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Além do desequilíbrio causado pela distribuição irregular de água no mundo, outro fator que vem ameaçando as reservas naturais e a capacidade de abastecimento em muitas regiões do planeta é a atividade humana. A disponibilidade da água está estritamente relacionada a sua capacidade de renovação através do ciclo hidrológico, no entanto, esta potencialidade está, cada vez mais sendo afetada pela intervenção do homem, comprometendo severamente a produção e a conservação da qualidade da água disponível (ANDREOLI et al., 2003).

Com a retirada da cobertura vegetal das bacias hidrográficas, ocorre à redução da infiltração da água no solo e o aumento do escorrimento superficial, limitando a alimentação dos lençóis subterrâneos e das várzeas, reservas que garantem a descarga dos rios durante estiagens, ao mesmo tempo em que acelera a velocidade de escorrimento superficial, aumentando o processo erosivo, e conseqüentemente o assoreamento e poluição dos cursos d´água (ANDREOLI et al., 2003).

Marengo (2003) concordando com o autor citado acima, destaca que existem estudos em bacias hidrográficas que apontam para um aumento no escoamento superficial após

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acontecer um desmatamento geralmente devido à redução de evapotranspiração e infiltração de água no solo.

Collischoonn (2001) avaliou o uso do solo na Bacia do rio Taquari, afluente do rio Jacuí, no Rio Grande do Sul, que é vizinho da cabeceira do rio Uruguai, e constatou um aumento no escoamento deste de 9% em função do uso do solo. O referido autor também utilizou os parâmetros do modelo do rio Taquari para análises no rio Uruguai, adequando-os a este, e concluiu que as duas bacias apresentam características semelhantes. Em seu modelo experimental, transformando a bacia de floresta para culturas agrícolas anuais, o aumento do escoamento foi de 14,4%, e quando transformado para pasto foi de 13,2%. O mesmo autor afirma ainda que o impacto atual do uso do solo na região até o ano de 2001 já havia apresentado 69% do impacto máximo que o ambiente pode sofrer.

Em experimento realizado pelo Projeto ABRACOS no período de 1992 a 1995 na Floresta Amazônica, foram analisadas as alterações da quantidade de chuvas ocorridas em diferentes usos do solo. Os autores chegaram a conclusão de que possivelmente devido as modificações na cobertura vegetal, a precipitação foi em média 28% maior na floresta do que em áreas com pastagem (FERREIRA DA COSTA et al., 1998).

O aumento do escorrimento superficial altera a dinâmica dos rios, aumentando os picos de cheia durante as épocas de chuva e reduzindo as vazões nos períodos de estiagem (ANDREOLI et al., 2003). Estima-se que hoje, 30% das maiores bacias hidrográficas do mundo perderam mais da metade da cobertura vegetal original certamente com redução significativa da quantidade de água produzida (TEICH, 2002 apud ANDREOLI et al., 2003).

Tucci e Clarke (1998 apud Marengo, 2007) perceberam que este incremento na vazão dos rios aconteceu depois de grandes áreas terem experimentado o desmatamento ou mudanças no uso do solo. Ao substituir as florestas por pastagens ou culturas agrícolas, o desmatamento modifica as interações físicas e químicas entre o solo, a vegetação e a

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atmosfera. Isso significa que a derrubada, quando atinge grandes extensões pode provocar sensíveis mudanças no clima (MARENGO, 2003).

O regime hídrico é diretamente afetado pela dinâmica e manejo da cobertura florestal, podendo contribuir tanto para sua perfeita manutenção e circulação no Planeta ou ainda para sua indisponibilidade. A dinâmica da vegetação inclui mudanças naturais (fatos normais do ecossistema, que não comprometem a disponibilidade normal de água) e as antrópicas (sendo o desmatamento a prática mais comum). Entre as diversas funções que a vegetação tem influência direta, está a proteção dos mananciais e a produção de água. Sua retirada tem efeito direto sobre a resposta hidrológica de uma determinada bacia, comprometendo a produção de água de uma determinada região (LINHARES et al., 2005).

A vegetação representa um obstáculo ao escoamento da água, diminuindo sua velocidade, permitindo maior tempo de infiltração no solo e maiores taxas de absorção (WARD, 1967 apud LINHARES et al., 2005).

Prado (1996) afirma que a vegetação natural é um importante indicador da disponibilidade hídrica no solo. Lino e Dias (2003) reconhecem que existe uma relação de interdependência entre a floresta e o ecossistema aquático, e que a degradação ou escassez de um perturba profundamente a existência e a qualidade do outro, porém para eles as bases científicas e a dimensão desta relação não são amplamente conhecidas e avaliadas. Há a necessidade de mais estudos que aprofundem o assunto.

Ainda segundo os autores citados no parágrafo anterior, a maneira mais fácil para entender a relação água-floresta é conhecendo o ciclo hidrológico na floresta. A água da chuva que se precipita sobre a mata, segue dois caminhos: volta à atmosfera por evapotranspiração ou atinge o solo, através da folhagem ou do tronco das árvores. Na floresta, a interceptação da água acima do solo garante a formação de novas massas atmosféricas úmidas, enquanto a precipitação interna, através de pingos de água que atravessam a copa e o

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escoamento pelo tronco, atinge o solo e seu folhedo. De toda a água que chega ao solo, uma parte tem escoamento superficial, chegando de alguma forma aos cursos d’água ou aos reservatórios de superfície. A outra parte sofre armazenamento temporário por infiltração no solo, podendo ser liberada para a atmosfera através da evapotranspiração, manter-se como água no solo por mais algum tempo ou percolar como água subterrânea. De qualquer forma, a água armazenada no solo que não for evapotranspirada, termina por escoar da floresta paulatinamente, compondo o chamado deflúvio, que alimenta os mananciais e possibilita os seus usos múltiplos. O processo de interceptação da chuva pela floresta, além de afetar a redistribuição da precipitação e a economia da água no solo, desempenha significativa influência sobre a qualidade de água. Isto é particularmente evidenciado quando da remoção da cobertura florestal (Lima, 1986 apud LINO e DIAS, 2003).

