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Parte II – Temas desenvolvidos ao longo do estágio

2. Infeções do trato genito-urinário na mulher: cistite não complicada e candidíase vulvovaginal

2.2. Cistite Aguda Não Complicada e Cistite Recorrente

A CANC ocorre em indivíduos com o trato urinário normal, ou seja, com ausência de alterações anatómicas ou funcionais, aos quais os sintomas se apresentem isolados na bexiga e não tenham sofrido nenhuma instrumentação recentemente[33]. Uma cistite recorrente é definida como duas ou mais infeções que ocorrem num espaço de seis meses ou três ou mais infeções que ocorrem num ano e é provocada por uma estirpe ou por uma espécie diferente do microrganismo originário. Este tipo de infeção mostrou ser mais frequente em mulheres pós- menopausa do que em mulheres pré-menopausa[34]. Sabe-se que 25% dos infetados pela primeira vez irão desenvolver infeções recorrentes no espaço de seis meses[35].

2.2.1. População prevalente e respetivos fatores de risco

Esta infeção é mais prevalente na mulher devido à sua estrutura anatómica, em que a uretra se encontra próxima da vagina e do ânus e devido ao facto desta ser menos comprida que a uretra do homem, pelo que há um menor caminho a percorrer pelos microrganismos até alcançarem a bexiga[30]. São vários os fatores que predispõem para este tipo de infeção, entre os quais a gravidez, a estase urinária, a diabetes, a falta de hábitos de higiene, a obstrução urinária, o climatério, a inserção de objetos estranhos e as doenças sexualmente transmissíveis[30].

Em mulheres saudáveis, jovens e pré-menopausa os fatores de risco mais comuns são o uso de espermicidas, relações sexuais recentes e histórico de ITU[36]. Contudo, o facto de haver história materna de infeção e a idade em que ocorre a primeira infeção também são fatores de risco neste grupo, sugerindo que há suscetibilidade genética[37]. Já em mulheres pós-menopausa, o risco que estas apresentam de ter uma infeção urinária recorrente deve-se à diminuição do nível de estrogénios tanto a nível sistémico como vaginal, que se sabe serem responsáveis pela manutenção do pH e da flora vaginal. Para além deste fator, a história prévia de ITU, prolapso anterior e/ou vaginal, incontinência urinária e esvaziamento incompleto da bexiga também são promotores de risco recorrência desta infeção[36].

2.2.2. Patogenia

A cistite resulta da colonização da vagina e da uretra pela flora fecal, que subsequentemente ascende para a bexiga. Uma vez na bexiga, os uropatogénios aderem e infetam as células uroepetilais. Estes também podem ser internalizados pelas células hospedeiras, escondendo-se da resposta imune, enquanto proliferam antes de causar a infeção[35]. Dentro das bactérias patogénicas causadoras CANC mais comuns encontra-se a Escherichia coli

uropatogénica, responsável por 80 a 90% dos casos, e a Staphylococcus saprophyticus, responsável por 5 a 10% deste tipo de infeções. Outros uropatogénios capazes de causar CANC incluem Enterococci spp., Streptococcus

agalactiae, Proteus mirabilis e Klebsiella spp.[35]. 2.2.3. Sintomas e Diagnóstico

Os sintomas característicos de inflamação da bexiga não complicada são a disúria, frequência e urgência em urinar, urina turva, acompanhados ou não de dor pélvica. Estes sintomas podem, por vezes, ser acompanhados de piúria ou hematúria[35,36]. O diagnóstico desta patologia varia conforme se trate de uma mulher pré-menopausa, pós-menopausa ou se trate de um caso de infeção recorrente[36]. Neste último caso, o diagnóstico é feito através de cultura de urina positiva, dado que o tratamento é dependente do tipo de bactéria responsável pela respetiva infeção[35,36]. Em mulheres pré-menopausa não há necessidade de realizar a cultura de urina desde que a mulher apresente os sintomas acima mencionados. Já em mulheres pós-menopausa, devem ser consideradas as culturas se a mulher apresentar só um sintoma[36].

