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Coleções: enriquecimento e gestão interna

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Graças às coleções originárias das viagens filosóficas, as coleções da Ajuda atingiriam no final do século XVIII números tais que lhe granjeavam o estatuto de uma das mais ricas coleções de história natural da Europa. Em comparação, as coleções do Cabinet du Roi em 1793 não ultrapassariam os setenta e oito espécimenes de mamíferos e cerca de quatrocentas e sessenta e três aves236,

enquanto as coleções da Ajuda continham números consideravelmente maiores. Naquele que podemos apelidar de "época de ouro" do complexo científico lisboeta, as coleções, segundo o catálogo manuscrito "Inventário geral, e particular de todos

os productos naturaes, e Artificiaes; Instrumentos, Livros, Utensiz e Moveis pertencentes ao Real Gabinete de Historia Natural, Jardim Botanico, e suas cazas annexas: Como saõ Gabinete da Biblioteca, Caza do Desenho; Dita do Laboratorio;

Dita das Preparaçoens, Amarzem de Reserva, Etc. Tudo como nelle se declara"237 de

1795, conteriam nada menos que sete mil duzentos e trinta e dois espécimenes zoológicos (cento e vinte e seis mamíferos, mil duzentas e cinquenta aves, seiscentos e um anfíbios e répteis, mil duzentos e trinta peixes, duzentos e oitenta e dois insetos, e quatro mil trezentos e trinta e quatro invertebrados), centenas de amostras botânicas, seis mil quinhentas e cinquenta e três geológicas, amostras de minerais e fósseis, e uma coleção de três mil quatrocentos e doze "produtos

artificiaes" que incluiriam desde moedas antigas a materiais etnográficos. O

enriquecimento das coleções far-se-ia também através da doação de colecionadores privados como o caso de António Jacinto de Araújo ou Luís

236 Saint-Hilaire (1809)

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Albuquerque Pereira Cáceres que viria a doar a totalidade do seu estabelecimento privado à Ajuda238. Outras ofertas espontâneas viriam a fornecer as coleções da

Ajuda com os mais diversos produtos naturais, desde fósseis239 a "monstros

bicorpóreos"240. Um dos principais contributos para o enriquecimento das coleções

da Ajuda seria a Rússia. O fluxo de espécimenes russos para a Ajuda estender-se-ia durante os anos graças a Horta Machado, embaixador Português na corte Russa, que em Julho de 1786 faria remeter para o estabelecimento lisboeta treze grandes caixas das quais cinco com uma coleção valiosíssima de mil e seiscentas e sessenta e quatro amostras de minerais, e oito com exemplares de animais (mamíferos e aves) em número de oitenta, entre os quais um lince oferecido pelo conde de Cheremetiev e um lobo oferecido pelo marechal-general Razumovsky, seguido de uma outra remessa de dois caixões com cinquenta exemplares de pássaros empalhados em Julho do ano seguinte241.

No entanto, a aposta nas relações epistolares com outras instituições europeias não esmoreceria, com o interesse estrangeiro em aceder à natureza brasileira como seu principal motor. Embora esta rede epistolar mantivesse uma amplitude europeia, onde se encontravam nomes como o de Casimiro Gómez Ortega (1741 - 1818), diretor do Jardim Botânico de Madrid242, do frei Pini

Ermenegildo (1739 - 1825) do Liceu S. Allessandro de Milão243, ou o famoso Peter

Simon Pallas (1741 - 1811), naturalista alemão ao serviço da Corte Russa244, seria

com a comunidade naturalista francesa que a relação seria mais intensa. De Lisboa

238 AHMB Rem. 442, Almanach de Lisboa (1799: p. 463-465) 239 Fernandes et al. (2012)

240 Ceríaco (in press)

241 Uma terceira remessa chegaria a Lisboa em 1788, não se tivesse perdido no trágico naufrágio do barco que a transportava (Carvalho 1979)

242 AHMB CE O3; AHMB CE O4; AHMB CE O5 243 AHMB CE P35

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para Paris, mas também para Montpellier, e vice-versa, seguiriam várias cartas, remessas de sementes e elogios recíprocos. De entre os personagens da cena naturalista francesa de então citam-se como correspondentes de Vandelli o botânico e famoso ictiólogo Francês Antoine Gouan (1733-1821), doutor em medicina do Hospital Militar gaulês e professor do jardim botânico de Montepellier245, André Thouin (1747 - 1824), jardineiro chefe do Jardin du Roi,246,

e Antoine Laurent de Jussieu (1748 - 1836)247.

