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Cognição, Potencial Evocado Auditivo (P300) e Dor crônica

CAPÍTULO 1 (Aspectos teóricos, justificativa e objetivos)

1- INTRODUÇÃO

1.4 Cognição, Potencial Evocado Auditivo (P300) e Dor crônica

O Potencial Evocado Auditivo de Longa Latência (P300) pode ser uma ferramenta eficaz para avaliar a cognição em pacientes com dor crônica (PINHEIRO et al., 2016; VELDHUIJZEN et al., 2006). Os potenciais evocados são respostas elétricas do sistema nervoso à estimulação auditiva específica; estão sendo utilizados nas pesquisas atuais como um instrumento de

investigação do processamento da informação (codificação, seleção, memória e tomada de decisão) e na avaliação dos distúrbios cognitivos, neurológicos, comportamentais e psiquiátricos (PEDROSO et al., 2012; TSOLAKI et al., 2015; VAN DINTEREN et al., 2014).

O potencial cognitivo P300 é gerado por uma rede neural complexa, envolvendo conexões aferentes, eferentes, estruturais corticais e subcorticais, como córtex pré-frontal e centro-parietal, tálamo, hipocampo e região límbica, responsáveis pela detecção, sensação e discriminação do estímulo acústico e pelo estado de alerta, atenção e memória (CÓSER et al., 2010; JIANG et al., 2015).

O potencial evocado é gerado a partir da discriminação de um estimulo auditivo raro dentre outros frequentes de mesma modalidade. Para a aplicação do exame, eletrodos são colocados na linha do couro cabeludo e após o estímulo auditivo raro uma onda é gerada a partir de sinais eletroencefalográficos. Solicita-se que ao identificar a ocorrência dos estímulos raros os pacientes realizem uma tarefa motora ou mental. Os estímulos raros podem representar de 15% a 20% do total de estímulos gerados (MIRANDA et al., 2012; DINTEREN et al., 2014).

A interpretação dos dados ocorre através das medidas de latência e amplitudes das ondas (JIANG et al., 2015; MIRANDA et al., 2012). Os potenciais evocados auditivos podem ser nomeados como P100, N100, N200 e P300 conforme as características da latência das ondas que são geradas. A latência refere-se ao intervalo de tempo decorrido entre o início do estímulo e a resposta da onda, descritos em milissegundos (ms). A amplitude é a medida do pico positivo até o pico negativo que se segue, expressa em microvolts (MIRANDA et al., 2012). O potencial P300 será considerado como sendo a maior amplitude média, no intervalo entre 300 e 600ms após o estímulo auditivo, sendo assim quanto maior a amplitude e menor a latência, melhor os resultados do processamento cognitivo.

A Figura 1 representa as ondas provenientes do eletroencefalograma, destacando a terceira onda positiva, designada como P300. A Figura 2 apresenta a posição de alguns eletrodos no couro cabeludo.

Figura 1 Ilustração das ondas provenientes do Potencial Evocado Auditivo.

(Fonte http://what-when-how.com/information-science-and-technology/current-practices-in- electroencephalogram-based-brain-computer-interfaces-information-science/ ).

Figura 2- Ilustração da posição dos eletrodos no couro cabeludo.

(Fonte: http://what-when-how.com/information-science-and-technology/current-practices-in- electroencephalogram-based-brain-computer-interfaces-information-science/).

Uma revisão sistemática recente que tinha como objetivo avaliar o uso do potencial evocado em idosos saudáveis identificou que a maioria dos estudos selecionados buscou avaliar e determinar a influência da idade no P300, observando que os indivíduos com idades mais avançadas apresentavam maiores valores na latência e diminuição da amplitude. Os resultados encontrados mostraram que os valores da amplitude do P300 variam entre 2,2 µV a 18,5 µV e os valores de latência de 320 ms a 484 ms, em idosos saudáveis. Os autores enfatizam que as variações nos valores podem ser explicados pelas diversidades das populações estudadas e pelos métodos que cada estudo utilizou. (PAVARINI et al., 2018).

Uma pesquisa realizada no sul do Brasil com idosos identificou que o tempo médio da latência do P300 aumenta segundo as faixas etárias, sendo que a média dos participantes de 60 anos foi 337,2 ms; no grupo de 65 anos foi 351,8 ms e na faixa etária dos 70 anos foi 370,1 ms. Os resultados também demonstraram por meio da regressão linear que os valores da latência aumentaram 2,85 ms por ano de idade (CÓSER SANTOS et al., 2008.)

