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Categorias teóricas adotadas na análise

3. METODOLOGIA

3.3 Categorias teóricas adotadas na análise

Como temos demonstrado ao longo deste trabalho, concorrem para a análise dos dados todo o arcabouço teórico da versão Ampliada da Teoria dos Protótipos. Em especial, estamos considerando que um protótipo é um caso abstrato central, que agrupa os traços considerados mais típicos, estabelecidos a partir da freqüência dos traços, ou seja, pelo grau de predizibilidade de uma propriedade em uma categoria. Nesse sentido, estamos assumindo que há um protótipo etimológico para a preposição de que é de

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MOVIMENTO COM ÊNFASE NA ORIGEM, baseados nos estudos de Said Ali (1964), Câmara Júnior (1975), Pottier (1968), Poggio (2002) e Castilho (2003).

Assim, tomando-se como base Castilhos (2003), partimos do pressuposto de que as “preposições dispõem de um sentido prototípico, reconhecível a partir de categorias cognitivas [...] e que, abstratizando-o, pode-se chegar aos seus usos derivados” (p. 7). Representaremos, no presente trabalho, esse sentido etimológico prototípico da preposição de pela seguinte figura, baseados na imagem representativa da preposição de proposta por Pottier (1968):

A B

Figura 1: Representação do sentido prototípico etimológico da preposição de.

Essa figura expressa a base representacional de MOVIMENTO COM ÊNFASE NA ORIGEM e, nesta dissertação, ela indica o sentido prototípico etimológico da preposição. Como afirmado, partimos do pressuposto que o sentido prototípico etimológico da preposição de é de MOVIMENTO COM ÊNFASE NA ORIGEM no campo espacial. O movimento é expresso pela reta, que se origina do círculo A e termina no círculo B, que é o ponto final do movimento. Representamos o círculo A em negrito para indicar a ênfase dada ao ponto de origem desse movimento.

Porém, como já afirmamos, esse protótipo etimológico não é representativo de todos os sentidos da preposição de, porque, de acordo com o tipo de palavra que a preposição relaciona, alguns sentidos considerados como prototípicos (como a ênfase na origem de determinado movimento) podem ser apagados, e outros sentidos podem ser atualizados, gerando, dessa maneira, um novo protótipo. Nesses casos, isto é, quando o protótipo etimológico de MOVIMENTO COM ÊNFASE NA ORIGEM não for representativo, procuraremos apontar o protótipo responsável pelo sentido expresso pela preposição. Para tanto, vamos nos apoiar novamente nos ensinamentos de Pottier (1968).

Pottier (1978, p. 132-133) nos ensina que a preposição de, em latim clássico introduzia o ablativo. Esse caso, de acordo com o estudioso, indicava a idéia de ‘causa’,

‘origem’ e ‘base’, exemplificado por vento crescente (levantando-se o vento) e melle

dulcior (mais doce que o mel, sendo o mel a base de referência). Porém, como veremos

no próximo capítulo, na seção referente ao latim vulgar, a preposição de passou a exprimir os sentidos expressos pelo genitivo, que desapareceu a partir do latim vulgar. O caso genitivo exprimia a dependência de uma base, exemplificada por multum aquae (uma grande quantidade de água) e cupidus gloriae (desejoso da glória). Assim, podemos depreender que, ao desempenhar a função do antigo genitivo, a preposição de passou a desempenhar também a função de indicar a dependência entre dois elementos. Logo, teríamos, até o momento, duas aplicações da preposição: aquela que indica MOVIMENTO COM ÊNFASE NA ORIGEM e aquela que indica RELAÇÃO ENTRE DOIS ELEMENTOS.

Cunha e Cintra (1985, p. 543 e ss.), baseados em Pottier (1968), afirmam que a relação que se estabelece entre as palavras ligadas pela preposição pode ser de movimento ou não movimento, sendo que essa expressão de não movimento é indicada pelo termo ‘situação’. Por exemplo, de acordo com Cunha e Cintra, na frase todos

saíram de casa, a relação estabelecida por de é de movimento, enquanto que na frase chorava de dor, a preposição indica situação, pela falta do traço de movimento. Tanto o

traço de movimento quanto o de situação podem ser considerados em referência ao espaço (todos saíram de casa), tempo (trabalha de oito as oito todos os dias) e noção (chorava de dor).

