• Nenhum resultado encontrado

5. O POSICIONAMENTO DA UNIÃO EUROPEIA NO CON TEXTO ALEMÃO

5.3. O CASO INCE

Como visto anteriormente, a despeito de o TJUE ter en- tendido pela possibilidade de instituição de monopólios justifi- cáveis no mercado de jogos de azar pelos Estados membros, o Bundesverfassungsgericht reconheceu a inconstitucionalidade dessa previsão. Entretanto, os órgãos jurisdicionais alemães não estavam de acordo com relação às consequências que deveriam ser atribuídas à ilegalidade dos monopólios.117

De um lado, os tribunais administrativos superiores e as autoridades administrativas consideraram que o efeito estaria di- retamente ligado à organização dos jogos de azar, enquanto a necessidade de autorização para a atividade permaneceria hí- gida. Ou seja, não se trataria de exclusão dos operadores priva- dos, mas da possibilidade de concessão de autorização “ficta” para esses.118

Esse posicionamento – a despeito de ter sido seguido pelo Tribunal Administrativo Alemão (Bundesverwaltungsgeri- cht), para permitir a proibição preventiva da organização e da intermediação de apostas até a apreciação da aptidão de cada operador para o exercício dessas atividades119– gerou um fato inusitado. À proibição preventiva somou-se o fato de que, pas- sados alguns anos, nenhum desses operadores tinha recebido au- torização até o reenvio do processo ao TJUE,120 a partir de um pedido de decisão prejudicial do Tribunal Cantonal de Sonthofen (Amtsgericht Sonthofen).121

117 Note-se o § 28 do Acórdão do caso Ince. 118 Observe-se o § 29 do Acórdão do caso Ince. 119 Conferir o § 30 do Acórdão do caso Ince.

120 Apesar da abertura de um processo organizado de forma centralizada para todo o

território alemão, com vista à concessão de um número máximo de vinte concessões a operadores públicos e/ou privados, mas que ensejou inúmeras dúvidas quanto à transparência e à imparcialidade do procedimento, levando à sua suspensão, diante da concessão de providências cautelares. Observar, para tanto, os § § 34 a 38 do Acórdão do caso Ince.

Particularmente, essa apresentação de reenvio ao TJUE ocorreu em sede de dois processos criminais instaurados contra a Sebat Ince, cidadã turca, sob a acusação de ter procedido à in- termediação de jogos de azar desportivos sem a autorização da autoridade competente, especificamente no território do estado federado da Baviera.122 O referido pedido tem como fundamento o art. 56º do Tratado de Funcionamento da União Europeia, no- tadamente em relação à liberdade de prestação de serviços em toda a UE,123 bem como o art. 8º da Diretiva 98/34/CE.124 Este, especificamente, trata da imediata comunicação à Comissão Eu- ropeia, pelos Estados membros, com as respectivas razões da ne- cessidade, de qualquer projeto de regra técnica, o que não ocor- rera quando da modificação da legislação do referido estado fe- derado alemão, por ocasião da adequação após o julgamento da inconstitucionalidade dos monopólios.125

O TJUE, por sua vez, em sua decisão, consignou que o referido art. 56º do TFUE não permite a punição penal de um operador quando há o descumprimento de uma formalidade ad- ministrativa, por conta da violação de uma norma do Direito da União, uma vez que o procedimento de autorização não fora cumprido, após a declaração de inconstitucionalidade do quickly. For the first time it seems possible to end the national monopoly on sports bets. But the legal situation is far from becoming clear and simple in the case of indi- vidual operators. Private operators have to be careful until the national monopoly is dissolved by statute. Until this happens, the state may defend its profitable monopoly by the help of public prosecutors, administrative clerks and the state-controlled offe- rors of gambling”.

122 Vide § 2 do Acórdão do caso Ince.

123 Coteje-se com a redação do artigo 56º do TFUE, senão vejamos: “No âmbito das

disposições seguintes, as restrições à livre prestação de serviços na União serão proi- bidas em relação aos nacionais dos Estados membros estabelecidos num Estado mem- bro que não seja o do destinatário da prestação”.

124 Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998,

com redação original publicada no JO L 204, p. 37, posteriormente alterada pela Di- retiva 98/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de julho de 1998, com publicação no JO L 217, p. 18.

125 Ressalvadas as exceções do art. 10º do referido diploma, sempre relativamente a

monopólio, que continuou a existir na prática.126 Ademais, con- siderou que o art. 8º da Diretiva 98/34/CE não fora violado, já que a legislação originária fora anteriormente notificada à Co- missão na sua fase de projeto, inclusive com a menção à possi- bilidade de prorrogação legislativa, que não fora utilizada.127

Em suma, o Tribunal de Justiça da União Europeia en- tendeu que seria possível não considerar uma punição válida por um Estado membro de um intermediário – como a Ince – que não tinha autorização para a atividade de oferta de apostas des- portivas, mas estava atuando por conta de um operador titular de uma licença para a organização dessa atividade em outro Estado membro. Esse fato apenas ocorre quando se verificar que não há respeito ao princípio de igualdade de tratamento aos pleiteantes de autorização – por conta da possível discriminação em razão da nacionalidade (como no caso, de uma cidadã turca) –, para atém da violação ao dever de transparência que dele decorre. Some-se a isso a manutenção da prática de um regime de mono- pólio declarado ilegal pelo Tribunal Constitucional Alemão, apesar de disposição que permite a autorização de operadores privados, que nunca fora concedida.128

5.4. AS RECOMENDAÇÕES DA UNIÃO EUROPEIA PARA

Documentos relacionados