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3. SÃO PAULO E O CLIMA

3.2. CLIMA URBANO EM SÃO PAULO

O

clima urbano “abrange o clima de um dado espaço terrestre e sua urbanização” (MONTEIRO, 1976, p. 95). Para este autor, o clima urbano é entendido como necessário para compreensão da organização da cidade, definido por ele como “canais de percepção do clima” ou “subsistemas termodinâmico” (conforto térmico), “fisioquímico” (qualidade do ar) e “hidromecânico” (impacto pluvial). A fonte primária de energia do primeiro e do último está na atmosfera.

A fonte do subsistema físico-químico encontra-se na atividade urbana, na circulação de veículos e indústrias. Cada um dos elementos citados possui mecanismo de ação própria e resultados diferenciados.

Para Oke (1986) o clima da cidade é produto de um fenômeno de transformação de energia a partir da interação entre o ar atmosférico e o ambiente urbano construído. O pesquisador diferencia os processos térmicos rurais dos urbanos, evidenciando a geometria urbana e a inércia térmica dos materiais de

17Conferência sobre o Meio Ambiente realizada pela ONU no Rio de Janeiro, 20 anos após a

construção no processo de mudança climática causado pelos assentamentos urbanos.

As cidades alteram o balanço de energia, por meio dos bolsões térmicos sobre áreas urbanas, denominadas de ICU. Uma das mais significativas expressões da alteração climática na cidade está relacionada à temperatura e a concentração de poluentes. Os espaços urbanos contêm extensas áreas de construção densas muito distintas dos espaços abertos circundantes, podendo haver diferenças de temperatura do ar, de velocidade do vento, de umidade relativa do ar e de pureza do ar (LOMBARDO, 1985).

A ICU corresponde a uma área onde a temperatura da superfície é mais elevada do que seus arredores, favorecendo o aparecimento de circulações locais por causa da redução da evaporação, aumento da rugosidade e das propriedades térmicas dos edifícios e dos materiais utilizados na pavimentação das vias de acesso. É no centro das áreas urbanas, nos lugares pobres em vegetação, que as temperaturas atingem valores máximos. Por outro lado, os valores mínimos são registrados em áreas verdes e reservatórios de água (LOMBARDO, 1985).

Uma das grandes modificações causadas pelo ambiente urbano é a drástica substituição das áreas verdes que, tanto na área urbana quanto nas áreas circunvizinhas às cidades, exercem enorme influência no clima local, regional e global (LOMBARDO, 1985). Para Santana (1997) a cidade que privilegia o espaço privado em detrimento do espaço público, geralmente contém um “design” contra e não a favor da natureza, que destrói ao invés de preservar os elementos naturais.

Estas mudanças impostas ao comportamento dos elementos atmosféricos, comandadas pelas modificações na natureza das superfícies ocupadas pelas cidades, interferem no balanço de radiação, estoque de calor, umidade, circulação do ar e emissão de poluentes.

Entre outros fatores, tais características devem-se às mudanças nas propriedades de albedo, condução e emissividade dos materiais empregados na construção civil, ou até mesmo obstrução de certa porcentagem da radiação solar (“sky view factor”) pelos altos edifícios. Este, também, relacionado ao incremento da “rugosidade” da superfície e o aumento da turbulência do ar.

A diminuição da umidade do ar dever-se-ia à supressão de áreas verdes e superfícies líquidas, com a drenagem de pântanos e a canalização de rios e córregos. A emissão de poluentes atmosféricos relaciona-se à queima de combustíveis fósseis, atribuída principalmente a imensas frotas de veículos e concentração de atividades industriais (JARDIM, 2007, p. 62).

Oke (1986) introduziu conceitos para a análise do clima urbano como o sky view factor (relacionado à cobertura da superfície urbana pelas edificações e vegetação urbana), o efeito oásis (frescor derivado de áreas verdes urbanas) e o papel da mistura dos solos na formação da ICU.

Esta anomalia térmica ocorre onde a temperatura de superfície do ar urbano se caracteriza por ser superior à da vizinhança rural, podendo acontecer em diferentes escalas, tanto em localizações dentro da própria cidade – pontos mais quentes que outros - quanto na diferença de temperatura entre a área urbana e rural. Além disso, as ICU variam temporal e sazonalmente (Figura 21).