De acordo com Braga et al. (2005) neste ciclo a presença do homem pode ser notada por meio de desmatamento e da impermeabilização via pavimentação do solo, acelerando assim a evaporação e reduzindo a recarga de aqüíferos subterrâneos gerando uma série de danos físicos, econômicos e transtornos aos habitantes da cidade. O avanço da urbanização e a devastação da vegetação influenciam significativamente na quantidade de água infiltrada em adensamentos populacionais e zonas de intenso uso agropecuário (KARMANN, 2000). Para Andreoli et al. (2003) em áreas rurais um dos principais problemas é a redução do potencial hídrico em função do desmatamento, da degradação estrutural do solo e do aumento da evapotranspiração, fatores que reduzem a infiltração, a recarga dos solos e dos aqüíferos subterrâneos, aumentando o escorrimento superficial e a erosão no âmbito das bacias hidrográficas.

A capacidade de infiltração depende do tipo e do uso do solo. Normalmente a capacidade de infiltração de solos com floresta é alta, o que produz pequena quantidade de escoamento superficial. Para solos com superfície desprotegida que sofre ação de

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compactação, a capacidade de infiltração pode diminuir dramaticamente, resultando em maior escoamento superficial (TUCCI, 2003). Ainda de acordo este autor, existe atualmente diversos modelos climáticos que sugerem um aumento na freqüência de chuvas torrenciais em algumas regiões do Planeta. Se isto for realmente confirmado, poderá provocar um aumento nas inundações e escoamento, reduzindo as possibilidades de infiltração de água no solo.

Em estudos realizados pelo Projeto de Experimentos de Larga Escala da Biosfera – Atmosfera na Amazônia (LBA) em Rondônia sobre a relação entre desmatamento e recursos hídricos, observou-se que em regiões de topografia baixa e sem floresta choveu 5% a menos do que em regiões baixas com floresta e 20% a menos do que em regiões altas com florestas (SILVA-DIAS et al., 2005).

Pesquisas realizadas por Nobre (2001 apud Silva-Dias et al., 2005) indicam que uma substituição total da Floresta Amazônica por pastagens levaria a uma redução na precipitação, tendo em vista que o balanço local de vapor da água é mantido em aproximadamente 50% pela evapotranspiração local. O autor indica também, que houve um aumento na duração da estação seca da Amazônia. Seus resultados sugerem que uma rápida e completa destruição da floresta pode ter efeitos irreversíveis no ciclo hidrológico da região.

Avissar et al. (2002 apud SILVA-DIAS et al., 2005) sugerem que inicialmente o efeito do desmatamento pode ser de intensificar os gradientes horizontais de temperatura induzindo um aumento de chuvas associado às circulações locais. O aumento pode existir enquanto o suprimento de vapor da água for suficiente para manter a chuva e o desmatamento não atingir grandes áreas.

A redução da cobertura florestal causa, em curto prazo, aumento da disponibilidade de água na bacia. Ou seja, o reflorestamento ou o desenvolvimento de vegetação secundária em áreas abandonadas promove o decréscimo da disponibilidade de água na bacia (BOSCH; HEWLETT, 1982 apud LINHARES et al., 2005).

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Leopoldo et al. (1993 apud FERREIRA et al., 2005) em experimento realizado na Amazônia, constataram que a transpiração das plantas é responsável por 61,8% do balanço hídrico, indicando que um desmatamento intensivo deverá trazer profundas alterações no ciclo hídrico regional. Este poderá diminuir drasticamente a evapotranspiração, com conseqüências diretas no balanço de água e na radiação solar, levando a expectativa de mudanças importantes nas condições climáticas da região.

Nas ultimas décadas a bacia do Prata, da qual o Rio Uruguai é um dos tributários, sofreu um aumento intensivo de desmatamentos e mudanças no uso do solo. Existem evidências que estas atividades modificaram as características termodinâmicas da baixa atmosfera. Estas mudanças são resultados de complexas interações entre o clima, hidrologia, vegetação e o gerenciamento dos recursos hídricos e da terra. Existem evidências de que as mudanças no uso da terra nas bacias dos rios Alto Paraná, Paraguai e Uruguai podem ter contribuído para o aumento de 28% no fluxo médio do rio Paraná, deste 1970 (MARENGO, 2007).

Atualmente, praticamente já não há mais florestas nativas intactas no oeste catarinense. Estas foram removidas basicamente para a instalação das lavouras produtoras de grãos e construção civil , restam raras glebas com floresta nativa primária, estimada em menos de 5% da área. Em escala maior, ocorre a floresta nativa secundária, estimada em 15% da área (TESTA et al, 1996). Esta situação pode estar vinculada a estiagem prolongada / seca que vem ocorrendo nos últimos anos na área de estudo.

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