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5 APLICAÇÃO DA LEI DE COTAS EM IFES: O CASO DA UFPE

5.2 Considerações Metodológicas

5.2.2 Caracterização do material coletado

Preliminarmente, foi realizada uma pesquisa documental, através da consulta a documentos oficiais na UFPE, para levantamento das informações oficiais acerca das ações de inclusão que possam ter sido realizadas, sua abrangência, objetivos, resultados observados, e percepções declaradas acerca da necessidade de ações complementares e revisões desde a vigência da Lei 12.711/2012. Esse primeiro levantamento visou caracterizar o perfil da instituição enquanto facilitadora nos processos de inclusão.

A fim de auxiliar na caracterização institucional, dirimindo dúvidas acerca das ações desenvolvidas, foram realizadas entrevistas institucionais adicionais, com os representantes dos dois setores da Pró-Reitoria para Assuntos Estudantis (PROAES) responsáveis pelas principais ações afirmativas praticadas na UFPE, a saber: a Diretoria de Assistência Estudantil (DAE) e a Diretoria de Ações Integrativas (DAI).

Em seguida, através de um levantamento de dados oficiais do SISU para a IFES nas seleções de 2015 e 2016, foram retirados, para a primeira seleção, alguns dados de cadastro dos alunos ingressantes e as notas de corte e, para a segunda, as notas de corte em cada curso e os cursos mais procurados da instituição na seleção, a fim de prosseguir com as etapas seguintes, descritas adiante.

Os dados de cadastro dos alunos nas seleções 2015 e 2016 foram transformados em mapas referentes à origem territorial desses alunos, através de dados referentes ao município e Unidade Federativa de origem no momento da inscrição. Para a elaboração dos mapas foram

considerados também os indicadores de IDH e renda per capita referentes aos municípios pernambucanos, quando fosse essa a origem dos classificados.

Para a realização das entrevistas com alunos cotistas foram escolhidos, inicialmente, dois cursos oferecidos no Campus Recife da UFPE, a saber: Medicina e Pedagogia. A escolha ocorreu baseada em critérios de prestígio do curso em nossa sociedade, considerando principalmente a taxa de ocupação, status conferido pela profissão correspondente ao curso, reconhecimento tanto monetário quanto social, desempenho dos candidatos no processo de seleção e tradição do curso.

Em primeiro lugar, ficou definido que deveriam ser escolhidos cursos cuja definição de prestígio na sociedade fosse distinta um do outro. Ou seja, um dos cursos deveria fazer parte do grupo de cursos com mais alto prestígio e o outro, do grupo de cursos com menor prestígio social.

A fim de definir os cursos de acordo com o prestígio, seguiu-se, primeiramente, a orientação para “prestígio” utilizada por Silva (1994) e Costa Ribeiro (1988), que levam em consideração o desempenho dos candidatos nos processos seletivos, ou seja, o argumento de classificação dos candidatos para cada curso.

Nesse sentido, o curso de medicina na UFPE foi o que apresentou a maior nota de corte geral para a seleção 2015, os classificados precisaram atingir a pontuação mínima de 791,49 para o referido curso.

Além disso, a fim de que a escolha não se deixasse levar por questões sazonais do mercado e do contexto socioeconômico, referentes à época em que a seleção foi realizada, a mesma foi norteada pela tradição já consolidada socialmente, dos diversos cursos.

A esse respeito, sabemos que medicina é tradicionalmente um curso de elevado prestígio em nossa sociedade, associado a status social, alta empregabilidade e salários atrativos. Ademais, essas informações foram confirmadas em um estudo realizado pelo Instituto de pesquisa Econômica Aplicada – IPEA em 2013.9

Intitulado “Perspectivas Profissionais” e publicado na edição nº 27 da Publicação “Radar” do IPEA, o estudo se baseia na taxa de ocupação, jornada de trabalho e ganhos salariais a fim de definir as profissões que mais se destacam dentro desses critérios e que trariam, portanto, melhores perspectivas profissionais para o futuro. Medicina é definida no estudo como a “vencedora disparada do Ranking trabalhista” (IPEA, 2013, p. 09).

9

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Publicações: Radar, 2013. Disponível em http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/radar/130703_radar27.pdf. Acesso em 02abr2016.

Por outro lado, a área de educação e formação de professores, apesar de ter alcançado a 8ª posição quanto à taxa de ocupação, sabemos que isso ocorre muito mais por não haver, em nosso País, muitos interessados em seguir essa carreira, em virtude da falta de reconhecimento, prestígio social e remuneração atrativa. Esses fatores são ainda mais evidentes quando se trata daqueles que lecionam na Educação Infantil e nos primeiros anos do Ensino Fundamental.

