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2 SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO EM EDIFICAÇÕES

2.2 COLETA DE DADOS DE INCÊNDIO NO BRASIL

A coleta de dados de incêndio é muito importante, pois propicia, entre outros, o desenvolvimento de novas tecnologias de prevenção e combate à incêndio. (DUARTE; RIBEIRO, 2008)

A aplicação mais concreta e imediata dos resultados obtidos através da análise de dados de incêndio é a definição clara dos objetivos e o mais adequado direcionamento da política de segurança contra incêndio a ser efetivada pelos órgãos competentes.

A normalização do sistema de coleta de dados de trabalho de bombeiros visa obter uma linguagem única para a coleta e o registro de dados de todo o país.

Os dados de incêndios existentes, em nível nacional, foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) por meio de Anuários Estatísticos do Brasil até 1991, ano em que o levantamento foi suspenso a pedido do Ministério da Justiça (MJ). A decisão levou em conta a inconsistência dos dados coletados na década de 1980, onde um estudo realizado pelo Departamento de Indicadores Sociais do IBGE já apontava as dificuldades na obtenção das informações e a falta de registros completos para análise. Tais dados já não estariam cumprindo seu papel de informar sofre a efetividade dos serviços de

bombeiros para melhoria da qualidade de vida da população, por meio do exercício de suas atividades principais: prevenção e combate a incêndios, salvamento/resgate, urgência médica e outros serviços à comunidade. (DUARTE; RIBEIRO, 2008)

Pode-se dizer que os dados fornecidos até 1991 nos Anuários mostram uma grande variação nos itens divulgados, chegando a apresentar, em certos anos, somente o número do efetivo dos corpos de bombeiros e o número total de incêndios por estado e, em outros anos, informações mais detalhadas, porém, nunca divulgando todos os resultantes do levantamento realizado pelo IBGE. Várias hipóteses, não confirmadas, podem justificar a não divulgação destes dados de forma integral, variando desde motivos de “segurança nacional”, resultados não- confiáveis (variação muito grande nos dados ou incompatibilidade dos itens requisitados com a realidade) até a falta de infraestrutura para processamento de grande quantidade de dados coletados e que pode ter levado à suspensão. (ONO, 1996)

Na série histórica de Anuários Estatísticos de 1937 e 1994, as informações sobre ocorrências de incêndios tornam-se sistemáticas a partir de 1951. As informações referentes às capitais deixaram de ser divulgadas a partir de 1976 e no ano de 1990 os dados foram divulgados apenas para o total do Brasil, sem haver qualquer detalhamento por Estados ou por Municípios. (DUARTE; RIBEIRO, 2008)

O primeiro registro encontrado refere-se a incêndios ocorridos em 1936 na região do Distrito Federal. As modificações mais significativas aparecem em 1982, com a inclusão de incêndios em veículos, sexo das vítimas, dados sobre vítimas da corporação, extensão do incêndio e causa provável. (DUARTE; RIBEIRO, 2008)

Em gráfico destacado a seguir, destaca-se a representação do número de incêndios ocorridos no Brasil publicados pelo IBGE de 1966 a 1990. (ONO, 1996)

Gráfico 3 – Total de incêndios no Brasil – 1966/1990.

Fonte: ONO, Rosária. Um sistema nacional de coleta de dados de incêndio. 1996.

Em análise realizada por Rosária Ono, o estado de São Paulo representa uma quantidade significativa de incêndios em relação às ocorrências no Brasil. Acredita-se que tal fato pode ser justificado pela concentração populacional do estado e seu nível de desenvolvimento econômico.

Corpos de bombeiros de vários estados brasileiros têm coletado dados de incêndio, utilizando diferentes formulários de coleta com conteúdos também variados. Atualmente, não existe uma padronização dos dados a serem coletados ou dos formulários de coleta utilizados entre os estados.

Em visita à sede do IBGE, em Brasília-DF, verificou-se que, atualmente, a única coleta de dados sobre incêndios do Instituto seria relativa à degradação do meio ambiente através das queimadas.

Deste modo, Ono (1996) destaca:

É possível afirmar que grande parte dos Corpos de Bombeiros de estados economicamente desenvolvidos apresenta uma maior preocupação na coleta e no tratamento adequado dos dados de suas atividades, o que reflete num sistema melhor elaborado. (ONO, 1996, p.1)

Concentram-se nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro o maior número de pesquisadores e elaboradores de normas vigentes no país, visto que há uma multidisciplinaridade de conhecimentos sobre ocorrências de incêndio, inclusive com a participação de membros do Corpo de Bombeiros.

Em dezembro de 1997, foi aprovada a Norma Brasileira – NBR 14023 – Registro de atividades de bombeiros. Esta norma abrange, além da consolidação de dados de incêndios, as demais ações realizadas pelos bombeiros no seu atendimento às ocorrências.

