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Já na identificação temática é possivel sentir-se a direção argumentativa do texto, pois além de falar sobre algo, o modo como o texto aborda o tema já aponta para o seu sentido.

Identificam-se as articulações do texto:

Com a sua exterioridade:

a. observa-se se o texto enquadra-se nos pressupostos do seu contexto sociolingüistico, isto é, situa-se e organiza-se como convencionalmente o faz um manual de instruções, um artigo informativo de jornal, um documento de caráter cientifico, etc., enfim, reafirma ou não as expectativas textuais e discursivas;

b. observam-se reflexos de outros textos ou campos discursivos.

Com o seu interior:

a. na organização textual, o que é enfatizado e o que não é de acordo com a distribuição temática na área textual.

Observar, por exemplo, articuladores a nivel macrotextual: "primeiro", "em seguida", etc.;

b. "vozes" se fazem sentir no texto. Observar se o enunciador é explicitado ou não, em que elementos as diferentes posições se manifestam. Proceder a levantamentos de pronomes pessoais com função de sujeito marcadores dos interlocutores no texto;

c. a situação de enunciação se manifesta no texto. Levantar os elementos da dêixis, o valor dos tempos verbais dentro do texto;

d. o efeito discursivo (objetivo/subjetivo/autoritário). Identificar as modalizações textuais.

Não há rigor, evidentemente, no desenvolvimento dessas etapas, pois os procedimentos tanto de ensino quanto de aprendizagem vão depender do texto, do interesse e projeto de leitura do público. Elas podem, portanto, sofrer alteração de ordem e podem até interpenetrarem-se. É quase inevitável, por exemplo, que já na identificação temática sinta-se a direção argumentativa do texto, pois além de falar sobre algo, o modo como o texto aborda o tema já possibilita estabelecer o(s) seu(s) sentido(s).

Pelos procedimentos • utilizados durante as etapas, percebe-se que é trabalhado o texto em vários niveis. A primeira e segunda etapas têm como eixo a dimensão referencial enquanto a terceira focaliza a dimensão argumentativa e enunciativa do texto. Por outro lado, a primeira etapa se caracteriza pela formulação de hipótese e previsão de sentidos e a segunda e a terceira etapas pela configuração e avaliação das expectativas e previsões.

Sabe-se através do desenvolvimento dos estudos que dois processos podem ser percebidos na leitura: o ascendente, também chamado ”bottom-up", e o descendente ou ”top-down”. Abaixo, um paralelo distintivo desses dois processos:

modelo ascendente modelo descendente

. papel do texto .papel do sujeito-leitor . processo indutivo .processo dedutivo

(do sirrples ao ccnplexo) (do geral para o particular)

. deocdificação - análise .antecipação, pero^3çãD de formas glcbais . (letra-silaba-palavra-frase...) .iirportância da situação e da motivação

A concepção de aprendizagem da leitura, portanto, que subjaz à "abordagem global", é caracterizada pelas estratégias descendentes sem, contudo, descartarem-se a intervenção de estratégias ascendentes. Essa tendência no processo de ensino/aprendizagem do Instrumental se deve ao fato de que, a grosso modo, o aluno-leitor possui uma competência linguistica em lingua estrangeira bastante reduzida.

5. O u t r o s a s p e c t o s r e l e v a n t e s d o e n s i n o

i n s t r u m e n t a l - l i n g u a e s t r a n g e i r a

5.1 A " p r o g r e s s ã o " t e x t u a l

Sendo o texto, material dos cursos instrumentais, produzido em situação real de comunicação, pois escrito por nativos de uma lingua pressupondo leitores dessa lingua (e não aprendizes), fica descartada a possibilidade de se manter a

famosa progressão gramatical dos cursos de lingua. 0 ato de ler é muito maior que a manipulação por um sujeito de regras lingüísticas.

No entanto, é possível selecionarem-se os textos de aula analisando a situação de leitura como um todo e depreendendo alguns fatores facilitadores ou complicadores para o acesso ao texto. Ressalte-se que essa avaliação é própria de toda situação de leitura, mesmo das que se realizam fora de sala de aula, já que essa situação não é condicionada apenas pelo fator lingüistico.

Lemos, com maior eficiência, textos: (cf.Nery,1990, p.49) . complementados e/ou integrados a outros códigos como o pictórico, fotográfico, etc.;

. com efeitos tipográficos nitidos e marcados de significação;

. cujo assunto conhecemos bem;

. cujo gênero situacional nos é familiar;

. cujo universo lexical e sintático é transparente; . que veiculam crenças, valores socioculturais e pragmáticos que compartilhamos;

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. que fomecan variadas pistas para a spreoisão de iirplicitos;

. onde a seqüência discursiva seja fácil de perceber, como é o caso da narração.

As observações acima não são conteúdos de curso de leitura, nem visam a constituir uma progressão, pois esta é praticamente impossivel de ser estabelecida a priori, pelo menos. Também não apresentam nem garantem eficiência por si

sós, pois fatores de ordem psicológica, cognitiva, ideológica, etc. envolvem também a situação de leitura.

Por outro lado, não é interessante limitar a escolha de textos ao simples e ao conhecido. Provavelmente, o interesse pela leitura cairia. É sempre estimulante ao aluno-leitor ser desafiado, como também é interessante proporcionar um enriquecimento de suas competências. A análise pré- pedagógica dos textos objetivará, portanto, equilibrar facilidades e dificuldades.