De acordo com dados de 2013 do Censo da Educação Superior10 o número de concluintes em licenciaturas no Brasil sofreu uma queda de 10,1% entre 2012 e 2013. Pode-se observar que esse número passa a apresentar queda desde 2011 onde há o registro de 238.107 formandos, chegando a 201.353 em 2013.

Significativos, dados como esses fizeram com que o governo passasse a oferecer estímulos para ingresso nesses cursos voltados à formação docente, como os que constam no programa “Quero ser cientista, quero ser professor”, que oferece bolsas de incentivo a estudantes do ensino médio em escolas públicas que desejem ingressar em programas de iniciação científica em áreas específicas de licenciatura, como física e matemática, que representam as áreas docentes mais carentes de profissionais, além de outros incentivos de ingresso no ProUni e FIES, que confirmam essa carência.

Ademais, acerca do baixo prestígio social das carreiras ligadas à educação, temos que: Contraditoriamente, por um lado, o professor desenvolve uma atividade profissional reivindicada como sendo cada vez mais necessária em face dos desafios e da complexidade da realidade contemporânea, por outro, constata-se amplamente que seu prestígio e seu reconhecimento profissionais, se não declinam, pelo menos não correspondem à afirmação de destaque que se diz lhe atribuir. (GUIMARÃES, V. S., 2004, p. 18)

Logo, seria possível escolher algum curso ligado às carreiras docentes para representar nesta pesquisa os cursos de menor prestígio, e desses foi escolhido o curso de pedagogia, por representar especialmente as carreiras ligadas aos primeiros anos do Ensino Fundamental, geralmente marcadas pelos mais baixos salário e reconhecimento no grupo escolhido. No

Ranking profissional do IPEA mencionado anteriormente, das 48 profissões relacionadas,

enquanto medicina ocupava a 1ª colocação, educação e formação de professores ficou na 46ª.

10

INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA (INEP).

CENSO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: Resumos Técnicos. Brasília: INEP, 201 1. Disponível em: < http://download.inep.gov.br/download/superior/censo/2013/resumo_tecnico_censo_educacao_superior_2013.pdf >. Acesso em: 16 abr. 2016.

Por último, definidos os cursos - Medicina e Pedagogia - e quantitativo de alunos da amostra (inicialmente, 12 alunos para cada curso), foram iniciadas as entrevistas semiestruturadas com alunos cotistas da IFES analisada a fim de levantar a visão deles acerca da aplicação da lei e de outras ações institucionais de inclusão, caracterizar seus perfis e entender as facilidades e barreiras que encontram após ingressarem na instituição.

No decorrer das entrevistas, foi observada uma saturação em relação das informações colhidas em cada curso. Essa saturação foi notada a partir da décima entrevista realizada, o que fez com que fosse necessário acrescentar mais dois cursos, um para cada grupo de prestígio, a fim de buscar dados diferenciados daqueles já colhidos,visto que as características analisadas acerca da convivência e cotidianos dos alunos podem ser fortemente influenciadas pelo curso ao qual pertencem.

Dessa forma, foram adicionados Engenharia e Filosofia para realização das entrevistas, e definida a quantidade de seis entrevistas para cada um dos quatro cursos, redistribuindo assim igualmente a quantidade inicial de vinte e quatro entrevistas.

Vale salientar que não foi especificada a modalidade de engenharia a ser analisada, visto que, de acordo com as práticas atuais de seleção na UFPE, todos os candidatos aos cursos de engenharia são submetidos à seleção unificada (denominada ABI Engenharia) e cursam juntos o primeiro ciclo da área. Apenas depois, através do desempenho alcançado pelos alunos nesse primeiro ciclo, é definido um ranking de desempenho onde eles serão selecionados para os cursos de preferência.

Além disso, a maioria das modalidades de engenharia está nas primeiras colocações da classificação proposta pelo IPEA na pesquisa “Perspectivas profissionais” que aqui utilizamos para justificar a escolha dos cursos de maior e menor prestígio social das profissões em nossa sociedade, através do critério das perspectivas das profissões correspondentes a esses cursos.

Ainda de acordo com o mencionado estudo, Filosofia fica na penúltima posição no ranking de profissões proposto, perdendo apenas para as carreiras relacionadas a religião. Ademais, sabemos tratar-se de uma área ainda pouco valorizada em nosso País, estando sempre ameaçada de ser retirada do currículo escolar nas propostas de reforma educacional propostas.