Assim, a referida norma pretendeu incluir o que se considerou o mínimo indispensável para a obtenção de parâmetros de comparação em nível nacional e internacional, permitindo liberdade às diferentes organizações para incluírem outros dados para uma melhor análise e diagnóstico de suas situações particulares, de acordo com seus julgamentos. (DUARTE; RIBEIRO, 2008)

Tendo-se um banco de dados padronizados, formando o “Sistema Nacional de Coleta e Análise de Dados de Bombeiros”, este seria capaz de fornecer, segundo Duarte e Ribeiro (2008), dentre outras, as seguintes informações para:

a) revelar a extensão dos prejuízos causados por incêndios e outros sinistros atendidos e os principais problemas encontrados;

b) identificar os problemas que requer ações mais efetivas e desenvolvimento de pesquisas;

c) orientar ações de prevenção e proteção da vida humana, do patrimônio e do meio ambiente; e

d) orientar o desenvolvimento efetivo de códigos, regulamentações e normas de segurança em edificações, meios de transporte, atividades profissionais e de proteção ambiental. (DUARTE; RIBEIRO, 2008, p.353-354).

No Distrito Federal (DF), o Corpo de Bombeiros possui um Centro de Investigação e Prevenção de Incêndio (CIPI). O CIPI subdivide-se em três seções: Seção de Perícias, Seção de Pesquisas e Seção de Estatística/Ensino, onde este último possui duas subseções: Coleta e Análise de Laudos e Subseção de Divulgação e Arquivo.

O CIPI, órgão de apoio do Sistema de Engenharia de Segurança, subordinado a Diretoria de Serviços Técnicos do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF), destina-se a: realizar a investigação de incêndio e explosões em todo o território do DF; realizar análises laboratoriais relacionadas à investigação de incêndios e de explosões; e emitir conclusões técnicas sobre atividades preventivas, possuindo, ainda, as seguintes atribuições:

a) Coordenar, executar e controlar todas as atividades relacionadas com a investigação de incêndio e explosão.

b) Realizar perícias de incêndio e de explosões de acordo com a legislação pertinente.

c) Realizar estudos técnicos dos fatos que provocam incêndios e explosões.

d) Realizar periodicamente estatísticas dos incêndios ocorridos dentro do Distrito Federal e disponibilizá-los, com a finalidade de elaborar programas de prevenção voltados para a comunidade. (Relatório de Perícia, CIPI, 2007)

O CIPI tem arquivados os laudos periciais. Para o CIPI, os laudos periciais têm como finalidade, além da retroalimentação do sistema visando minimizar as causas mais freqüentes (que é também importante para melhoria de projetos de arquitetos, projetistas e engenheiros), auxiliar como peça de instrução a inquéritos policiais, auxiliar a justiça com informações sobre o incêndio e auxiliar as vítimas do sinistro quanto ao esclarecimento das causas do incêndio para fins de seguro.

Na cidade de Brasília, o CBMDF é o responsável pela Gestão do Risco de Incêndio no Distrito Federal.

O modelo legal adotado pelo CBMDF para tal fim fundamenta-se em um processo integrado e cíclico de ações, reações, estudos e revisões, o que compreende em:

1. Elaboração de Normas Técnicas - O CBMDF elabora legislações (normas técnicas) de alcance interno ou externo à Instituição, para serem aplicadas ao seu público interno, principalmente em forma de capacitações e ou padronizações de análises, estudos, procedimentos e outras ações, e também para influenciar (proporcionando eliminação ou mitigação de riscos), os cenários, os objetos (bens móveis duráveis), as edificações, os eventos, entre outros ambientes que são suscetíveis a ocorrências de Incêndio, explosão ou pânico.

2. Prevenção Técnica – Militares do CBMDF investidor de Poder de Polícia, constatam in loco se os sistemas projetados, requeridos e instalados estão atendendo às legislações aplicáveis às edificações, sistemas, cenários, eventos entre outros ambientes propícios aos sinistros.

3. Resposta aos Sinistros – Atuação nos cenários sinistrados por parte dos

preventivos (podendo ser os fixos ou os móveis ou ainda ser o tipo ou padrão de construção ou recursos humanos capacitados, entre outros); também dos agentes públicos, como os militares do CBMDF que atuam na circunscrição ou eventualmente deslocados para tais sinistros; transeuntes e população da edificação, evento ou cenário.

