes e treinamento de professores, recebendo, para tanto, recursos dessa agência.

Na década de 50, a Campanha havia sido incluída no Orçamento da União, embora fosse excluída no ano de 1970. O Relatório de Atividades 1969/71 afirma, entretanto, que a Secretária Geral do MEC a incluíra na dotação orçamentária, sob a rubrica Assistência Técnica e Financeira a instituições de Ensino Fundamental. A Campanha recebeu 57,4% do montante sob essa rubrica, lamentando que, infelizmente, como os recursos não estavam vinculados à CNEC, outras organizações procuraram habilitar-se, também, aos recursos em questão. Nesse momento, a Campanha já desenvolvia atividades de produção, principalmente na área agrícola, atendendo tanto à profissionalização do ensino quanto ao envolvimento da comunidade nessas atividades e obtendo, ainda, maiores recursos para a escola.59

O XX Congresso Ordinário da Campanha, realizado em 1974, contou, mais uma vez, com a presença de autoridades civis e militares, destacando-se o Ministro da Educação Ney Braga. Entre os assuntos debatidos, encontram-se o projeto de Criação de uma Escola Superior de Engenharia Eletrônica, no estado da Guanabara, a transferência da sede da entidade para Brasília e a idéia de criação de quatro mil centros comunitários nos quatro anos seguintes.60

A Campanha implantou 10 escolas polivalentes nas regiões norte e nordeste do país, como parte do convênio firmado com a USAID, e os professores dessas escolas foram

58 Relatório de Atividades da CNEC 1969-1971. 59 Op.cit.

60 No ano de 1973, assumiu a Presidência da Campanha o Ministro do Supremo Tribunal Militar Alcides Vieira

treinados com o patrocínio do PREMEN, órgão governamental que tinha como objetivo o aperfeiçoamento do ensino de 1º e 2º graus. Passou a atuar, também, no ensino supletivo, como suplência e qualificação de mão-de-obra, com a pretensão de oferecer cursos de extensão e outras atividades no campo do desenvolvimento comunitário.61

Mesmo reconhecendo que houve diminuição dos recursos federais para a Campanha, no exercício de 1975, 97% da receita da administração nacional foi originada do poder público federal, excetuando-se convênios com órgão públicos. Esses recursos eram destinados a atividades produtivas, construção, instalações e equipamentos, já que as escolas estavam mantidas pela comunidade.62

No congresso realizado em 1976, o administrador estadual da Seção do Ceará fez uma análise da trajetória da Campanha, da qual vale ressaltar alguns aspectos. Com relação ao seu ingresso na entidade, no ano de 1959, afirma:

“(...) porque o que me chamou a atenção na Campanha não foi essa gratuidade, porquanto achava essa gratuidade universal utópica [...] o que me empolgou foi exatamente essa distinção, esse posicionamento de meio: um movimento que não tinha o azinhavre da escola particular, como não tem os vícios e defeitos da escola pública(...)63

Ele aponta, como fatores para a expansão da Campanha, o apoio do Estado e os interesses políticos eleitoreiros, entre outros, como se pode observar nos itens a seguir64:

“a) o interesse dos pais, devido à sua pobreza nas cidades do interior, pais que não tinham a oportunidade de colocar seus filhos nos estabelecimentos oficiais [...] em razão da inexistência de escolas nas cidades do interior e falta de recursos para educar os filhos nas capitais[...]

b) a promoção pessoal, com vistas a processos eleitorais – deputados, prefeitos e vereadores são muito vivos. Então toda vez que havia oportunidade de construção de um ginásio, era natural que eles se interessassem em liderar tanto o vereador como o

da instituição, realizado em Brasília, na sede da Associação Comercial do Distrito Federal e no auditório do Hospital do Estado Maior das Forças Armadas.

61 Relatório de Atividades 1975-1976. 62 Op. cit.

63 Discurso proferido pelo Prof. Lucio Melo no XXII Congresso Ordinário da CNEC em 1976. 64 Op.cit.

deputado, num aliciamento de votos. E o prefeito, numa satisfação à comunidade, numa oportunidade de conseguir alguma coisa para os seus estabelecimentos.

c) a iniciativa do município com vistas ao recebimento de verba. Nos velhos tempos, na CNEC ontem, recebíamos 60 mil cruzeiros por turma/ano. Assim, todos os prefeitos estavam interessados em ter um ginásio da Campanha, porque tinha garantido aqueles 60 mil cruzeiros. Isso em 1960. [...]. De forma que quem detivesse no setor o poder daquele colégio, daquela unidade, teria condições fabulosas de promoção. Por isso que a história, pelo menos no nosso Estado, nos primeiros tempos, foi marcada pela ação, pela participação política maciça: deputados e vereadores eram donos dos setores locais [...]

d) a ação isolada de educadores que vislumbravam o desenvolvimento da juventude através das escolas ginasiais.

e) organização dos estabelecimentos.

[...] Era-nos fácil chegar numa Secretaria e conseguir algum giz, material insignificante para manutenção do estabelecimento. Nossos professores eram improvisados. Tínhamos uma varinha-de- condão. Batíamos a varinha com ela num padre e o transformávamos em professor de português; batíamos num juiz e o transformávamos em professor de história [...] Assim, formávamos nosso professorado. O quadro administrativo, idem.

