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Características do fogo e das comunidades vegetais

No documento O fogo no Parque Nacional das Emas (páginas 78-80)

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2.3 Características do fogo e das comunidades vegetaisCaracterísticas do fogo e das comunidades vegetaisCaracterísticas do fogo e das comunidades vegetaisCaracterísticas do fogo e das comunidades vegetaisCaracterísticas do fogo e das comunidades vegetais

As comunidades vegetais no Parque Nacional das Emas apresentam características que evidenciam sua história de queimadas freqüentes, com o predomínio de fisionomias abertas, presença de árvores mortas com severas marcas de queima e ausência de espécies sensíveis. Pela falta de registros históricos detalhados da flora do Parque, não é possível determinar de maneira precisa quais mudanças ocorreram na vegetação nas últimas décadas. Suspeita- se que a alta freqüência de queimadas já tenha eliminado as espécies mais sensíveis a queimadas de grande intensidade como, por exemplo, as pertencentes à família das velosiáceas. Este grupo está praticamente ausente da área do Parque, mas ocorre em áreas adjacentes.

No Parque Nacional das Emas é possível separar dois tipos de resposta da vegetação ao fogo: um tipo de resposta é a encontrada em áreas de cerrado e áreas abertas úmidas e outro tipo é o apresentado pelas florestas.

De modo geral, queimadas nos cerrados e áreas úmidas abertas (campo úmido, campo de murundus, brejos e, em menor grau, buritizais) apresentam como resposta uma rápida reposição de fitomassa e alterações fenológicas, como o sincronismo ou picos de floração. Pelo longo histórico de queima, estas áreas apresentam comunidades bem resilientes ao fogo. As características ambientais da época da queima e a intensidade do fogo podem determinar diferentes respostas. Não existem dados disponíveis sobre os efeitos da freqüência de queima, mas é esperado que diferentes freqüências determinem respostas diferentes.

A característica mais importante dos cerrados do Parque Nacional das Emas diz respeito à dominância, ou não, do capim-flecha (Tristachya leiostachya Ness). Essa gramínea, pelas suas características fenológicas e alta densidade, tem a capacidade de tornar o ambiente mais suscetível à ocorrência de uma queimada. Esta espécie, ao mesmo tempo, parece favorecer-se com o fogo, pois existe um aumento do tamanho de sua touceira após a queima. Deste modo, a presença desta espécie, poderia controlar grandes fluxos de energia, podendo ser classificada como espécie engenheira (senso Lawton, 1994). Estas características colocam o capim-flecha no centro das atenções, sendo necessários aprofundamentos a respeito de sua biologia na área do Parque. O conhecimento do comportamento do capim-flecha e as suas relações com as outras espécies é indispensável para a elaboração de um manejo adequado. O comportamento extremamente agressivo desta espécie, caracterizado pela sua grande dominância, lembra o comportamento de espécies invasoras, podendo ser esta dominância, fruto de sua expansão, decorrente de distúrbios pretéritos ocorridos na área. Cabe lembrar que o aumento do risco de queima determinado pelo acúmulo de biomassa de capim-flecha pode diminuir o sucesso no estabelecimento de plântulas de elementos arbóreos, trazendo conseqüências na reposição das árvores mortas (Miranda et al., 2002).

No caso das florestas do Parque Nacional das Emas, o comportamento é muito distinto do observado acima. Tanto as florestas ciliares, como as florestas estacionais presentes no Parque são compostas por espécies sensíveis à queima. De forma geral, durante as queimadas apenas as bordas das florestas são atingidas, podendo até matar as espécies mais sensíveis. Redford (1984) chama a atenção para as queimadas que atingem as matas ciliares e provocam sua retração, o que é verdadeiro também para as florestas estacionais. O fogo atingiu o interior das florestas em poucas oportunidades, sendo a queimada de 1994 uma das mais graves neste aspecto. Após esta queimada, o sub-bosque foi eliminado em muitas áreas de floresta e árvores de grande porte foram mortas, depois de terem a base dos troncos queimada. Por ter uma pequena representação em área, as áreas florestadas, principalmente as de floresta estacional semidecidual, receberam pouca atenção em relação ao acompanhamento dos efeitos das queimadas. Apesar de a área ser relativamente pequena, as florestas no Parque Nacional das Emas, e nos cerrados de forma geral, apresentam importante papel para a fauna (Redford e Fonseca, 1986). Assim, os efeitos deletérios das queimadas sobre estas formações podem ter uma dimensão extremamente maior, quando comparados com a sua área.

