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Dicromatismo sexual presente: coloração da pelagem no macho negra brilhante com mãos, pés, extremidade da cauda e flancos ruivos a castanho-avermelhados (Fig. 28); fêmea com coloração parda-amarelada e pêlos acinzentados esparsos, re- sultando em uma tonalidade olivácea (Fig. 29).

Descrição geral

As medidas cranianas e do osso hióide estão na tabela XIII. O macho adulto apresenta barba densa com coloração negra na região do mento, tornando-se ruiva no pescoço e pos- teriormente à orelha. Pêlos da cabeça curtos e negros dispostos em várias direções. Dorso castanho-avermelhado com estreita faixa sagital negra, ou todo negro com poucas manchas ruivas distribuídas de forma irregular, dando uma aparência geral avermelhada e brilhante ao animal (Fig. 28); região lombar com pêlos longos e negros. Região lateral com pelagem castanho- avermelhado misturando-se a pêlos dourados esparsos; pêlos laterais distintamente mais longos que os dorsais. Membros

anteriores e posteriores com coloração variando desde casta- nho-avermelhado a negra, com pêlos esparsos dourados. Mãos e pés castanhos-avermelhados a ruivos. Cauda negra com o terço apical ruivo, ou totalmente ruiva; pêlos dourados distri- buídos esparsadamente por toda a cauda. Pelagem brilhante, macia e longa. As fêmeas adultas têm a barba rala, ruiva no queixo, tornando-se castanho na região do pescoço. Cabeça com pêlos castanho-avermelhados dispostos em direções vari- adas. Regiões dorsal, lombar e lateral com pelagem castanho claro a acinzentada, resultando em uma tonalidade olivácea

muito brilhante (Fig. 29); região médio-dorsal, às vezes, com uma faixa sagital distinta de coloração bruna, desde a cabeça até a base da cauda. Pêlos dorsais monocromáticos, sem faixas distintas. Membros anteriores e posteriores de mesma colora- ção que a região médio-dorsal, ou ligeiramente escurecidos, clareando nas mãos e nos pés. Cauda de coloração castanho- avermelhado clareando na extremidade apical para uma tona- lidade amarelada.

O macho jovem tem a pelagem toda negra, excetuando as extremidades das mãos, pés e cauda, cuja coloração é ruiva escura. Pêlos ruivos esparsos pelas regiões lombar, das espádu- as e da nuca. A fêmea jovem tem a barba e cabeça com pelagem bruna a castanho-avermelhado claro. Dorso e lateral de colora- ção castanho claro brilhante, exceto na região lombar, onde se torna mais escura. Membros anteriores, posteriores e cauda com coloração marrom chocolate.

Osso hióide no macho adulto com comprimento total 63,7 mm (N = 1). Tentório desenvolvido e liso: 21,1 mm (N = 1) (Figs 36 e 37). Cornos e cornículos reduzidos ou vestigiais. Região ventral da bula hióidea lisa. Abertura hióidea tão larga quanto longa, de forma quadrada. Sulco contornando lateral- mente à abertura hióidea. Não há osso hióide de fêmea dispo- nível nas coleções estudadas. Ossos nasais nos machos adultos são curvos em vista lateral.

Cariótipo. Não há registro de cariótipo na literatura.

Variação

A variação na coloração de A. ululata é individual, embo- ra a análise seja influenciada pela baixa amostragem e pelo re- duzido número de localidades. O padrão de coloração da pelagem mais freqüente nos machos é aquele descrito acima. A variação registrada refere-se basicamente ao número e inten- sidade das manchas ruivas que ocorrem no dorso e membros dos machos, onde se encontra desde indivíduos com poucos campos cromatogenéticos de coloração castanho escuro, resul- tando em uma aparência bruna do animal (MZUSP 2484 e 2879 de Miritiba, MA, e MNRJ 21096 e 23142 de São Benedito, CE), a animais com muitas manchas dorsais e laterais castanho- avermelhado a ruiva, dando uma aparência mais rufa e bri- lhante aos espécimes (MZUSP 2748 de Miritiba, MNRJ 23213 de Santa Luzia, MA, e MNRJ 23140 de Granjá, CE). A presença de pêlos dourados no corpo também variou, podendo ocorrer por toda a lateral do animal (MNRJ 23142 de São Benedito) ou por poucos pontos isolados e esparsos nos membros anterio- res, cauda e dorso (MNRJ 2752 de Miritiba). O exemplar de Boa Vista, MZUSP 2484, apresentou uma faixa dourada e muito brilhante circundando toda a região posterior do pavilhão au- ditivo externo. A coloração na fêmea em geral é castanho claro acinzentada com uma tonalidade olivácea (Fig. 29), mas ocor- rem variações bruscas desde indivíduos cuja pelagem é negra com poucos campos ruivos no dorso (MZUSP 2880, Miritiba) a indivíduos com pelagem castanho escuro com a presença de pêlos dourados espalhados pelo corpo, principalmente nos flancos, membros e cauda (MZUSP 2750 e 2752 de Miritiba). Tabela XIII. Dados morfométricos (mm) das amostras (ambos os

