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3 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

3.2 CAMPO DE INVESTIGAÇÃO

A pesquisa teve como campo de investigação uma instituição penitenciária feminina localizada no estado da Bahia, com a finalidade de custodiar presas provisórias e condenadas, dando cumprimento às penas privativas de liberdade, em regime fechado, semiaberto e aberto.

A escolha desse lócus se deu a um conjunto de fatores dentre eles: 1) por ser uma instituição que abriga exclusivamente mulheres; 2) conhecimento prévio do quantitativo de mulheres presas pelo envolvimento com o fenômeno das drogas.

Informações sobre a história da instituição estudada foram identificadas nos trabalhos realizados por Almeida (2006) e Araújo (2010), os quais abordam o cotidiano de mulheres em regime carcerário e as condições oferecidas pelas instituições penitenciarias para abrigar pessoas do sexo feminino em Salvador, respectivamente.

De acordo com Araújo (2010), a instituição escolhida foi inaugurada em 1990, como parte do Complexo Penitenciário do Estado da Bahia, subordinado à Secretária de Justiça e Direitos Humanos do Estado. Sua estrutura física não atende as necessidades da clientela feminina, uma vez que originalmente não foi concebida para tal finalidade, característica essa comum enquanto origem de inúmeras unidades prisionais femininas do Brasil (ALMEIDA, 2006).

Tem capacidade prevista para oitenta e nove (89) vagas, porém o número de detentas tem se mostrado superior, variando no período de coleta de dados entre noventa a cento e sessenta mulheres. A demanda crescente de mulheres aprisionadas exigiu aumento do quantitativo de vagas, consequentemente, em reforma e ampliação da unidade, de forma que no período da pesquisa seu funcionando estava sendo realizado em um módulo improvisado, dentro do Complexo Penitenciário.

Em relação ao quadro de funcionários, foi identificada a presença de agentes penitenciários, funcionários da saúde e funcionários administrativos, de ambos os sexos. A equipe de saúde é composta por uma médica ginecologista, uma enfermeira, um cirurgião dentista, duas psicólogas, três assistentes sociais e dois técnicos de enfermagem e suas ações são voltadas para a promoção, prevenção e tratamento de agravos. As ações de saúde

desenvolvidas por estes profissionais englobam: direito a visita íntima, distribuição de kit de medicamentos, consultas médicas, atendimento específico para gestantes, atendimento de saúde mental e bucal.

O acesso ao complexo é permeado por portões, identificações e revistas na tentativa de dificultar a entrada de pessoas não autorizadas e a saída de detentas e detentos. Na entrada, há enorme portão com policiais armados e agentes penitenciários que fazem a primeira abordagem para identificação da pessoa visitante mediante apresentação de documentos. Após a identificação, as/os agentes através de equipamento de comunicação interna, informam aos funcionários da unidade a ser visitada a presença da/do visitante e encaminha a/o mesma/o à unidade desejada.

Na entrada do presídio feminino, um enorme portão se mantém aberto, todo o dia, dando acesso à sala de recepção, onde se encontram outros agentes penitenciários masculinos e femininos. É o segundo bloqueio à entrada de qualquer pessoa para esta unidade, onde nova identificação é feita com entrega obrigatória de um documento de identificação e informações sobre horário de entrada e o setor de visita. Esses dados são registrados em um livro de ocorrência após permissão para a visita, o que depende do objetivo da/do visitante e dos acontecimentos na penitenciaria. Uma vez permitida a entrada o(a) visitante é submetido(a) a revista, se desfaz de pertences e, somente após esses procedimentos, é liberada.

Adentrando à unidade, do lado esquerdo, fica a parte administrativa, consultório odontológico, enfermaria, sanitário para os funcionários, central de cadastramento, almoxarifado, quatro celas especiais (para mulheres com nível superior e mulheres que estão sendo ameaçadas por outras internas) e duas salas de aula. À frente, mais um portão, com enormes cadeados que dá acesso a uma área aberta, a cozinha, ao refeitório e ao módulo que está em reforma. Escadas dão acesso ao andar superior, no qual se encontram salas de atendimento dos profissionais de serviço social e psicologia, de ateliês de costura, artesanato, bordados e cursos profissionalizantes, alojamento para agentes penitenciários e armários para guardar pertence das internas.

A cozinha é explorada por uma empresa terceirizada funcionando diariamente. Algumas presidiárias trabalham neste setor fazendo a dispensação dos alimentos sob a supervisão de funcionários da empresa e de agentes penitenciários.

