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O Ceilão: Do controle dos Portugueses para o dos Holandeses

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Capítulo I: A configuração do Império Católico Luso-Indiano

XVII): os casos de Mateus de Castro e José Vaz” ANPUH – XXIV SIMPÓSIO NACIONAL DE

1.3. O Ceilão: Do controle dos Portugueses para o dos Holandeses

Figura 3: O Ceilão

REGO, Sebastião do. Chronologia da Congregação do Oratório de Goa [1746]. Lisboa: CHAM, 2009.

A história da ilha do Ceilão, situada ao sul do subcontinente indiano, integrou- se ao conjunto de acontecimentos que modificaram as estruturas do Estado da Índia. É imprescindível que se faça, neste capítulo, uma análise (ainda que breve) sobre a importância do Ceilão para os portugueses no século XVI, as consequências de sua perda para os holandeses no século XVII e, principalmente, seu papel central na reconfiguração da atividade missionária no fim do século XVII e início do XVIII, visto

que grande parte das ações de missionação empreendidas pelos Oratorianos de Goa ocorreram nessa ilha.

O Ceilão (atualmente conhecida como Sri-Lanka) foi – e ainda é – a ligação entre as duas metades do Índico (o mar arábico e o golfo de Bengala), local que assumiu o papel de entreposto de mercadorias e importante local de passagem de missionários e demais pessoas. A ilha era altamente valorizada na região do sul da Índia por sua riqueza comercial e, para o comércio português, interessavam a canela e as pedras preciosas. Quando os primeiros contatos entre o povo cingalês e os portugueses ocorreram, em 1506, os lusos buscavam, além das especiarias da ilha, também a madeira para a construção naval. Por isso, Portugal logo se interessou pelo Ceilão e não poderia desperdiçar as potencialidades da ilha, que também despertou cobiça das demais potências europeias.

É de se compreender que o Ceilão teve importância para o poderio luso em três aspectos distintos, a saber. No aspecto político, adicionava uma aura mística em torno de Taprobana (nome pelo qual a ilha era designada desde a Antiguidade), o que garantiria prestígio ao monarca português; no âmbito estratégico, funcionava como uma rota de fuga em possíveis conflitos no continente indiano; no aspecto econômico, interessava o domínio do “Mar do Ceilão” e do rico comércio da região que circulava por ele. No entanto, apesar de toda a importância atribuída à ilha do Ceilão, a prioridade lusa na Índia estava focada no domínio de Goa e seus arredores, o que deixou a ilha ao sul da Índia em posição semiperiférica em relação às Velhas Conquistas.106

No entanto, se os resultados da conquista temporal do Ceilão pareciam lentos, a conquista espiritual se mostrava promissora com a abertura da ilha para a missionação a partir do tratado de vassalagem entre o reino de Kotte (Figura 3) e os portugueses. Assim, a atividade missionária também foi prevista como fomento para a colonização, com a entrada dos sacerdotes franciscanos na ilha ainda no século XVI.107

No início do século XVII, outras ordens religiosas chegaram à ilha do Ceilão como, os jesuítas (1602), os dominicanos (1606) e os agostinhos (1606). A maioria dos missionários enviados por estas ordens se estabeleceram em Jaffna (Figura 3), ao norte da ilha. Ainda que em número menor do que dos franciscanos, os jesuítas estiveram de forma mais disseminada no território cingalês, e é importante chamar a atenção para o

106 FLORES, Jorge. Os portugueses e o mar de Ceilão: trato, diplomacia e guerra (1498- 1543). Ed. Il.

Lisboa: Edições Cosmos, 1998.

107

DE SILVA, Chandra R. The Portuguese in Ceylon 1617- 1638. H. W. Cave & Company, Colombo. 1971, p. 236-258.

fato de que os inacianos foram enviados pelo rei de Portugal para estudar a língua local e estabelecerem instituições em que se ensinasse a doutrina cristã para os descendentes dos portugueses e para os nativos.108

Porém, o número de missionários e a quantidade de conversões caíram progressivamente ao longo do século XVII, muito em decorrência dos diversos confrontos locais – entre portugueses e holandeses, e mesmo, entre os próprios reinos da ilha. Quando iniciados os conflitos na ilha e a contínua perda de espaços do Império português, foram os missionários das diversas ordens religiosas que atuaram como propagadores da religião e mesmo da cultura lusa no Ceilão. 109 Mas, nem a ação dos missionários foi suficiente para que, no século XVII, o relativo domínio dos portugueses na ilha sobrevivesse aos incessantes embates contra os holandeses, apoiados por importantes reinos locais.

