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“CARNAVAL NA OBRA”: O POP SAMBA-ROCK E A FORMAÇÃO DO MUNDO LIVRE S/A EM RECIFE

2.1 - “Por Pouco”: esquerda estudantil e movimento punk Recife, primeira metade da década de 1980.

Há dois momentos que consideramos essenciais na trajetória do grupo de amigos do qual fizeram parte, durante este período, Fred Montenegro, Renato Lins, José Carlos Arcoverde (vulgo H.D. Mabuse) e Luciana Araújo, entre outros, e do qual se originaram a banda Mundo Livre S/A, em 1984, e o programa Décadas, em 1985. Primeiramente, o contato com a universidade (Fred, Renato e Luciana cursaram Comunicação na UFPE entre 1981 e 1985) e, logo em seguida, a descoberta musical e política do movimento

punk.

Certamente, um dos aspectos mais marcantes deste começo dos anos 1980, freqüentemente deixado em segundo plano pelas abordagens que privilegiam o estigma de decepção e descrença generalizados comumente associado a este período, é o clima intenso de abertura política e cultural que se observava dentro do ambiente universitário brasileiro naquele momento.

Não se tratava de um fato isolado. Na virada dos anos 1970 para os 1980, mesmo com o “entulho autoritário” que ainda escoava pelos dispositivos constitucionais e legais do Regime, tendo a maioria de seus aparelhos repressivos (a “polícia política”) praticamente intactos, a abertura, com a extinção do AI-5 em 1978 e o regresso ao Estado de direito em 1979, começava, de qualquer forma, a constituir uma realidade palpável no cotidiano do país.

Dentro deste quadro, as universidades ocupavam um papel primordial, vindo de uma trajetória de sucessivas greves e mobilizações envolvendo professores e estudantes, desde a segunda metade dos anos 1970. No início dos oitenta, a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) veria eclodir algumas de suas greves mais significativas, envolvendo toda a universidade. Em 1981, o curso de Comunicação Social decretaria a sua primeira greve. Dela teria participado ativamente um jovem estudante morador de Candeias, bairro localizado na faixa praieira do Recife, chamado Fred Rodrigues Montenegro.

E quem seria este rapaz? A princípio, um jovem de família de “classe média alta”, recém-ingressado na Universidade, interessado por música e política, o mesmo podendo ser dito sobre seu amigo Renato Lins e tantos outros. Isso, por si só, significava muitas coisas no começo dos anos 80 do último século.

Estes jovens vinham de uma geração que fora praticamente criança em 1968, e que debutara em 1977, quando a PUC do Rio reuniu 5 mil estudantes em uma greve de dois dias e a Universidade de São Paulo mobilizou uma passeata com 2.500 estudantes pelas ruas da cidade, ocasião em que se registra um retorno expressivo dos estudantes à vida política nacional, a assim chamada, por Elio Gaspari, “juventude de 1976”:

O pedaço dessa mocidade que se alinhava com a oposição não carregava derrotas. Adolescentes durante o surto terrorista, votaram pela primeira vez em 1974, e viram a vitória do MDB. Era a ditadura quem tinha medo deles, não eles dela. Em maio de 1975, ao saber da greve da faculdade de Jornalismo da Universidade de São Paulo, Geisel perguntara como estava “o negócio dos estudantes”. Temia que conseguissem solidariedade e queria eliminar o foco de agitação.1

Se a “geração de 1976” foi a geração que “não carregava derrotas”, a geração de Fred e Renato, por sua vez, acumulara também as “vitórias” destas últimas gerações. Quando Fred Montenegro participa de sua primeira greve na universidade, o país já passara por 1977 e 1979.

