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CAPÍTULO III O GÊNERO CRÔNICA

3.3 Classificações de Crônica

Ao longo deste capítulo, foi discutido o caráter difuso da crônica, isto é, uma definição precisa em texto literário ou texto jornalístico, já que, segundo Bender e Laurito (1993, p. 76-77), nela se pode encontrar uma linguagem metafórica, alegorias, repetições, antíteses, paradoxos, gradação, metonímia, hipérbole, eufemismo, ironia, diminutivos afetivos, aumentativos depreciativos, supense (...) “tudo que a elaboração literária permite pode estar lá, naquele texto, jornalístico também, aparentemente despretensioso”.

Em contrapartida, contemplando a funcionalidade do gênero, Melo (1985, p. 156) apresenta que a crônica moderna se configura como um gênero eminentemente jornalístico, cujas características fundamentais são:

1) Fidelidade ao cotidiano, pela vinculação temática e analítica que mantém em relação ao que está ocorrendo, aqui e agora; pela capitação dos estados emergentes da psicologia coletiva.

2) Crítica social, que corresponde a “entrar fundo no significado dos atos e sentimentos do homem”. Tal tarefa o cronista realiza de modo dissimulado, pois ele mantém o “ar despreocupado, de quem está falando coisas sem maior consequência”. Esse é um traço essencial da crônica moderna, que assume o ar de “conversa fiada”, de apreciação irônica dos acontecimentos, deixando de ser o “comentário mais ou menos argumentativo e expositivo” que se praticava nos fins dos séculos XIX (MELO, 1985, p. 156).

Na verdade, o que não se pode perder de vista acerca da crônica é que esse gênero não monolítico, tampouco uniforme, e sim comporta várias formas de escrita. Por isso, sua classificação tem sido objeto de estudo de pesquisadores tanto do jornalismo quanto da literatura.

Mediante a tantas especificidades, há várias tentativas de classificações do gênero crônica. Nesse sentido, muitos estudiosos propuseram classificações, como:

“Na bibliografia sobre crônica brasileira encontramos quatro tentativas de classificação: Luiz Beltrão usa um critério jornalístico; Afrânio Coutinho toma como base a tipologia literária; Massaud Moisés procura uma correspondência com os gêneros literários; Antônio Cândido orienta-se pela estrutura da narrativa.”(MELO, 1985, p.157).

70 Neste sentido, são apresentados alguns exemplos de classificações a partir do trabalho de Melo (1985), o qual reuniu em seu trabalho os tipos de crônicas propostas pelos autores Beltrão (1980), Coutinho (1967), Moisés (1978) e Candido (1989).

Segundo Beltrão (1980, p. 68 apud Melo, 1985, p. 157), a crônica possui duas classificações, as quais são elencadas quanto ao tema abordado e ao tratamento que lhe dá o cronista.

A partir do tema, Beltrão (1980, p. 68 apud Melo, 1985, p. 157) identifica três espécies:

a. Crônica geral: é aquela com espaço fixo no jornal, em que o autor aborda assuntos variados.

b. Crônica local: também conhecida como “urbana”, trata dos temas quotidianos da cidade, atuando como uma espécie de antena coletiva, captando as tendências da opinião pública na comunidade em que se localiza.

c. Crônica especializada: focaliza assuntos referentes a um determinado campo de atividade. (BELTRÃO,1980, p. 68 apud MELO, 1985, p. 157)

Quanto ao tratamento dado a qualquer um desses temas, Beltrão (1980, p. 68 apud Melo, 1985, p. 157) sugere:

d. Analítica: os fatos são expostos com brevidade e logo dissecados objetivamente; o cronista dirige-se mais à inteligência do que ao coração. e. Sentimental: os fatos são apresentados a partir dos seus aspectos pitorescos,

líricos, épicos, sendo capazes de comover e influenciar a ação, num impulso quase inconsciente; predomina, portanto, o apelo à sensibilidade.

f. Satírico-humorística: seu objetivo é criticar, ridicularizando ou ironizando fatos, ações, personagens; busca entreter, assumindo feição caricatural. (BELTRÃO,1980, p. 68 apud MELO, 1985, p. 157)

Já o autor Coutinho (1967, p. 97-98 apud Melo, 1985, p. 157-158) apresenta cinco tipos de crônicas encontradas na literatura brasileira. Tais classificações são delimitadas com base na natureza do assunto e no movimento interno do texto.

