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O censo 2010 e os povos indígenas do Pix

Capítulo 2 – Povos indígenas no Parque Indígena do Xingu e os Kamaiurá

2.3 O censo 2010 e os povos indígenas do Pix

O objetivo desse subitem é apresentar os dados demográficos oriundos do Censo Demográfico 2010 referentes aos povos do Parque Indígena do Xingu, bem como dos indígenas rurais e urbanos que residem nos municípios limítrofes ao Parque.

Como dito anteriormente, foi no Censo de 1991 que a categoria “indígena” se tornou uma possibilidade de resposta fechada. No Censo de 2000 o quesito sobre “raça e cor” também estava presente no questionário da amostra.

No Censo Demográfico 2010 tanto o quesito “raça e cor” quanto a coleta de informações sobre etnia e língua falada dos povos indígenas no Brasil fizeram parte do questionário do universo e houve a incorporação de novas perguntas: “Qual é a sua etnia ou o povo a que pertence”, “Fala a língua indígena no domicílio” e “Quais. Especifique a língua indígena”.

De acordo com Estanislau (2014, p. 26) graças ao Censo 2010:

Povo Família Linguística Região

Aweti Tupi Alto Xingu

Kalapalo Caribe Alto Xingu

Kamaiurá Tupi Alto Xingu

Kuikuro Caribe Alto Xingu

Matipu Caribe Alto Xingu

Mehinako Aruak Alto Xingu

Nafuquá Caribe Alto Xingu

Trumai língua isolada Alto Xingu

Waurá Aruak Alto Xingu

Yawalapiti Aruak Alto Xingu

Yudjá (Juruna) Tupi Baixo e Médio Xingu

Kawaiweté (Kaiabi) Tupi Baixo e Médio Xingu

Kisêdjê (Suyá) Jê Baixo Xingu

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[...] pudemos ter maiores informações sobre o universo de indígenas no Brasil de maneira mais desagregada, tanto territorialmente quanto por outras variáveis, sem perder a confiabilidade, além de dados por etnia e língua falada e a possibilidade de se conhecer informações sobre cada uma das Terras Indígenas que foram incluídas como setores censitários71 com a compatibilização da malha de terras72 da FUNAI com a de setores censitários do IBGE.

Figura 10 - Mapa da localização dos municípios limítrofes ao Parque Indígena do Xingu

Fonte: Elaborado por Vitti, 2013.

71 “Setor Censitário é unidade territorial de coleta das operações censitárias, definido pelo IBGE, com limites físicos identificados, em áreas contínuas e respeitando a divisão político-administrativa do Brasil.” Fonte: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/defaulttab_agregado.shtm, acesso em 15/09/2014. 72

"A malha territorial é um produto cartográfico elaborado pelo Setor de Cartografia do IBGE, que retrata a situação vigente da Divisão Político-Administrativa do País, através da representação vetorial das linhas definidoras das divisas estaduais e municipais onde são representados os limites definidos nas leis estaduais, municipais, e também aqueles referentes às Terras Indígenas fornecidos pela FUNAI." (PEREIRA: 2011: 28)

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Tabela 3 – Distribuição da população segundo situação de domicílio (rural e urbano dos municípios limítrofes ao PIX

Todos os povos que residem no Parque mantém contatos permanentes com os municípios do entorno. Na tabela acima é possível observar a porcentagem de indígenas e não indígenas que residem nas áreas urbana e rural. Os municípios que estão no entorno do Parque merecem ser analisados cuidadosamente, porém, para esse trabalho vamos nos ater somente em Canarana porque ela é a cidade que os Kamaiurá e todos os povos do Alto Xingu frequentam regularmente.

Ao observamos Canarana verifica-se que 20,1% da população indígena vive em área urbana e logo indagamos: porque há essa quantidade de indígenas residindo na área urbana? Sendo que eles fazem parte dos 83,5% da população do município que vive em área urbana. Canarana está localizada no nordeste do estado de Mato Grosso com uma população de 18.754 pessoas (IBGE, Censo 2010). A maioria da população é de origem sulista e chegou à região em meados de 1970 atraídas pelos projetos de colonização. Atualmente, dentre os moradores do município, a grande maioria é de gaúchos ou descentes diretos dos colonos que chegaram à região na década de 1970. A economia do município é baseada na pecuária e produção agrícola, sendo um dos polos produtores de soja mais importante do estado do Mato Grosso. Nos dias de

Município Urbana Rural Urbana Rural

Canarana 20,1 79,9 83,5 16,5 Feliz Natal 1,3 72,4 46,6 10,5 Gaúcha do Norte 3,6 97,6 12,3 12,2 Marcelândia 0,2 21,0 42,6 24,7 Nova Ubiratã 1,1 4,5 34,0 18,5 Paranatinga 3,2 0,1 84,9 25,7 Querência 1,0 99,0 34,2 32,9

São Félix do Araguaia 10,2 27,4 34,7 23,4

São José do Xingu 1,3 15,4 21,6 7,2

União do Sul 0,1 0,1 13,4 8,2

População não indígena População indígena

Proporção de população indígena e não indígena

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hoje, ao caminhar pelas ruas da cidade, observa-se que a maioria das lojas do comércio são de implementos e máquinas agrícolas.