Seriam estas greves estudantis, no início dos anos 1980, greves um pouco diferentes das demais, tendo em suas hostes uma nova geração, composta por jovens menos (ou nada) calejados que seus antecessores, transpirando de ímpeto e paixão adolescentes, prontos a arrebentarem, verbal e fisicamente, com o “sistema”, a qualquer hora. Os traumas políticos e ideológicos que acompanharam a geração de 68, e que não teriam incomodado tanto, segundo Gaspari, a própria “geração de 1976” (ao menos da maneira que incomodara as anteriores), estariam certamente mais distantes ainda de interferir decisivamente na prática de uma geração que amadurecia gozando dos precedentes de uma re-abertura política. Isto não quer dizer que toda a criatividade estética e manancial crítico observados, a partir deste período, na prática do grupo de jovens sobre o qual desenvolvemos nossas reflexões, seja unicamente decorrente de um “ambiente político propício”. Estamos apenas ressaltando como teriam estes jovens, de

1 GASPARI, Elio. Alice e o camaleão. In: GASPARI, Elio; HOLLANDA, Heloisa Buarque de; VENTURA, Zuenir. 70/80 – Cultura em trânsito: da repressão à abertura. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2000, p.19.

alguma maneira, contado e se apoiado neste tipo de ambiente para exercitarem suas pretensões políticas e estéticas.

O que se passou em grande medida, com uma dada parcela da juventude brasileira com tendência à esquerda que ingressava nas universidades no início dos anos 1980, foi a integração a um processo de abertura em andamento, praticamente já consolidado com a Lei da Anistia de 1979. Foi um período, por este mesmo motivo, repleto de possíveis caminhos (novos e antigos) a serem tomados, com muito a ser construído (e também, de certa forma, “destruído”) e, principalmente, perpassado por uma grande vontade de se construir algo.

De maneira geral, o quadro que se apresentava a jovens como Fred e Renato em seu período, poderíamos dizer, de “iniciação” na vida política, era consideravelmente híbrido. Nele conviviam resquícios (ativos, porém menos do que antes) da conjuntura política do auge do período repressivo – espiões do Regime, agentes de milícias revolucionárias armadas –, ao lado outras novas formas de participação política, em concomitância com a emergência, no cenário político, de novos movimentos civis pelos quais se destacavam, cada vez mais, discussões sobre questões como homossexualismo, direitos civis, feminismo, racismo e desemprego. Algumas das lembranças de Renato acerca deste período, colhidas para esta pesquisa, são bastante significativas neste sentido:

Getúlio: E uma certa história de que o Fred Zeroquatro se filiou num

movimento de guerrilha, uma história assim...

Renato: Não, não, não, Fred foi porquê, é, Fred participou da primeira greve

do curso de Comunicação. E aí ele teve um papel de, se engajou e tal, quando a gente entrou na universidade a gente entrou na abertura. Então assim, eu já entrei na universidade, rapaz, eu falava o que eu queria, não tem conversa assim. Fred também, já era um clima de bastante abertura na universidade na época assim, muito debate, muita discussão sobre, de tudo, de sexo a socialismo, e tal, então um período bastante rico assim, porque, voltavam os exilados, né, Gabeira, de Olinda, aquela parada toda, então um movimento, uma, período de, preparando assim, então a gente sabia que tinha, ainda tinha todo um aparato repressivo dentro da universidade, não é, o resto dele, os, os polícias federais, é... conhecidos, todo mundo sabia que aquele ali era federal e tal, mas também a gente tava, ah foda-se, nesse tempo eu me senti bem à vontade, mas... Fred participou da primeira greve e aí, ele chegou a ser convidado, por o... por alguém ligado ao MR-8, nós gostamos da... participação, na greve, e a gente queria te convidar, aí deram uma cartilha, não sei se eu falei com Fred dessa época, não sei se ele me contou ou eu tava com Fred, e aí, Fred recebeu a cartilha, falou você lê em casa pra ver, é, do partido, sei lá, pá, mas tome cuidado, tenha um certo cuidado e tal, e aí ele ah, beleza, tá, e o cara foi embora, ele pagou o lanche, tava na cantina e acabou

esquecendo na... no balcão da cantina cara, é um desastre como guerrilheiro (risos) Ia ser pego na primeira... (risos)2

Teriam se sentido como quem não tivesse nada a temer, podendo falar o que quisessem. Sentiam-se à vontade, pois, ao mesmo tempo em que se deparavam, dentro da universidade, com uma conjuntura política altamente receptiva às suas emergentes aspirações juvenis, por outro lado, a “polícia política” do Regime não parecia, na prática, incomodá-los, ao menos dentro da universidade. Todos pareciam saber quem eram os “espiões”, porém a sua presença não os intimidava como antes. O clima de “terror” que marcara parte da infância de Renato, ligado a tendências “esquerdistas” de seu pai, por exemplo, não se repetiria no ambiente universitário que começaria a freqüentar no começo dos anos 80.