a) Crônica narrativa: seu eixo é uma história ou um episódio, o que a aproxima do conto contemporâneo (sem possuir necessariamente começo, meio ou fim); exemplo típico é encontrado em Fernando Sabino.

b) Crônica metafísica: constituída de reflexões de cunho mais ou menos filosófico sobre os acontecimentos ou sobre o comportamento dos homens; como é o caso de Machado de Assis ou Carlos Drummond de Andrade, que

71 encontram sempre ocasião e pretexto nos fatos para dissertar ou discretear filosoficamente.

c) Crônica poema em prosa: de conteúdo lírico, mero extravasamento da alma do artista ante o espetáculo da vida, das paisagens ou episódios carregados de significação; seus principais cultores foram: Álvaro Moreyra, Rubem Braga, Manuel Bandeira, Ledo Ivo, Eneida, Raquel de Queiroz.

d) Crônica-comentário: resenha de acontecimentos diferentes e díspares, tornando o aspecto de “bazar asiático”, acumulando muita coisa diferente ou díspar; como são muitas das crônicas de José de Alencar e Machado de Assis.

e) Crônica-informação: divulga fatos, tecendo sobre eles comentários ligeiros; aproxima-se da crônica-comentário, sendo menos pessoal. Lourenço Diaféria e Flávio Rangel produziram hoje crônicas que se enquadram nessa espécie. (COUTINHO,1967, p. 97-98 apud MELO, 1985, p. 157-158)

Sobre a sua proposta de classificação, Coutinho (1967, p. 97-98 apud Melo, 1985, p. 159), esclarece que “é evidente que essa classificação não implica o reconhecimento de uma separação estanque entre os vários tipos, os quais, na realidade, se encontram fundindo traços de uns e outros.”

Defendendo o ponto de vista de que a crônica tem um caráter ambíguo, oscilando entre poema e conto, Moisés (1978, p. 108-109 apud Melo, 1985, p. 158) propõe dois tipos de crônica. No seu entender o lugar ideal da crônica é o meio termo entre acontecimento e lirismo; “a crônica deriva para o conto ou a poesia” ela é a “poetização do cotidiano”.

a) Crônica-poema: os cronistas chegam a fazer versos na sua prosa emotiva ou a lançar mão se uma estrofe para encerrar um texto; ou então, constroem a crônica totalmente em verso. Carlos Drummond de Andrade recorreu algumas vezes a esse tipo de expressão verbal.

b) Crônica-conto: um acontecimento que provoca a atenção do cronista é narrado como se fora um conto. Enquanto o primeiro tipo explora a temática do “eu” (concentra-se nas emoções do cronista), o segundo tipo gira em torno do “não-eu” (o acontecimento de que o cronista é apenas o narrador, o historiador). (MOISÉS, 1978, p. 108-109 APUD MELO, 1985, p. 158)

Sem a pretensão de criar categorias específicas, mas sim destacar diferenças entre os modernos cronistas brasileiros, Candido (1989 apud Melo, 1985, p.159) sugere as seguintes classificações:

72 a) Crônica-diálogo: onde o cronista e seu interlocutor imaginário se reverzam, intercambiando informações e pontos de vista; exemplos: “Gravador” (de Carlos Drummond de Andrade) e “Conversinha Mineira” (de Fernando Sabino).

b) Crônica narrativa: tem certa estrutura de ficção, marchando rumo ao conto.

c) Crônica exposição poética: divagação livre sobre um fato ou personagem; cadeia de associações.

d) Crônica biografia lírica: narra poeticamente a vida de alguém. (CANDIDO, 1989 apud MELO, 1985, p. 159)

Após a leitura dos estudiosos que se propuseram a classificar a crônica, percebe-se que há uma ausência acerca de um estudo mais específico sobre a crônica de humor. Entretanto, admite-se que o humor em uma crônica é, inclusive, fundamental, dando um tom de leveza e coloquialidade. Além disso, visto que, sendo o Humor uma forma de escape da realidade, conforme apresentado no segundo capítulo, “a crônica é um gênero de disfarce e ajuda a aguentar com certa fantasia a vida e a realidade” (BENDER e LAURITO, 1993, p. 44).

A partir desta definição, este trabalho considera as crônicas de Agamenon como de humor; e, mais, cujo objetivo é denunciar os entraves políticos e, ao mesmo tempo, informar o leitor. Cabe também a esse cronista proporcionar, por meio do riso, uma forma de escape da realidade para o leitor. Aspectos que são tratados na seção seguinte.

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