[...] Assim, era fácil fazer um diretor [...] a secretária também era fácil [...] E, em pouco tempo requeríamos o seu registro e o Ministério expedia, como fazia em relação aos diretores.

f) profusão de escolas pela falta do Poder Público, incapacidade financeiro-administrativa, comodismo. [...] O comodismo dos próprios governantes, que davam graças a Deus o aparecimento de uma instituição qualquer que fizesse, por eles, a escola e, como aconteceu em outras áreas, um hospital, etc.” 65

Evidencia-se, aqui, uma espécie de lucro que a fundação de escolas da Campanha proporciona, o lucro político. Não foi apenas a ausência do Estado que possibilitou a expansão da entidade, ainda que esse seja o fator preponderante. O fisiologismo político chegava a interferir na autonomia dos Setores e seções Estaduais, como afirma o dirigente:

“(...) disputas políticas pelo mando dos ginásios, a degola de presidentes de setores e, às vezes, até estaduais, pela força da politicagem, por imposição dos donos de verbas. Isso aconteceu à larga, aqui e ali, e ainda persiste, porque política é política.” 66 Analisando a situação da entidade no período em torno de 1976, o dirigente refere- se à falta dos recursos federais que eram destinados a cada turma de alunos, diminuição do recebimento de bolsas-de-estudo, desinteresse dos governos estaduais pela Campanha, participação comunitária passiva, limitada ao pagamento de mensalidades. Aborda, ainda, a dificuldade de oferecer ensino de 2º grau, por incapacidade técnica e falta de professores especializados.

Quanto à situação do professorado, afirma que falta pessoal habilitado e que os baixos salários pagos pelas escolas da Campanha dificultavam a sua contratação:

“Situação criada pelos salários irrisórios. Os nossos professores são de baixo nível. Não podemos ter ilusões. E esse baixo nível vem se acentuando pelos salários irrisórios. Nós temos, ainda, no interior, professor com aula de 3 cruzeiros. E vivem disso [...]. E ontem me lembrando, tomei [...] um café por um cruzeiro e cinqüenta centavos(...) 67

Refere-se, ainda, a questões trabalhistas e tributações:

“Hoje os nossos colégios estão acossados pelas tributações. Foi-se o tempo em que a Campanha não pagava nada. Que a Campanha podia ficar sem pagar o INPS pela vida toda, que ninguém ia atrás dela [...] Estamos hoje, então, acossados por essas tributações. INPS, acordos sindicais, que nós temos que cumprir [...] e estamos verificando, estamos temendo, é que essas questões trabalhistas se avolumem. Não é mais só na capital, no interior também estão surgindo essas questões e estão aparecendo lá pela Estadual, querendo acordo, etc.” 68

Nesse mesmo Congresso, o Sr. Salomão Ribas Júnior, Secretário de Educação de Santa Catarina e presidente da Diretoria Estadual da Campanha, teceu alguns comentários a

66 Op.cit. 67 Op.cit. 68 Op.cit.

respeito da instituição no seu estado. Considera que essa é, apenas, um apêndice do sistema estadual de ensino, mas seus membros são participes da obra governamental, no setor educacional. Afirma que estão consolidando a Campanha com recursos do Fundo de Apoio e Desenvolvimento Social, para construção dos seus prédios escolares.

Para ele, a Campanha cresceu muito e necessita definir caminhos mais seguros frente às opções da nova legislação. No seu Estado, iria deixar de atuar no primeiro grau, com caráter supletivo e ação comunitária.

A comissão de Educação desse Congresso elaborou as seguintes recomendações para a entidade:

(...) a Diretoria Nacional solicitaria dos órgãos públicos que não criassem escolas que viessem a ter sua área de influência se superpondo à da Campanha; que as escolas da Campanha atuariam na busca de adequação gradual à Lei 5.692/71; a Direção Nacional elaboraria seus planos de ação compatibilizando-os com os planos setoriais do MEC”.

Uma importante questão abordada nos Congressos da CNEC diz respeito à ampliação da rede oficial de ensino em localidades em que essa atua, haja visto, conforme citado, a decisão de atuar junto ao poder público, com o intuito de impedir a criação de escolas oficiais se superpondo à área de influência da Campanha.

Nos estados de Sergipe e Rio de Janeiro, houve fechamento de escolas da CNEC, por causa da fundação de escolas públicas.69 Há informações referentes ao ano de 1979, no sentido de que em alguns estados haveria um acordo entre a Secretaria de Educação e a CNEC, a fim de evitar a criação de escolas cenecistas e oficiais ao mesmo tempo, a exemplo dos estados do Paraná, Bahia, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, esses dois últimos no referido ano.70

Verifica-se, por outro lado, uma reação da Campanha ao que denomina estatização do ensino, como podemos depreender dos trechos abaixo:

“É a CNEC o grande baluarte contra a estatização [...] parece que se delineia uma tendência mais estatizante no nosso ensino, porque as ajudas oficiais ao particurlar, vêm a cada ano diminuindo.

69 Relatório de Atividades 1976-1977.

Então, parece muito mais estatizante do que qualquer outra coisa. E é a Campanha o baluarte contra esta estatização (...)” 71

“Na medida em que o Poder Público foi transformando seus grupos escolares em Escolas de 1o. grau, a Campanha não só perdia as oportunidades de expandir-se como, também, passou a ter as unidades oficiais de ensino como concorrentes no universo de educandos que ela atendia. E como o 2ºo. grau, pelas exigências da reforma, passou a ser altamente dispendioso, menos promissoras se tornaram as nossas perspectivas (...) os novos tempos tornaram mais fácil o processo de estrangulamento. É que, às armas anteriores, somou-se outra: a criação de Escolas de 1o grau ao lado dos Ginásios da Campanha .”72

Esse discurso tem, também, o objetivo de defender a experiência que a Campanha realiza:

“A Campanha Nacional de Escolas da Comunidade vem desenvolvendo um processo educativo que tem, na comunidade, sua inspiração e continuidade. Não defende ela uma educação