É certo que a memória pode conter (como sempre contém) suas “ênfases”, ou mesmo “exageros”, todavia podemos perceber como a fala de Renato sobre o período se faz repleta de referências diretas e objetivas a alguns episódios marcantes para grande parte da juventude universitária neste período. Tal é a referência à importância que teve a Lei da Anistia e o retorno dos exilados políticos (com destaque para a influência de figuras como Fernando Gabeira) no processo de reconfiguração da conjuntura política brasileira como um todo na virada dos anos 70 para os 80 do último século, e também às suas implicações práticas em termos de um recrudescimento maior da própria repressão militar dentro das universidades. Fala-se de um período de “abertura” que o fora não apenas em teoria, mas também, e especialmente, na prática.

Encontramo-nos em plena época de “descoberta” e “entrada” na vida política destes jovens, que estavam dispostos a aproveitá-lo ao máximo. Participaram de greves, colaboraram direta e indiretamente na produção de jornais de curso, estiveram até mesmo próximos da “Revolução”, como é o caso de Fred e o convite para filiar-se ao

2 Depoimento de Renato Lins, ex-produtor dos programas de rádio Décadas e New Rock durante os anos 1980, ex-produtor e apresentador do programa de rádio Manguebeat e ex-produtor e apresentador do programa Manguetronic, exibido exclusivamente pela Internet durante os anos 1990, atualmente trabalhando no jornal Diário de Pernambuco. Recife, 25 de maio de 2006. 27min. A mesma história de Fred é também contada por Renato no texto Subcomandante Zero Quatro: uma biografia, publicado no

fanzine cultural on-line A Ponte (atualmente fora do ar, mas o texto pode ser ainda encontrado no link abaixo referenciado): Quando chegou a época de fazer vestibular, Zero foi militar na contra-informação:

optou por jornalismo e entrou para uma universidade pública. No primeiro ano, já uma greve e uma participação destacada (e desastrada) do nosso herói trapalhão: convidado por conta de seu desempenho para entrar no então proscrito MR8, ele esqueceu em pleno balcão da cantina da faculdade o manual de iniciação cuidadosamente recomendado pelo líder da seita! L., Renato. Subcomandante

Zero Quatro: uma biografia. Disponível em: <http://www.aponte.com.br/musica/planeta/planeta-00-07-

MR-8. Muitas das vezes, como no último caso, seu envolvimento político não teria ido além de um rápido contato inicial, sem maiores desdobramentos. As opções eram muitas, e a guerrilha armada encontrava-se, para eles, entre os tópicos menos interessantes da lista.

Havia, ainda, além das supra-citadas, outras alternativas políticas que se abririam a eles, as quais não se restringiam, por sua vez, à esquerda universitária, apesar de terem dialogado com ela, e que teriam sido decisivas para a prática destes jovens ao longo do período em questão. Nesse sentido foi marcante, podemos citar, o impacto, entre uma boa parcela da juventude do período, ocasionado pelo lançamento, em 1982, do LP intitulado Grito Suburbano, primeira coletânea de bandas punk brasileiras, todas elas provenientes da Grande São Paulo. Chegamos ao segundo foco principal de interesse destes rapazes, também o foco central, nesta nova etapa de nossa narrativa, do presente trabalho: a música.

Desde o início de sua adolescência, Fred Montenegro aprendera a gostar igualmente de samba e rock’n’roll, e a tocar um pouco de ambos. Estudara piano em sua infância, quando escutava e cantava os sons da Jovem Guarda por influência do irmão mais velho. Desistiu do piano e quis aprender a tocar violão por influência da música de Jorge Ben e seu álbum A Tábua de Esmeralda3, lançado em 1974. Conheceu o grupo de rock norte-americano Suzy 4 por intermédio de seu primeiro professor de violão, também apreciador do samba. No início dos anos 80, por volta dos vinte anos de idade, tocava violão à beira-mar com os seus amigos de Candeias, incluindo em seu repertório desde Jorge Ben, passando pelos Rolling Stones, até o pós-punk-rock do The

Clash. À época, Fred trocaria o violão pela guitarra e formaria a sua primeira banda de

rock, o Trapaça:

