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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Perfil socioeconômico e técnico dos cajucultores pesquisados

4.1.2 Características técnicas

A importância socioeconômica da cajucultura nordestina é inconteste. Por muito tempo, a atividade esteve no topo da pauta de exportações da região trazendo divisas, gerando emprego e renda. No entanto, nos últimos anos, o processo de produção encontra-se fragilizado em decorrência de um modelo de exploração obsoleto que envolve a heterogeneidade dos plantios, carência de tecnologias e não cumprimento de recomendações técnicas. A produtividade dos pomares, que já alcançou 700 kg/ha na década de 1970, atualmente oscila entre 250 e 350 kg/ha.

Como se pode observar na Tabela 3, a maior parte dos plantios nordestinos encontra- se sob a exploração de mini e pequenos produtores. Esse grupo foi responsável por 71,6% do valor da produção da castanha de caju em 2006, ressaltando a importância socioeconômica da atividade, principalmente na estação seca, já que o caju é uma cultura de entressafra (RIBEIRO et al. 2004).

Tabela 3 - Participação relativa dos produtores na produção, área plantada e valor da produção do caju e da castanha de caju por estrato de área. Região Nordeste e estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Piauí. Ano 2006 (%).

Estrato de Área (ha)

Caju Castanha de Caju

Quantidade produzida Quantidade produzida

Nordeste Piauí Ceará

Rio Grande do

Norte

Nordeste Piauí Ceará

Rio Grande do Norte Menos de 5 (mini) 48,0 67,0 31,8 65,2 60,0 64,0 49,4 63,8 De 5 a menos de 20 (pequenos) 13,0 21,8 13,0 19,9 15,6 14,6 18,2 19,1 De 20 a menos de 100 (médios) 7,2 7,7 8,7 12,1 9,6 5,1 12,6 13,3 Acima de 100 (grandes) 31,8 3,5 46,5 2,8 14,8 16,3 19,8 3,7

Área Plantada Área Plantada

Nordeste Piauí Ceará

Rio Grande do

Norte

Nordeste Piauí Ceará

Rio Grande do Norte Menos de 5 (mini) 34,2 35,6 26,0 31,7 30,3 25,2 26,9 35,0 De 5 a menos de 20 (pequenos) 26,5 32,0 22,9 28,7 22,7 20,8 23,9 27,0 De 20 a menos de 100 (médios) 19,0 15,8 22,2 27,0 17,5 9,7 23,8 24,4 Acima de 100 (grandes) 20,2 16,6 28,9 12,6 29,5 44,3 25,4 13,6

Valor da Produção Valor da Produção

Nordeste Piauí Ceará

Rio Grande do

Norte

Nordeste Piauí Ceará

Rio Grande do Norte Menos de 5 (mini) 29,0 64,6 11,7 70,5 55,5 59,5 48,8 50,0 De 5 a menos de 20 (pequenos) 8,1 20,1 5,2 17,1 16,1 15,7 17,9 18,4 De 20 a menos de 100 (médios) 4,6 11,3 2,8 10,8 12,6 5,5 12,3 28,8 Acima de 100 (grandes) 58,3 3,9 80,4 1,5 15,8 19,3 21,0 2,8 Fonte: IBGE. Censo Agropecuário (2006)

No estado do Ceará, identifica-se uma distribuição mais uniforme da área plantada com caju entre os diferentes estratos de área analisados. No entanto, 55,2% da quantidade produzida de caju e 32,4% da produção da castanha foram ofertadas por produtores que se enquadravam como de médio e grande porte em 2006. Em termos de valor da produção de caju, as diferenças entre pequenos e grandes produtores são ainda mais perceptíveis no estado,

cabendo aos maiores o correspondente a 80,4% do valor total da produção de caju. As diferenças apontadas, no entanto, são invertidas quando analisado o valor da produção da castanha. Assim como nos demais estados pesquisados e no Nordeste como um todo, os pequenos produtores cearenses apresentam uma maior relevância na formação desse indicador.

O conhecimento de que os mini e pequenos produtores são, de fato, os principais agentes produtivos da cajucultura nordestina é importante em qualquer análise conjuntural da atividade e traz elementos que auxiliam na caracterização do perfil técnico dos produtores, descrito a seguir.

Segundo Oliveira et al (2003), o cajueiro não é exigente quanto à classe de solo, porém devem ser preferidos aqueles com textura arenosa ou franco- arenosa. De acordo com o Gráfico 5, essa característica é observada na maior parte das propriedades pesquisadas.

Gráfico 5 - Tipos de solo encontrados nas propriedades rurais dos cajucultores do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Dados os elevados valores do coeficiente de variação6 existe uma grande heterogeneidade entre os cajucultores quanto à proporção da área da propriedade destinada à cajucultura, como pode ser percebida na análise da Tabela 4. Embora seja apontada como principal atividade agropecopecuária exercida na maior parte das propriedades pesquisadas, em 25% destas há no máximo 23% da área destinada ao cultivo dos cajueiros.

Tabela 4 - Estatísticas descritivas da variável proporção da área da propriedade destinada à cajucultura. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Piauí e amostra total (%).

