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2 SÍNTESE BIBLIOGRÁFICA

2.2 CANDIDA ALBICANS E BIOFILMES

Em aproximadamente 25 a 50% dos indivíduos saudáveis, fungos do gênero

Candida são encontrados como organismos comensais, colonizando superfícies

mucosas da cavidade bucal, vagina e trato gastrintestinal, não causando danos aparentes nem inflamação nos tecidos adjacentes (ELAHI et al., 2000; AKPAN;

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MORGAN, 2002). Contudo, sob certas condições predisponentes, como imunodepressão, o fungo pode multiplicar-se, tornando-se patogênico, e penetrar nos tecidos do hospedeiro causando inflamação e destruição tecidual, alternando-se quanto a sua morfologia, de levedura para micélio ou hifa (ROGERS; BALISH, 1980; BUNETEL; BONNAURE-MALLET, 1996; DONGARI-BAGTZOGLOU; FIDEL, 2005; SHARMA; HEGDE, 2014). A transição dessas leveduras de comensal inócuo a parasita depende tanto de fatores de virulência do microrganismo como da susceptibilidade do hospedeiro (JORGE; BATISTA; REGO, 2000).

Mais de 200 espécies de Candida já foram descritas e 10% estão relacionadas a doenças nos seres humanos, tais como C. albicans, C. tropicalis, C.

glabrata, C. pseudotropicalis, C. guillierimondii, C. krusei, C. lusitaniae, C. parapsilosis e C. stellatoidea (FARAH; ASHMAN; CHALLACOMBE, 2000; AKPAN;

MORGAN, 2002; EGGIMANN; GARBINO; PITTET, 2003).

Uma capacidade inerente a C. albicans é a formação de uma estrutura particular denominada de biofilmes, os quais consistem em comunidades de microrganismos aderidos às superfícies e envoltos por uma matriz formada por substância polimérica extracelular produzida por eles mesmos (HAWSER; DOUGLAS, 1994; TUNNET; GORMAN; PATRICK, 1996; DONLAN, 2001; DONLAN; COSTERTON, 2002;). Portanto, C. albicans possui a habilidade para aderir e colonizar várias superfícies como, por exemplo, cateteres, válvulas cardíacas artificiais, aparelhos ortodônticos e resinas acrílicas das próteses removíveis (HE et al., 2006; RAMAGE; MARTÍNEZ; LÓPEZ-RIBOT, 2006; COULTHWAITE; VERRAN, 2007; SHINDE et al., 2011).

A adesão desse fungo às superfícies é um evento primário e necessário para a sua colonização, envolvendo alguns componentes da parede celular do fungo como manose, manoproteínas, sacarinas e adesinas. Após a adesão à superfície, inicia-se o processo de formação do biofilme, o qual é variável e depende da cepa clínica de Candida spp. (NIKAWA et al., 1991; CANNON; CHAFFIN, 2001; SÁNCHEZ-VARGAS et al., 2013). A patogenicidade do fungo do gênero Candida tem sido atribuída a sua capacidade de aderir e formar biofilmes, bem como de liberar enzimas hidrolíticas, como as proteases (NAGLIK et al., 2003; NAGLIK et al., 2008; SÁNCHEZ-VARGAS et al., 2013).

Aderidas às superfícies, as leveduras de Candida formam rapidamente complexos biofilmes associados a bactérias e inerentemente resistentes aos

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tratamentos convencionais com antifúngicos. Tais biofilmes, quando em contato com os tecidos do hospedeiro, resultam em uma reação inflamatória, como observado na mucosa bucal, nos casos de EP (JENKINSON; LAMONT, 2005; COCO et al, 2008; PELLIZZARO et al., 2012).

De um modo geral, os biofilmes são a forma mais comum de crescimento microbiano na natureza; estima-se que até 80% de todos os microrganismos no ambiente existam em comunidades de biofilmes aderidos às superfícies, e mais de 65% das infecções microbianas em humanos envolvam biofilmes (COSTERTON; STEWART; GREENBERG, 1999; DONLAN; COSTERTON, 2002; RASMUSSEN; GIVSKOV, 2006). Por esta razão, os biofilmes apresentam importante relevância clínica, especialmente devido à alta resistência a antibióticos (CHANDRA et al., 2001). Microrganismos, quando organizados em biofilmes, estão mais protegidos das células imunes do hospedeiro e tornam-se mais resistentes aos antimicrobianos, quando comparados aos seus homólogos no estado planctônico (LEWIS 2001).

