• Nenhum resultado encontrado

Capítulo III Classificação das Recolhas Populares do Padre AVF

S. Martinho, 3/5/1954 «Adúltera» “(Cantiga popular cantada por algumas pessoas da freguesia de Martinho)”

79) publicou esta composição com o nome «Rimance Numeral», sem indicação do local de recolha.

4.5. Cantigas ao desafio

Foto nº 730 a 731, Caixa nº 21.30

Câmara de Lobos, 10-1-1952 - «Despropósitos entre uma mulher e um marido» - Lorictos “(recitado por uma velhinha de Câmara de Lobos que me disse ter aprendido quando ainda nova)”

80 Apesar de AVF ter publicado vários despiques: “Um despique (entre a mãe e a filha)” e “À desgarrada (entre um compadre e comadre)” (1988b: 31-38), não incluiu este na sua publicação. Trata-se de um diálogo entre marido e mulher, recolhido em Câmara de Lobos, com o nome «Despropósitos entre uma mulher e um marido», com a indicação de ter sido recitado por uma mulher idosa daquela localidade. É uma composição em sextilha em que o marido chama à atenção da mulher e ela diz que não é casada, pois ter um marido como ele é o mesmo que nada. Ele diz que lhe dá tudo, mas ela considera aborrecimentos tudo o que ele lhe dá e, assim, os ataques entre eles vão subindo de tom. O marido com severidade diz que ela está “discorada” e que vai acabar “desgraçada”. Ela assume que quer é ser livre e se divertir e depois vêm as ameaças. Termina com ele a dizer que a mulher “Foi-se amigar com o doutor / Passou-me, as palhetas, voou”, onde encontramos o verbo amigar para amancebar e palhetas, sinónimo de cornos, na linguagem popular.

DESPIQUE – Diálogo entre Homem e Mulher (Não identificado, datado nem localizado)

Pequeno despique de duas quadras entre um homem e uma mulher, parecendo ser um fragmento do final de uma cantiga ao desafio.

Foto nº 739 a 742, Caixa nº 21.30

Machico, 1956 - Coligido por Jorge Teixeira Gois

Despique sem nome entre uma mulher e o marido em tom jocoso. Começa com um diálogo entre uma velha e um velho, em que ela diz que ele vem todo “presomido” e “bico de retorcido”. O marido, por sua vez, chama-a de “velha gaiteira”. Depois, a mulher trata o marido por Manuel, fala de bebedeira e de não ter de comer e de ele andar sempre nos arraiais e diz: “O vinho não te faz mal / Que és uma pipa avinhada / E fincas tudo na pança / a mim nunca me dás nada”. Regista-se aqui a expressão popular “fincar tudo na pança”. O marido acrescenta ainda: “vou-te pôr mais contente / Pois vou-te encher o pandulho / de vinho e água-ardente”. Esta composição também retrata bem a realidade sociocultural madeirense dos arraiais e do consumo de vinho e aguardente nos meios rurais.

Seguem-se quadras que pertencem a outra cantiga. Estas falam de um baile e de uma brincadeira do cantador com o compadre João, em que diz, sobre as raparigas, “Tudo queria vir comigo / Uma lhe faltava as botas / outra faltava os vestidos”. Aqui está bem patente também o sentido jocoso destas quadras. É a partir daqui que entra no diálogo uma mulher que declara: “Se a fidalga dá licença / Deixe entrar o meu marido”. A mulher afirma: “Eu venho aqui toda negra / De um sovão que ele me deu”. É então que o marido diz que vai explicar à fidalga o que aconteceu: “Não me apanhou erva ao gado / Ergueu- se ao meio-dia”. A mulher responde: “Marido vende-se as vacas / Marido vai-se vender”. O marido acusa-a de querer ter vida de solteira. Ela desculpa-se que “Estava em casa de meu pai quieta / Não me fosses lá buscar”. As quadras continuam, mudando para o tom

81 de brincadeira, a partir da quadra com o número 16: “A velha vem do campo / Vem de focinho atrevido / se eu trago bolos do caco / é p’ra mim mais meu marido”. Pede-se mais vinho à fidalga, se não acabam as cantorias. Mais uma vez, retrata-se aqui a vivência rural madeirense.