Estado

Estatísticas Descritivas Media Quartil 1 Mediana Desvio

Padrão

Coeficiente de Variação

Ceará 58,4 25,0 60,0 27,6 47,3

Rio Grande do Norte 65,2 30,0 70,0 24,3 37,3

Piauí 57,9 12,4 51,3 33,3 57,5

Ceará, Rio Grande do Norte e Piauí 60,5 23,0 60,0 28,9 47,8 Fonte: Dados da pesquisa

* Não há diferença significativa entre os estados quanto à média da variável proporção da área da propriedade destinada à cajucultura.

A baixa proporção relativa da área destinada à cajucultura é reflexo das dificuldades encontradas pelos produtores que enfrentam perdas contínuas de produtividade e competitividade.

A ausência de financiamento implica que qualquer investimento na atividade deve ser realizado com parcela dos rendimentos ou lucro obtido pelo cajucultor. Dado que a maioria dos cajucultores entrevistados apresenta baixo nível de capitalização, o acesso ao crédito torna-se, portanto, uma alternativa para potencializar as chances de inserção no mercado. Neste sentido percebe-se que o número de produtores que tiveram acesso a algum tipo de financiamento é ainda relativamente pequeno, embora seja considerável e significativo no estado do Ceará (Gráfico 6).

6

Segundo Pimentel Gomes (2000), se o coeficiente de variação for inferior a 10%, considera-se o mesmo como baixo, ou seja, tem alta precisão; de 10% a 20% os CVs são considerados médios, implicando boa precisão; de 20% a 30% são julgados altos, significando baixa precisão e acima de 30% são tidos como muito altos, indicando baixíssima precisão.

As instituições financeiras públicas são as principais fontes de crédito da cajucultura nordestina e atuam de forma diferenciada nos estados. Em relação à instituição que forneceu o financiamento agrícola, o Banco do Nordeste tem maior atuação no Rio Grande do Norte e no Piauí. O Banco do Brasil é o maior financiador da cajucultura no Ceará em termos de número de cajucultores beneficiados (Gráfico 7).

Gráfico 6 – Distribuição relativa dos cajucultores segundo o recebimento de algum tipo de financiamento agrícola. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Fonte: Dados da pesquisa

Os investimentos realizados pelos cajucultores na atividade são baixos e variam significativamente entre os estados pesquisados. Na amostra total, no entanto, o valor do financiamento prevalecente ocorre entre R$ 10.000,00 a R$ 20.000,00 (Gráfico 8). Não foi identificada uma relação estatística significante entre o valor do financiamento e variáveis socioeconômicas e técnicas como idade, renda familiar mensal, proporção da área da propriedade destinada à cajucultura. No entanto, de acordo com Guanziroli et al (2009), os mini e pequenos produtores foram os mais assistidos com crédito rural em 1998.

Gráfico 7 - Instituições financeiras que forneceram recursos para os cajucultores entrevistados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total

Fonte: Dados da pesquisa

Gráfico 8 - Distribuição dos cajucultores segundo o valor do financiamento. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Observou-se nos três estados (Gráfico 9) que a cajucultura é o principal motivo do financiamento sendo o maior interesse o aumento da área destinada ao cultivo de caju (AACC) e as práticas agrícolas destinadas ao cultivo do caju (PACC). Investimentos em tecnologias, no entanto, não é o propósito da maior parte dos empreendimentos pesquisados apesar do cenário já mencionado.

Gráfico 9 - Distribuição dos cajucultores segundo a finalidade do financiamento. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Fonte: Dados da pesquisa

A esse respeito, Guanziroli et al (2009) discutem que financiamentos concentrados nos mini e pequenos produtores podem não ter o impacto econômico esperado, haja vista que os médios e os grandes produtores apresentam melhores condições técnicas e econômicas, na maioria dos casos, para introduzir tecnologias mais adequadas para gerar ganhos de produtividade.

Diante das possibilidades de sistema de produção em sequeiro, irrigado ou misto, a cajucultura nordestina emprega, quase que exclusivamente, o sistema de sequeiro o qual demanda tecnologia menos sofisticada (Gráfico 10). O fato de o sistema irrigado tornar a produção bastante onerosa pode ser umas das possíveis razões de não termos encontrado produtores que utilizem o referido sistema.

Gráfico 10 - Distribuição dos cajucultores segundo o sistema de produção da cultura de caju. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total

Fonte: Dados da pesquisa

A baixa capitalização dos cajucultores é também responsável pelos resultados pífios das políticas governamentais de incentivo à adoção de tecnologias como o plantio de variedades desenvolvidas pela EMBRAPA, caso do cajueiro anão precoce. Essa variedade requer, no entanto, um pacote tecnológico oneroso para o produtor. Diante desse impasse, Guanziroli et al (2009) sugerem a substituição de copas dos cajueiros gigantes ou enxertia, sem necessitar o uso intensivo de insumos. Para isso, no entanto, torna-se necessária a qualificação de mão de obra.

