Capítulo 3 Preparação e caracterização do sistema BiNbO 4
3.4. Caracterização elétrica
3.4.2. Caracterização dielétrica na gama das radiofrequências
Na figura 3.14 apresentam-se as partes real e imaginária da permitividade elétrica em função da temperatura, à frequência de 100 kHz.
A caracterização dielétrica na gama das radiofrequências incidiu apenas nas amostras tratadas a 500, 650, 850 e 1050 ˚C, pois o tratamento efetuado a 1150 °C, promoveu a fusão dos discos.
Analisando a evolução da constante dielétrica constata-se que esta se mantém praticamente constante com o aumento da temperatura.
As amostras tratadas a 850 e 1050 ˚C, ou seja, as amostras com α-BiNbO4 e β-BiNbO4 puros,
apresentam valores de constante dielétrica mais baixos e muito próximos, enquanto que a amostra tratada a 1050 ˚C apresenta constante dielétrica superior, sendo, no entanto, a amostra tratada a 500 ˚C a que apresenta os valores de ε' mais elevados.
Esta distribuição de valores dever-se-á à presença das fases secundárias identificadas nos difratogramas.
Relativamente às perdas, estas também são mais expressivas na amostra tratada a 500 ˚C, aumentando de forma significativa com o aumento da temperatura.
Da análise da figura 3.14(b), destaca-se a deflexão que ocorre, aproximadamente a 270 K, na amostra tratada a 850 ˚C, que sugere a ativação térmica de portadores de carga com a temperatura.
Figura 3.14 - (a) Constante dielétrica e (b) perdas dielétricas, em função da temperatura, à
frequência de 100 kHz.
Na figura 3.15 apresenta-se a constante dielétrica e as perdas em função da frequência, determinadas à temperatura constante de 300 K. A análise destes gráficos revela que a constante dielétrica se mantém praticamente constante com o aumento da frequência, ao contrário das perdas, que diminuem expressivamente com o aumento da frequência.
Figura 3.15 - (a) Constante dielétrica e (b) perdas dielétricas, em função da frequência,
A presença de relaxações dielétricas foi estudada através do formalismo do módulo dielétrico, uma vez que, recorrendo ao formalismo da permitividade, a presença deste fenómeno não era tão percetível. De facto, a baixas frequências, o formalismo do módulo dielétrico diminui o efeito das interfaces dos elétrodos, enfatizando as pequenas contribuições a altas frequências [11]. Assim, na figura 3.16 encontra-se representada a parte imaginária do módulo complexo, em função da frequência, para três temperaturas distintas.
Analisando as curvas obtidas, constata-se que as amostras tratadas a 500, 650 e 1050 ˚C não apresentam fenómenos de relaxação no intervalo de frequências e temperaturas considerado. Por outro lado, no caso da amostra tratada a 850 ˚C, a única com α-BiNbO4 puro, é possível
observar a evolução de um processo de relaxação termicamente ativado, que se desloca para frequências mais elevadas com o aumento da temperatura.
Figura 3.16 - Parte imaginária do módulo dielétrico em função da frequência, determinado às
Com o objetivo de estudar a relaxação identificada na amostra tratada a 850 ˚C, apresenta- se, na figura 3.17(a), a parte imaginária do módulo dielétrico em função da parte real, constituindo uma representação de Nyquist.
Este gráfico apresenta a forma de um semicírculo descentrado, com um perfil que confirma que o modelo de Debye é inapropriado para descrever o fenómeno de relaxação, devendo este ser estudado através de um modelo empírico, mais concretamente o modelo de Cole-Cole, uma vez que o centro do semicírculo está localizado abaixo do eixo de M' [12], e é simétrico, tal como se pode ver, também na figura 3.17(a).
Na figura 3.17(b) encontra-se representada, para a mesma amostra, M'' em função da frequência, considerando um intervalo de temperaturas em que o processo de relaxação é visível.
A representação logarítmica da frequência de relaxação em função do inverso da temperatura, tal como se apresenta na figura 3.18, permite o cálculo da energia de ativação, recorrendo à equação (2.32), tendo sido obtido para esta amostra o valor de (0.30 ± 0.01) eV.
Figura 3.17 - (a) Representação de Nyquist e (b) parte imaginária do módulo dielétrico em função
Figura 3.18 - Representação de
Arrhenius da frequência de relaxação do módulo em função do inverso da temperatura, para a
amostra tratada a 850 ˚C.
3.5. Análise e discussão
De acordo com trabalhos prévios, a transição de β-BiNbO4 para α-BiNbO4 ocorre a
temperaturas de aproximadamente 700/750 °C, quando preparado pelo método de reação do estado sólido [13], e a temperaturas de aproximadamente 600 °C, quando preparado pelo método de co-precipitação [5]. Assim, poder-se-á inferir que o método de sol-gel promove a formação de α- BiNbO4 a temperaturas inferiores, uma vez que na amostra tratada a 500 °C já foi identificado
niobato de bismuto ortorrômbico.
O aumento da temperatura de tratamento resultou no aumento da densidade das amostras, resultados confirmados pelas micrografias apresentadas.
Relativamente às propriedades elétricas das amostras preparadas, a tabela 3.1 resume os valores de ε' e a tabela 3.2 os valores de ε'', obtidos para as diferentes amostras, à temperatura ambiente.
