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4 O BRASIL E O SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS

4.2. CASOS DE CONDENAÇÃO DO BRASIL NO SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS

4.2.4 Casos de violência policial

Caso Favela Nova Brasília

O caso Favela Nova Brasília554 carrega a peculiaridade de os principais fatos de lesão a direitos fundamentais terem ocorrido antes de ser reconhecida a competência da Corte Interamericana no Brasil, datando de outubro de 1994 e maio de 1995 as incursões policiais à comunidade, consubstanciadas no homicídio de 26 pessoas e na violência sexual de outras três, representando violações aos artigos 4.1 e 5.1 da Convenção Americana, ainda que fora da jurisdição temporal da Corte555. Somente em 2007 que o Inquérito Policial 187/94, referente aos graves fatos de homicídio, violência sexual e abuso de autoridade foi unificado com o IP 52/94, na Corregedoria Geral de Polícia. Com muitas dilações e solicitações de novos prazos, em outubro de 2009, o Ministério Público solicitaria o arquivamento do caso em razão da inevitável extinção de punibilidade pela prescrição556. Mesmo reabertas as investigações mais tarde, as mesmas não esclareceram as mortes e não houve punição pelos fatos denunciados557. Assim como não houve nenhuma investigação das autoridades públicas por parte dos fatos concretos de violência sexual558. O inquérito sobre as mortes da incursão de 1995 continua inconcluso559.

A Corte, assim, responsabilizou o Estado pela violação dos direitos à proteção judicial e às garantias judiciais, previstos nos artigos 25 e 8.1 da Convenção Americana em relação com o art. 1.1 do mesmo instrumento, e artigos 1º, 6º e 8º, da Convenção I para Prevenir e Punir a Tortura, assim como o art. 7º da Convenção de Belém do Pará560. E também, pela violação do

554 CrIDH. Sentença de Mérito Caso favela Nova Brasília vs. Brasil, 2017, pp. 27,28. Disponível em: < http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_333_por.pdf> Acesso em 30 de outubro de 2019. 555 Ibid.

556 Justificativa semelhante à do caso também de condenação na Corte, Fazenda Brasil Verde, quanto à questão da prescrição. No caso Fazenda Brasil Verde a Corte reconhece a imprescritibilidade do delito da escravidão e suas práticas análogas, responsabilizando o Estado mesmo passada mais de uma década dos fatos. A prescrição para esse delito no Brasil é de 12 anos.

557 CrIDH. Sentença de Mérito Caso favela Nova Brasília vs. Brasil, 2017, pp. 30,37. Disponível em: < http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_333_por.pdf> Acesso em 30 de outubro de 2019.

558 CrIDH. Sentença de Mérito Caso favela Nova Brasília vs. Brasil, 2017, pp. 39. Disponível em: < http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_333_por.pdf> Acesso em 30 de outubro de 2019.

559 CrIDH. Sentença de Mérito Caso favela Nova Brasília vs. Brasil, 2017, pp. 40. Disponível em: < http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_333_por.pdf> Acesso em 30 de outubro de 2019.

560 A Corte remete, quanto à alegada violação das garantias judiciais e da proteção judicial dos familiares das vítimas mortas nas incursões de 1994 e 1995, a parágrafo 320 da sentença do caso Fazenda Brasil verde, onde frisa a importância do papel do Estado em prevenir tais práticas – contando com um marco jurídico de proteção

direito à integridade pessoal, previsto no art. 5.1 da CADH em relação ao art. 1.1 do mesmo instrumento561. O Estado não violou o direito de circulação e de residência, previsto no art. 22.1 da CADH562.