O Gráfico 11 apresenta o uso de práticas agrícolas recomendadas no cultivo do cajueiro nas propriedades visitadas. Percebe-se que o emprego dos tratos culturais recomendados é tímido, inclusive sem uso de corretivo e adubação em algumas propriedades. Os baixos percentuais observados nos estados e na amostra total permitem inferências sobre a vulnerabilidade da cajucultura nordestina decorrente do manejo inadequado.

Gráfico 11 - Distribuição dos cajucultores segundo as práticas agrícolas utilizadas no sistema de sequeiro do cajueiro. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

A situação da cajucultura nordestina quanto ao manejo da produção torna-se ainda mais preocupante à medida que se observa que boa parte dos cajucultores não tem a percepção de que a não adoção de práticas agrícolas recomendadas pode comprometer o desempenho da atividade (Gráfico 12).

Gráfico 12 - Distribuição dos cajucultores segundo a percepção sobre falhas no manejo da produção. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Fonte: Dados da pesquisa

Quando perguntados sobre pontos falhos durante o processo produtivo as opiniões entre os cajucultores foram diversas. Como pode ser observado no Gráfico 13, a dificuldade mais comum foi no combate às pragas. A carência de assistência técnica foi apontada por 23% dos entrevistados como a maior fragilidade do processo. Foi identificada, ainda, a necessidade de modificar o espaçamento dos cajueiros, o que já está sendo feito por alguns produtores.

Segundo os produtores entrevistados, as falhas cometidas na execução das práticas agrícolas impactam negativamente sobre a cajucultura, especialmente na redução da produtividade e da renda. (Gráfico 14).

Gráfico 13 - Distribuição dos cajucultores segundo os pontos falhos durante o processo produtivo. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Gráfico 14 - Distribuição dos cajucultores segundo os impactos negativos decorrentes da adoção de práticas de cultivo inadequadas. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Fonte: Dados da pesquisa

A comercialização tem sido um dos grandes entraves da cajucultura, principalmente no elo dos produtores, em que a remuneração não cobre os custos de produção, ou seja, o preço que o produtor paga pelos insumos (fatores de produção), como mão de obra, matéria- prima, máquinas e equipamentos. Com isso, não há estímulo para investir na melhoria do cajueiral (LIMA, 2011; MAGALDI, 2010).

A pesquisa mostrou que alguns produtores vendem sua produção diretamente às agroindústrias e outros aos atravessadores. Segundo os produtores, a questão é o acesso ao mercado, por isso eles ficam dependentes dos atravessadores. Isso tem provocado várias consequências para o setor, como, por exemplo, as distorções de preços e o desestímulo ao investimento em novas tecnologias.

Conforme o Gráfico 15, a produção do caju é vendida em parte para as agroindústrias, enquanto a produção da castanha é vendida aos atravessadores, os quais compram na propriedade do produtor, evitando que eles tenha custos com o transporte da produção. Em contrapartida, os atravessadores ditam seus preços, deixando o produtor sem opção de escolha para a venda. Outros destinos dos produtos são minifábricas, cooperativas, usinas de beneficiamento e processamento com baixo nível tecnológico, e ainda a produção de cajuína caseira, com técnicas rudimentares.

Gráfico 15 - Comercialização da produção de caju e de castanha do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Fonte: Dados da pesquisa

Como se observa no Gráfico 16, a maioria dos produtores não pratica produção coletiva. Dentre os motivos pode está o processo de colonização implementado nas localidades em que se realizaram as pesquisas. Na Serra do Mel, o processo de instalação de famílias de colonos se deu através da demarcação da área, desmatamento e plantio de cajueiros. As benfeitorias realizadas na área atraíram pessoas em busca de oportunidades de trabalho. O projeto tornou-se singular em função da implantação de uma cultura permanente e capaz de ser comercializada nos mercados, no caso a cajucultura, além da instalação de pequenas unidades de beneficiamento de castanha de caju nas próprias residências dos colonos. A importância da castanha de caju para a economia do município é facilmente perceptível. Uma maior organização dos produtores facilitaria a comercialização da produção de caju, fortaleceria a atividade e o beneficiamento do pedúnculo, que por vezes é desperdiçado, ficando desprezado na área dos cajueiros.

Ainda como contribuição à atividade, coloca-se que a apicultura praticada em conjunto com a cajucultura traz benefícios para o produtor, pois aumenta a produtividade da cultura e favorece a ação dos polinizadores. Trata-se de uma atividade lucrativa e, quando realizada em cooperativas, os participantes encontram facilidades para fixar o preço do mel e adquirir equipamentos e máquinas para beneficiamento da produção. A produção de mel, no entanto, não é comum entre os cajucultores, cuja maioria não possui experiência com apicultura (Gráfico 17). Vários produtores assumiram ter medo da atividade, desconhecendo os seus benefícios para a polinização do cajueiro e como fonte alternativa de renda.

Gráfico 16 - Distribuição dos cajucultores segundo a forma de organização. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Fonte: Dados da pesquisa

Gráfico 17 - Distribuição dos cajucultores segundo a experiência com apicultura. Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Piauí e amostra total.

Fonte: Dados da pesquisa

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