A partir da quadra nº 21, o desafio continua com o marido a chamar “Mulher do diaxo [sic]”, dizendo que a mulher não o envergonhe porque veio “Foi que me disseram / Que havia folgança / Comida e bebida / P’ra atacar a pança”. Documenta-se aqui, mais uma vez, a palavra pança, assim como o arcaísmo folgança, característicos da linguagem popular.

Foto nº690 a 695, Caixa nº 21.30 Santo da Serra - «Despique» - Xavier

Diálogo em despique entre um vilão e uma viloa, típico dos arraiais populares, em que ele quer casar com ela.

Foto nº 2756 a 2758, Caixa nº 12.10

Santa Cruz - «Versos da Romagem de S. Pedro de 1947» - “Um despique”

Outra versão da composição anterior, com referências à Capela de S. Pedro, em Santa Cruz. Estes despiques, pela temática do casamento, aproximam-se do despique seguinte, entre um compadre e uma comadre.

Foto nº2337 a 2339, Caixa nº 12.3 Calheta - «História da comadre»

Desafio entre um compadre e uma comadre, em que ela é viúva e ele lhe fala em casar. Texto publicado por AVF (1988b: 35-38), com o título «À desgarrada (entre um

compadre e comadre)» e a indicação “da Calheta”. Em vez das indicações numéricas

entre as estrofes, na publicação, antes de cada uma delas, colocou “Ele” quando fala o compadre e “Ela” para a comadre.

Foto nº 708 a 709, Caixa nº 21.30

«Despique popular» - coligido por Manuel Armando L. Sardinha

Embora sem indicação de homem e mulher, será um despique popular típico, neste caso tendo como fundamento o bigode dele.

Foto nº721 a 722, Caixa nº 21.30

Camacha - «Discussão entre marido e mulher»

Despique popular típico, com acusações entre marido e mulher, em que ela se queixa da vida que tem e ele promete dar-lhe porrada, se ela não lhe obedecer.

Foto nº 2547 a 2548, Caixa nº 12.3

82 Quadras em diálogo entre uma vilã, um vilão e uma fidalga, como indica o título da composição. Os vilões vão à casa da fidalga levar produtos agrícolas e ela é mal- agradecida.

Foto nº 2549 a 2551, Caixa nº 12.3 Faial – «Diálogo» - “(Popular)”

Diálogo que se aproxima de um despique entre um genro e um sogro. O genro quer devolver a mulher ao pai e diz tanto mal dela que o pai acaba por aceitar.

Foto nº 2554 a 2555, Caixa nº 12.3

Ponta do Sol, 29-4-1952 – “Diálogo Popular” - Abreu

Diálogo em tom de picardia entre um patrão e um moço que vem do Brasil, com referências ao território continental português.

Foto nº 688 a 689, Caixa nº 21.30

São Gonçalo,8-1-1945 - «O Freguês e o Vendeiro» - Orlando Morna

Embora a maior parte das cantigas tradicionais ao desafio sejam entre homens e mulheres, casados ou solteiros, nesse caso é entre um dono de uma venda e um freguês que não quer pagar o que deve. Serve como denúncia social de quem quer ter boa vida, não quer trabalhar e não tem vergonha de não pagar o que comprou fiado. Na cantiga há a ocorrência da palavra “pança”, assim como de outras caracteristicamente populares, por exemplo malandrão. Contudo, no texto, temos a palavra “caloteiro” da norma padrão e não “pangueiro”, regionalismo lexical madeirense. Graficamente, apenas notámos a forma “murar” por “morar”.

Foto nº 752, Caixa nº 21.30

Gaula / Levadas (Foto nº 755, Continua)

Composição em verso com “motte” e “glosa”, que é uma disputa entre o mar e a terra. De difícil classificação, decidimos incluir nesta tipologia por se tratar de um diálogo em desafio, para ver qual dos dois “tem mais virtude” e “mais firmeza”. Texto inédito.

Ficou por transcrever «Um despique entre a mãe e a filha», sem local e sem data, que AVF (1988b: 31-34) publica com o mesmo nome e a indicação “da Camacha”.