Além das comunidades nativas do Parque, o fogo age sobre comunidades em processo de invasão por espécies exóticas. Aparentemente, o estabelecimento das espécies invasoras está mais ligado às práticas de manutenção de aceiros do que os efeitos do fogo. A localização de espécies invasoras no Parque está diretamente relacionada às áreas gradeadas dos aceiros, e não às áreas com grande freqüência de queima. De qualquer forma, estas espécies exóticas, principalmente a braquiária (Brachiaria spp.) e o capim- gordura (Melinis minutiflora) representam um perigo potencial para a diversidade do Parque (Coutinho, 1990). Klink (1996) ressalta que gramíneas africanas, pela sua capacidade de colonização de áreas perturbadas, são as mais agressivas invasoras dos cerrados. No entanto, o sucesso da invasão depende do tipo de manejo aplicado, já que em áreas não perturbadas estas espécies parecem não deslocar as nativas.

Conforme o apresentado, as relações entre o fogo e a vegetação são complexas, existindo diferentes respostas conforme a época da queima ou características das comunidades. A principal particularidade do regime de fogo no Parque Nacional das Emas é que, até 1994, existia um regime determinado por incêndios durante a época seca, de causas antropogênicas e outro de ocorrência no período mais úmido, de causas naturais. Estes dois tipos de fogo apresentam comportamentos diferentes e ocorrem em diferentes situações climáticas, por conseqüência, determinam diferentes respostas das comunidades. As queimadas antropogênicas caracterizam-se por ocorrer durante a estação seca, com uma freqüência de queima dependente do grau de proteção da área. Este “regime” é considerado predominante para os cerrados (Mistry, 1998), principalmente pelo fato de queimadas antropogênicas se adiantarem às queimadas naturais, que, teoricamente, ocorrem em menor freqüência (Coutinho,

1990). No Parque, com a proteção eficiente contra queimadas antropogênicas, fica evidente a importância das queimadas naturais durante os meses mais úmidos. Mais importante que a presença destas queimadas são as diferenças nas respostas das comunidades vegetais em queimadas durante os meses mais úmidos. Este fato abre novas questões e oportunidades de pesquisa em relação à ecologia do fogo nos cerrados.

A aceitação do regime antropogênico como “adequado” ou “esperado” para os cerrados é muito mais decorrente da extensão, intensidade e persistência das queimadas de origem humana durante a estação seca, do que de qualquer análise lógica baseada nas possibilidades e probabilidade de queimadas naturais. Pelo menos para o Parque Nacional das Emas, queimadas naturais durante a estação seca são eventos raros. No período de 1995 a 2004 ocorreu apenas uma tempestade de raio durante a estação seca, mesmo assim sem causar nenhum foco de incêndio.

O maior problema relacionado à aceitação generalizada de um regime de queima durante a estação seca é o fato da maioria das informações científicas disponíveis sobre a resposta da vegetação e da fauna do cerrado ao fogo advirem das queimadas de junho a agosto e, em muito menor proporção, setembro, o qual em muitas áreas de Cerrado ainda é um mês seco. Assim, quase todo nosso conhecimento sobre a ecologia do fogo para os cerrados é baseado em queimadas que nada tem a ver com padrões naturais. Este problema é grave para áreas onde o objetivo principal é a conservação, buscando a diminuição de influências antropogênicas externas.

No documento O fogo no Parque Nacional das Emas (páginas 78-80)

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