Figura 21 - Esquema de Ilha de Calor Urbano Fonte: Botkin e Keller, 1995

As ICU são caracterizadas como um fenômeno atmosférico da baixa troposfera cuja ocorrência é diretamente relacionada à presença de grandes áreas urbanas de alta densidade populacional, com escassa vegetação que Influência a sua existência a situação sinótica (temperatura, umidade, velocidade dos ventos, inversão térmica) que altera significativamente sua abrangência superficial, intensidade e efeitos no ambiente urbano (alta densidade das construções, concentração de materiais construtivos de grande potencial energético de emissividade e refletância), a poluição do ar e as enchentes na cidade (LOMBARDO, 1985).

Em seus estudos, Oke (1986) traçou o perfil das ICU dos grandes centros urbanos descrevendo o local da cidade com maior atividade antrópica. Seus resultados apontaram para uma incidência em áreas centrais. Estas se caracterizam

por ser mais quente que os bairros residenciais e periféricos. Esse perfil foi chamado de “clássico das ICU”. O autor destaca o centro da cidade como o pick da ICU. A temperatura vai diminuindo gradativamente conforme aumenta a distância do centro chegando ao que o autor caracteriza por plateau.

O limite entre a área urbana e a área rural é representado pela queda brusca da temperatura, que o autor conceitua como cliff. O pesquisador fez ainda uma síntese dos fatores que causam o fenômeno das ICU e subdividiu em mecanismos da camada superior (boundary layer) e mecanismos da camada limite do dossel (canopy boundary layer).

Pelos estudos de Oke (1986) podem-se separar os principais mecanismos que afetam as camadas: superior e a limite do dossel. A primeira é afetada pelo calor antropogênico provenientes de telhados, aglomeração de telhas e chaminés; calor percorrido da camada dossel; calor excedente do ar pelo processo de convecção; e fluxo de radiação de onda curta que converge com a poluição do ar.

Na segunda os mecanismos que mais afetam incluem: o calor antropogênico das construções; alta absorção de ondas curtas das construções; decréscimo do fluxo de ondas longas perdidas; alto armazenamento do calor pelos materiais de construção civil (armazenam calor durante o dia e liberam calor no período noturno); excesso de calor sensível pela diminuição do fluxo de calor latente; e convergência do calor sensível pela redução da velocidade do vento.

Figura 22 - Albedos de materiais urbanos Fonte: Bias, Baptista e Lombardo, 2003

O ICU é mais verificado em ambientes urbanos, como se observa na Figura

22. Os diferentes padrões de refletividade, ou de albedos, estão condicionados aos

materiais empregados na construção civil. Conforme o albedo, mais radiação será absorvida e mais calor será emitido pela superfície.

Apesar das ICU existirem em diversos centros urbanos, sua intensidade muda segundo as características específicas de cada um deles e conforme o clima, a topografia, o nível e o padrão de urbanização e a localização geográfica. Por isso as estratégias mais eficazes para reduzir os efeitos do aquecimento também devem obedecer às particularidades regionais.

A Metrópole Paulistana, por estar localizada a uma latitude aproximada de 23º21’ e longitude de 46º44’, junto ao Trópico de Capricórnio (23º27’ Sul), faz com que exista uma realidade climática de transição, entre os Climas Tropicais Úmidos de Altitude, com período seco definido, e aqueles subtropicais, permanentemente úmidos do Brasil meridional.

O clima do município de São Paulo é bastante diversificado por causa da altitude, topografia desigual e a influência das massas de ar irregulares, provocadas pelos próprios microclimas ou pelas edificações. Sua área urbanizada é muito extensa, com 1.528,5 Km², com um grande volume de construções irregulares com gabaritos variados e uma concentração de áreas verdes distribuída de maneira também irregular (TARIFA; ARMANI, 2000).

A RMSP está inserida no Planalto Atlântico, um alto platô, com altitude média de 750 m acima do nível do mar. A topografia deste planalto apresenta as mais variadas feições, tais como planícies aluviais (várzeas), colinas, morros, serras e maciços com as mais variadas orientações. O Oceano Atlântico dista 45 km em média do município de São Paulo. Esta localização geográfica explica a frequência de manhãs e noites mais frescas. As quatro estações do ano não são claramente definidas, mas durante alguns dias é possível sentir todas em 24 horas (TARIFA; ARMANI, 2000).

As temperaturas médias anuais variam entre 20ºC e 24ºC, podendo atingir 18ºC ou menos nas regiões elevadas. Durante o verão a temperatura tende a variar entre 30ºC a 32ºC e, nos meses de inverno, a média mínima de temperatura pode variar entre 6ºC e 20ºC, com mínimos absolutos alterando de 4ºC a 8ºC (TARIFA; ARMANI, 2000).

