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A causa do cancelamento do efeito-mas nas estruturas com que-reportativo

Minha proposta é que o cancelamento do efeito-mas nas estruturas com que-reportativo quando inserimos uma sentença encaixada que expressa dúvida ou percepção por parte do falante está relacionado também à Máxima de Quantidade. Isso se dá porque quando o falante expressa incerteza ou afirmação, o enunciado proferido é o máximo de informação necessária que o falante possui, ou seja, se o falante negasse ou afirmasse algo sobre que ele não tivesse certeza, ele estaria violando a Máxima de Qualidade. Assim, o informante está sendo cooperativo, respeitando todas as cinco máximas conversacionais e o efeito-mas não é desencadeado.

Em uma sentença com que-reportativo, como em (9a) repetida abaixo como (16), temos que o falante está respeitando todas as máximas, como vemos a interpretação em (17) abaixo, não gerando, portanto, nenhuma implicatura para produzir o efeito-mas.

(16) QC: O João também conserta celular?

R: Que ele conserta celular, eu acho/penso/acredito que ele conserta.

(17) Que ele conserta celular, eu acho/penso/acredito que ele conserta.

1. Se o falante tem dúvida, expressar a dúvida é o máximo de informação necessária que ele possui para satisfazer 2;

2. O falante está sendo verdadeiro; 3. O falante está sendo relevante;

4. O falante está se expressando de modo claro.

A proposta de Vicente (2007), vista na seção 5.1 acima, não daria conta desses casos de cancelamento do efeito-mas em estruturas com que-reportativos porque a proposta se concentra na estrutura da sentença em si. Como apresentado em 5.1, Vicente propõe que se o falante opta por usar uma sentença completa ao invés de responder sim/não, o efeito-mas seria desencadeado porque a sentença completa indica que há informações implícitas. Os casos das estruturas com que-reportativo, porém, são casos que envolvem o conteúdo das sentenças e não a estrutura curta ou completa, já que se o falante responder sim/não não tendo certeza da informação dada, ele estaria violando a Máxima de Qualidade. Assim, o falante poderia responder em casos de dúvidas e

incertezas “não sei” ou “não tenho certeza” e, ao utilizar a sentença completa, o

efeito-mas seria desencadeado. Entretanto, as estruturas com que-reportativo continuam com o

efeito-mas cancelado nos casos de sentenças encaixadas com verbos epistêmicos em primeira pessoa mesmo com o falante não optando por essas respostas curtas, o que mostra que a estrutura da sentença não é o que importa nesses casos, mas sim o máximo de informação que a sentença veicula.

Se essa proposta de o cancelamento do efeito-mas estarrelacionado ao máximo de informação que o falante possui estiver no caminho certo, a previsão que se faz é que as construções de topicalização de infinitivos do tipo 2 de Bastos devem perder a obrigatoriedade do efeito-mas quando se insere uma sentença encaixada de verbos epistêmicos em primeira pessoa. Os dados em (18) abaixo confirmam a previsão, já que o efeito-mas não é obrigatório nesses casos.

(18) a. QC: O João lavou o carro?

R: Lavar o carro, eu acho/penso/acredito que ele lavou. b. QC: A Maria limpou a casa como eu pedi?

R: Limpar a casa, eu acho/penso/acredito que ela limpou. c. QC: O Pedro arquivou aquela tese?

R: Arquivar aquela tese, eu acho/penso/acredito que ele arquivou.

As sentenças em (18) acima reforçam a proposta de que o cancelamento do efeito-mas está relacionado à quantidade de informação necessária que o falante possui ao proferir um enunciado. Se colocarmos a sentença encaixada em terceira pessoa, vemos que o efeito-mas se torna obrigatório novamente, como em (19) abaixo.

(19) a. QC: O João lavou o carro?

R: Lavar o carro, a Maria acha que ele lavou (mas...) b. QC: A Maria limpou a casa como eu pedi?

R: Limpar a casa, o Pedro acredita que ela limpou (mas...) c. QC: O Pedro arquivou aquela tese?

Vemos em (19) acima que, ao utilizar uma sentença encaixada de verbos epistêmicos com sujeito em terceira pessoa, temos a sensação que o falante não está dando o máximo de informação, pois ao dizer que alguém “acha” ou “pensa” o falante parece insinuar que esse alguém não sabe a verdade. Exemplos como em (20) abaixo ilustram essa sensação de incompletude.

(20) a. QC: O João lavou o carro?

R: Lavar o carro, a Maria acha que ele lavou, mas na verdade ele não lavou.

b. QC: A Maria limpou a casa como eu pedi?

R: Limpar a casa, o Pedro acredita que ela limpou, mas na verdade ela só varreu.

c. QC: O Pedro arquivou aquela tese?

R: Arquivar aquela tese, a Maria pensa que ele arquivou, mas ele ainda não teve tempo.

Vemos que a manutenção do efeito-mas em sentenças encaixadas de verbos epistêmicos com sujeito em terceira pessoa evidencia que o cancelamento do efeito-mas não está relacionado com a opção do falante em utilizar uma estrutura longa, mas com o máximo de informação que o falante possui, já que encaixadas de verbos epistêmicos com sujeitos em terceira pessoa deixam a sensação de incompletude da informação dada pelo falante.

Outra evidência de que o efeito-mas é cancelado quando o máximo de informação se torna evidente são sentenças como em (21) abaixo que, ao inserir uma coordenada aditiva que evidencia mais informações que o falante possui, o efeito-mas também é cancelado.

(21) QC: O João conserta celular?

a. Que ele conserta celular, ele conserta e muito bem por sinal! b. Que ele conserta celular, ele conserta e bem consertado! c. Que ele conserta celular, ele conserta e o preço é camarada!

Vemos em (21) acima que as estruturas com que-reportativo com uma coordenada aditiva não desencadeiam o efeito-mas pois a coordenada adicional mostra o máximo de informação que o falante possui. Ao inserir uma coordenada aditiva nas estruturas de infinitivos topicalizados, temos que o efeito-mas também não é desencadeado, como mostra (22).

(22) a. QC: O João lavou o carro?

R: Lavar o carro, ele lavou, e muito bem por sinal! b. QC: A Maria limpou a casa como eu pedi?

R: Limpar a casa, ela limpou e bem limpado! c. QC: O Pedro arquivou aquela tese?

R: Arquivar aquela tese, ele arquivou e rapidinho!

Assim, vemos que o máximo de informação é o que causa o cancelamento do efeito-mas.