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2. ESPECIFICIDADES DO SETOR DE BEBIDAS ALCOÓLICAS ARTESANAIS

2.1 História da cachaça, da cerveja e do vinho

2.1.2 Cerveja

O aparecimento da cerveja está ligado ao pão e, por decorrer de um processo de fermentação comum para a alimentação, assim como o vinho, é uma das bebidas mais antigas conhecidas (ABRABE,2014).

Estima-se que, na Suméria, velhas civilizações perceberam que a massa de pão, quando molhada, passava a fermentar. Assim, a espécie primitiva de cerveja decorria de um processo rudimentar, em que um pão, composto de cevada e levedura, era colocado num jarro de água para se iniciar a fermentação. Por essa razão, é comum a cerveja ser chamada de “pão líquido”, já que assim se iniciou sua produção (ABRABE,2014).

Dessa maneira, a cerveja foi bem de consumo desde a Antiguidade. No entanto, tendo em vista sua difícil conservação e a preferência pelo vinho das classes mais abastadas na época antiga, a bebida era mais comum nas classes menos favorecidas da população.

Já na Idade Média, mosteiros e abadias passaram a produzir e a melhorar as técnicas de produção da bebida, sendo responsáveis pelo aumento do consumo na época. Ao utilizar o lúpulo, a bebida passou a ser mais fresca e de maior tempo de conservação, além de mais agradável e nutritiva. A técnica de fermentação fez com que em algumas regiões a cerveja fosse, inclusive, mais consumida que a água, tendo em vista as práticas de higienização (ABRABE,2014).

Os monges foram os principais produtores da bebida na Idade Média. A partir do século XII, o espaço da Igreja na produção da cerveja foi diminuindo, surgindo outros fabricantes espalhados pela Europa, que popularizaram a bebida na sociedade medieval como alimento, moeda de troca e pagamento de impostos (PACHECO, 2005)

Já na Idade Moderna, com a Revolução Industrial e a Francesa, que marca o final do período, as profundas alterações sociais e econômicas atingiram, também, a produção de cerveja. No final do século XVIII, com a invenção da máquina de vapor por James Watt e, quase cem anos mais tarde, com a descoberta da pasteurização, por Louis Pasteur, e da refrigeração artificial, por Carl von Linde, as técnicas de produção e conservação da cerveja

foram substancialmente alteradas, o que permitiu que seu consumo pudesse ser feito em casa, e não só em bares (ABRABE,2014).

No Brasil, a chegada da cerveja é marcada pelas invasões holandesas, entre 1634 e 1654, já que os portugueses não eram consumidores da bebida (SANTOS, 2004). Em 1640, sob o comando de Maurício de Nassau, a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais teria instalado uma cervejaria em Recife, que funcionou até o final da colonização batava (ABRABE,2014).

Com a saída dos holandeses, o consumo de cerveja no país caiu drasticamente, já que o vinho e a cachaça eram, de longe, as bebidas mais comercializadas internamente. Como no tempo da Colônia os portos eram fechados para navios estrangeiros, apenas com a chegada da Corte portuguesa, em 1808, e a consequente abertura dos portos, a cerveja voltou ao cenário brasileiro (ABRABE,2014). Antes, a cerveja consumida no país chegava, de forma clandestina, no Rio de Janeiro, Salvador e Recife (SANTOS, 2004).

Com a chegada da família real, muitos comerciantes estrangeiros vieram ao país, principalmente, ingleses, conhecidos, na época, como os maiores produtores da bebida (SANTOS, 2004). A partir de então, o consumo passou a crescer gradativamente, e, em 1836, apesar de não ser possível precisar o início da produção de cerveja no país, teve-se notícia da fabricação da bebida (ABRABE,2014), no Rio de Janeiro, através de um anúncio no Jornal do Comércio, sendo este o primeiro documento a retratar a produção nacional do produto (SANTOS, 2004).

Em 1850, aproximadamente, a cerveja alemã, mais clara e límpida, passou a ser fabricada, também, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Na mesma época, no Rio Grande do Sul, teve início a produção da cerveja alemã, de forma artesanal e em pequena escala (SANTOS, 2004). Na virada do século, a cerveja já era o produto mais popular no Brasil (ABRABE,2014).

A produção industrializada da cerveja no país teve início entre 1870-1888, sendo a primeira noticiada uma cervejaria de Porto Alegre, em 1878 (SANTOS, 2004). Nesta época, ainda, a fermentação, em um país tropical, era difícil de ser controlada, chegando-se, inclusive, a se importar gelo dos Estados Unidos para controlar a temperatura (SANTOS, 2004).

Em 1888, em São Paulo, foi criada a primeira fábrica de cerveja no país, com tecnologia apropriada para produção de cervejas de baixa fermentação, como a alemã. Da união entre uma cervejaria e um frigorífico, que contava com uma máquina de gelo ociosa, nasceu a

“Antarctica Paulista – Fábrica de gelo e cervejaria”. Em 1891, a cervejaria se torna uma Sociedade Anônima, passando a se chamar Companhia Antarctica Paulista, que rapidamente se modernizou e expandiu, por ter no seu quadro de acionistas importadores e exportadores de café, que obtinham com facilidade maquinário estrangeiro (SANTOS, 2004). Em 1905, a Cia. Antarctica Paulista comprou sua maior concorrente em São Paulo, a fábrica Bavária, e em 1911 abriu sua filial em Ribeirão Preto.

Em 1888, também, foi inaugurada no Rio de Janeiro a cervejaria Manufactura de Cerveja Brahma Villiger & Companhia, que depois mudaria de nome para Companhia Cervejaria Brahma. Em 1905, a Brahma e a Cia. Antarctica estabeleceram um acordo para regular os preços e o volume de venda no país, configurando o primeiro cartel de cervejas no território nacional (SANTOS, 2004).

Com o aumento dos impostos de importação de forma contínua e o crescimento da produção interna de cerveja, no início do século XX, a importação da bebida praticamente cessou (SANTOS, 2004). As indústrias continuaram crescendo e estima-se que, em 1913, só na região Sul, já existiam 134 cervejarias em atividade (ABRABE,2014).

Esse processo de aumento de tarifas, inicializado em 1904, decorreu graças a pressões das duas empresas acima citadas sobre as autoridades alfandegárias, intensificou-se ao longo do século e, a partir de 1930, ambas passaram a eliminar quase todos os concorrentes, o que fez com que o preço da cerveja nacional fosse deveras alto ao consumidor comum, o que fica claro com a comparação feita por Santos (2004, p. 28), “O salário diário de um serralheiro em 1919 correspondia a seis a oito garrafas de cerveja. O de um operário têxtil, de quatro a dez garrafas e o de uma faxineira somente duas e meia garrafas de cerveja Antarctica”.

Ao longo do século XX, novas marcas de cerveja foram surgindo, todavia, a grande maioria estava concentrada nas mãos de poucas indústrias, dominantes no mercado (ABRABE,2014). Essa concentração apenas aumentou, como será abordado em tópico próprio.