Com uns vinte anos passei a tocar músicas dos Rolling Stones, The Clash, Led Zeppelin, Jorge Ben, junto com uma galera, na beira-mar de Candeias. Num certo dia, saímos doidões da praia e fomos num restaurante que tinha um conjunto de baile. Havia uma determinada hora na qual eles tocavam rock. Foi aí que um dos membros da banda anunciou o intervalo e disse que se a gente quisesse, poderia subir no palco e tocar. Eu tava tão chapado que fui logo pisando nos pedais de guitarra (não sabia nem pra quê aquilo servia); peguei a guitarra e fiquei tocando junto com o baterista do grupo. Então, a rapaziada conhecida nossa foi pra junto do palco e começou a agitar. E foi do caralho!! O maior astral! Meus amigos que estavam nas mesas subiram no palco e tocamos músicas de John Lennon, Neil Young, Rolling Stones. Depois daquilo, decidimos formar uma banda. Na mesma semana, comprei uma guitarra usada, daquelas que estão prontas para ir ao lixo; tive de remontá-la todinha. Foi aí que surgiu o Trapaça - em alusão ao disco do Sex Pistols, "The Great

Rock´n´Roll Swindle". Naquele ano, 1982, a dificuldade pra ensaiar e tocar era grande. A bateria era artesanal, o baixo não afinava e nem o baixista sabia tocar (Nota do editor: Fábio Goró, irmão de Fred, hoje no mundo livre). Tony só tinha nove anos (Nota do editor: atual batera do mundo livre, também irmão de Fred) e ficava só assistindo aos ensaios. Mas o Trapaça nem chegou a fazer shows e só durou alguns meses.4

Com a formação do Trapaça, Fred e seus amigos pareciam repetir em solo pernambucano a atitude punk de bandas londrinas como Sex Pistols e The Jam: produzir música a qualquer custo. As condições eram ruins, os instrumentos, de baixíssima qualidade, alguns dos instrumentistas mal sabiam tocar, e isso não os preocupava. A primeira experiência destes jovens com suas bandas de rock se faz, sobretudo, como uma “brincadeira” jovial, urgente e não-profissional, uma forma de se divertirem ao seu modo, e de quebrarem o tédio diário do cotidiano praieiro em Candeias. Se havia alguma conotação “política” subjacente a esta realização musical, essa ainda não se daria nos moldes do “compromisso” que viria a caracterizá-la logo em seguida, quando se envolverão diretamente com o “movimento” punk propriamente dito.

O ano de 1982 assistiria à eclosão de um dos episódios culturais mais significativos desta década no Brasil: a revelação do movimento punk de São Paulo e sua difusão intensiva por todo o país. Como afirma Antônio Bivar em seu livro O que é

Punk?, o surgimento de bandas punk nas periferias de São Paulo data de 1978, no entanto o movimento acabou “descoberto” apenas em 82, após o lançamento, em abril, do LP Grito Suburbano. Com o lançamento do disco, o movimento paulista ganharia um novo fôlego: outras bandas começariam a gravar seus discos, fanzines passariam a divulgar e a cobrir o movimento com maior freqüência, e o punk brasileiro começaria a gerar seus novos adeptos em várias partes do país. Isto estabeleceu uma ampla rede independente de correspondências, o intercâmbio de informações e materiais musicais, incluindo as trocas de correspondências internacionais envolvendo focos punk em várias partes do planeta, como Itália, Inglaterra, Califórnia, Suécia e Finlândia. Entre julho e dezembro do mesmo ano, como comenta Bivar, o movimento punk brasileiro também atingirá em cheio a grande mídia e o meio intelectual. Os punks concederão, por exemplo, entrevistas a quase todos os meios de comunicação de maior circulação e audiência nacional, como as revistas Veja e Istoé, os jornais Folha de São Paulo, O

4ZEROQUATRO, Fred. Entrevista com Fred Zero Quatro, jornalista, vocalista e guitarrista do

Mundo Livre S/A. Entrevista concedida a Adelson Luna. Disponível em: <http://www.sambanoise.hpg.ig.com.br/fred04entrev.htm>. Acesso em: 27 ago. 2006. Pela idade de Fred (hoje com 44 anos de idade) indicada na introdução da entrevista (36), supõe-se que esta tenha sido realizada em 1998.

