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4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.1 Caracterização dos Sujeitos da Pesquisa

Participaram da pesquisa, ao todo, 80 sujeitos, 40 do hospital público (cerca de 80% do total) e 40 do Privado (cerca de 70% do total), todos lotados nas Unidades de Terapia Intensiva gerais. No Público, assim como no Privado, foram entrevistados 14 homens e 26 mulheres - isso levanta a noção de cuidado de saúde enquanto ação socialmente concebida como feminina e produto de “qualidades naturais” das mulheres (mulher-mãe, curandeira, cuidadora), gênero predominante não apenas nesta pesquisa, mas na área de saúde de modo geral. As idades dos respondentes variaram de 21 a 60 anos. A mediana da idade dos sujeitos no Público foi igual a 40 anos (com quartil inferior, 25° percentil ou “Q1/4” = 31,25 anos, e

quartil superior, 75° percentil ou “Q3/4” = 46,5 anos) e, no Privado, 32,5 anos (Q1/4 = 29,25 e

Q3/4 = 37,5 anos). Tal diferença nas idades dos sujeitos pesquisados deve-se ao fato de o setor

público engendrar estabilidade (econômica, social, política) e permitir com que seus empregados usufruam dos benefícios da seguridade social e tenham garantia de renda, independente da situação econômica vigente no país. Além disso, esta diferença se justifica pela exigência de qualificação, cada vez maior, por parte do setor privado (conforme Tabela II, a seguir) e por certa desconsideração com relação aos idosos, os quais, sob uma leviana ótica instrumental, oneram financeiramente as organizações (através de planos de carreira, benefícios adquiridos, licenças para tratamentos de saúde, etc.).

Entrevistaram-se pessoas com diferentes graus de instrução, do Ensino Fundamental à Pós-graduação universitária.

Tabela II: Escolaridade dos entrevistados, controlando o setor onde os dados foram coletados.

Público Privado

Escolaridade

Nº. Sujeitos Percentual Nº. Sujeitos Percentual

Ensino Fundamental 2 5,0 1 2,5

Ensino Médio 4 10,0 2 5,0

Ensino Técnico 15 37,5 12 30,0

Nível Superior Incompleto 6 15,0 4 10,0

Nível Superior Completo 4 10,0 7 17,5

Pós-graduação 9 22,5 14 35,0

TOTAL 40 100,0 40 100,0

Como se pôde verificar na tabela acima, a exigência de escolaridade parece ser maior no Privado do que no Público. Tal diferença pode ser, em parte, explicada pelas diferenças culturais de cada cidade pesquisada (Rio de Janeiro como uma grande metrópole, com uma competitividade trabalhista cada vez mais acirrada, e a região de Florianópolis, por outro lado, preservando ainda características das cidades de pequeno porte) e também pelo grau de complexidade tecnológica (recursos, equipamentos, etc.) das UTI’s pesquisadas - aparentemente maior no Privado. Apesar disso, o setor privado aparenta aglutinar empregados com mais alto nível de educação formal. Pelo menos em parte, isso se deve ao imperativo da produtividade, mais predominante neste setor. Ou seja, por entender que os trabalhadores mais qualificados agregam mais valor ao trabalho que desempenham, o setor privado norteia- se por escolaridade ao selecionar seus empregados e adota políticas de pessoal mais agressivas no tocante a este item. Estas suposições ganham força quando comparadas à idade dos sujeitos e ao tempo de serviço em cada setor estudado, conforme se poderá ver a seguir.

O tempo de serviços prestados ao hospital verificado nos trabalhadores das duas UTI’s variou de menos de 6 meses até 27 anos. Todavia, a mediana encontrada no Público foi igual a 12 anos (com Q1/4 = 3 anos eQ3/4 = 19 anos) e 4 anos (com Q1/4 = 2 anos eQ3/4 = 10 anos) no

Privado. Quando questionados há quanto tempo trabalham nas UTI’s pesquisadas, os entrevistados assinalaram respostas que variaram de 1 mês até 20 anos. O valor da mediana encontrado nesta questão para o Público foi 7 anos (com Q1/4 = 2 eQ3/4 = 15 anos) e, para o

Privado, 4 anos (com Q1/4 = 1,62 eQ3/4 = 9 anos).

Como os dados eram assimétricos e o número de participantes pequeno, o teste estatístico (não-paramétrico) mais apropriado foi o Mann-Whitney. As estatísticas descritivas mostraram que os participantes do Público, quando comparados aos do Privado, eram mais

velhos (mediana = 40 anos no Público contra 32,5 anos no Privado) e trabalhavam há mais tempo no hospital (mediana = 12 anos no Público versus 4 anos no Privado). O valor do U de Mann-Whitney encontrado para a idade dos sujeitos foi de 501 (Z = -2,88) e 524 (Z = -2,66) para o tempo de serviço nos hospitais pesquisados, com um valor de probabilidade associada (bi-caudal) de 0,004 e 0,008, respectivamente, o que sugere que estes resultados não se deram por erro amostral9. Portanto, existem provas o suficiente para concluir que o grupo dos participantes do Público são mais velhos e trabalham há mais tempo nos hospitais pesquisados que os do Privado. Estes resultados trazem à tona, mais uma vez, a questão da estabilidade no setor público.