A preposição de, portanto, tem aplicações, além de espaciais, temporais e nocionais, nas quais houve um processo crescente de abstratização da aplicação espacial da preposição, considerada básica, como vimos.

Considerando, então, que o protótipo etimológico de MOVIMENTO COM ÊNFASE NA ORIGEM não pode representar os sentidos da preposição nos quais são enfatizados o modo ou o meio pelo o qual se dá determinado movimento, estipulamos a seguinte figura representar o protótipo de MOVIMENTO COM ÊNFASE NO MEIO ou MODO:

A B

Figura 2: Representação do sentido prototípico de MOVIMENTO COM ÊNFASE NO MODO e MEIO.

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A figura acima expressa o protótipo de MOVIMENTO COM ÊNFASE NO MEIO ou MODO, no qual a ênfase é dada ao modo ou meio característico de determinado movimento, representado pela reta que liga os pontos A e B.

Caso a ênfase seja dada ao fim de determinado movimento, passamos a trabalhar com outro protótipo: o de MOVIMENTO COM ÊNFASE NO FIM, representado pela figura abaixo:

A B

Figura 3: Representação do sentido prototípico de MOVIMENTO COM ÊNFASE NO FIM.

A figura acima expressa o protótipo de MOVIMENTO COM ÊNFASE NO FIM, no qual a ênfase é dada à finalidade de determinado movimento, expressa pelo preenchimento do ponto B.

Esses protótipos de MOVIMENTO COM ÊNFASE NA ORIGEM, MOVIMENTO COM ÊNFASE NO MEIO ou MODO e MOVIMENTO COM ÊNFASE NO FIM têm atualizado o traço de movimento, e o que os diferencia é a atualização ou o apagamento dos traços ‘origem’, ‘meio ou modo’ e ‘fim’. Por exemplo, a partir do protótipo de MOVIMENTO COM ÊNFASE NA ORIGEM, houve um processo de apagamento da ênfase dada à origem e um processo de atualização do traço finalidade, resultando no novo protótipo de MOVIMENTO COM ÊNFASE NO FIM.

Da mesma maneira que o traço ‘ênfase na origem’ é passível de ser apagado em determinados contextos, o traço de ‘movimento’ também o é. De acordo com Pottier (1968), a ausência do traço de movimento é representada pelo termo ‘situação’. Adotaremos no presente trabalho a denominação de RELAÇÃO ENTRE DOIS ELEMENTOS ao protótipo da preposição de no qual o traço de movimento está apagado.

Portanto, analogamente ao observado no protótipo de MOVIMENTO, no qual podem ser atualizados os traços de ‘origem’, ‘modo ou meio’ e ‘fim’, o protótipo de

RELAÇÃO ENTRE DOIS ELEMENTOS pode atualizar os traços de ‘origem’, ‘modo ou meio’ e ‘fim’, e tais protótipos serão representados pelas mesmas figuras representativas do protótipo de MOVIMENTO, porém, para indicar a ausência desse traço, incluiremos nas figuras o seguinte símbolo: -M . Adotaremos as mesmas figuras para os protótipos de MOVIMENTO e RELAÇÃO porque entendemos que a reta que liga os pontos A e B pode tanto expressar o percurso de determinado movimento, quanto representar simplesmente a relação entre dois objetos, eventos ou situações.

Logo, a partir da análise de diferentes acepções apresentadas nos dicionários, reconhecíveis para falantes do século XXI, consideraremos que o protótipo MOVIMENTO COM ÊNFASE NA ORIGEM pode ser observado nos diferentes sentidos de de, e, caso contrário, qual seria um possível protótipo para os sentidos que a preposição vincula nos dias de hoje. Assim, pretendemos, ao analisar a semântica prototípica da preposição, indicar que protótipos mantiveram-se desde o latim clássico, quais foram acrescidos no latim vulgar e apontar a possível derivação semântica entre os diferentes sentidos expressos pelas diferentes acepções que de pode hoje comportar.

Feitas essas considerações a respeito da metodologia de pesquisa adotada neste trabalho, no próximo capítulo, apresentaremos o capítulo referente às perspectivas diacrônica e sincrônica dos sentidos da preposição de.

4. PERSPECTIVAS DIACRÔNICA E SINCRÔNICA DOS SENTIDOS DA