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Considerando nossos objetivos de pesquisa, a escolha dos sujeitos implicava, em primeira ordem, na delimitação de uma rede na qual a oferta de formação continuada para professores alfabetizadores ocorresse de forma minimamente contínua, pelo menos nos últimos cinco anos, para que estes sujeitos tivessem um repertório de experiências que pudessem ser significativas na constituição de seus saberes, no estabelecimento de uma rede de socialização de conhecimentos e experiências e na configuração de um tempo necessário de apropriação, reflexão e uso de ferramentas que pudessem representar tal apropriação. Considerando esta questão e buscando dentre as redes municipais de ensino uma que se aproximasse deste perfil, optamos por realizar o

trabalho com professores(as) da rede municipal de Camaragibe, que atendia aos critérios acima descritos.

O município localiza-se vizinho à capital, constituindo um grupo de cidades que formam a chamada Região Metropolitana de Recife. Tem uma população em torno de 150.000 (IBGE/Censo 2010). A rede municipal de ensino contava, no período em que realizamos a pesquisa, com 26 escolas, das quais 23 ofereciam os anos iniciais do Ensino Fundamental. No sistema de ensino do município, as turmas de 1º. e 2º. ano se caracterizavam pela continuidade na progressão/promoção, havendo retenção de alunos que não alcançaram o perfil de saída a partir do 2º ano.

Em seu quadro funcional a rede contava, quando iniciamos a pesquisa, com cerca de 330 docentes efetivos. Embora não tenhamos dados percentuais, segundo representantes sindicais e membros da equipe de ensino com que tivemos contatos, a maioria desses docentes tinham curso superior e Pós-graduação lato sensu (Cursos de Especialização ligados à Educação), o que era incentivado pelo Plano de Cargos e Carreiras e as promoções decorrentes da titulação. De acordo com a Diretora de Ensino, havia naquele momento um crescente movimento dos professores de busca de cursos de mestrado. Os relatos nos nossos contatos iniciais com a equipe de ensino e diretorias da rede eram de que a Secretaria vinha sendo cada vez mais consultada sobre o reconhecimento ou não de cursos dessa natureza oferecido por instituições privadas em convênio com universidades de outros países. Tanto os profissionais da gestão quanto os representantes sindicais com quem conversamos informaram que tal fato vinha gerando certa apreensão, tendo em vista a grande oferta de cursos não reconhecidos e sem possibilidade de revalidação pelas universidades brasileiras. O plano de Cargos faz tal exigência para conceder a progressão funcional por titulação. Em um dos momentos da realização dessa pesquisa, uma das professoras comentou que em encontro de formação, uma representante da Secretaria de Educação fez esclarecimentos a esse respeito.

A rede municipal de ensino de Camaragibe é uma das redes públicas da região metropolitana de Recife que vinha desenvolvendo sistemáticamente, nos anos anteriores a este estudo, uma série de ações de formação continuada de professores voltadas para a alfabetização e ensino da língua, mesmo diante das mudanças na gestão municipal. O investimento na temática da alfabetização, nessa rede, foi marcado por uma perspectiva

que tem embasamento nos estudos sobre a Psicogênese da Língua Escrita. Assim, embora a sistemática da formação e os grupos de formadores tenha passado por mudanças nesse período, não houve uma mudança radical no que se refere aos princípios conceituais que a fundamentavam. Os enfoques e as perspectivas metodológicas de intervenção é que, pode-se dizer, seguiam rumos específicos em função das escolhas que caracterizavam o trabalho de grupos diferentes de pesquisadores e formadores que assumiram tal formação em períodos específicos. Outra característica é que, ao contrário de outras redes de ensino da região metropolitana de Recife, não se observa nesta rede de ensino a presença de projetos e programas (“pacotes”) de interesses editoriais privados, se intercalando, de forma semelhante a franquias que têm assolado muitas redes públicas mesmo aquelas com tradição de investimentos em formação continuada para seus professores.

A escola onde a pesquisa foi desenvolvida localizava-se em um bairro de periferia do município, de difícil acesso e atendia a um público diversificado, mesmo sendo todos de nível sócio-econômico baixo. Muitas crianças residiam nas imediações, filhos de trabalhadores, que estudavam na escola desde a Educação Infantil; outros eram novatos na escola e no bairro, onde moravam numa área mais afastada, de invasão, em casas muito precárias e as famílias tinham atividades informais como fonte de renda ou mesmo dependiam de benefícios do governo federal, como o bolsa-família ou bolsa- escola.

Em termos de estrutura física, a escola dispunha de salas de aula amplas e com mobiliário adequado, laboratório de informática, pátio externo coberto onde as crianças eram acolhidas no início do turno, rampas de acessibilidade, tendo em vista que a construção acompanhava desníveis do terreno, com diferentes patamares interligados por estas rampas. As crianças dispunham de espaço pequeno para recreio, por esta razão o horário de tal atividade era dividido para atender a todas as turmas. No período de realização da pesquisa, a biblioteca estava desativada em função de funcionar no local uma sala de aula, para atender ao número excedente de alunos matriculados no 3º ano. Neste espaço também ficavam guardados materiais didáticos como jogos, livros didáticos do PNLD e sobras de kits de materiais dos alunos, distribuídos pela prefeitura no início do ano letivo. Embora as crianças não pudessem utilizar o espaço da biblioteca, algumas professoras, inclusive as que participaram desse estudo, visitavam o

espaço para selecionar do acervo os livros de literatura infantil que pegavam emprestado para ler para seus alunos. As reuniões de professores aconteciam também neste espaço.