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Antes de aprofundarmos o processo de expansão urbana de Fortaleza - suas causas e conseqüências - a partir da atuação do empresário imobiliário na criação e mercantilização do solo urbano na cidade, pensamos que se faz necessárias algumas considerações teóricas acerca da importância da cidade na sociedade moderna, por seu papel de centro propulsor das condições gerais de produção capitalista. Para tanto, apresento uma síntese da abordagem do pensamento dos pais da sociologia e seus seguidores contemporâneos.

A cidade ocupa lugar de destaque no pensamento social clássico, vista como produto de diversas causas econômicas, políticas e sociais. Destaco, por sua influência na produção das ciências sociais e no arcabouço teórico-metodológico utilizado neste estudo, as contribuições de Karl Marx e Max Weber, cuja característica comum é o entendimento que a cidade ocidental é um lugar de mercado. (MARX, 1980; WEBER, 1987).

Para Marx a cidade é um mercado, onde é encontrado a força de trabalho necessária à produção capitalista e o exército industrial de reserva, recurso utilizado pela burguesia para comprimir salários. Assim, na cidade encontram-se o capital (bens e dinheiro) e força de trabalho, as duas pontas de um mercado que substitui a sociedade feudal e vai construir o capitalismo.

A análise de Marx, como observa Tedesco, não fica apenas no aspecto da funcionalidade da divisão social do trabalho. Marx observa que o crescimento das

aglomerações é resultado “da apropriação dos meios de produção por poucos indivíduos, o

que ocasiona a expulsão de trabalhadores do campo, conduzindo-os a se tornarem trabalhadores volantes ou a viveram nas cidades ofertando sua força de trabalho”. Assim, o capital passa a exercer domínio sobre o processo de trabalho, condição necessária para sua auto-expansão, encontrando, na cidade moderna, o espaço ideal para o desenvolvimento desta etapa. (TEDESCO, 1998).

É a cidade, pela sua estrutura e funcionamento, o espaço privilegiado para impulsionar a acumulação de capital e, por conseguinte, a expansão dos meios de produção

e da força de trabalho assalariada. Forças necessárias ao incremento da circulação do capital, etapa fundamental para a produção dos lucros capitalistas.

Max Weber observa, no texto Conceito e Categorias da Cidade, que vários tipos de cidade existiam no passado e mostra suas diferentes origens, enfatizando a importância do mercado para seu desenvolvimento. O ensaio enumera os pré-requisitos necessários para o desenvolvimento das cidades. Resumindo o conceito weberiano, a existência da cidade traz consigo uma comunidade com alto grau de autonomia, tanto no nível objetivo (mercado, fortificação, exército, tribunal e direito, ao menos parcialmente próprios), quanto no nível

subjetivo, “como um conjunto de lealdades” (WEBER, 1987).

Para Weber, sem o surgimento da cidade o capitalismo não alcançaria o estágio de desenvolvimento que conhecemos. Onde isso não ocorreu não foi possível fazer crescer o capitalismo, como por exemplo, no Oriente.

Merece observar-se que tanto Marx como Weber destacam o papel da cidade para o desenvolvimento do capitalismo. Ambos insistem na característica essencial do capitalismo ocidental que é, justamente, o de ser composto por trabalho livre e regulado pelo lucro. A diferença consiste no fato de que a lógica weberiana não trabalha com o antagonismo de classes como Marx cuja categoria central define a história das sociedades como a história das lutas de classes, preconizando a vitória do proletariado sobre a burguesia e, conseqüentemente, a emergência da sociedade sem classes.

Essa concepção da cidade como centro do poder econômico abriga, pois, as forças atuantes da sociedade de mercado. Serve, ainda, como base para o debate do papel por ela desempenhado no capitalismo e, notadamente, suas mutações ao longo da história.

Se a cidade na sociedade moderna é o lócus privilegiado do poder econômico, ela também atrai para si a sede do poder político, que deve garantir a ordem econômica e estabelecer as normas de convívio social entre as diferentes forças que disputam o espaço e o próprio poder político. É através do poder coercitivo de que dispõe o Estado (polícia,

aparelho judiciário e a máquina de propaganda) que a ordem é imposta e aceita dentro de limites que evitem os excessos e a violência. No entanto, mesmo no âmbito da ordem estabelecida, as contradições internas que marcam a cidade moderna - pois estes cidades abrigam no seu interior grupos e classes em competição entre si, com as aspirações e visões de mundo em estado permanente de conflito - afloram com grande intensidade propiciando à cidade fortalecer-se cada vez mais, na sua condição de epicentro da sociedade moderna.

Por sua vez, a sociologia contemporânea tem refletido sobre a cidade sob diversos ângulos e linhas de pensamento. As ações humanas multifacetadas produzem, criam e recriam, no interior das cidades, todas as adversidades do mundo moderno, marcando a existência dos grandes centros urbanos como locais onde impera a disputa por espaço, onde se ver o isolamento de grande parte da população que fica alijada das conquistas modernas do capital. Acentuam-se, enfim, as contradições sociais produzidas pelas transformações estruturais do capitalismo, incluindo-se suas mutações sócio-políticas.

Dessa maneira, a cidade, a partir de sua territorialidade, é o centro onde, historicamente, se desenvolvem as diversas ações econômicas, culturais, políticas e sociais que produzem forças em constante movimento cujo poder de criação estabelece as linhas de convivência do homem com a natureza. Este centro torna-se, então, de fundamental importância para aqueles que se preocupam e observam o desenvolvimento de suas cidades e, de resto, para o restante da sociedade, no desejo de conhecer e analisar as formas de construção física das cidades e a configuração urbana por elas assumidas.