No contexto do enriquecimento e utilização desta riquíssima coleção é importante referir-se a colaboração entre Frei José Mariano da Conceição Veloso (1742-1811) e o complexo da Ajuda. As remessas de Veloso, estabelecido no Brasil, para o complexo da Ajuda iniciar-se-ão em 1786, com o envio de coleções de natureza botânica e zoológica, onde se contavam uma coleção de conchas, alguns espécimenes vivos de aves bem como uma coleção xilológica248. A este primeiro

envio, seguir-se-iam outros, e logo em 1787 e 1788 chegariam a Lisboa importantes documentos listando a desconhecida diversidade natural brasileira. Referimo-nos aos "Descriptio animalium quorundam brasiliensium (anno 1787)", ao "Descriptio animalium, avium, mineraliumque quorundam brasilensium (anno 1788,

9 de Julho)" e ao "Producta naturalia brasiliae (21 de Dezembro de 1788)249. É

interessante notar que a organização interna destes documentos seguia o sistema lineano, utilizando todas as suas classes, bem como a sua linguagem típica, e nelas se podem encontrar breves trechos descritivos. Embora não haja documentação que o confirme, é bem provável que estas listagens correspondessem a espécimenes concretos, possivelmente enviados por Veloso para a Ajuda, ou que pelo menos fizessem parte da sua coleção particular. Será no entanto em 1790 que

245 AHMB CE G103

246 AHMB CE R30; AHMB CE G104. 247 AHMB CE D22

248 Nunes & Brigola (1999: p. 59) 249 AHMB Rem. 584

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Veloso apresentará o seu maior contributo para as coleções da Ajuda. Acompanhando Luís de Vasconcelos e Sousa após o término do seu mandato governativo no Rio de Janeiro, Veloso viaja para Lisboa trazendo consigo as suas consideráveis coleções de história natural. Estas terão sido depositadas na Ajuda. A descrição que temos da coleção que terá dado entrada na Ajuda apresenta-nos não só um elevado número de espécimenes, como também o seu caráter único e importância científica. Dentro de "70 caixões" seguiam os textos originais e as gravuras da sua "Florae Fluminensis" bem como:

"[...] uma colecção de todos os peixes de água doce e salgada, feita por um novo

método; por outra de insectos marinhos e terrestres; e finalmente por uma de borboletas impressas pela fécula colorante de que se cobrem as membranas das suas asas, obra tão rara e estimável que tem o suplicante notícia não haver outra em algum dos Gabinetes reais da Europa [...]"250.

O referido livro das borboletas existe ainda hoje no Arquivo Histórico do Museu Bocage. Dedicado a D. Maria I e intitulado "Lepidoptérarum suorum Omne

pulchrum Praefectura Fluminensis" o livro continha cento e setenta e duas

ilustrações das diferentes espécies de borboletas existentes na região do Rio de Janeiro251. A técnica utilizada consistia no decalque direto dos animais no livro,

sendo este decalque acompanhado do desenho dos seus contornos principais, bem como daquelas estruturas que não continham escamas. Assim resultavam ilustrações à escala real das espécies, apresentando as cores características das asas do animal. Outro cuidado apresentado pelo frade naturalista prendia-se em dar duas visões do mesmo animal, uma lateral, mostrando a parte inferior da asa, e outra mostrando o seu lado superior (Figura 7). Por sua vez, a coleção de peixes encontra-se atualmente incompleta, com exemplares dispersos por várias instituições museológicas, nomeadamente a Academia das Ciências de Lisboa252, o

Museu de Ciência da Universidade de Coimbra e o Muséum national d’Histoire

250 Nunes & Brigola (1999: p. 60) 251 AHMB Res. 3

252 Um catálogo detalhado dos exemplares presentes na Academia foi publicado por Antunes & Balbino (2003), embora considere que a coleção faria parte das remessas de Alexandre Rodrigues Ferreira.

