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5.1. Competência do foro (territorial) e competência do juízo

Foro é o local onde o órgão jurisdicional exerce as suas funções; é a unidade territorial sobre a qual se exerce o poder jurisdicional (lembre-se que o Estado é soberania de um povo sobre dado território). No mesmo local, conforme as leis de organização judiciária, podem funcionar vários juí�zes com atribuições iguais ou diversas.

Assim, para uma mesma causa, verifica-se primeiro qual o foro com-petente, depois o juí�zo, que é a vara, o cartório, a unidade administrativa. A competência do juí�zo é matéria pertinente às leis de organização judiciária.

A competência de foro é regulada pelo CPC.

5.2. Competência originária e derivada

A competência originária é aquela atribuí�da ao órgão jurisdicional para conhecer da causa em primeiro lugar; pode ser atribuí�da tanto ao juí�zo sin-gular, em primeiro grau, o que é a regra, como ao tribunal, excepcionalmente (ação rescisória e mandado de segurança contra ato judicial, por exemplo).

A competência derivada ou recursal é atribuí�da ao órgão jurisdicional destinado a rever a decisão já proferida; normalmente, atribui-se a com-petência derivada ao tribunal, mas há casos em que o próprio magistrado de primeira instância possui competência recursal, como acontece com os

26. Também no sentido de ser absoluta essa competência, NERY JR., Nelson; NERY, Rosa. Código de Processo Civil comentado e legislação processual extravagante em vigor. 4ª ed. São Paulo: RT, 1999, p. 719.

embargos infringentes de alçada, cabí�veis na forma do art. 34 da Lei de Execução Fiscal (Lei n. 6.830/1980), que serão julgados pelo mesmo juí�zo prolator da sentença.

Ambas são espécies de competência funcional e absoluta.

5.3. Competência relativa e competência absoluta

As regras de competência submetem-se a regimes jurí�dicos diver-sos, conforme se trate de regra fixada para atender principalmente a interesse público, chamada de regra de competência absoluta, ou para atender preponderantemente ao interesse particular, a regra de com-petência relativa.

Antes de apresentar as diferenças, convém apontar primeiramente as semelhanças entre os regimes jurí�dicos de reconhecimento da incompetência.

5.3.1. A translatio iudicii

O CPC adotou um sistema que consagra a translatio iudicii: a preser-vação da litispendência e dos seus efeitos (materiais ou processuais), a despeito do reconhecimento da incompetência27.

Esse sistema pode ser visualizado a partir de algumas regras.

a) A incompetência (absoluta ou relativa) é defeito processual que, em regra, não leva à extinção do processo. A incompetência gera a remessa dos autos ao juízo competente. (art. 64, § 3º, CPC). Excepcio-nam-se, porém, a incompetência nos Juizados Especiais (inciso III do art. 51 da Lei n. 9.099/1995) e a incompetência internacional (arts. 21 e 23 do CPC)28.

No caso de acolhimento da alegação de convenção de arbitragem for-mulada pelo réu, que em última análise é uma alegação de incompetência do juí�zo estatal, o processo também será extinto, e não remetido ao juí�zo arbitral (art. 485, VII, CPC).

Convém, no entanto, observar o que acontece nas hipóteses de in-competência do juí�zo para processar e julgar demandas incidentes,

27. ASPRELLA, Cristina. La translatio iudicii: trasferimento del giudizio nel nuovo processo civile (l. n. 69/2009).

Milano: Giuffrè Editore, 2010, passim. Sobre o assunto, ainda, vale conferir GRECO, Leonardo. “Translatio iudicii e reassunção do processo”. Revista de Processo. São Paulo: RT, dez. 2008, v. 166; CUNHA, Leonardo Carneiro da. “A translatio iudicii no projeto do novo Código de Processo Civil brasileiro”. Revista de Processo. São Paulo: RT, jun. 2012, v. 208, p. 257-263.