Esse quadro físico define um conjunto de controles climáticos que, em interação com a sucessão habitual dos sistemas atmosféricos, irão dar identidade aos climas locais, produzidos pelos encadeamentos de diferentes tipos de tempo.

Ao tratar de clima urbano em megalópoles como São Paulo, pelo seu imenso e diversificado território torna necessária uma escala menor. Tarifa e Armani (2000) no “Atlas Ambiental do Município de São Paulo” fazem isso, retrataram o clima paulistano baseado em Unidades Climáticas Naturais e Unidades Climáticas Urbanas de São Paulo.

As Unidades Climáticas Naturais foram dividas em climas locais e mesoclimas, com os controles climáticos naturais estabelecidos pelo Oceano Atlântico e pela altitude e pelo relevo com suas diferentes formas e orientações. Assim, instituíram cinco climas locais subdivididos em meso ou topoclimas em função das diferentes características topográficas de cada clima:

I. Clima Tropical Úmido de Altitude do Planalto Paulistano; II. Clima Tropical úmido Serrano da Cantareira Jaraguá; III. Clima Tropical Úmido de Altitude do Juqueri;

IV. Clima Tropical Suboceânico Superúmido do Reverso do Planalto Atlântico;

V. Clima Tropical Superúmido da Fachada Oriental do Planalto Atlântico. As Unidades Climáticas Urbanas foram divididas em quatro macro unidades (Figura 23). Estas unidades podem ser consideradas como “homogêneas” para cada dimensão das relações entre os controles climáticos urbanos (uso do solo, fluxo de veículos, densidade populacional, densidade das edificações, orientação e altura das edificações, áreas verdes, represas, parques e emissão de poluentes) e os atributos (temperatura da superfície, do ar, umidade, insolação, radiação solar, qualidade do ar, pluviosidade, ventilação). Portanto, existe uma série de níveis e dimensões destas unidades hierarquizadas numa “rede” de relações que se definem no espaço (comprimento, altura, largura) e no tempo (sazonal, mensal, diário e horário).

Figura 23 - Unidades climáticas do município de São Paulo Fonte: Tarifa e Armani, 2001, p. 9

Em São Paulo já foram realizadas várias pesquisas sobre as suas ICU sendo principal e pioneiro o estudo de Lombardo (1985). Nesta metrópole, as ICU, ocorrem principalmente no verão e trazem problemas muito mais graves, tais como desconforto, desigualdade socioambiental, aumento de estresse térmico, ampliação de consumo e dos custos de energia para o resfriamento de imóveis e de automóveis, gerando prejuízos ao meio ambiente e à economia.

Os climas de São Paulo são afetados pelo constante crescimento da mancha urbana implicando no desmatamento de áreas verdes e, consequentemente, aumento da temperatura em dias de grande incidência solar. Esta situação agrava as modificações provocadas na natureza das superfícies ocupadas pelo município que interferem no balanço de radiação, estoque de calor, umidade, circulação de ar e emissão de poluentes. O resultado desponta em diferentes temperaturas ocorrendo simultaneamente em diversas regiões da capital paulista (Figura 24).

As ICU em São Paulo são caracterizadas como um fenômeno atmosférico da baixa troposfera cuja ocorrência é diretamente relacionada à presença de grandes áreas urbanas de alta densidade populacional, com escassa vegetação que Influência a sua existência a situação sinótica (temperatura, umidade, velocidade dos ventos, inversão térmica) que altera significativamente sua abrangência

superficial, intensidade e efeitos no ambiente urbano (alta densidade das construções, concentração de materiais construtivos de grande potencial energético de emissividade e refletância), a poluição do ar e as enchentes na cidade (LOMBARDO, 1985).

Figura 24 - As diferentes temperaturas que podem ocorrer simultaneamente em regiões da capital Fonte: Lombardo, 1985

De modo geral, a RMSP (Figura 25) é composta por um mosaico de temperaturas de superfície diferenciadas como o município de São Paulo. Os mesmos fenômenos que caracterizam os mesoclimas urbanos existem em menor escala espalhados por toda a Região – ICU, inversões térmicas localizadas, bolsões de poluição e diferenças locais nos comportamentos dos ventos.

Figura 25 - Micro Climas de São Paulo Fonte: OESP, 2007, p. C4

Esta condição climática e o crescimento da mancha urbana, além da ausência de um planejamento em prol da população e não para um grupo de investidores, acaba provocando situações de vulnerabilidade climática que pode se agravar. Estas questões serão abordadas no próximo capítulo.

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