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Fonte: Almir Batista da Silva, dez. 2010.

Dando sequência, os alunos de mãos estendidas para o centro do círculo repetem o juramento de fidelidade à etnia Potiguara em língua tupi. Esse juramento tem como objetivo conscientizar cada formando indígena sobre sua missão, sua dimensão enquanto cidadão indígena de portar-se dignamente em qualquer lugar e de retornar para a comunidade, colocando em prática seus conhecimentos, seja como médico, engenheiro, professor, etc. A visão indígena é preparar seus filhos para beneficiar a etnia.

Em seguida, a direção da escola começa a entregar os certificados para os concluintes. Terminado esse momento, prolonga-se o ritual com a dança do Toré, conforme a foto abaixo.

Foto 09 - Colação de grau 3ª série

Fonte: Almir Batista da Silva, dez. 2010.

A última etapa é abrigar todas as pessoas nas barracas de palhas que existem nas margens do mangue, para o almoço de confraternização. Formam-se as filas e começa a distribuição do almoço. Concluído esse momento, retornam para os ônibus, que os levam de volta para as respectivas aldeias.

O ritual para os recém-formados implica em gratidão para com o sagrado, que durante a sua existência ajudou a vencer obstáculos, e a passar de uma etapa do estudo para outra. “Perante o sagrado, o ser humano percebe-se limitado, relativo, efêmero, dependente.” (VILHENA, 2005, p. 59). Sem a ajuda dos espíritos dos antepassados, esse momento único jamais teria chegado. Também é momento de agradecimentos e louvores onde as personagens podem exclamar do fundo da alma: obrigado! O contato com nosso pai Tupã e nossa mãe

Terra nos darão forças para prosseguirmos nos livrando de todos os perigos; quero retribuir vivendo como indígena e lutando pelo meu povo. (JULIANA, informação verbal, aldeia São

Francisco, dez. 2010).

Outro depoimento revela: Eu estou muito feliz, mesmo com toda a dificuldade ter

chegado até aqui; e quero não parar, vou fazer vestibular e poder contribuir de um jeito ou de outro com a minha comunidade. (RUBENILDO, informação verbal, aldeia São Francisco,

dez. 2010).

O depoimento da direção da escola indígena traz a seguinte impressão: Realmente é

um momento muito significativo para mim quanto direção, ver mais uma turma formada, e termos cumprido a missão de preparar essas pessoas para a vida. (ROBERTO - Diretor,

informação verbal, aldeia São Francisco, dez. 2010). A vice-diretora Nilda (dez. 2010) complementa o pensamento, dizendo: Esse momento é muito importante, mais uma turma

concluiu. Eles sabem o que aprenderam. Portanto, possuem responsabilidade para com a aldeia de usarem o que sabem para o bem daqui e não abandonarem seus costumes e tradições.

O ritual fortalece os valores indígenas e desperta a responsabilidade que carregam sobre seus ombros, de serem indígenas e de não se afastarem de suas crenças e dos seus valores culturais.

O próximo tema também tem como eixo principal o Toré. Já é uma tradição no dia 19 de abril os indígenas realizarem diversas atividades de mobilização e de conscientização sobre a cultura Potiguara.

3.3 O ritual Toré do dia 19 de abril

Para o indígena Potiguara, o dia 19 de abril, Dia do Índio, tem um duplo significado:

É momento de muita tristeza, pra quem compreende, esse dia foi criado pelo Governo Federal como um pedido de desculpas aos índios, pela matança de antigamente. Mas também é momento de festejo na roda de Toré, de fortalecimento, de encontrar os parentes que moram distantes. E que o dia do índio não é só 19 de abril, dia do índio é todo o dia, todo o dia estamos na luta, reivindicando, cobrando, não é só 19 de abril, não (CHICO URUBU, informação verbal, aldeia São Francisco, maio 2010).

Momento de reflexão quanto ao passado, de marcha e luta no presente e agora de alegria, de confraternização. Na medida em que se aproxima o dia 19 de abril, as atenções são voltadas para o terreiro sagrado, local onde geralmente acontece o ritual do Toré. Para esse momento há uma mobilização da maioria da outras aldeias, preparam as caravanas e vêm a São Francisco para juntos se alegrarem. Há Torés de forte expressão em outras aldeias, porém nosso foco neste trabalho está voltado para a aldeia mãe.

3.3.1 Os preparativos do ritual do Toré

Em São Francisco, enquanto o dia 19 de abril não chega, há uma expectativa na comunidade. Quando se encontram, perguntam uns para os outros, seja em viagens, à margem dos rios, lavando roupas ou durante os eventos da igreja: Com que traje vai a festa? Como vai

muitas as perguntas feitas uns para os outros, na expectativa de brincar, de agradecer, de se confraternizar, de reivindicar seus direitos e mostrar a força da cultura Potiguara. Nesse dia, estão juntos, em um mesmo espaço, indígenas de várias aldeias e, até mesmo, daquelas mais distantes ou de parentes que moram na cidade.

Na semana que antecede se faz mutirão para limpar o terreiro, enquanto outros levantam as barracas e as cercam de palhas. Ficam dispostas, em volta do terreiro sagrado, porém afastadas, nos modelos e tamanhos variados. Durante todo o dia, os artesãos indígenas apresentam seus trabalhos, cativando os olhares de curiosos para vender os adornos, colares, pulseiras, brincos, etc. Em outras barracas são vendidas comidas típicas como milho assado, água de coco, tapioca, bolo, sucos e até almoço.

Uma vez preparado o terreiro sagrado para o ritual, é chegado o momento de dedicar- se para a arrumação própria de cada participante. Muitas pessoas dão os últimos ajustes nos utensílios que serão utilizados como adorno corporal durante o ritual. Alguns indígenas preparam os seus saiotes novos ou reformam os antigos (BARCELLOS, 2005). Outros ainda vão confeccionar o bustier ou o cocar com a folha da carnaúba. Depois de tudo pronto, agora e só esperar para o dia do ritual.

3.3.2 A mobilização da etnia Potiguara

Pela manhã, os indígenas aos poucos, vão chegando ao terreiro sagrado. Uma parte dos indígenas vai ao evento apenas rever os parentes e amigos e não participam da roda do ritual. São apenas espectadores. A data é muito conhecida em toda região e várias caravanas de outras cidades circunvizinhas e até mesmo da capital, João Pessoa, vão conhecer e/ou prestigiar o ritual indígena. Muitos representantes da FUNAI e FUNASA se fazem presentes. Raramente as autoridades do poder municipal local (prefeito, vereador) ou estadual (governo, deputado) se fazem presentes, a não ser, de dois em dois anos, quando acontece o período eleitoral. O maior interesse é acadêmico e várias universidades (UFPB, UFCG, UFPE) enviam grupos de estudantes de vários cursos. Algumas pessoas são desinformadas sobre o forte significado espiritual que o espaço tem para o ritual, desconhecendo que é preciso cuidado no lugar onde estão. Seu Chico afirma:

Essas pessoas que são de fora da etnia não deviam estarem nesse espaço sagrado (furna) aqui é o lugar e momento em que encontramos com os nossos ancestrais, o momento de firmar como indígenas, eles não entendem o quanto esse momento representa para nós indígenas, por não conhecerem nem serem indígenas; seria bom

que nem chegassem aqui. (CHICO URUBU, informação verbal, aldeia São Francisco, abr. 2010).

Muitas vezes, isso traz indignação por parte de quem conhece o profundo significado do ritual, que expressa o sentido espiritual do viver indígena.

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