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naturelle. No que toca à sua preparação prática, esta peculiar técnica foi primeiramente descrita por Jean Frederick Gronow (ou Gronovius na forma latinizada), naturalista holandês e médico em Leiden, no volume 42 das

Philosophical transactions of the Royal Society of London, em 1742253. Desta

metodologia resultaria o primeiro herbário de peixes conhecido na Europa, o do seu sobrinho, o ictiologista Laurent-Theodore Gronow (1730-1777), que viria mais tarde a ser adquirido e estudado pelo famoso ictiólogo britânico do século XIX, John Edward Gray (1800-1875)254.

Figura 7 - Páginas e detalhe dos desenhos da obra "Lepidoptérarum...". De notar à direita a vista microscópica das escamas utilizadas para o desenho. Fonte AHMB, fotos Luis Cériaco.

Em Portugal, a técnica de Gronovius era também alvo de referência em algumas obras e documentos técnicos dos naturalistas portugueses. É o exemplo

253 Para uma transcrição total do artigo de Gronovius onde a técnica é apresentada e mais informações sobre a mesma veja-se Ceríaco & Marques (2011).

254 Este herbário encontra-se ainda hoje no British Museum. Sobre a aquisição e estudo por John E. Gray, ver Gray (1854).

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de Vandelli que nas "Viagens filosóficas" de 1779 refere esta técnica255. Também,

nas conhecidas “Breves instrucções aos correspondentes da Academia…” é referida a metodologia de “herborização” de peixes256. Não será, porém, apenas Vandelli a

referir esta técnica. José António de Sá na obra “Compendio de Observaçoens, que

fórmaõ o Plano da Viagem Politica e Filosófica, que se deve fazer Dentro da Pátria”

também a referiria257.A recente descoberta de uma coleção de 68 espécimenes de

peixes herborizados numa arrecadação da Museu da Ciência da Universidade de Coimbra veio trazer, entre nós, um renovado interesse a esta técnica de preparação de animais (Figura 8). A referida coleção afigura-se como proveniente das coleções da Ajuda, mas não como parte da coleção de Alexandre Rodrigues Ferreira, como propõem alguns autores258.

Figura 8 - Exemplar de "peixe herborizado" da coleção do Museu de Ciência da Universidade de Coimbra. Foto por Luis Ceríaco.

255 Dantes (2009: Vol. 1 p. 157). 256 Anónimo (1781: p. 51-52) 257 Sá (1783: p. 180-182). 258 Casaleiro et al. (2011)

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Comparando a caligrafia presente na base e por vezes no topo dos espécimenes de Coimbra (representando um acrescento do epíteto específico ao nome genérico), com aquelas presentes em outros documentos de Veloso, percebemos, sem qualquer espaço para dúvidas, que terá sido o frade a escrever estes nomes pelo seu próprio punho. Sabemos que, por volta de 1791 e 1792, Veloso terá trabalho em conjunto com Vandelli para a produção de um "Ictiologia

do Reino e do Brasil"259, obra essa que nunca terá sido dada à estampa, e que como

já vimos acima terá trazido do Brasil "uma colecção de todos os peixes de água doce

e salgada, feita por um novo método [negrito do autor]”. Esta hipótese parece-nos

muito mais sólida do que aquelas que os atribui a Alexandre Rodrigues Ferreira260

por quatro motivos. O primeiro, por todas as referências relativas aos trabalhos em ictiologia de Veloso transcritas acima. O segundo prende-se com a análise caligráfica das anotações contidas nos espécimenes. O terceiro é pela ausência de qualquer referência à técnica no "Methodo de Recolher, Preparar, Remeter, e

Conservar os Productos Naturais" de Alexandre Rodrigues Ferreira, nem sequer

nos próprios inventários de material e instrumentação levados pelo naturalista constar qualquer referência a material destinado a este fim. O quarto e último argumento é o da inexistência de qualquer referência a material ictiológico preparado desta maneira nas várias listagens de Alexandre Rodrigues Ferreira.

