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1.4. Características personalísticas 1 Definição de personalidade

1.4.10. Características personalísticas e clínicas nos criminosos

O crime, como ação humana, pode ser concetualizado como uma resposta normal ou patológica consciente ou não de uma determinada personalidade, a uma situação dualmente estimulante a nível intrínseco e extrínseco. Fala-se de um fenómeno grandemente dependente tanto da personalidade como do ambiente envolvente, isto de forma transitória, contínua ou periódica (Costa, 1989, cit. in Cardoso & Costa, 2005). A literatura associa frequentemente o comportamento criminoso à presença de psicopatologia, referindo que a perturbação mental contribui amplamente, em diversos casos, para a execução dos crimes (Hodgins, 2006, cit. in Nunes, 2009). Assim como o comportamento criminal pode também estar associado a uma perturbação de personalidade que funciona como força impulsionadora da prática do crime (Nunes, 2009). Especificamente, no caso da população presidiária, existem diversas evidências que indicam uma considerável prevalência de perturbação mental nesta população, quando comparada com a população geral (Teplin et al., 1996; Cardoso et

al., 2004; Assadi et al., 2006, cit. in Teixeira, Pereira, Rigacci & Dalgalarrondo, 2007).

Após uma aprofundada revisão da literatura, verificou-se uma escassez de estudos que investigaram a relação entre as características personalísticas abordadas no presente estudo e o criminoso passional, especificamente. Todavia, encontraram-se estudos que avaliam essas características personalísticas, bem como outras características clínicas, noutro tipo de criminosos.

Diversos estudos demonstram que a sintomatologia da ansiedade e depressão é a mais predominante na população reclusa. Em Portugal, pode referir-se um estudo em que se aplicou o instrumento State Trait Anxiety Inventory (STAI) em 48 reclusos, onde se verificou que 88% apresentava elevados níveis de ansiedade (Ventura & David, 2001, cit. in Marques,

2010). Associados à sintomatologia depressiva e de ansiedade, ocorrem por vezes explosões de agressividade, descompensações do tipo psicótico, alterações da imagem de si, delírios e, nos casos mais extremos, tentativas de suicídio (Marques, 2010).

Num estudo levado a cabo em Portugal, cujo objetivo era explorar determinadas características de nove criminosos, sendo que um dos instrumentos utilizados foi o MMPI, verificou-se que os indivíduos considerados imputáveis (no momento ato estão capazes de decidir voluntariamente acerca das suas ações, bem como conhecerem, antecipadamente, as consequências futuras que delas advêm) eram aqueles que cometeram um crime mais associado ao crime passional, na base dos seus motivos para o crime estiveram o ciúme (obsessão), a exaustão da relação, e a influência da pessoa amada. A nível dos resultados mais significativos, estes indivíduos apresentaram pontuação média para a depressão, sendo considerados estáveis, ajustados e realistas, apresentam psicopatia moderada; a nível da psicastenia, apresenta-se com uma elevação moderada, caracterizando indivíduos ansiosos, com depressão moderada, falta de segurança em si mesmos, perfeccionistas e não se sentindo aceites pelos outros (Cardoso & Costa, 2005).

O MMPI, que abrange a características personalísticas de interesse para a presente investigação, tem sido o teste psicológico mais utilizado na avaliação psicológica e investigação de abusadores sexuais de crianças. Em geral, este tipo de criminosos tende a ter uma pontuação mais alta na escala de desvio psicopático. Os sujeitos mais violentos e os abusadores de crianças mais reincidentes tendem a pontuar secundariamente na escala de esquizofrenia (Quinsey & Lalumière, 2001, cit. in Pechorro, Poiares & Vieira, 2008). A literatura revela que este padrão de resposta não parece ser unicamente específico dos abusadores de crianças, sendo comum em outros tipos de agressores (Okami & Goldberg, 1992; Quinsey & Lalumière, 2001, cit. in Pechorro, Poiares & Vieira, 2008). Outro estudo corrobora estes resultados para os agressores sexuais, em geral, mostrando que estes últimos apresentaram comportamentos relacionados com a personalidade antissocial, sendo que os que acabam por matar a vítima tem esses traços comportamentais mais presentes no decorrer da vida (Costa & Mello, 2012).

Investigações realizadas em Inglaterra, com presos por terem cometido crimes violentos, verificaram uma maior prevalência de pessoas com esquizofrenia quando comparada com a da população normal (Taylor & Gunn, 1984; 1999 cit. in Teixeira, Pereira, Rigacci & Dalgalarrondo, 2007). Num estudo retrospetivo realizado com condenados por homicídio na Austrália, de 1993 a 1995, verificou-se uma taxa elevada de condenados que apresentavam antecedente de tratamento para esquizofrenia previamente ao crime. Sendo que essa taxa aumentava quando examinada a sua associação com o uso/abuso de substâncias (Wallace et

al., 1998, cit. in Teixeira, Pereira, Rigacci & Dalgalarrondo, 2007).

As investigações que se preocupam com a caracterização de indivíduos presidiários centram-se maioritariamente em amostras do sexo masculino. Todavia, um estudo norte- americano, já realizado há algumas décadas, comparou os perfis de reclusos do sexo masculino com perfis do sexo feminino, obtidos através do MMPI. Os resultados deste estudo

demonstram que os homens apresentam médias significativamente mais altas nas escalas de hipocondria e paranoia, enquanto as mulheres pontuam mais alto a nível da introversão- extroversão e essencialmente na escala paranoia. Ambos os sexos apresentam resultado elevado no que concerne ao desvio psicopático. Parece que os reclusos do sexo masculino são mais antissociais e neuróticos (Panton, 1974).

Num estudo americano, que recorreu à aplicação do MMPI-2 em homens e mulheres presidiários (N = 41.159), Black et al. (2004) relataram que 66% dos homens obtiveram pelo menos um escala clínica elevada (T> 64), sendo que as três escalas mais frequentemente elevadas foram a de desvio psicopático, paranoia e hipomania. Cerca de 21% da amostra deste estudo foi excluída, usando os critérios tradicionais de perfil inválido (Wise, 2009). Num outro estudo americano, que utilizou o MMPI-2 para avaliar os padrões e configurações em homens e mulheres presos, corroborou o estudo anterior mostrando que as escalas de desvio psicopático, paranoia e hipomania são das mais elevadas, para ambos os sexos, verificou ainda que homens e mulheres apresentam configurações de perfil relativamente semelhantes, ainda que o sexo feminino apresente pontuações mais desviantes, relativamente ao sexo masculino (Megargee, Carbonell & Jill, 1999).

A nível da violência doméstica, as características personalísticas mais frequentes, segundo diversos autores e que podem propiciar este tipo de violência são: a psicose, perturbações do comportamento, ambas combinadas com o consumo abusivo de álcool (Echeburua, 1994; Rojas Marcos, 1995, cit. in Verde & Cortés, 2007), a paranoia, o delírio (Dutton, 1995, Coleman., 1980; Roy, 1982; Walker, 1979, cit. in Verde & Cortés, 2007), a depressão (Hammond & Carole, 1997, cit. in Verde & Cortés, 2007), a perturbação de personalidade antissocial, paranoica, narcísica (Echeburua, 1994, cit. in Verde & Cortés, 2007) e boderline (Dutton, 1995, cit. in Verde & Cortés, 2007).