4. Avaliação Técnica – Fase do processo de Gestão que consiste em

contribuir para as outras etapas processuais, promovendo análises das atuações, das normas aplicáveis e da eficiência/eficácia das ações e equipamentos preventivos, realimentado as demais fases do processo por meio de estudos, relatórios, laudos e eventos. (Relatório de Perícia, CIPI, 2007)

Esta última fase, a Avaliação Técnica, é desenvolvida pelo CIPI. Na ocorrência de algum evento, o CBMDF desloca-se para atuar e resgatar a normalidade do ambiente, objeto ou sistema. A coordenação do evento (oficial superior que concorre à escala de Oficial de Operações do CBMDF junto à Central Integrada de Atendimento e Despacho – CIAD), subsidiado pelo militar que chefiou a atuação do CBMDF no local sinistrado ou por demanda do proprietário, usuário, responsável, interessado ou envolvido, aciona uma equipe do CIPI para realizar o levantamento das causas, conseqüências, ações e omissões que permitiram, influenciaram, facilitaram e até impediram o surgimento e ou a extinção dos eventuais sinistros. Também neste ato é possível, salvo em casos excepcionais, realizar-se perícias técnicas, atendendo ao preceituado em legislações específicas. Estas fases do Processo de Gestão denominam-se Ciclo Operacional do CBMDF. (CIPI, Relatório de Perícia, 2007)

As estatísticas desenvolvidas e revisadas, resultantes de avaliações técnicas dos laudos periciais, são de grande importância na condução do Processo de Gestão, a não recorrência dos sinistros e, conseqüente desenvolvimento da sociedade, do CBMDF e dos indivíduos afetados de alguma forma pela ocorrência registrada. Assim, o que se pretende é que tais dados ou informações possibilitem melhores resultados preventivos ao DF ou até mesmo ao país.

Mesmo assim, segundo o engenheiro civil e de segurança do trabalho, o Tenente Coronel Eduardo Alexandre Loureiro Melo, do CBMDF, destaca-se que as estatísticas periciais comprovam que cerca de 60% dos incêndios são causados por ação pessoal, quer intencional ou acidental e, em segundo lugar, vêm os fenômenos termelétricos, com 15% das causas, levando-se em consideração que estes fenômenos, em sua maioria, são causados por instalações improvisadas, inadequadas ou não têm manutenção constante, e que estes dois fatores podem ser enquadrados como responsabilidade humana direta.

É importante lembrar que a perícia feita pelo CBMDF é de caráter reativo, ou seja, é necessariamente solicitada para ser realizada. Assim, o número de ocorrências em que se realizam a perícia não representa a totalidade de eventos.

As informações obtidas pela análise dos laudos periciais foram agrupadas em treze campos:

1) às Regiões Administrativas; 2) aos bens sinistrados; 3) aos tipos de ambientes; 4) aos dias da semana; 5) à hora da ocorrência; 6) à causa;

7) à subcausa;

8) ao tempo de resposta; 9) ao agente extintor;

10) ao tempo de socorro feito por populares; 11) ao objeto causador;

12) à zona de origem; e

13) às ocorrências de vítimas. (Relatório de Perícia, CIPI, 2007)

Todas são importantes do ponto de vista do resultado desejado: suprir a deficiência de informações sobre a coleta de dados de incêndio no DF.

Um dos pontos mais relevantes, ou que pode ser considerado o mais importante a ser observado é a ocorrência de vítimas, aspecto relacionado diretamente à proteção da vida. (Tabela 1)

Tabela 1 – Estatísticas de incêndio dos anos 2002 a 2008 no DF, segundo a ocorrência de vítimas

ANO VÍTIMAS FATAIS VÍTIMAS NÃO FATAIS

2002 04 18 2003 04 19 2004 03 31 2005 05 14 2006 03 16 2007 03 14 2008 03 24 Total 25 136

Fonte: Relatório de Perícia, CIPI-2007: Boletim de fatores envolvidos nos incêndios e sinistros –

2002-2007. Relatório Anual de Perícia, CIPI-2008: Anexo 04, do BG nº 13, de 20 de janeiro de 2009.

Segundo informações da CIPI, as edificações são as responsáveis pela ocorrência do maior número de registros de incêndios.

Considerando o número total de ocorrências a partir de dados das regiões administrativas, observa-se que tal estatística vem diminuindo entre 2002 e 2007, sendo que se identificou um pequeno aumento no ano de 2008, de cerca de 18% do total de ocorrências do ano anterior. (Gráfico 4)

Gráfico 4 – Número de ocorrências entre os anos de 2002 e 2008 no DF.

Fonte: Relatório de Perícia, CIPI-2007: Boletim de fatores envolvidos nos incêndios e sinistros –

Realizando um paralelo com o número de ocorrências de incêndio do estado de São Paulo, observa-se que, diferentemente do Distrito Federal, houve um crescimento entre os anos de 2004 e 2006. (Gráfico 5)

Gráfico 5 – Tendência dos incêndios no Estado de São Paulo.