Seria também no reinado de D. Maria que se fundaria no país uma das mais importantes instituições científicas nacionais - a Academia das Ciências de Lisboa – que mais tarde, após a constatação da sua utilidade pública, viria a beneficiar do privilégio e proteção régia, passando a denominar-se Academia Real das Ciências de Lisboa. Fundada em 1779, por iniciativa do segundo Duque de Lafões, D. João Carlos de Bragança de Sousa Ligne Tavares Mascarenhas da Silva (1719 - 1806), a

259 "O compromisso intelectual com a Academia passaria também por um proecto de co-autoria com

o director dos estabelecimentos da Ajuda, Domingos Vandelli (1735-1816), que previa a edição de um inventário ictiológico, decidindo-se, por isso, na sessão de 31 de Março de 1792 que: «[...] se fizessem os gastos que se julgassem próprios para os desenhos e estampas da Ictiologia do Reino do Dr. Vandelli e do Brasil do Sr. José Mariano da Conceição Vellozo e algumas viagens se forem precisas»." in Nunes &

Brigola (1999: p. 61).

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que se associariam Domingos Vandelli, e entre outros, José Francisco Correia da Serra (1750 - 1823), mais conhecido por Abade Correia da Serra, Luís António Furtado do Rio de Mendonça e Faro (1754 - 1830), sexto Visconde de Barbacena, ou ainda o frade Teodoro de Almeida (1722 1804). O Duque de Lafões viria a ser o seu primeiro Presidente, secretariado pelo Visconde de Barbacena e tendo como vice-secretário Correia da Serra. Os seus primeiros estatutos dividiriam a Academia em três diferentes Classes - a de Ciências de Observação, a de Ciências de Cálculo, e a de Belas Letras. Nos estatutos da Academia encontrava-se previsto o estabelecimento de um "museu" para apoio ao desenvolvimento científico, algo que seria publicamente assumido com a publicação das "Breves instrucções aos

correspondentes da Academia das Sciencias de Lisboa sobre as remessas dos produtos e noticias pertencentes à historia da natureza para reformar hum Museo

Nacional"261, que tal como o seu próprio nome indicava serviria para "formar um

Museu Nacional", e cuja "Advertencia" explicitamente referia que "Considerando pois a Academia das Sciencias de Lisboa, cujos trabalhos se encaminhão todos ao bem público, a grande utilidade, que de huma similhante Collecção, sendo bem ordenado, póde resultar para o adiantamento das Artes, Commercia, Manufacturas e todos os mais ramos da Economia; propoz-se o projecto de formar nesta Capital hum Museo Nacional, onde principalmente se ajuntem e conservem os productos, ao menos os mais notaveis, que se achão dentro do reino e das suas Colonias".

Desde cedo Vandelli, então estabelecido em Coimbra, assumiria em parte a responsabilidade de enriquecer o gabinete da Academia, reservando os duplicados do Museu de Coimbra para esse fim.262 As contribuições de Vandelli para o

gabinete da Academia suceder-se-iam, sendo disso exemplo:

Em Julho de 1780 - "produções da Russia, entre as quaes huma

colleção de marmores, e tãobem a carta mineralogica de todo o

261 Anónimo (1781)

262 Carta de Vandelli a Correia da Serra, Coimbra a 30 Janeiro de 1780 - "Eu não me descuidarei em

aprontar todo o dobrado do Museo, e logo q.e o tempo o permittir o remetterei." in Ayres (1927: p.

