• Nenhum resultado encontrado

O carcinoma hepatocelular (CHC) é um tumor primário do fígado, que ocupa o quinto lugar em frequência entre as neoplasias, sendo o terceiro em causa de mortalidade dentre os

tumores malignos no mundo (PARKIN, 2001). Apresenta características epidemiológicas diversas, incluindo variações marcantes entre as diferentes regiões geográficas (< 80% dos casos estão localizados na África Subsaariana e Ásia oriental), predominância no sexo masculino e presença bem documentada dos fatores de risco precipitantes como a doença hepática crônica e a cirrose (aproximadamente 70-90% dos casos) (EL–SERAG; RUDOLPH, 2007).

As principais causas de cirrose nos portadores de CHC são: infecção crônica pelos vírus das hepatites B e C, doença hepática alcoólica, e possivelmente, a esteato-hepatite não alcoólica, estando menos frequentemente envolvidas, a hemocromatose hereditária, a deficiência de alfa1-antitripsina, a hepatite autoimune, e algumas porfirias ) (EL–SERAG; RUDOLPH, 2007).

De acordo com as recomendações internacionais (BRUIX; SHERMAN, 2005), a triagem do CHC deve ser adotada naqueles pacientes com alto risco de desenvolver o tumor, ou seja, indivíduos portadores de cirrose hepática e com infecção crônica pelo vírus da hepatite B, realizando-se ultrassonografia de abdome semestralmente. Uma vez detectado um nódulo no fígado com cirrose, o diagnóstico de CHC deverá ser investigado. Estabelecido o diagnóstico de CHC, o prognóstico do paciente varia de acordo com o estádio tumoral (no momento do diagnóstico) e a terapêutica instituída. Pacientes com tumores em estádios precoces poderão receber tratamentos curativos, como ressecção cirúrgica ou transplante ortotópico de fígado, com até 70% de sobrevida em 5 anos (LLOVET; BRUIX, 2003). Entretanto, indivíduos com doença avançada e não tratados, apresentam taxas de sobrevida em 1 e 2 anos de 10-72% e 8-50%, respectivamente (LLOVET; BRUIX, 2003). Enquanto pacientes em estádio terminal sobrevivem menos de 6 meses (WILDI et al., 2004)

Por ser doença com história natural ainda não completamente conhecida, o CHC tem despertado grande interesse para estudos genéticos em diferentes populações. Os principais marcadores são os sítios polimórficos observados nos genes HLA de classe II. El-Chennawi et

al. (2008) estudaram pacientes egípcios portadores de CHC, relatando que os grupos de alelos

DRB1*04 e DQB1*02 estão associados com susceptibilidade, enquanto o grupo de alelos

DQB1*06 com proteção contra o desenvolvimento do tumor. Estudo em chineses de Hong Kong em portadores de infecção crônica pelo vírus da hepatite B, apresentando ou não CHC, mostrou que os alelos DRB1*15:01, DQA1*01:02 e DPB1*05:01 foram os mais frequentes nos pacientes com CHC (DONALDSON et al., 2001).

Em estudo sobre a expressão de oncogenes e genes supressores de tumor relacionados ao CHC e com as sobrecargas de ferro, o gene supressor de tumor p53, cuja expressão é aumentada em pacientes com CHC, encontra-se também mutado em 71% dos pacientes com hemocromatose hereditária (HH). Além disso, os pacientes homozigotos para a substituição C282Y do HFE apresentam também mutações no códon 220 de p53. Curiosamente, o promotor da hepcidina contém um elemento sensível ao p53, sendo que o p53 pode ativar o promotor da hepcidina em células de hepatoma por via inflamatória dependente de IL-6. Porém, essa associação entre mutações de p53 e genótipos HFE mutantes ainda não está bem esclarecida (VAUTIER et al., 1999).

I.5.1 Carcinoma Hepatocelular e HFE

A hemocromatose hereditária é provavelmente a desordem genética na mais comum população caucasiana, com incidência de 1 em 200. O excesso de ferro absorvido pelo intestino, se não eliminado, pode acumular-se por anos e causar dano tecidual progressivo. A manifestação do dano tecidual é a cirrose, que pode levar ao desenvolvimento de câncer hepático (EDWARDS et al., 1988; WILLIS et al., 1997; WILLIS et al., 2000).

Trabalhos têm demonstrado associação entre hemocromatose hereditária e carcinoma hepatocelular, tendo que a hemocromatose hereditária foi apontada como uma das principais complicações no tratamento do carcinoma. O risco de pacientes com hemocromatose hereditária desenvolverem carcinoma hepatocelular foi estimado em 200 vezes maior por alguns autores. (BRADBEAR et al., 1985; NIEDERAU et al., 1985; ; KOWDLEY, 2004). No entanto, há duvidas se a associação de sobrecarga de ferro moderado, doenças hepáticas crônicas e mutações no gene HFE geram carcinoma hepatocelular (KOWDLEY, 2004).

O acúmulo de ferro no fígado leva a formação de oxigênio reativo, que causa stresse oxidativo, provocando mutações no DNA das células hepáticas e desenvolvimento de carcinoma hepatocelular (DEUGNIER, 2003; NAHON et al., 2008). Além da idade e do sexo masculino serem fatores de risco bem conhecidos para o acúmulo de ferro, descobrir marcadores genéticos de risco para o câncer hepatocelular, como mutações no gene HFE, é de grande interesse para validar o papel carcinogênico do ferro no fígado e sugerir medidas preventivas (NAHON et al., 2008).

Alguns estudos têm examinado se existem associações entre mutações no gene HFE e carcinoma hepatocelular, entre os pacientes com hepatite C crônica ou induzida por consumo de álcool. Muitos investigadores (BOIGE et al., 2003; CAUZA et al., 2003; FARGION et

al., 2001; HELLERBRAND et al., 2003; KOWDLEY, 2004) têm encontrado relativo aumento nas mutações clássicas no gene HFE em pacientes com câncer hepatocelular, independentemente de outros fatores de risco para o câncer hepático tais como: idade, sexo e duração da cirrose (KOWDLEY, 2004; RACCHI et al., 1999).

Além do câncer hepatocelular, há controvérsia se pacientes com hemocromatose hereditária tem aumento no risco de câncer extra-hepático. Alguns estudos têm achado grande prevalência de câncer extra-hepático, enquanto outros não. Entretanto dados epidemiológicos sugerem relação positiva entre sobrecarga de ferro e câncer, dando suporte ao conceito que a sobrecarga de ferro pode ter efeito carcinogênico generalizado (AMMANN

et al., 1980; BOMFORD; WILLIAMS, 1976; BRADBEAR et al., 1985; STEVENS et al., 1988; ELMBERG et al., 2003; FRACANZANI et al., 2001; KOWDLEY, 2004; MALLORY; KOWDLEY, 2001; SELBY; FRIEDMAN, 2006).

A influência da sobrecarga de ferro e das mutações do gene HFE têm sido debatidas nos últimos anos. A duas mutações C282Y e H63D explicam a maioria dos casos de hemocromatose hereditária, condição caracterizada pela sobrecarga de ferro hepático que

conduz a alta incidência de câncer. Ainda permanece obscura a questão se os pacientes com outras doenças hepáticas e heterozigotos para C282Y e H63D podem desenvolver sobrecarga hepática de ferro, o que conduziria ao aumento da lesão hepática e carcinomas (FEDER et al., 1996; FARGION et al., 2005; KEW, 2005; NAHON et al., 2008).

Documentos relacionados