Quanto à constante dielétrica, é possível verificar que os valores calculados seguem a mesma tendência, tanto na gama das radiofrequências como na gama das micro-ondas, com os valores mais elevados a ocorrerem para a amostra tratada a 500 ˚C, sem aumento significativo das perdas. Trata-se, no entanto, de uma amostra de baixa densidade e com as fases secundárias, Bi2O3
e BiOCl, na sua composição.
As amostras tratadas a 650 e 850 ˚C apresentam valores de ε' e ε'' muito semelhantes, no entanto, a amostra tratada a 850 ˚C apresenta um processo de relaxação termicamente ativado. Sendo a única amostra composta apenas por niobato de bismuto ortorrômbico e sendo também a única amostra a apresentar uma relaxação, será válido inferir que este fenómeno se deve à
presença do α-BiNbO4 puro. A morfologia desta amostra também é distintiva, já que é a única a
apresentar grãos na forma de bastonete na sua constituição.
Com o tratamento a 850 ˚C todo o β-BiNbO4 se converteu em α-BiNbO4, havendo também
um aumento da densidade, sem se registarem alterações significativas nos valores de ε' e ε''. Por outro lado, o tratamento a 1050 ˚C converte todo o α-BiNbO4 em β-BiNbO4, promovendo novo
aumento de densidade. Assim, será válido afirmar que o aumento de ε' será devido à conversão da fase ortorrômbica e ao aumento da densidade. Este aumento da constante dielétrica ocorreu sem aumento significativo das perdas.
Por fim, verifica-se que na amostra tratada a 1150 ˚C, que foi apenas caracterizada eletricamente na gama das micro-ondas, ocorreu um ligeiro aumento dos valores de ε' e ε'', podendo este aumento dever-se à formação da fase secundária Bi3.54Nb7.09O22.7 e/ou ao significativo
crescimento de grão.
Tabela 3.1 - Valores de ε' das amostras preparadas, determinados
a 1 kHz, 100 kHz, 1 MHz e 2.7 GHz, a 300 K. TT (˚C) ε' ± Δε' 1 kHz 100 kHz 1 MHz 2.7 GHz 500 66 ± 2 63 ± 3 63 ± 3 7.7 ± 0.8 650 18 ± 1 18 ± 1 18 ± 1 5.0 ± 0.5 850 17 ± 1 16 ± 1 16 ± 1 5.4 ± 0.5 1050 31 ± 1 30 ± 1 30 ± 1 7.0 ± 0.7 1150 _____ _____ _____ 7.8 ± 0.8
Tabela 3.2 - Valores de ε'' das amostras preparadas, determinados
a 1 kHz, 100 kHz, 1 MHz e 2.7 GHz, a 300 K. TT (˚C) ε'' ± Δε'' 1 kHz 100 kHz 1 MHz 2.7 GHz 500 2.1 ± 0.2 0.47 ± 0.04 0.41 ± 0.03 0.17 ± 0.02 650 0.48 ± 0.04 0.04 ± 0.01 0.04 ± 0.01 0.010 ± 0.001 850 1.1 ± 0.1 0.14 ± 0.01 0.07 ± 0.01 0.05 ± 0.01 1050 0.18 ± 0.02 0.098 ± 0.009 0.14 ± 0.01 0.11 ± 0.01 1150 _____ _____ _____ 0.28 ± 0.03
Na tabela 3.3 apresentam-se os valores da tangente de perdas, tg, obtidos para as diferentes amostras, à temperatura ambiente, a quatro frequências diferentes. Na figura 3.19
apresentam-se os valores de tg, em função da temperatura de tratamento, às mesmas
frequências.
Analisando a figura 3.19(a), relativa ao regime de radiofrequências, observa-se praticamente a mesma tendência para a três frequências em estudo. A tangente de perdas inicialmente diminui com o aumento da temperatura de tratamento, seguidamente aumenta com o tratamento a 850 °C, e por fim, com o tratamento térmico a 1050 °C, diminui novamente. Também é notório que a tangente de perdas tende a diminuir com o aumento da frequência.
Considerando agora a figura 3.19(b), relativa ao regime de micro-ondas, observa-se que, a partir do tratamento térmico de 650 °C, a tangente de perdas aumenta com o aumento da temperatura de tratamento.
Assim, verifica-se que, independentemente do regime de frequências considerado, todas, as amostram apresentam perdas dielétricas inferiores a 1, o que significa que, nestas frequências, a energia armazenada nas cargas é superior à energia dissipada, uma vez que a tangente de perdas é dada pela razão entre ε'' e ε'.
Tabela 3.3 - Valores de tg das amostras preparadas, determinados
a 1 kHz, 100 kHz, 1 MHz e 2.7 GHz, a 300 K. TT (˚C) tg ± Δtg 1 kHz 100 kHz 1 MHz 2.7 GHz 500 0.033 ± 0.003 0.008 ± 0.001 0.006 ± 0.001 0.022 ± 0.005 650 0.026 ± 0.003 0.0022 ± 0.0003 0.0019 ± 0.0002 0.0020 ± 0.0004 850 0.063 ± 0.009 0.009 ± 0.001 0.0042 ± 0.0006 0.009 ± 0.003 1050 0.006 ± 0.001 0.0032 ± 0.0004 0.0045 ± 0.0006 0.016 ± 0.003 1150 _____ _____ _____ 0.036 ± 0.008
Figura 3.19 - Tangente de perdas em função da temperatura de tratamento (a) para as frequências
de 1 kHZ, 100 kHz e 1 MHz e (b) para a frequência de 2.7 GHz, a 300 K.
3.6. Referências
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de Aveiro, 2014. Dissertação de Mestrado.
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