Na cavidade bucal, estes fungos têm sido isolados da superfície dos dentes e de material restaurador, língua, mucosas palatal e jugal e, sobretudo, superfícies resinosas de próteses removíveis (RAMAGE; MARTÍNEZ; LÓPEZ-RIBOT, 2006; COULTHWAITE; VERRAN, 2007; SÁNCHEZ-VARGAS et al., 2013). Em comparação com outros materiais dentários, tem sido sugerido que C. albicans adere e forma biofilmes preferencialmente em polimetilmetacrilato (PMMA), o principal componente das resinas acrílicas que compõem as próteses removíveis (RAMAGE et al., 2012).

O processo de formação do biofilme de C. albicans em lâminas de PMMA ocorre em basicamente três fases distintas: a) fase inicial (0 a 11 horas); b) fase intermediária (aproximadamente 12 a 30 horas) e c) fase de maturação (aproximadamente 38 a 72 horas). Inicialmente, as células leveduriformes de C.

albicans se aderem à superfície da lâmina de PMMA, formando microcolônias. Nas

primeiras 11 horas, as comunidades de C. albicans aparecem como uma camada de células, devido ao crescimento e agregação das colônias. Já o desenvolvimento da fase intermediária é caracterizado pela emergência e predominância de substância não celular (polimérica), a qual se assemelha a uma “névoa” que forma um filme e cobre as microcolônias do fungo. Durante a fase de maturação, a quantidade de substância polimérica extracelular aumenta com o tempo de incubação, e as comunidades de C. albicans são completamente cobertas por essa substância

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(CHANDRA et al., 2001b).

Inicialmente, a aderência microbiana às superfícies de PMMA pode ser atribuída a interações não especificas (interações eletroestáticas e forças físico- químicas) entre as proteínas de superfície das células de Candida e superfícies inertes ou tecidos bucais, conhecidas como hidrofobicidade da superfície da parede celular (CSH – cell surface hidrofobicity). A CSH é caracterizada pela presença de proteínas hidrofóbicas que estão embebidas na matriz extracelular de Candida. Subsequentemente, a aderência ocorre por meio de interações específicas entre receptores da película adquirida (que cobre tecidos bucais e a prótese, como por exemplo as mucinas) e ligantes presentes na superfície dos fungos Candida, como as adesinas. Além disso, propriedades do PMMA, como a rugosidade de superfície e a energia livre de superfície, podem contribuir para a taxa de colonização e relacionar-se com a maturação de biofilmes microbianos, em especial por C.

albicans, em superfícies bucais (BUSSCHER; COWAN; VAN DER MEI, 1992;

VASILAS et al., 1992; QUIRYNEN; BOLLEN, 1995; SIPAHI; ANIL; BAYRAMLI, 2001; COMBE; OWEN; HODGES, 2004).

Quando a resina acrílica apresenta rugosidade superficial acima de 0,2 µm, sua superfície torna-se passível de colonização (BOLLEN; LAMBRECHTS; QUIRYNEN, 1997), pois o crescimento em forma micelial de Candida spp. permite que esse fungo se desenvolva e se aloje no interior das ranhuras formadas, onde estará livre de forças externas de remoção, como o efeito autolimpante da saliva e da escovação, proporcionando um reservatório de fungos (SAMARANAYAKE; MCCOURTIE; MACFARLANE, 1980). Além disso, as superfícies rugosas proporcionam colonização e maturação mais velozes da placa microbiana sobre a prótese (QUIRYNEN; BOLLEN, 1995).

A rugosidade superficial é extremamente crítica, principalmente, para as próteses removíveis totais, visto que, diferente das superfícies externas vestibular e lingual, as quais devem ser polidas, a sua superfície interna ou área basal convencionalmente sofre apenas um leve polimento, a fim de melhorar a retenção da prótese ao palato (PHILLIPS, 1986; NEPELLENBROEK et al., 2009). Dessa maneira, essa região deve apresentar valores de rugosidade superficial bem superiores a 0,2 µm, tornando-se passível de adesão microbiana (BOLLEN; LAMBRECHTS; QUYRINEN, 1997).

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dental e dos ajustes clínicos com fresas, bem como a deterioração do acrílico por substâncias como a água e soluções higienizadoras, com o decorrer do tempo, são fatores que proporcionam a formação de irregularidades na resina acrílica de próteses totais, compatíveis com o diâmetro dos microrganismos, favorecendo o acúmulo e a penetração desses patógenos no interior da resina (DAVENPORT, 1972; VAN REENEN, 1973). Estudos têm revelado que alguns microrganismos podem penetrar até 3 mm, na superfície interna da prótese (THEILADE; BUDTZ- JORGENSEN, 1980; CATALAN; HERRERA; MARTINEZ, 1987). Desse modo, os cuidados de higienização devem ser cuidadosamente realizados sobre as superfícies das próteses removíveis (CHAU et al., 1995).

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