2.2.4. Tratamento

No tratamento farmacológico da CANC as primeiras três linhas de tratamento são antibióticos. A posologia e a duração do tratamento são variáveis de acordo com o fármaco, podendo existir tratamentos com durabilidade de 1, 3 ou 5 a 7 dias. Os tratamentos de 3 dias têm demonstrado eficácia idêntica aos tratamentos de 7 dias e são preferíveis devido ao seu custo reduzido, ao melhor cumprimento da posologia e à diminuída frequência de reações adversas. A escolha do tratamento empírico é feita com base no conhecimento do microrganismo causador da infeção e a sensibilidade que este apresenta à terapêutica disponível, sendo então importante considerar estes dois aspetos sobre o antibiótico em questão: deve apresentar uma prevalência de resistência bacterianas inferior a 20% e ser de fácil cumprimento da terapêutica. De acordo com a Associação Portuguesa de Urologia, os fármacos utilizados em Portugal como 1ª, 2ª e 3ª escolha encontram-se na Tabela 2[33].

Tratamento Posologia

1ª escolha Fosfomicina Dose única de 3 g

Nitrofurantoína 100 mg a cada 6 h, durante 5-7 dias

2ª escolha

Sulfametoxazol + Trimetropim 800 + 160 mg a cada 12 h, durante 3 dias Ciprofloxacina 500 mg a cada 12 h, durante 3 dias

Norfloxacina 400 mg a cada 12 h, durante 3 dias Levofloxacina 250 mg a cada 24 h, durante 3 dias Pivmecilinam 200 mg a cada 12 h, durante 7 dias 3ª escolha Amoxicilina + Ácido Clavulânico 500 + 125 mg a cada 8 h, durante 5 dias

Cefixima 400 mg a cada 24 h, durante 3 dias

O tratamento farmacológico da cistite recorrente inclui imunoprofilaxia, antiboterapia profilática em mulheres não grávidas e estrogénios intravaginal/oral em mulheres pós-menopausa. A imunoprofilaxia é feita com uma vacina oral que contém 18 diferentes estirpes de E.coli, a Uro-Vaxom®. Esta vacina deverá ser tomada 1 cápsula por dia em jejum, de manhã, durante 3 meses consecutivos. A antibioterapia profilática aplica-se a mulheres cujas alterações no estilo de vida e higiene pessoal não resultaram bem como em mulheres pós- menopausa cuja terapêutica estrogénica, quer oral quer vaginal, não se adequa ou não obteve resultados. Na Tabela 3 encontram-se os antibióticos utilizados em primeira e segunda linha na profilaxia. A antibioterapia profilática

pode ser feita de duas maneiras: em regimes com duração de seis meses com doses baixas ou regimes curtos com altas doses, sendo este último iniciado quando a mulher se encontra exposta a um trigger, como é o caso de uma relação sexual[34].

Tratamento Posologia

1ª escolha Trimetropim Dose única de 200 mg quando exposta a trigger ou 100 mg à noite Nitrofurantoína Dose única de 100 mg quando exposta a trigger ou 50 a 100 mg à noite 2ª escolha Amoxicilina Dose única de 500 mg quando exposta a trigger ou 250 mg à noite

Cefalexina Dose única de 500 mg quando exposta a trigger ou 125 mg à noite Para além destas medidas farmacológicas, estão a emergir no mercado novas terapêuticas não antibióticas que parecem ter efeito na prevenção da cistite recorrente, como é o caso de probióticose suplementos alimentares contendo D-manose ou arando vermelho[34].

A administração de probióticos contendo Lactobacillus pode ser feita de forma oral ou vaginal, sendo que estes são capazes de diminuir o pH do urotélio e induzir a formação de citoquinas através da produção de peróxido de hidrogénio, alterando os locais de ligação das bactérias. Os suplementos alimentares contendo arando vermelho têm efeito anti-inflamatório e capacidade de inibir a aderência dos uropatogénios à parede da bexiga enquanto que os suplementos de D-manose inibem a ligação das bactérias ao urotélio por se ligarem às fímbrias das bactérias[34]. Contudo, tanto para a CANC como para a cistite recorrente, não devem ser esquecidas as medidas de higiene nem as alterações no estilo de vida de modo a prevenir a cistite, entre as quais: evitar o uso de espermicidas como método contracetivo; reduzir o uso de pensos diários; não atrasar a micção pós-coito; limpar a zona genital sempre na direção da uretra para o ânus; não ficar mais de 4 horas sem urinar; manter a zona genital sempre seca; perder peso, se necessário; tratar incontinência fecal, se for o caso; aumentar o consumo de líquidos diário; utilizar produtos de limpeza próprios para a zona genital[33,34].