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Imperio" a serem remetidos pelo embaixador Português na Rússia

Horta Machado263;

Em Janeiro de 1782 - um esqueleto de "Physeter macrocephalus" que houvera dado à costa "nas prayas em visinhança de Aveiro"264; Em Maio de 1787 - duplicados de "todas as minas da Russia, e

Liberia, entre as quaes o ferro virgem, alem de outras muitas raras e particulares pela sua mineralização e mixtura etc", oferecidos por

Simon Pallas, assim que o mesmo gabinete fosse deslocado para uma "habitação mais segura"265;

Em Agosto de 1789 - "hum calculo urin.o m.to raro"266.

O apelo da Academia espalhar-se-ia pelos seus sócios e seriam vários aqueles que viriam a contribuir para o crescimento das suas coleções. É disso exemplo Serafim Francisco de Macedo (? - ?), baiano formado em Filosofia pela Universidade de Coimbra, que em Setembro de 1781 reconhecia ser seu dever como sócio contribuir para o seu enriquecimento, pedindo no entanto à Academia que o avisasse "em q.l dos Reinos Naturaes se acha o d.o Muzeo mais falto de

Produtos, p.a q com a remessa deses ponha em pratica o meo dever com a exactidão q

m fôr possivel."267. Também Francisco António de Sampaio ofereceria em Maio de

1789 um segundo tomo relativo à "Historia dos Reinos Vegetal, Animal, e Mineral do

Brazil", "hua pedra brasiliense exculpida" e "hum Relicario clausuradas, as Armas dessa Real Academia", prometendo dedicar-se ao estudo do mineral em causa, da

qual daria mais tarde "a noção das suas qualidades"268. Do Brasil, pelas mãos do

doutor em Direito Civil Joaquim Amorim Castro, seguiriam, também no verão do 263 Ayres (1927: p. 138) 264 Ayres (1927: p. 251) 265 Ayres (1927: p. 261) 266 Ayres (1927: p. 309) 267 Ayres (1927: p. 192) 268 Ayres (1927: p. 297-298)

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mesmo ano, um "tomo da Historia Natural"269. Seria no entanto Francisco Luís de

Meneses (? - 1804), funcionário do governo colonial de Goa, e que já encontráramos a remeter coleções da capital da Índia portuguesa para o museu de Van-Deck (Capítulo 1), que viria a contribuir com um maior número de coleções para o gabinete da Academia. Tendo sido nomeado sócio correspondente em 1780, Meneses iniciaria uma constante prática de remessas para a Academia a partir de 1783, algo que manteria pelo menos durante mais de dez anos. Em carta ao Visconde de Barbacena, datada de Abril de 1782, Meneses agradecia efusivamente a sua nomeação como sócio correspondente, e tendo "principiado a fazer huma

coleção dos objectos da natureza deste Paiz" prometia enviá-la para a Academia no

ano seguinte270. A "piquena Colecção das produçoens" seguiria como prometido no

ano seguinte, em Fevereiro de 1783, pedindo Meneses que o informassem de como haviam chegados as mesmas "Para precaver para o futuro nas remessas do que for

ajuntando"271. Em Março de 1785 seguiria de Goa mais uma coleção preparada por

Meneses para a Academia272, e em Abril de 1786, Meneses faria uma terceira

remessa "de alguns produtos", mas também algumas "memorias e descriçoens feitas

com presa" com figuras "debuxadas" pelo próprio273. No entanto, a falta de notícias

preocupava Meneses relativamente à chegada em condições das remessas anteriores, e referiria que "As péles e mais produtos que vão no caixote estimarei

que cheguem perfeitas e livres de avaria."274. Em Março de 1787275, e em Fevereiro

de 1788 seguiriam novamente coleções goesas de Meneses, e em particular, nesta última, para além de alguns "productos da natureza" seguiriam também as suas

