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Choro e Waldir Azevedo – Breve panorama

No documento INSTITUTO DE ARTES DEPARTAMENTO DE MÚSICA (páginas 35-37)

CAPÍTULO 1 – WALDIR AZEVEDO, CAVAQUINISTA BRASILEIRO

1.1 Choro e Waldir Azevedo – Breve panorama

Cazes (1998) apresenta a história da formação do choro, primeiramente como uma maneira de interpretação, na segunda metade do século XIX e, num segundo momento, no início do século XX como um gênero musical consolidado. Sua formação primária era formada pelos ternos (flauta, cavaquinho e violão) que mais tarde ficariam conhecidos como “grupo de pau e cordas”. Tido num primeiro momento como uma forma interpretativa brasileira para as músicas estrangeiras que tocavam nos salões imperiais, esta forma “chorada” de tocar logo ganhou espaço no Rio de Janeiro.

Nos ternos, o cavaquinho era o responsável pela sustentação rítmica, já que o elemento percussivo, o pandeiro, só se consolidou nestes tipos de grupos, no início do século XX por intermédio de João da Baiana. Por ser pequeno, o cavaquinho já estava presente nas navegações portuguesas juntamente à viola caipira. Ao final da década de 1890, já temos notícias dos primeiros choros compostos para cavaquinho, mas é somente no fim da década

de 1940 que o cavaquinho solista ganha prestígio e se firma nesta função. Este fato se deve pelo sucesso de Waldir Azevedo.

Waldir Azevedo bateria, já no princípio de sua carreira como solista, inúmeros recordes de vendagens. Logo, se tornaria um grande artista mundial. Seu primeiro sucesso internacional se deu na Argentina, em 1952. Este fato colaborou para que a sua gravadora, a Continental, logo firmasse parceria com a argentina T.K., gerando um intercâmbio internacional entre os dois países.

Ao chegarem na Rádio El Mundo para a audição de estreia, levados pelo diretor da T.K., Waldir estranhou a multidão que se aglomerava na frente da rádio. "Será algum incêndio?", perguntou ao diretor da gravadora argentina, ao que este lhe respondeu: "Não Waldir, é o seu programa." Mas Waldir assustou-se mesmo ao percorrer o caminho entre o carro e a sede da rádio, chegando aos estúdios com sua roupa em frangalhos, toda rasgada e amarrotada. Waldir pensou: "Ou essa gente é muito camarada ou, então, estão com raiva de mim!" E realizou o show, que contou com a honrosa presença de João Batista Luzardo, o embaixador do Brasil na Argentina, recebendo acolhida total da parte dos portenhos (BERNARDO, 2004, p. 54).

Anos depois, Waldir comentaria em uma entrevista a sua agitada saga em Buenos Aires:

"Fui para tocar na Radio El Mundo, e acreditava que até iria ser recebido friamente, pois não tinha a menor ideia de minha popularidade na Argentina. Quando cheguei na estação [de rádio], havia muita gente aglomerada na porta, e fui entrando tranquilamente. Aí, alguém gritou: 'Olha o Waldir Azevedo! 'Foi uma desgraça. Uma jovem pulou no meu pescoço enquanto outras me arrancavam a gravata, o lenço, os sapatos. Cheguei ao palco todo rasgado e arranhado, e quando terminei o programa tive que ir para a cama. [Respira e prossegue] Depois, fui a uma loja de discos para dar autógrafos. A multidão invadiu tudo, houve quebra-quebra, a polícia teve que intervir baixando o pau. Não podia sair na rua. Passei o resto da temporada em Buenos Aires trancado no hotel, e quando saía era com escolta policial. O argentino, quando gosta de um artista, é fogo” (BERNARDO, 2004, p. 56).

Na Argentina, Waldir se tornara uma celebridade a ponto de voltar outras vezes na década de 1950 e ainda ter participações em filmes com grandes atores daquele país.

Até 1959, Waldir e seu conjunto retornariam à Argentina (e, eventualmente, Uruguai) quatro vezes para novas temporadas. Ainda na segunda vez que esteve na Argentina, Waldir participou do filme cômico dirigido por Kurt Land e Raymond Horvilleur, intitulado Como Yo No Hay Dos, cujo papel principal foi entregue ao famoso ator argentino Pepe Iglesias, conhecido como El Zorro. O enredo tratava de um roubo de joias, que os ladrões haviam depositado na caixa do cavaquinho. Waldir apareceu – no papel dele mesmo – solando várias vezes, vigiado pelos ladrões que, por sua vez, já estavam sendo interceptados pela polícia. Como não poderia deixar de ser, os temas de Brasileirinho e Delicado são explorados de fio a pavio na película que percorreu todo o território argentino, mas jamais foi exibida no Brasil (BERNARDO, 2004, p. 59).

O choro estava fazendo muito sucesso no Brasil e agora na Argentina. Waldir Azevedo reinava absoluto. A idolatria no país vizinho era de uma grandeza inimaginável.

A partir da segunda viagem à Argentina, o contrabaixista Gugu foi substituído por Dalton Vogeler, que acumulou as funções de músico e relações-públicas, responsabilizando-se por questões contratuais e outras tantas para as quais Waldir não manifestava a menor vocação. Dalton comentou acerca dessas viagens: "Waldir revolucionava a Argentina, era como se fosse o Frank Sinatra lá. Uma passagem curiosa: numa dessas vezes, houve uma disputa de empresários argentinos, um contratou o Louis Armstrong e o outro contratou Waldir para fazer frente àquele. Enquanto Louis Armstrong enchia meia casa no Teatro Opera, o Teatro Astral ficava abarrotado de gente que ia ver o Waldir. Quando nós passávamos em frente ao Teatro Ópera, onde estava o Louis Armstrong, o povo até nos xingava. Waldir era um sujeito simples, até prejudicado pela modéstia". (BERNARDO, 2004, p. 59)

É difícil dimensionarmos o sucesso de Waldir Azevedo no Brasil e no exterior. É quase impossível de acreditar na forma como os argentinos acolheram a música e Waldir Azevedo. As mulheres rasgavam-lhe as roupas, quando ia se alimentar fora do hotel, precisava de escolta policial. Tratamento este nunca experimentado por um chorão, ainda mais em terras estrangeiras.

Mais tarde, o baião Delicado ganharia o mundo, tornando-se o maior sucesso da música instrumental brasileira pelo mundo. Mas isto veremos mais adiante em um capítulo próprio.

Waldir Azevedo permaneceu na gravadora Continental por mais de 30 anos, mantendo a concorrência com as demais gravadoras em altíssimo nível. A RCA Victor contava com Jacob do Bandolim, responsável pela nova sonoridade ao bandolim e a Odeon com o multi- instrumentista Garoto (Aníbal Augusto Sardinha) que acompanhou Carmen Miranda nos Estados Unidos.

O cavaquinho brasileiro ganhou o prestígio como instrumento solista nas mãos de Waldir. Suas obras se tornaram essenciais para o aprendizado do instrumento e fazem parte do rol dos clássicos do choro. Sua sonoridade se tornou a referência para os demais cavaquinistas.

No documento INSTITUTO DE ARTES DEPARTAMENTO DE MÚSICA (páginas 35-37)

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