sexos) de A. ululata no Maranhão. Linha superior: média, desvio padrão e número de indivíduos analisados (em parênteses), respectivamente; linha inferior: mínimo e máximo.

Variável Macho Fêmea

CCR 124,7 ± 5,3 (7) 103,7 ± 3,8 (8) 118,4-134,6 96,0-107,3 CCB 114,8 ± 6,5 (10) 89,9 ± 4,8 (8) 106,8-129,2 81,3-96,0 LZI 80,6 ± 5,0 (9) 64,8 ± 2,8 (8) 71,6-86,0 61,2-69,4 LIO 62,3 ± 3,3 (11) 53,8 ± 2,3 (8) 57,6-67,2 51,4-57,3 CPA 46,0 ± 3,7 (11) 36,0 ± 1,8 (8) 41,8-53,4 33,0-38,5 ACR 39,1 ± 2,9 (11) 40,7 ± 1,8 (8) 36,5-43,0 38,0-44,0 LCR 52,3 ± 2,3 (11) 52,4 ± 1,8 (8) 49,5-57,0 50,0-55,0 LCO 23,7 ± 0,9 (11) 21,0 ± 0,8 (8) 22,1-25,1 19,8-22,2 LMT 55,9 ± 2,7 (11) 50,2 ± 1,4 (8) 50,8-60,8 48,5-52,8 LPO 41,0 ± 1,2 (11) 41,4 ± 2,2 (8) 38,8-43,0 38,7-45,9 CMA 100,0 ± 5,2 (10) 76,0 ± 3,1 (8) 93,4-109,2 71,8-80,1 APA 80,6 ± 5,9 (11) 53,2 ± 2,7 (8) 71,8-91,1 50,0-58,9 CDS 41,8 ± 2,5 (11) 35,0 ± 0,5 (8) 37,4-46,4 34,2-35,8 LMO 40,7 ± 2,2 (10) 35,3 ± 1,5 (7) 38,0-44,2 32,6-37,1 LPA 26,1 ± 1,8 (10) 22,2 ± 1,4 (8) 22,9-29,2 20,2-24,4 CHI 63,7 (1) 30,0 (1) LHI 40,1 (1) 22,5 (1) LTE 21,1 (1) 3,6 (1)

Após analisar os espécimes do norte do Maranhão e Cea- rá, e toda sua variação, certifica-se que os exemplares proveni- entes desta região pertencem a um táxon distinto de A. belzebul (Linnaeus) e de A. discolor (Spix, 1823), espécies filogeneticamente próximas. Alouatta ululata difere de suas espécies mais próximas por apresentar dicromatismo sexual e algumas regiões do crânio serem menores (Tab. XIII). Em adição, A. ululata habita um tipo de vegetação particular: enquanto que as espécies A. belzebul e A. discolor estão restritas à floresta pluvial equatorial amazônica, A. ululata habita uma vegetação xerófita com uma formação predominantemente aberta e com elevada freqüência de babaçu. Alouatta ululata se diferencia de A. caraya, a outra espécie que habita áreas de vegetação mais aberta e de distribuição parapátrica, por apresentar fêmeas com coloração da pelagem mais olivácea (contra o castanho claro amarelado de A. caraya) e os machos apresentrarem campos cromatogenéticos ruivos no dorso (contra o totalmente negro de A. caraya), e por ter a morfologia hióide diferenciada, principalmente pela presença de um tentório desenvolvido (estrutura ausente em A. caraya).