269 Ayres (1927: p. 306-307) 270 Ayres (1927: p. 203)

271 Ayres (1927: p. 211); AHMB Rem. 384 272 AHMB Rem 385a; AHMB Rem. 385b 273 Ayres (1927: p. 236-237)

274 Ayres (1927: p. 236-237) 275 AHMB Rem. 385c

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"mal acabadas descrisoens e debuxos a elles atinentes "276. Estas descrições seriam

as "Descrisoens de istoria natural aprezentadas à Academia Real das Sciencias de

Lisboa pelo Socio Correspondente Francisco Luis de Menezes, Mestre de Campo de

Auxiliares com exercicio nas Ordenansas de Goa. Em 1788"277 , contendo a descrição

e desenhos dos animais de Goa nomeados por Meneses de "Caranguejo Crusaxo", "Perilampo femea", "Pitoli ou Bulbule", "Raiboncurdi, especie de Pitoli" e da "Salangane Andorinha do ninho". É provável que a "Historia Natural e Descrição do

Terió, ou Bicho Vergonhozo: Aprezentada a Real Academia das Sciencias de Lisboa

pelo Socio Correspondente de Goa, Francisco Luis de Menezes."278 fosse também uma

destas memórias. De Meneses seriam conhecidas pelo menos mais três remessas para a Academia - uma em Março de 1789279, outra em Abril de 1790280, e outra em

Maio de 1792281. Durante toda a década de 1790, continuariam a chegar ao Museu

da Academia ofertas dos mais variados produtos naturais por sócios e particulares, com destaque para as feitas por Conceição Veloso a partir de 1791282.

Face à quantidade e diversidade de cargos sob a sua alçada, Vandelli ver-se- ia obrigado a decidir sobre a sua continuidade nas suas diversas funções. Após a sua nomeação para a Real Junta de Comércio em 1789 deixaria de reger as cadeiras da Faculdade de Filosofia bem como a direção dos seus estabelecimentos, mantendo-se no entanto como diretor do complexo da Ajuda. No entanto também na Ajuda se veria impossibilitado de coordenar sozinho todo o funcionamento do complexo, algo que se agravaria com a morte de Júlio Mattiazi em Setembro de 1794. De imediato Mattiazi seria substituído por Alexandre Rodrigues Ferreira,

276 Ayres (1927: p. 257) 277 BACL - Série Azul, Cod. 203 278 BACL - Série Azul, Cod. 209 279 Ayres (1927: p. 287-288) 280 AHMB Rem. 385d 281 AHMB Rem. 387a

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que a 14 de Setembro de 1794 seria encarregado da administração de todo o complexo da Ajuda283. O que aparentaria ser uma situação provisória começaria no

entanto a revelar-se como um posto definitivo, nomeadamente quando a 6 de Maio de 1795, lhe é ordenada a continuação no cargo da administração económica do complexo devido à impossibilidade de Vandelli poder assistir diariamente a referida organização284. Um mês depois Rodrigues Ferreira seria oficialmente

nomeado administrador285. Do decreto assinado pelo marquês Mordomo-mor a 3

de Julho de 1795, constava o seguinte:

"Sendo-me presente que para haver de se conseguir a perfeita conservação, o

progressivo augmento, e a bem regulada Economia do Meu Real Jardim Botanico, Laboratorio Chimico, Museo, e Casa do Risco, de que he Inspector Geral o Marquez Meu Mordomo Mor, e Director o Doutor Domingos Vandelli, se fazem necessarias mais duas Pessoas, huma das quaes seja bem instruida nestas Sciencias, para que com hua assidua assistencia haja de administrar tudo quanto pertencer, e respeitar a estes uteis Estabelecimentos, e a outra que tenha a seu cargo e cuidado o trabalho de huma regular, e exacta Escripturação de todas as despezas que nelle se fazem, e se fizerem; E querendo Eu que nada falte em tão proveitosos Estabelecimentos, para que se consigão todos os progressos e vantagens delles: Sou Servida nomear para Administrador dos referidos

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