Na condição de enfermeira pesquisadora, considero que as condições de higiene, carecem de maior atenção. Quanto à qualidade e sabor da alimentação, pessoalmente fiz algumas refeições no local e considero razoável, no entanto, as internas sempre reclamam e dizem que a comida não tem bom sabor, é muita gordurosa, chega fria e é pouco variada.

Do lado direito, encontram-se salas para advogados, promotores e juízes e coordenação de segurança. À frente, mais um portão com enormes cadeados, que dá acesso a uma área aberta e logo em seguida outro portão dando acesso a uma sala denominada de

“base”, na qual fica agentes penitenciários para fazer a vigilância interna da unidade. Essa vigilância funciona por vinte e quatro horas.

Da base, obtém-se uma visão direta do pátio, local onde as internas tomam banho de sol ou de chuva, a depender das condições climáticas, recebem visitas e participam de atividades religiosas e recreativas. Neste local, em meio às falas e gritos das mulheres, pode- se distinguir o som do presídio em predomínio: um som metálico, que vem dos portões de ferro a abrir e fechar, barulho de correntes, chaves e cadeados. No presídio não há um cheiro, são cheiros que se misturam: vêm das frituras da cozinha, dos esgotos, dos banheiros das celas; é um odor indefinido.

A luz do sol, embora intensa no pátio, não irradia em plenitude dentro das celas, as quais são dispostas em oito galerias. Cada galeria tem oito celas, dois banheiros, um refeitório, seis chuveiros e seis pias utilizadas para lavar mão, rosto e roupas.

As celas que foram adaptadas para abrigar duas mulheres, todavia, em face da superlotação, algumas estão ocupadas por mais de três presas. Nas celas há duas “camas” feitas de cimento, ambas com colchonete, um chuveiro e um sanitário. As internas, de formas diversas, reinventam esses espaços na tentativa de delimitar seu território. Algumas decoram com objetos trazidos pelos familiares e amigos, enquanto outras guardam pequenas coisas que adquirem no decorrer da reclusão e que lhes trazem algum sentido de individualidade, a exemplo de santinhos, fotografias de atores, cantores, recortes de revistas, etc.

Dentro da unidade estudada há uma cela reservada para observação de novas internas e, outra utilizada para “ castigo” daquelas que descumprem as normas da instituição. As internas, pelo desconforto desse espaço, a denominam de “tranca”. Essa terminologia foi incorporada até pelos funcionários do presídio.

No presídio não há uma separação espacial entre não condenadas (processadas) e condenadas (sentenciadas). Também não são isoladas por delito, de forma que convivem juntas as que furtaram, assaltaram, mataram e traficaram, entre outros delitos.

Poucos programas de reabilitação estão disponíveis para as presas. Os programas de qualificação para o trabalho são escassos e as oportunidades para cursos profissionalizantes e atividade laboral no interior do presídio são limitadas. Apenas um pequeno número de reclusas tem acesso ao trabalho que, por excelência, é de natureza artesanal. Há um interesse

das presas em trabalhar, pois, uma vez trabalhando, podem dispor de meios para ajudar a família, a visita é mais assídua e a pena é remida.

Quanto à assistência à saúde, existe uma equipe composta por uma médica ginecologista, um psiquiatra, um dentista, uma enfermeira, duas psicólogas, dois técnicos de enfermagem e uma auxiliar de consultório dentário para atendimento a casos de menor complexidade. Os casos de maior complexidade, bem como exames complementares e partos são encaminhados para unidades do Sistema Único de Saúde – SUS. O deslocamento das internas para as referidas unidades torna-se complicado, pois nem sempre existem vagas disponíveis para consultas, exames e internações, tampouco escolta e viaturas desocupadas para deslocamento das mesmas.

As mulheres grávidas e/ou com filhos em período de amamentação ficam em celas separadas das demais detentas, por um período de seis meses. Ao término desse período as crianças são desligadas e transferidas para creches estatais ou para o convívio de familiares, ficando restrita ao contado semanal com a mãe em visita por algumas horas. As visitas são realizadas em dois dias da semana: quarta-feira e sábado. É permitida a visita de familiares de até 2º grau de parentesco. As mulheres, independentemente de escolha sexual, têm direito a visita íntima. Contudo, essa visita só acontece para as mulheres casadas e não há um espaço privativo para tal visita, sendo a mesma realizada na cela da interna, obrigando a saída das demais companheiras para o pátio.

Em todas as visitas a/o visitante é previamente cadastrado e, ao chegar é submetido a uma inspeção íntima e são examinados todos os objetos que irão para as celas das galerias. Representantes da Pastoral Carcerária e da Igreja Universal do Reino de Deus, que desenvolvem atividades de cunho religioso dentro da instituição, são liberados da inspeção íntima.