A revalidação formal do táxon, e ao nível específico, é considerada como uma hipótese a ser testada com dados adicio- nais, tais como os citogenéticos, estudos morfológicos comple- mentares incluindo mais espécimes, e um incremento nos estu- dos da biologia destas populações. A única grande série deste táxon, excluindo a do MZUSP, está depositada no Museu Britâ- nico a qual não foi analisada por mim. Segundo R. Thorington (com. pes.), lá encontram-se indivíduos machos claros e fêmeas escuras o que divergem parcialmente dos resultados alcançados

no presente estudo, questionando assim a presença do dicromatismo sexual e conseqüentemente, a diagnose de A. ululata. Contudo, a descrição da coloração da pelagem por ELLIOT (1912) daquela série não deixa dúvidas quanto ao dicomatismo sexual do táxon, contrariando as informações do Dr. Thorington. De fato, a série de A. ululata do Museu Britânico foi obtida por Schwanda, o mesmo coletor do material depositado no MZUSP, a maior série desta espécie nos museus brasileiros, e é de se estra- nhar que ela seja muito diferente em ambos os museus. Assim, a convicção de que os espécimes do norte do Ceará, Maranhão e Piauí referem-se a um táxon distinto de A. belzebul é baseada em exemplares de museus brasileiros e eles caracterizam uma espé- cie dicromática. Somente após estudos mais aprofundados de variação morfológica e citogenética aliados aos dados ecológi- cos podem esclarecer se a espécie deve ser invalidada ou se o padrão de coloração peculiar encontrado nos indivíduos do Maranhão e Ceará é apenas uma variação de A. belzebul, talvez relacionada ao hábitat de vegetação mais aberta.

História taxonômica

Como já exposto e em LÖNNBERG (1941), a história taxo- nômica de A. ululata está diretamente relacionada àquela de A. discolor. DOLLMAN (1910) foi o primeiro autor a descrever o pa- drão de coloração de A. ululata baseado em uma série enviada ao Museu Britânico e cuja proveniência era Miritiba, Estado do Maranhão O autor estava convicto que os exemplares que esta- va analisando pertenciam a A. discolor devido à coloração da pelagem negra e dorso castanho-avermelhado, padrão este su- perficialmente coincidente com aquele descrito, mas não figu- rado, por SPIX (1823).

Posteriormente, ELLIOT (1912) discerniu os animais de Miritiba descritos minuciosamente por DOLLMAN (1910) daque- les do Rio Tapajós, descritos por SPIX (1823), ambos designados por discolor. ELLIOT (1912) criou o nome A. ululata para indicar o táxon do Maranhão (= A. discolor Dollman, 1910), caracterizan- do-o por apresentar dicromatismo sexual e o colorido ruivo mais acentuado e brilhante se comparado à espécie do oeste do Pará, na qual o autor denominou de A. belzebul [assim como DOLLMAN, ELLIOT (1912) questionou a validade de A. discolor (Spix) conside- rando-a apenas como uma variação de A. belzebul (Linnaeus)]. Posteriormente, IHERING (1914) reavaliou a sistemática dos bugi- os e com base nos exemplares do Museu de Zoologia da USP, e considerou A. ululata apenas como uma variação de A. belzebul. Após o trabalho de IHERING (1914), os autores têm concordado com a categoria subespecífica de A. ululata (CRUZ LIMA 1945, VIEIRA 1955, 1957, CABRERA 1958, HILL 1962, MITTERMEIER & COIMBRA-FI- LHO 1981, LANGGUTH et al. 1987, BONVICINO et al. 1989, COIMBRA- FILHO 1990) ou mesmo negado a validade do táxon (LÖNNBERG 1941, WOLFHEIM 1983, ÁVILA-PIRES 1989, GROVES 1993, 2001a). A coloração da pelagem nos machos de A. ululata difere de A. discolor pela primeira mostrar os campos ruivos a castanho- avermelhados nos flancos, com uma faixa médio-dorsal negra, enquanto que A. discolor tem a região médio-dorsal ruiva e flancos enegrecidos. As fêmeas são marcadamente diferentes em ambos Figuras 36-37. Osso hióide de A. ululata, indivíduo macho (MZUSP

2943): (36) vista ventral; (37) vista lateral. Note o tentório largo, retangular e inflado latero-ventralmente. (TE) Tentório.

20 mm

os táxons, pois em A. ululata elas são castanho claro levemente acinzentadas enquanto que em A. discolor elas apresentam o mesmo padrão que os machos.

A exposição acima mostra que o táxon habita uma for- mação vegetal diferenciada, apresenta características da pelagem conspícuas não registradas para qualquer espécime de A. belzebul ou A. discolor, e tampouco há registros confiáveis de hibridação entre os táxons. Assim, considera-se o táxon que ocorre no norte dos estados do Maranhão, Piauí e Ceará como uma espécie boa e designada pelo nome A. ululata.

Alouatta belzebul (Linnaeus, 1766)