Com relação às medidas de reparação563, a Corte IDH ordenou ao Estado brasileiro,

entre elas: iniciar ou reativar uma investigação a respeito das mortes ocorridas; investigação a respeito dos fatos de violência sexual; oferecer tratamento psicológico e psiquiátrico, , publicar anualmente um relatório oficial com dados relativos às mortes ocasionadas durante operações da polícia em todos os estados do país a respeito de cada incidente que redunde na morte de um civil ou de um policial; realizar ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional em relação aos fatos; estabelecer os mecanismos normativos necessários para que, na hipótese de supostas mortes, tortura ou violência sexual decorrentes de intervenção policial, se delegue a investigação a um órgão independente e diferente da força pública envolvida no incidente; adotar as medidas necessárias para que o Estado do Rio de Janeiro estabeleça metas e políticas de redução da letalidade e da violência policial; uniformizar a expressão “lesão corporal ou homicídio decorrente de intervenção policial” nos relatórios e investigações da polícia ou do Ministério Público, abolindo o conceito de “oposição” ou “resistência” à ação policial; e pagar as indenizações por dano imaterial e pelo reembolso de custas e gastos564.

Em 06 de fevereiro de 2018, passado quase um ano após a sentença, o Ministério Público realizou reunião com os representantes da Procuradoria-Geral do Estado para debater os desdobramentos da referida condenação565.

Na supervisão do cumprimento da sentença de 30 de maio de 2018566 a Corte verifica

quanto à restituição ao Fundo de Assistência Jurídica às vítimas, analisando as informações

adequado, aplicando o mesmo de forma efetiva – bem como políticas de prevenção e práticas que permitam atuar de maneira eficaz diante de denúncias. Tornando assim a estratégia de prevenção integral.

561 CrIDH. Sentença de Mérito Caso favela Nova Brasília vs. Brasil, 2017, pp. 65,68. Disponível em: < http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_333_por.pdf> Acesso em 30 de outubro de 2019.

562 CrIDH. Sentença de Mérito Caso favela Nova Brasília vs. Brasil, 2017, pp. 68,69. Disponível em: < http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_333_por.pdf> Acesso em 30 de outubro de 2019.

563 CrIDH. Sentença de Mérito Caso favela Nova Brasília vs. Brasil, 2017, pp. 69,87. Disponível em: < http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_333_por.pdf> Acesso em 30 de outubro de 2019.

564 NÚCLEO INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS, Cosme Rosa Genoveva e outros vs. Brasil (2017): os homicídios na favela Nova Brasília e o dever de reformulação da prática policial. Disponível em: < https://nidh.com.br/cosme-rosa-genoveva-e-outros-vs-brasil-2017-os-homicidios-na-favela-nova-brasilia-e- dever-de-reformulacao-da-pratica-policial/> Acesso em: 30 de outubro de 2019.

565 MPRJ e PGE se reúnem para tratar de condenação internacional do Brasil no caso Nova Brasília. Disponível em < https://www.mprj.mp.br/home/-/detalhe-noticia/visualizar/54508?p_p_state=maximized>. Acesso em 30 de outubro de 2019.

566 CrIDH, Supervisão de Cumprimento de Sentença caso Favela Nova Brasília vs. Brasil, Resolução de 30 de maio de 2018. Disponível em: < http://www.corteidh.or.cr/docs/asuntos/favela_fv_18.pdf> Acesso em 9 de novembro de 2019.

quanto à implementação das demais medidas de reparação ordenadas nos outros pontos resolutivos da sentença em resoluções diversas ainda não publicadas até o presente momento. O Estado informou que realizou transferência bancária em janeiro de 2018, mediante a qual realizou restituição ao Fundo de Assistência.567 A Secretaria da Corte emitiu comprovante ao

Estado do referido pagamento no mês seguinte. A Corte observou que devido ao pagamento com mais de dois meses de atraso do disposto em sentença e a não inclusão dos juros moratórios, o Estado ainda deveria restituir ao Fundo de Assistência da Corte a quantia faltante do montante disposto na sentença568. Diante de tais fatos, o Tribunal reiterou a importância da

contribuição para o Fundo, sejam estas através de contribuições de capital voluntárias, fontes de cooperação de Estados membros da OEA, ou no presente caso, restituição por violação da Convenção Americana569. A Corte, assim, optou por assinalar como cumprida a obrigação, no

entanto, manter em aberta a supervisão da sentença neste ponto com base no fundamentado.

4.3 CLASSIFICAÇÃO DO CUMPRIMENTO DAS SENTENÇAS PELO ESTADO