Com relação à utilização do P300 como ferramenta para diagnóstico de demência em idosos, alguns estudos apontam a utilização desse método como um instrumento complementar a outros tradicionais que são utilizados (PAVARINI et al., 2018, PEDROSO et al, 2012). Um estudo de revisão sistemática que tinha como objetivo analisar os valores de latência e amplitude do P300 em idosos com Doenças de Alzheimer (DA) identificou que nesses pacientes observa-se um aumento da latência, mas não foi possível verificar uma relação com a amplitude (PEDROSO et al., 2012a).

Os resultados de uma meta-análise com o objetivo de investigar se o P300 é um marcador neurofisiológico útil para identificação do Comprometimento Cognitivo Leve (CCL) e da sua progressão identificou, por meio da avaliação de 13 estudos, que houve diferença nos valores da latência entre os participantes com CCL, DA e os indivíduos saudáveis, concluindo que o P300 pode ser uma ferramenta útil para avaliação desses pacientes (JIANG et al., 2015).

Na literatura também são encontrados estudos que utilizam o P300 para avaliação do processamento cognitivo em indivíduos com dores crônicas (TITLIC et al., 2015; VELDHUIJZEN et al., 2006; WANG et al., 2014). Uma pesquisa desenvolvida na Croácia com 29 pacientes com enxaqueca crônica e 29 controles observaram que 62% dos participantes com enxaqueca apresentaram alterações do P300 sugerindo possíveis distúrbios do processamento cognitivo; a amplitude do grupo com dor crônica foi reduzida quando comparado ao grupo controle. Com relação à latência, não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos (TITLIC et al., 2015).

Um estudo realizado na China com indivíduos adultos observou por meio do P300, que os pacientes que relataram dor apresentaram amplitudes diminuídas quando comparado ao grupo controle, com diferenças estatisticamente significativas. A comparação da latência entre os grupos não apresentou diferenças estatísticas (WANG et al., 2014).

Uma pesquisa realizada com 14 adultos com dor crônica e 30 sem dor em que foram avaliados por meio dos potencias evocados analisando os canais Fz, Cz, Pz e Oz. O teste aplicado referia-se a uma tarefa para avaliar a atenção na qual o nível de dificuldade durante o teste era modificado para condições fáceis e difíceis. Os resultados demonstraram que os indivíduos com dor crônica apresentaram uma maior taxa de erros no teste de atenção quando comparados com o grupo controle, porém não apresentaram diminuição na resposta a estímulos irrelevantes, sugerindo comprometimento da alocação de recursos atencionais nesse grupo com dor (VELDHUIJZEN et al., 2006).

Dessa maneira, observa-se que o P300 é uma ferramenta eficaz para avaliar a cognição de indivíduos com dor crônica e que associado aos instrumentos de avaliação cognitiva possibilitam um método aprimorado na utilização em estudos a fim de avaliar a relação entre dor crônica e desempenho cognitivo.

2 – RELEVÂNCIA E JUSTIFICATIVA DO ESTUDO

Diante dos dados expostos, acredita-se que a temática cognição e dor crônica é relevante e deve ser explorada, uma vez que os estudos transversais e/ou longitudinais não apresentam um consenso sobre a influência da dor crônica no desempenho cognitivo, e principalmente, como estas variáveis se comportam em idosos que cuidam. O ato de cuidar pode desencadear e favorecer consequências para a vida do indivíduo, em pessoas idosas este ato pode apresentar peculiaridades que ainda não foram totalmente exploradas, Assim, estudos que aprofundam o conhecimento sobre esta população são necessários dado o aumento significativo nos últimos anos de idosos que realizam o cuidado a outro idoso.

TERASSI et al. (2017) não observaram diferenças no desempenho cognitivo de idosos cuidadores com dor crônica e ausência de dor, porém este estudo não verificou se existe influência do cuidado nessa relação, não foram avaliados idosos não cuidadores para confirmar se o ato de cuidar é uma variável de influência. Hipotetizando que o cuidado é uma variável de influência para esses resultados, outra questão levantada pelos autores que ainda não foi estudada é a influência do tempo nesse processo, ou seja, se o declínio cognitivo dos idosos com dor crônica acentua-se ao longo do tempo.

Diante dessas indagações, da escassez de pesquisas e da importância em se estudar idosos que são cuidadores e referem dor crônica, justifica-se a realização deste estudo com o intuito de responder as seguintes perguntas de pesquisa: o desempenho cognitivo difere entre os grupos de idosos cuidadores e idosos não cuidadores com e sem dor crônica? Ao longo de quatro anos o desempenho cognitivo sofre maior declínio no grupo de idosos cuidadores com dor crônica?

Desta maneira, acredita-se que avaliar o desempenho cognitivo e a dor crônica em idosos cuidadores brasileiros e explorar o conhecimento sobre essa temática possa contribuir para um melhor conhecimento científico da relação entre cognição e dor crônica, além de contribuir para um planejamento da

assistência de saúde nessa população, bem como salientar a importância do manejo adequado da dor crônica em idosos.