Globo, e O Estado de São Paulo, as TV’s Manchete, Bandeirantes e Cultura e as rádios

Capital e Gazeta FM. Enquanto isso, estudantes universitários desenvolverão trabalhos acadêmicos sobre os punks. O próprio DCE da PUC adotará com grande simpatia o movimento, e começará a abrir com freqüência o Salão Berta para shows de bandas

punk. Segundo Bivar:

Realmente têm estilo, esses punks. Tanto que uma turma do último ano de Jornalismo do Instituto Metodista decide fazer um trabalho sobre o movimento, para as provas de fim do ano da faculdade. Assim como uma turma de garotas colegiais da PUC, que também fazem um trabalho sobre os punks. E a realidade, mais uma vez prova todo o seu absurdo: os punks, que não têm dinheiro para pagar estudos, são agora estudados.5

Também em 1982, neste contexto de grande difusão do punk na mídia e no meio acadêmico paulista, o universitário Renato Lins desembarcará em São Paulo para participar de um encontro de estudantes, de onde voltará a Recife levando consigo um exemplar de Grito Suburbano. O resultado entre os amigos de Candeias e da universidade será imediato. Empolgados com a agressividade e a crueza sonora daquelas músicas, todos se apressarão em montarem suas bandas punk. Renato criou a Sala 101. Fred fundou a Serviço Sujo.

Apesar de não dispor de registros sonoros destas bandas, por meio de alguns depoimentos de Fred e Renato prestados à mídia, tudo parece indicar que a música que tocavam era essencialmente o punk rock mais próximo do hardcore6 feito àquela época pelas bandas de São Paulo, porém com composições e letras próprias. Na flor de seus vinte anos de idade, grande parte das escolhas pessoais destes jovens seriam, com toda a certeza, realizadas com rapidez e urgência. Mesmo assim, o envolvimento com o punk tendeu a constituir progressivamente, para eles, uma filiação verdadeiramente “política”, a qual se encontrava além de um simples “modismo”, e que eles procuraram cumprir fielmente, até onde lhes fora possível.

Fred adotara o codinome Rato e passara a andar pelo Recife trajando camisetas que continham escritos como “Abaixo a poesia” e usando coturnos e alfinetes de

5 BIVAR, Antonio. O que é punk. São Paulo: Brasiliense, 1982, p.104.

6 O hardcore, fiel às “raízes punk”, assumiu, a partir do início da década de 1980 (e inclusive, com grande força, no Brasil), a retomada de uma certa crueza sonora e da postura de oposição ao sistema, contra as tendências de caráter mais pop e intimistas pelas quais a cultura punk parecia vir se desdobrando cada vez mais junto ao público roqueiro em geral e aos novos músicos, em consonância também com modificações expressivas na indústria fonográfica. Para muitos dos jovens punks brasileiros do início dos anos 80, o

hardcore era tratado como sinônimo de punk-rock. Seu lema principal seria “o punk não morreu”. Hoje em dia, o hardcore é mais propriamente compreendido como mais um entre os inúmeros “estilos” nos quais o punk-rock se encontraria subdividido, ele próprio também estando repartido em uma série de outras categorias.

segurança pendurados nas roupas, assim como Renato7 e vários outros, os “punks de Candeias”, como relembra Denise Arcoverde (irmã de H.D. Mabuse), em suas memórias dos anos 80, disponíveis on-line em seu próprio blog:

Mas, como tudo muda muito rápido, nessa fase da vida da gente, entrei na faculdade de Sociologia da Federal, conheci Jô e nós ficamos amigas de Fred Zero 4 e Renato L, uns meninos estranhos que andavam com alfinetes de segurança na roupa e falavam de umas bandas da Inglaterra.

(...)

E os punks de Recife? Espalhavam alfinetes de segurança pela roupa, mas só depois de sair de casa, pra mãe não brigar... sempre muito revoltados com o sistema e ouvindo London Calling. (Perdão, Renato! hehehe...)8

O tom irônico com o qual Denise se refere a estes “meninos estranhos” que usavam alfinetes de segurança em suas roupas escondidos de suas mães, além de revelar o choque que este tipo de comportamento obviamente gerava em suas famílias de “classe média” conservadoras, parece apontar para a perspectiva de um certo caráter de ilegitimidade, poderíamos assim dizer, relacionado a este mesmo estilo de

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