Fonte: Anuário Estatístico do CBMPMESP/Departamento de Operações, 2008.

Em análise por Região Administrativa do DF, as cidades de Taguatinga e Ceilândia, e os bairros de Brasília, Asa Sul e Asa Norte, são as regiões que mais apresentaram registro de sinistros. Considerando a macrorregião do Plano Piloto - Asa Sul e Asa Norte – observa-se a ocorrência da maioria das ocorrências entre 2002 e 2008. (Gráfico 6)

Gráfico 6 – Número de ocorrências em quatro regiões administrativas do DF entre os anos 2002 e 2008.

Fonte: A partir de dados do Relatório de Perícia, CIPI-2007: Boletim de fatores envolvidos nos

incêndios e sinistros – 2002-2007 e do Relatório Anual de Perícia, CIPI-2008: Anexo 04, do BG nº 13,

de 20 de janeiro de 2009.

Como destacado anteriormente, o risco é a interação de uma ameaça em um ambiente vulnerável, ou seja, aquilo que pode gerar incêndio, explosão, pânico sobre cenários, sistemas, pessoas ou bens de forma a prejudicá-los.

A análise interativa dos componentes de um risco é a forma moderna de Gestão de Risco ou Gestão de Segurança. Identificando-se os fatores causadores e contribuintes e correlacionando-os às vulnerabilidades dos cenários, têm-se os pontos sensíveis que devem ser tratados para redução e até a eliminação dos sinistros previsíveis.

As causas, identificadas pelos laudos periciais são as precursoras das ameaças – outro componente do Risco.

Identificando-se os fatores que influenciam o surgimento do sinistro, é possível a aplicação de ações, programas e políticas que previnam a recorrência de tais fenômenos.

Nos anos de 2002 a 2008, observou-se que a ação pessoal, seja ela intencional ou acidental, é a maior causa de incêndio, evidenciando ser possível, por meio de mudança de comportamento humano, a diminuição dos riscos de incêndio. (Gráfico 7)

Gráfico 7 – Principais causas de sinistros entre os anos de 2002 e 2008 no DF.

Fonte: A partir de dados do Relatório de Perícia, CIPI-2007: Boletim de fatores envolvidos nos

incêndios e sinistros – 2002-2007 e do Relatório Anual de Perícia, CIPI-2008: Anexo 04, do BG nº 13,

de 20 de janeiro de 2009.

Junto às causas de incêndio, existem também as subcausas. Dentre elas, em primeiro lugar de ocorrência, o contato direto com a chama (contato de chama ou brasa), depois, o surgimento do curto circuito e o defeito de funcionamento, respectivamente.

Outro item de investigação são os dados estatísticos relacionados ao “bem sinistrado”. As ocorrências ocorrem com maior freqüência em casas residenciais unifamiliares. (Tabela 2)

Tabela 2 – Perícias de incêndio dos anos 2002 a 2008 no DF, segundo bens sinistrados.

Bem sinistrado Ocorrências Porcentagem

Casa residencial 621 31%

Apartamento 165 8,25%

Prédio public 108 5,40%

Prédio comercial 95 4,75%

Representam 49,4% do total de Ocorrências

Fonte: A partir de dados do Relatório de Perícia, CIPI-2007: Boletim de fatores envolvidos nos

incêndios e sinistros – 2002-2007 e do Relatório Anual de Perícia, CIPI-2008: Anexo 04, do BG nº 13,

de 20 de janeiro de 2009.

Vale lembrar que, segundo a Companhia de Planejamento do Distrito Federal (CODEPLAN), essas casas (residências unifamiliares) representam cerca 70% e os apartamentos representam um pouco mais de 20% dos domicílios do Distrito Federal, caracterizando-se como uma unidade federativa de edificações horizontais. Os prédios mais altos estão presentes na região central do Plano Piloto, tipicamente de edifícios comerciais e de escritórios, e de tipologia residencial na região da cidade de Águas Claras, com edifícios de até vinte e três andares.

Outro ponto importante são os sinistros ocorridos na área de comércio, visto que, além da população fixa, tem-se a presença de uma população flutuante. Assim, o número de vítimas pode ser maior do que em uma residência.

Assim, a aquisição, de maneira sistemática, dos dados de incêndio, quando tratados de maneira correta, fornece subsídios essenciais à pesquisa e realimentam todas as frentes de atuação do Poder Público, dinamizando-as, atualizando-as e otimizando-as.

O quadro a seguir relaciona a estatística de incêndio e pesquisa com as demais frentes de atuação do Poder Público.

Quadro 3 – Atuação da estatística de incêndio e da pesquisa nas demais frentes de atuação do poder público.

FONTES DE