28. Esse regime jurídico diferenciado da incompetência internacional justifica-se como aplicação do prin-cípio da unilateralidade, que rege a competência internacional, logo abaixo examinado.

como a reconvenção e os embargos de terceiro, por exemplo. A competência funcional para o julgamento das demandas incidentais é do juí�zo da causa principal. Sucede que é possí�vel que esse juí�zo não tenha competência objetiva (em razão da matéria ou da pessoa) para o processamento/julgamento do feito.

Se isso acontece na reconvenção, o magistrado indeferirá a peti-ção inicial da reconvenpeti-ção, não admitindo o seu processamento.

A consequência da incompetência absoluta, neste caso, não pode ser a remessa dos autos ao juí�zo competente nem a extinção do processo. Somente é possí�vel admitir reconvenção se houver ação; assim, a reconvenção não poderia ser enviada a outro ju-í�zo distinto daquele onde tramita a demanda principal. Porque demanda incidente, o seu não-conhecimento não pode implicar a extinção do processo, que prossegue para o exame da demanda principal. Raciocí�nio semelhante se aplica no caso de cumulação de pedidos, em que o juí�zo é absolutamente incompetente para um deles: não se admite a cumulação, prosseguindo-se o proces-so em relação ao pedido para o qual se é competente, cabendo ao autor propor o outro pedido perante o juí�zo competente (art.

45, §§1º e 2º, CPC).

A incompetência absoluta para o conhecimento de embargos de terceiro ou denunciação da lide implica a remessa dos autos, com as demandas principal e incidental, ao juí�zo competente. E� o que pode acontecer se, em processo que tramita na Justiça Estadual, houver embargos de terceiro propostos por um ente federal ou em face de um deles seja proposta uma denunciação da lide – em ambos os casos, os autos serão remetidos à Justiça Federal.29

b) A decisão sobre a alegação de incompetência deverá ser proferida imediatamente após a manifestação da outra parte (art. 64, § 2º, CPC).

29. Acolhida a denunciação, o processo continuará seu curso na Justiça Federal; rejeitada, os autos devem retornar a Justiça Estadual, resguardada a competência funcional (recursal) do Tribunal Regional Federal da respectiva região para apreciar eventuais recursos dessa decisão. O juiz estadual não está autorizado a continuar o julgamento do processo sob o argumento de que não é caso de denunciação da lide, rejeitando-a; deve remeter os autos à Justiça Federal, para que lá se averigue a admissibilidade da denunciação. Cf., a propósito: STJ, Conflito de Compe-tência n. 12.094-PR, publicado no DJ de 27.03.1995, rel. Torreão Braz; Conflito de CompeCompe-tência n. 21.268/SC, publicado no DJ de 17.05.1999, p. 119, rel. Min. Eduardo Ribeiro; Conflito de Competência n. 21792/RR, publicado no DJ de 14.12.1998, p. 82, rel. Min. Garcia Vieira, rel.

p/ acórdão Min. Humberto Gomes de Barros; Conflito de Competência n. 12586/SP, publicado no DJ de 17.04.1995, p. 9552, rel. Min. Paulo Costa Leite. Em sentido diverso, entendendo que apenas os embargos de terceiro serão remetidos para a Justiça Federal, com o sobrestamen-to da execução na justiça estadual: STJ, 2ª S., CC n. 93969/MG, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. em 28.05.2008, publicado no DJe de 05.06.2008; STJ, 3ª Seção, CC n. 83.326/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. em 27.02.2008, publicado no DJe de 14.03.2008. O STJ, no entanto, mantém o entendimento de que, uma vez proposta a denunciação da lide, a demanda principal e a incidental serão remetidas para a justiça federal: STJ, REsp n. 1.003.635/MG, 1ª T., Rel. Min.

