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Cocaína

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CAPÍTULO 2 CONCEPÇÃO HUMANA: ASPECTOS HISTÓRICOS E CUL-

2.2 Contexto histórico cultural das drogas

2.2.1 Cocaína

O nome da planta coca é derivado do Inca Cuca ou do Aymaran Khoka, que significa “A Árvore” (ROCHA, 1993, p.19), que exerceu grande influência sobre diversas culturas nativas e foi monopolizada por muito tempo pelos Incas para uso palaciano. É um arbusto que pode atingir dois metros de altura, adapta-se em solos argilosos em temperatura média de 20ºC.

Desde os tempos dos Incas a coca era considerada uma divindade: “Dizia a lenda que os Filhos do Sol presentearam o homem com a folha da coca para satisfazer a fome, outorgar novo vigor aos cansados e aos fracos e fazer os infelizes se esquecerem de suas misérias” (ISM – INSTITUTO SOCIAL MORUMBI, 1971, p.69;71). Consta que durante o Império dos Incas, a folha de coca era reservada às classes superiores, “reservadas exclusivamente para a corte e outorgadas os servos como prêmio” (ESCOHOTADO, 1997(b), p 27) e, com a queda do Império, a partir de crises políticas, econômicas e principalmente sociais, o costume de mascar a folha espalhou-se pelos camponeses.

Mesmo tendo sido conhecida pelos europeus nos primeiros anos da colonização espanhola, as folhas de coca não conseguiram popularidade nesse continente até o século XIX, quando passou a fazer parte da fórmula de estimulantes e anestésicos, ideais para exaltar o humor, espantar a depressão e “deixar as damas plenas de vivacidade e charme” (ESCOHOTADO, 1997(b), p 154), publicadas nas principais revistas médicas da época e que passaram a ser vendidas livremente e consumidas em cafés e restaurantes, elogiadas por pessoas ilustres como: Julio Verne, Sigmund Freud, que usou a droga durante mais de uma década e o Papa

Leão XIII que no ano de 1878 foi eleito sucessor do Papa Pio IX (SANCHEZ,1982, p.40).

A monografia do então desconhecido cientista Sigmund Freud “Über Coca”, de 1884, fez o primeiro estudo sobre os efeitos da cocaína. Louvava a capacidade da substância de elevar o humor, combater transtornos gástricos, asma, além de ser afrodisíaca e um anestésico local. Freud defendia seu uso como terapia para o tratamento de alcoólatras e farmacodependentes da morfina7, ao descrever seus efeitos excitantes e eufóricos. Nesta mesma época, ministrou a cocaína no tratamento do seu amigo Ernest Von Fleischl que tornou-se dependente em morfina. Não obteve êxito, pois Ernest morreu vítima e arruinado pelo uso da cocaína quatro anos depois do início do tratamento. Este acontecimento fez com que Freud retirasse seu apoio à terapia com o uso desta droga em outro escrito, passando a se dedicar à psiquiatria, onde se tornou famoso (ROCHA,1993,p.21 ).

O refrigerante Coca-Cola fabricado em 1885 e lançado em 1890 era produzido a partir de folhas de coca e anunciado como “marcante agente terapêutico” para a melancolia, um remédio supremo, “ a pausa que refresca”. Em 1906, o fabricante mudou a fórmula do refrigerante passando a usar cafeína como ingrediente ativo, substituindo a cocaína, mas o nome da bebida continuou o mesmo (ROCHA, 1993, p. 21 ).

Em 1914, o Congresso Americano apontou a ilegalidade da cocaína, tornando seus usuários sujeitos às mesmas penalidades do ópio e da heroína. A campanha contra esta droga ensejou a primeira lei contra seu uso, o chamado Harrison Act, que visava legitimar a repressão aos negros norte-americanos.

A associação entre negros e cocaína foi produto de uma campanha dos políticos conservadores sulistas, líderes do movimento proibicionista, que “disseminavam a idéia de que os homens negros, sob efeito da cocaína, tendiam a violentar mulheres brancas” (CARLINI-COTRIM,1998,p.22).

A partir de então, seu uso foi diminuindo até que em 1930 surgiram as anfetaminas com efeitos semelhantes, mais baratas e legais. Entretanto, no momento em que elas passaram a ser controladas e entregues à ilegalidade, a cocaína começou a ser produzida em grande escala, importada e distribuída

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Chamada assim em homenagem a Morfeu, substância isolada como componente do ópio no início do século XIX. O primeiro emprego maciço do fármaco ocorreu na guerra civil americana (1861 - 1865) – Escohotado, Antonio, O livro das drogas ,usos e abusos e preconceitos, São Paulo: Dynamis, 1997, p.63.

novamente, só que controlada pelas organizações de tráfico de drogas, movimento que permanece nos dias atuais.

De 1968 à 1975, período mais violento da repressão política no Brasil, havia uma ligação entre o uso de drogas, principalmente as alucinógenas, e a rebelião libertária dos jovens que disseram “não” ao sistema estabelecido e tentaram criar um estilo de vida alternativo e despojado, os hippies, conhecidos através do movimento de contracultura, negavam o nacionalismo e abraçavam aspectos religiosos do budismo e do hinduismo. As drogas eleitas por esta geração foram a maconha e o LSD. A cocaína, apesar de não ter sido escolhida como a principal, não deixava de ser usada mesmo sendo de alto custo.

Nos anos 1980 veio o susto, substâncias que antes representavam a idéia de “paz e amor” passaram a ser vinculadas às palavras violência, tráfico e morte. Paralelamente, a cocaína apresenta-se como um estimulante basicamente urbano e por ser de alto custo no início desta década, ficou associada como a “droga das elites”, mais especificamente à geração yuppie, que surge com ideologias opostas ao movimento hippie, conforme expressado por Alfredo Toscano Junior: “Esta geração de jovens profissionalmente bem sucedida e integrada ao sistema consumista, inalavam-na para dar-lhes energia e ambição social que eram os principais atributos para esses jovens executivos” (TOSCANO, 2000, p.17).

No início dos anos 1990, “a cocaína popularizou-se com o preço mais acessível, atingindo nas camadas sociais mais baixas, faixas etárias cada vez menores” (TOSCANO, 2000, p.17). Sob o prisma da ilegalidade, como um problema de âmbito judicial, é uma questão a ser resolvida no espaço social e sanitário por envolver aspectos psicológicos, políticos e, no que diz respeito à esta dissertação, educativo.

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