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CAPÍTULO 1 – DOTAÇÃO E TALENTO

1.5 Capacidade perceptual

O Domínio Perceptual apresentado por Gagné (2008), na versão do DMGT 2.0, antes constituído no Domínio Sensório-motor, desperta significante atenção para a condição da duplicidade de necessidades educacionais especiais (DNEE), neste estudo, dotação e talento – perdas auditivas.

Gagné (2008), em artigo intitulado “Building gifts into talents: detailed overview

of de DMGT 2.0”, assinala que o conhecimento do mundo começa com impressões

sensoriais e que a maioria das informações ocorre dentro do cérebro em cada área ligada aos cinco sentidos, bem como no córtex. Gagné acrescenta que é muito mais mental que físico, por isso, coloca o perceptual no domínio mental.

Guenther (2006c, p. 1) inspirada na obra de Combs (1962) assinala que inteligência é um atributo que se apresenta relacionado ao grau de efetividade com que o indivíduo se comporta e o campo fenomenal como “o universo de experiências aberto

ao indivíduo, no momento de seu comportamento”. Portanto, “o comportamento depende das percepções que as pessoas fazem em seu campo fenomenal”. Guenther (idem) acrescenta que, a inteligência como capacidade de comportamento efetivo depende da riqueza e variedade de percepções possíveis para as pessoas. Neste contexto, Guenther aponta fatores que podem limitar o estímulo ao comportamento inteligente reduzindo a habilidade perceptual e destaca as limitações fisiológicas como as anomalias pré-natais, microcefalias, entre outras.

Quanto à limitação perceptual em pessoas com dificuldades sensoriais, Guenther (idem, p. 1) assinala:

Os fatores físicos e fisiológicos que limitam a percepção do organismo têm sido bastante estudados, mas na verdade correspondem a uma pequena proporção das pessoas que operam em níveis reduzidos de inteligência. Outras formas menos dramáticas de deficiências físicas podem ter efeitos sobre as percepções possíveis ao indivíduo, por exemplo, deficiências nos órgãos sensoriais, as quais podem inibir a existência de algumas percepções.

As pessoas com perdas auditivas mais profundas, sem outra limitação sensorial, principalmente, aquelas que comunicam por língua de sinais, possivelmente tenham o sentido visual mais saliente, pois é por meio dele que percebe o mundo e utiliza o gestual para se comunicar. A língua de sinais é considerada viso-gestual. Gagné (2008) considera o Domínio Físico (antes pertencente ao Sensório-motor) subdividido em muscular e controle motor (Figura 3).

Para uma pessoa com perdas auditivas que utiliza a língua de sinais e se sobressai em talento linguistico, possivelmente, o sentido visual e a capacidade física sejam mais salientes.

Pode-se inferir que, as pessoas com limitações auditivas terão percepções limitadas por meio da audição, desta forma, se tiverem os outros quatro sentidos sem perdas, os utilizará como substituição, conforme expressa Strobel (2008).

Gagné (idem) pontua os traços físicos do catalisador intrapessoal que consiste em aparência, deficiências, saúde, entre outros, e podem interferir no processo de desenvolvimento de dotação em talento para as pessoas que tenham tais traços.

As pessoas com perdas auditivas, independentemente do grau de perda, terão alguma sequela, no âmbito da fala e da comunicação, conforme apresenta o Quadro 5.

Desta forma, o prejuízo no desenvolvimento da dotação em talento, mais agressivo, se apresenta nos indivíduos que estão em grau de perda profunda e severa que não faz uso de língua de sinais, pois vivem em mundo ouvinte, normalmente, com pais e familiares ouvintes, e não participam das interações comunicacionais e sociais. As percepções podem ser visuais para esses sujeitos, mas eles não se apropriam de seus significados.

Goldfeld (2002) assinala que a relação entre pais ouvintes e filhos com perdas auditivas é um ponto difícil, pois eles não têm condições, enquanto pequenos, de adquirir a língua e cultura de seus pais espontaneamente, como as crianças ouvintes.

Em relação à gravidade da ausência da percepção auditiva para a aquisição da própria consciência e o compartilhamento com o mundo ouvinte, Goldfeld (idem, p. 54) explicita que:

[...] se pensarmos no caso dos surdos que não têm acesso a língua alguma, percebemos que a situação é de grande gravidade, que estes indivíduos são privados de compartilhar as informações mais óbvias de uma comunidade e, sem um instrumento lingüístico acessível, sofrem enormes dificuldades na constituição de sua própria consciência, ou seja, não se constituem com base nas características culturais de sua comunidade e com isso desenvolvem uma maneira de ser e pensar muito diferente dos indivíduos falantes.

É considerável destacar, que os indivíduos com perdas auditivas podem ter percepções dos sentidos não prejudicados, quais sejam: o visual, o olfativo, o tátil e o paladar e que estes podem apresentar dotação e, se estimulados e desenvolvidos adequadamente, constituírem-se em talentos.

No entanto, apesar do domínio perceptual teoricamente comprovado, Guenther (2011a) comenta que não há pesquisa básica para apontar esse domínio em meios escolares. Essa é uma ressalva à falta de estudos básicos, mas será que o meio escolar considera as possibilidades de potencial superior nos alunos com deficiências que não estejam no âmbito acadêmico?

Pessoas com deficiência visual, por exemplo, podem cantar esplendidamente, como também, a perda auditiva pode proporcionar, desde que recebam condições estimulantes, potenciais elevados na percepção do paladar e se tornarem grandes provadores e classificadores, assim como na percepção olfativa, como os sommeliers, perfumistas, baristas, entre outros profissionais, cujo sentido olfativo e o paladar sejam as principais ferramentas da atividade profissional. Mas, para tanto, as pessoas com

perdas auditivas devem ser olhadas nessa dimensão e receber os estímulos sensoriais nos outros quatro sentidos, de preferência o mais cedo possível.

A perda auditiva e as abordagens clínica e educacional são apresentadas no Capítulo 2.