José Delgado, j. em 08.04.2008, publicado no DJe de 24.04.2008. Trata-se, porém, de distinção que não se consegue compreender.

c) A incompetência (absoluta ou relativa) não gera a automática invalidação dos atos decisórios praticados. Nada obstante reconhecida a incompetência, preserva-se a eficácia da decisão proferida pelo juí�zo incompetente, até ulterior determinação do juí�zo competente. E� o que determina expressamente o § 4º do art. 64 do CPC: “Salvo decisão judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos de decisão proferida pelo juí�zo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juí�zo competente”.

d) O regramento da incompetência na ação rescisória (art. 968, §§

5º e 6º, CPC), estruturado para o aproveitamento total da ação rescisória ajuizada perante tribunal incompetente, é outro bom exemplo de consa-gração da translatio iudicii.

e) Se for absolutamente incompetente, o juí�zo que receber uma carta precatória ou arbitral poderá determinar o seu envio ao juí�zo competente (art. 267, par. ún., CPC).

f) O art. 240 do CPC determina que a citação válida, ainda que ordenada por juízo incompetente, induz litispendência para o réu, faz litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor. O § 1º do art. 240 do CPC determina que o despacho citatório, ainda que ordenado por juí�zo incompetente, interrompe a prescrição. Preservam-se os efeitos do ato de citação e do despacho citatório, mesmo reconhecida a incompetência do juí�zo que a determinou.

Do mesmo modo, a litispendência para o autor é eficaz a partir da propositura da ação, mesmo que perante juí�zo incompetente; assim, mes-mo que perante juí�zo incompetente, a propositura da ação torna litigiosa a coisa para o autor.

5.3.2. Distinções entre a incompetência relativa e a incompetência ab-soluta

A distinção entre os regimes jurí�dicos das regras de incompetência absoluta e relativa pode ser feita em quadro esquemático, que facilita a visualização e a aprendizagem.

Absoluta Relativa

Regra de competência criada para atender a interesse público.

Regra de competência criada para atender precipuamente a interesse particular.

Absoluta Relativa A incompetência absoluta pode ser alegada

a qualquer tempo, por qualquer das partes, podendo ser reconhecida ex officio pelo órgão julgador (art. 64, § 1º, CPC). Pode, inclusive, ser alegada como preliminar de contestação pelo réu (art. 64, caput, CPC).

A incompetência relativa somente pode ser arguida pelo réu, na contestação, sob pena de preclusão e prorrogação da competência do juízo, não podendo o magistrado reconhe-cê-la de ofício (enunciado n. 33 da súmula da jurisprudência do STJ). O Ministério Público pode alegar incompetência relativa nas causas em que atuar (como fiscal da ordem jurídica, esclareça-se, a despeito do laconismo do texto legal – art. 65, par. ún., CPC). O assistente sim-ples não pode alegar incompetência relativa em favor do assistido (aplicação do art. 122, CPC).

Trata-se de defeito grave; uma vez transitada em julgado a última decisão, ainda será possí-vel, no prazo de dois anos, desconstituí-la por ação rescisória, com base no art. 966, II, CPC.

A regra de competência absoluta não pode ser alterada pela vontade das partes. Não se admite negócio processual que altere compe-tência absoluta.

As partes podem modificar voluntariamente a regra de competência relativa, quer pelo foro de eleição (art. 63, CPC), quer pela não alegação da incompetência relativa (art. 65, caput, CPC).

A regra de competência absoluta não pode ser alterada por conexão ou continência.

A regra de competência relativa pode ser mo-dificada por conexão ou continência.

Competência em razão da matéria, da pessoa e funcional são exemplos de competência absoluta. A competência em razão do valor da causa também pode ser absoluta, quando extrapolar os limites estabelecidos pelo legisla-dor. Em alguns casos, a competência territorial também é absoluta.

Competência territorial é, em regra, relativa.

Além disso, também é relativa a competência pelo valor da causa, quando ficar aquém do limite estabelecido pela lei.

Mudança superveniente de competência abso-luta impõe o deslocamento da causa para outro juízo, excetuando a perpetuação da competência.

Mudança superveniente de competência rela-tiva é irrelevante para o processo, mantida a perpetuação da competência.

6. FOROS CONCORRENTES, FORUM SHOPPING, FORUM NON

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