Voltando a nossa pergunta, qual a explicação para esse grande número de indígenas residentes em Canarana? Há dois motivos: os Kamaiurá e os demais povos do Alto Xingu têm na cidade as bases das políticas públicas direcionadas a atender todos os povos do Parque e, na sua maioria, diversos indígenas integram o quadro de funcionários.

Dentre a base das políticas públicas relacionadas à saúde encontramos na cidade os seguintes escritórios: sede do Distrito Sanitário Especial Indígena73 (DSEI) Xingu e a CASAI Tuiuiú (Casa de Saúde do Índio) que recebe os indígenas que estão em atendimento médico de maior complexidade na rede do Sistema Único de Saúde (SUS). A Fundação Nacional do Índio (FUNAI), mantem um escritório, trata-se de uma ramificação Coordenação Regional do Xingu (CR Xingu), responsável por executar as políticas públicas do órgão indigenista do governo federal. Há ainda, mantido pela Funai, o Centro Cultural e de Convívio do Xingu, local que presta apoio assistencial às comunidades indígenas que estão de passagem em Canarana; nesse local os índios em trânsito recebem apoio, alimentação, espaço para armar as redes de dormir e um rádio de comunicação para contato com parentes que ficaram nas aldeias.

Canarana acaba sendo o primeiro contato com o “mundo dos brancos”. Eles também têm a cidade como referência para suas compras e passeios. A “proximidade” facilita essas visitas que parecem ser algo plenamente integrado às perspectivas quotidianas da aldeia. Para os Kamaiurá há 3 opções para da aldeia alcançar cidade: taxi aéreo que leva aproximadamente 45 minutos, o que é muito caro para eles: R$2.000,00 por voo; ida de barco (sete horas de barco e três horas em estrada secundária em veículo fretado, R$ 1000,00); ida por estrada (oito horas em estrada secundária que atravessa os limites do Parque e mais uma hora de barco R$1000,00).

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O DSEI é uma unidade organizacional da FUNASA e deve ser entendido como uma base territorial e populacional sob responsabilidade sanitária claramente identificada, enfeixando conjunto de ações de saúde necessárias à atenção básica, articulado com a rede do Sistema Único de Saúde - SUS, para referência e contra-referência, composto por equipe mínima necessária para executar suas ações e com controle social por intermédio dos Conselhos Locais e Distrital de Saúde. Fonte: http://www.bvsde.paho.org/bvsapi/p/fulltext/distritos/distritos.pdf, acesso em 21/06/2014.

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Canarana representa o primeiro contato com o capitalismo e tudo que ele traz consigo; sem falar nas questões subjetivas, como a geração de sentidos e a assimilação de signos estranhos ao imaginário indígena. (VITTI: 2005: 84). As idas à cidade não tem regularidade e, como o custo da viagem é alto, muitas vezes os Kamaiurá acumulam demandas a serem resolvidas ou aguardam conseguir carona (geralmente de visitantes não indígenas).

O ingresso nas aldeias do alto Xingu de recursos monetários, oriundo de salários, aposentadorias, doações de amigos e projetos que os próprios indígenas elaboram permite um consumo regular no município. Canarana passou a ter um “público consumidor”, tornando-se um entreposto logístico: ali se adquire combustível e óleo para barcos e geradores; é para lá que motores e outros equipamentos são mandados para conserto; é onde os indígenas fazem suas compras nas lojas, e nos demais estabelecimentos que exibem de tudo um pouco: tecidos, calçados, armarinhos, panelas de alumínio etc. Além dos recursos monetários provenientes das compras realizadas pelos indígenas, só o serviço de saúde voltado a atendê-los injetou na economia local, em 2011, R$ 2.158.054,72(esse montante de dinheiro entra na cidade, por meio dos salários e dos repasses governamentais dos pagamentos aos estabelecimentos de saúde hospital e Casa de Saúde do Índio). (PORTAL DOS CONVÊNIOS, 2014)

Apesar dos indígenas transitarem ou morarem em Canarana e contribuírem para o desenvolvimento da economia local não são raras as situações em que são alvo de preconceito e discriminação. Nas cidades vizinhas ao Parque são muitos os exemplos que ilustram a humilhação e o desrespeito sofridos por indígenas, que ainda são vistos como obstáculo ao progresso.

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