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V. 4 Entrevistas

V.4. d1 – Cocama

Com relação ao método empregado na captura de abelhas, ficou evidente a preferência de algumas ferramentas em relação a outras, pelos índios (Tab.

XVI). Constata-se que os Cocamas utilizam para cortar árvore, com bastante

freqüência, o machado. Com freqüência menor, mas quase sempre associado ao machado, figurou o terçado e, raramente, fazem uso da moto-serra. É provável que não utilizem com freqüência a moto-serra por demandar combustível o que acrescentaria mais um item de despesa. Outro inconveniente pode ser a dificuldade do transporte da moto-serra pelo mato devido ao seu tamanho e peso.

No passado, após o corte da árvore e a colheita do mel, o restante do ninho e da colônia com as abelhas eram abandonados no local da derrubada da árvore, evidenciando o não aproveitamento das abelhas e o desconhecimento de técnicas de manejo. O Informante 14 ilustra bem isso quando fala: “Foi assim

que nóis tiremo primeiro um ninho tava num ajuri ali no centro aí peguei um ninho de abelha, mas ninguém sabia de nada, só tiremo a colmena, o mel assim, aí nóis deixamo estragar aí, ninguém sabia de nada como é que tava fazendo, aí estragou aí assim.”. Nesta fala a palavra “ajuri” significa

mutirão, reunião de pessoas para realizar determinado trabalho.

Desde a implantação do projeto, essa metodologia tem mudado. Ao comparar a fala do informante 14 (parágrafo anterior) com as falas a seguir foi possível verificar o contraste e a mudança de comportamentos em relação a retirada do mel e aproveitamento das abelhas:

Informante 5 – “Por exemplo, eu vi que ele fez o seguinte: ele cortou,

derrubou o pau, aí depois ele derrubou e ele cortou, fez tipo um... torou o pau e aí ele trouxe com tudo. E outro dia ele foi também num outro ninho ele cortou e só fez transplanta du, da madeira, do pau, pra caixa. Lá mesmo

ele fez o transplante. Ele procurou a rainha e colocou na caixa, aí botou tudo e fez o transplante e veio embora.”.

Informante 16 – “A primeira vez que eu tirei eu tirei já pra fazer a

transferência que inclusive eu achei tinha mel pra cá na ponta direita e na ponta esquerda também, tinha mel nos dois lugares, tava bem cheio de mel, aí a gente fez três transferência né, que seja só de um pau.”.

Informante 21 – “A vez quando um... assim andando no mato né, atras

de caça, as vez atrás de a roça deles, vez quando vai passando assim no pau fica olhando porque onde que eles estão, tem assim eles estão sonando né... Tão sonando aí eles. As vezes tem uma eles tão choonnnnn, que eles tão... “Choonnnnn” Aí diz... aí tem, nóis chamamo, aí tem colmena, bora tomba esse pau aí bora tira, aí tira o pau abaixo, aí então que eles tão, aí corta bem assim e saca assim, e aí tá com casa deles né aí vai tirando, agora não sei assim... tora o pau assim donde tá ele e puxa pra traze pra cá... pra colocar aqui na caixinha.”.

Informante 24 – “Ele tirou pra colocar na caixinha né, de abelha. Eu vi

ele derrubou o pau e abriu aonde tava os mel aí colocou os discos de cria na caixinha.”.

Os índios Cocama já começam a se preocupar com a captura de enxames para transferência para caixas racionais. Com o trabalho de educação ambiental, paralelo ao treinamento sobre manejo de meliponíneos, foi possível reduzir a freqüência de captura de ninhos que se traduziu na diminuição do número de troncos existentes nas residências de alguns comunitários (Tab. X). Atualmente, recomenda-se a captura de um ninho da floresta em casos excepcionais, como por exemplo, quando da queda de uma árvore que tenha sido atingida por um raio ou que tenha caído por morte natural e que abriga um ninho de abelha sem ferrão. Outra situação em que se recomenda a captura de ninhos é durante o estabelecimento de uma área de roçado, quando várias árvores são cortadas e

dessa forma os ninhos das abelhas podem ser poupados e transferidos para caixas racionais.

Embora exista o desenvolvimento de todo um trabalho de sensibilização sobre a necessidade de se criar abelha de forma racional, o que se observa na região é uma grande corrida para obtenção de colméias da natureza. O informante 4 quando perguntado se já tinha ouvido falar de alguém que vendia mel na região respondeu: “Não ouvi, mas eu... ali tem aquela comunidade que

tão criando também, mas num sei se tão vendendo mel.” Em uma visita a

essa comunidade vizinha, constatou-se a criação rústica de abelhas sem ferrão, ora em cortiços com janelas para abertura periódica, ora em caixotes inadequadas, com espessura interna muito fina. Foi realizado um convite de cooperação entre os meliponicultores Cocama e o grupo dessa pequena comunidade que criava abelhas. O patriarca de uma das famílias que possuía alguns cortiços reagiu de forma hostil a nossa intenção de esclarecer o prejuízo à natureza com o manejo inadequado das abelhas. Constatou-se que vários enxames dessa comunidade estavam fracos e segundo relatos de alguns dos seus criadores: “As abelhas fugiram!”.

As ilhas fluviais, comuns na região do Alto Solimões, representam um manancial de ninhos de meliponíneos, constatado tanto por visitas quanto por narrativas dos informantes. Podemos ilustrar isso com a fala do informante 7: “Na vaxia, do outro lado, na ilha. Porque lá é que tem muito... Aqui não

quase tem, uma ainda a gente encontra de vez em quando, lá é que tem...”

Na fala desse informante, “vaxia” significa várzea. Devido às dificuldades de acesso a essas ilhas, esses enxames naturais podem ter um sucesso adaptativo maior, por serem menos predados do que em terra firme, próximo das comunidades. Mas essa situação parece estar ameaçada porque é muito difícil sensibilizar os indígenas para que compreendam que o custo para se obter um enxame dessa forma é muito maior que o seu benefício para a natureza ou para o próprio meliponicultor.

Para a colheita do mel é comum o uso de uma vasilha de plástico ou alumínio ou até mesmo um balde. Somente um dos informantes (23) mencionou a não utilização de vasilhas, afirmando que os homens estão acostumados a improvisar “tigelas” com folhas de algumas plantas para serem utilizadas no momento de colher o mel, para beber. Vale ressaltar a fala desse informante: “Às vezes tem copo mais ou menos o pessoal assim quando anda no mato as

folha aí quando eles têm aí sempre assim eles fazem assim tipo uma tijela. A pessoa vai aí derramar o mel aí, daí a pessoa bebe aí, tem vontade de beber, pode beber aí.”.

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