Ainda que os portugueses se proclamassem os dominadores da ilha do Ceilão, isto não impedia que outras companhias de comércio entrassem e atuassem na ilha. Como já dito, o Ceilão suscitou a cobiça de todas as potências europeias, por sua capacidade comercial e localização geográfica. A entrada da Verenigde Oost-Indische Compagnie (VOC) Holandesa no Ceilão aconteceu de forma progressiva e ainda no século XVI. Ademais, as disputas entre portugueses e holandeses se intensificaram no século XVII, e foi nesse contexto que o reino de Cândia (Kandy na Figura 3) teve extrema importância, pois, após a entrada da VOC no Ceilão, foi com este reino que a companhia holandesa firmou um dos seus mais importantes acordos de mútua cooperação e ajuda. Desta forma, entre os anos de 1638 e 1658, iniciou-se um ciclo de vitórias sobre os portugueses que terminou com a derrocada total do aparato luso na ilha.110

As batalhas de Cândia e da fortaleza de Batticaloa (Figura 3), em 1638, são tidas como o marco inicial da desagregação do Ceilão dos domínios portugueses que compunham o Estado da Índia e da instalação definitiva da VOC. Ainda no mesmo ano, os portugueses perderam Trincomale e, no ano de 1640, Negombo e Galle (Figura 3);

108 THAMBYNAGAM, Agnes Padmini. The gentiles, a history of Sri Lanka 1498-1833. Author House.

2009, p. 32- 147.

109 DE SILVA, Chandra R. The Portuguese in Ceylon 1617- 1638. H. W. Cave & Company, Colombo.

1971, p. 236-258.

110

FLORES, Jorge. Os olhos do rei: desenhos e descrições portuguesas da Ilha de Ceilão. (1624-1638). Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses. 2001. p. 11-16.

começou assim um irreversível declínio da presença portuguesa na ilha.111 Os holandeses cercaram e dominaram Colombo em 1656, enquanto Mannar e Jaffna (Figura 3) foram perdidas em 1658 e, dessa forma, os lusos foram definitivamente expulsos do Ceilão.112

O Ceilão passou então para o domínio da VOC, que buscou fazer na ilha conquistada o que os portugueses haviam feito de forma mais efetiva em Goa: apoiaram o casamento entre agentes holandeses e mulheres nativas como meio de promover a colonização territorial, o que facilitava, de certa maneira, a consolidação da presença neerlandesa. Para além da dimensão político-econômica da atuação holandesa na ilha, apostou-se também na difusão da religião (do protestantismo, no caso holandês) e, entre as ações adotadas, construíram seminários113 para promover o ensino das elites locais e assegurar uma colonização bem sucedida, utilizando mesmo a língua portuguesa para ensinar e difundir o protestantismo, visto a grande difusão do idioma.114

Naquele contexto a autoridade política portuguesa na ilha teria sido banida. No entanto, Agnes Padmini Thambynagam115 afirma que, durante a década de 1660, os frades dominicanos que viviam em Jaffna (no norte do Ceilão, Figura 3) eram de origem lusa e submetidos à Congregação da Propaganda Fide, os quais continuavam a evangelizar a população local. Dessa forma, ainda que a presença holandesa e de seus agentes religiosos tivesse se consolidado, uma herança dos tempos de domínio do Estado da Índia ainda se mantinha, em função da existência de uma comunidade católica de mais de 70 mil pessoas ao norte da ilha do Ceilão.116 Por levar em conta tal dado, é fácil entender – pelo menos a partir de uma ótica espiritual – o motivo pelo qual, trinta anos após a queda de Jaffna, alguns missionários católicos voltaram ao Ceilão na tentativa de amparo aos cristãos.

Ainda que houvesse remanescentes das ordens religiosas que primeiro estiveram no Ceilão, em locais como Potulão (Puttalam- Figura 3), a nova onda missionária na ilha não foi mais empreendida pelos franciscanos (os primeiros a entrar

111 FLORES, Jorge. Hum curto historia de Ceylan: quinhentos anos de relações entre Portugal e o Sri

Lanka. Fundação Oriente. 2001. p. 829.

112 Ibidem, p. 83.

113 FLORES, Jorge. Ceilão: entre a história e a memória. In:. PEREZ, Rosa Maria (org). Os portuguees e

o Oriente. Lisboa. D. Quixote, 2006, p. 193-218.

114 FLORES, Jorge. Hum curto historia de Ceylan: quinhentos anos de relações entre Portugal e o Sri

Lanka. Fundação Oriente. 2001, p. 102.

115 THAMBYNAGAM, Agnes Padmini. The gentiles, a history of Sri Lanka 1498-1833. Author House.

2009, p. 32- 147.

116

FLORES, Jorge. Ceilão: entre a história e a memória. In:. PEREZ, Rosa Maria (org). Os portuguees e o Oriente. Lisboa. D. Quixote, 2006, p. 193-218.

na ilha), os jesuítas, os agostinhos ou os dominicanos, mas pelos oratorianos de Goa. O Ceilão tornou-se então campo privilegiado de afirmação de um grupo de missionários advindos de uma instituição nova no Oriente: a Congregação do Oratório de Goa.117

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FLORES, Jorge. Hum curto historia de Ceylan: quinhentos anos de relações entre Portugal e o Sri

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