O estado civil dos indivíduos pesquisados será apresentado em forma de tabela, a seguir.

Tabela III: Estado civil dos entrevistados, controlando o setor onde os dados foram coletados.

Público Privado

Estado Civil

Nº. Sujeitos Percentual Nº. Sujeitos Percentual

Casado 31 77,5 23 57,5

Solteiro 6 15,0 14 35,0

Divorciado 1 2,5 2 5,0

Viúvo 2 5,0 1 2,5

TOTAL 40 100,0 40 100,0

Houve diferença significativa com relação ao estado civil dos entrevistados ao se comparar os dois setores pesquisados. Exatamente 31 indivíduos do Público e 23 do Privado eram casados, enquanto 6 dos pesquisados no Público contra 14 do Privado eram solteiros. Como se poderá conferir na tabela a seguir, o valor do teste do qui-quadrado (χ²) encontrado para estas variáveis foi igual a 4,38, com valor-p igual a 3,3% (hipótese unicaudal) com grau de liberdade (gl) igual a 1, mostrando que é muito improvável que tal relacionamento se dê em virtude do acaso (erro amostral). O V de Cramer (valor estatístico que mede a força de associação ou dependência entre duas variáveis categóricas em uma tabela de contingência) obtido acentua que em torno de 6% da variação das freqüências do estado civil pode ser explicado pelo local de trabalho dos indivíduos estudados. Neste sentido, é possível concluir que existe uma relação entre estas variáveis.

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A probabilidade de se encontrar tais resultados é tão improvável quanto 4 em 1000 e 8 em 1000, respectivamente.

Tabela IV: Diferenças significativas entre o Estado Civil dos sujeitos controlando Local de Trabalho.

Público Privado Local de Trabalho

Casado Solteiro Casado Solteiro Χ² gl p V de Cramer

Estado Civil 31 06 23 14 4,38 1 0,033 0,243 (5,9%)

*6 sujeitos eram divorciados ou viúvos, e não foram incluídos nesta análise.

A diferença entre a quantidade de sujeitos casados no Público e no Privado ressuscita a discussão a respeito da representação social de estabilidade proposta pelo setor público, a qual permite uma condição mais digna de segurança ocupacional que possivelmente influencia as decisões individuais, as quais, muitas vezes, são exteriores ao contexto profissional (além da idade – os trabalhadores do Privado são mais jovens – a não união conjugal é um exemplo disso).

Todos os sujeitos entrevistados trabalhavam na UTI geral. A função de cada um deles é apresentada a partir da tabela a seguir.

Tabela V: Função atual do entrevistado na UTI pesquisada, controlando o setor onde os dados foram coletados.

Público Privado

Função Atual

Nº. Sujeitos Percentual Nº. Sujeitos Percentual Auxiliar Administrativo ou de Enfermagem 7 17,5 5 12,5 Técnico Administrativo 2 5,0 1 2,5 Técnico de Enfermagem 18 45,0 16 40,0 Enfermeiro 7 17,5 10 25,0 Médico 6 15,0 8 20,0 TOTAL 40 100,0 40 100,0

A cada entrevistado foi solicitado um breve resumo das principais atividades por ele desempenhadas na UTI. Dentre o grupo dos auxiliares administrativos ou de enfermagem, as principais atividades descritas, em linhas gerais, pelos trabalhadores foram: arrumação de prescrições/prontuários médicos, estocagem de remédios, limpeza e conservação, desinfecção, coleta de gasometria, etc. O grupo dos técnicos administrativos descreveu as seguintes atividades: organização de prontuários, solicitação de medicações, materiais, cobrança de taxas, medicamentos e materiais, elaboração de escalas de serviço, pedido e entrega de medicações, etc. Por sua vez, os técnicos de enfermagem descreveram as seguintes atividades: cuidados de enfermagem e/ou gerais ao paciente em estado crítico, verificação/checagem de

sinais vitais, cuidados específicos pré e pós-operatórios de cirurgias cardíacas, neurológicas e gerais, higiene corporal e oral nos pacientes, admissão do paciente, administração de medicamentos em todas as vias (intravenosos, via oral e via sonda nasoentérica), cuidados com cateteres, drenos e sondas, banho no leito, auxílio nos procedimentos médicos, cuidar do conforto do paciente (este item foi visivelmente mais citado no Público), mudanças de decúbito, aspiração, cuidados de bem-estar, etc. Os enfermeiros destacaram as seguintes atividades: assistência ao paciente, desenvolvimento de rotinas, orientação e supervisão da equipe (técnicos de enfermagem), administração do plantão, auxílio aos médicos em procedimentos, “passagem” (cateter enteral + vesical), planejamento de assistência de enfermagem, intervir e colher resultados dos cuidados prestrados, conforto ao cliente (mais citado no Público), supervisão das atividades, orientações aos familiares dos pacientes. Por fim, o grupo dos médicos salientou as atividades seguintes: visita aos pacientes, solicitação de exames, medicação, avaliação de pacientes graves, procedimentos diagnósticos/terapêuticos invasivos, definição de tratamentos, coordenação da equipe de saúde, evolução clínica diária e atendimento de intercorrências, etc.

A seguir, apresentar-se-ão os resultados obtidos através de estatísticas descritivas.