5.2 A l e i t u r a s i l e n c i o s a

Face a um artigo de jornal, a reportagem de um semanário, uma história de revista em quadrinhos, a leitura se faz em silêncio. Praticamente em quase toda situação de leitura lê- se para compreender e não para falar. Conseqüentemente, não há sentido fazer oralmente a leitura de textos em aula de instrumental se o seu objetivo é ler. Essa obviedade, como muitas, aliás, nem sempre é percebida, principalmente por uma certa tradição didática de leitura que, freqüentemente, confundiu decodificação com leitura.

Tem-se notado que o público de curso instrumental para leitura de texto estrangeiro traz como pressuposto que para aprender a ler é preciso proceder como a criança que decodifica em voz alta as silabas. Segundo Sophie Moirand,

"só leitores pouco preparados recorrem à oralização ou subvocalização” (1979, p.20), e reafirma a inconveniência da

leitura oral para a compreensão. Posição que se confirma pela observação de crianças e adultos que, ao lerem em voz alta

diante de professor e colegas, não conseguem concentrar-se no sentido, devido à preocupação com a decodificação oral adequada. A prática mostra que para o aprendiz de uma lingua estrangeira ocorre o mesmo fenômeno, dai, a inadequação de tal procedimento no curso.

É interessante lembrar aqui que estudos não confirmaram ainda se a ausência de subvocalização é total em leitores adultos, proficientes, nem definiram qual a sua relevância para o processo de compreensão .

Excetuando a questão da leitura integral do texto em voz alta (seja pelo professor, seja pelo aluno) como obstáculo à compreensão, o instrumental não descarta a oralidade de sua abordagem, pois:

. a discursividade não é exclusividade da escrita e nem a oralidade é estanque da escrita e vice-versa. A voz integra-se ao conjunto da linguagem composto também de efeito, plurisensorial;

o reconhecimento e/ou aproximação de termos estrangeiros pode se dar também pela sua imagem acústica e não somente pela visual;

. no trabalho com o texto é normal retomarem-se oralmente certos trechos para análise e discussão.

Dai a necessidade de introduzirem-se noções de pronúncia e de uma certa prática da dimensão oral ao longo do curso. Esta posição vai ao encontro da de Souchon ao considerar que o ensino instrumental deve relativizar a exclusão da oralidade em cursos de leitura, pois a dimensão sensorial perpassa os dois códigos: o oral e o escrito (cf. 1992, p.76).

5.3 O d i c i o n á r i o

Quando são indagados sobre as dificuldades que têm em segunda

lingua, os aprendizes de leitura respondem, na sua grande

maioria, gue o problema principal deles é "um problema de

vocabulário" ( S o a c h o n , 1 9 9 2 , p . 8 2 ) .

Essa preocupação vocabular por parte do aluno-leitor e que a minha prática também tem constatado, reflete uma concepção limitada do processo da leitura. Em outros termos, o sentido só concerne as palavras, privilegiando-se, então, estratégias ascendentes de leitura.

Se a visualização de um texto em lingua que não conhecemos tem efeito desmobilizador é porque a atenção é direcionada para as palavras que são vistas como elementos autônomos e essenciais no processo da leitura.

A questão do uso do dicionário será, portanto, muito importante dentro dos procedimentos de ensino/aprendizagem de linguas para que essa predisposição do aluno-leitor, prejudicial à leitura com sentido, possa ser revertida.

Para evitarem-se os efeitos negativos desta concepção, o instrumental recorre, já num primeiro momento do curso, a uma explicitação ao aluno-leitor do processo'’ de leitura e das estratégias que normalmente são usadas por leitores.

Igualmente, é esclarecido que é no discurso que as palavras ganham sentido pelas suas capacidades de indexação interdiscursivas e pelo seu contexto microtextual e macrotextual.

Chamar-se-á a atenção do grupo para a questão do dicionário e do seu uso. É fundamental mostrar que a representação que normalmente as pessoas têm de um dicionário é que a qualidade é inerente a qualquer dicionário (a

diferença é percebida só pelo número de verbetes), por isso eles se correspondera. Segundo Mazière, temos sempre imi dicionário (cf. 1989, p.47). Os lexicógrafos apenas registram a palavra que representa cada evento, cada objeto, cada sentimento, etc.. Mas desconsidera-se a implicação dos lexicógrafos como enunciadores dentro da elaboração do dicionário. Além disso, acredita-se, ingenuamente, numa relação biunivoca e anterior ao discurso entre palavra e mundo, levando à ilusão da estabilidade do sentido.

Recorrendo-se principalmente a exemplos em lingua m'áterna, mostrar-se-á a instabilidade do sentido. Seu valor só se dará numa relação de discursividade. Portanto, a utilização do dicionário só tem sentido depois da leitura global do texto e depois de já se ter feito a inferência lexical através de seu contexto imediato e seu contexto global.

A antecipação, fenômeno crucial da leitura, tem na questão do uso do dicionário, um papel muito importante. us alunos devem ser orientados para consultá-lo somente após terem feito uma hipótese de sentido para o vocábulo desconhecido. Ao longo do curso, a própria prática evidenciará ao aluno-leitor que, em geral, ao ter a compreensão o global do texto, ao considerar o contexto, ele já tem o significado dos termos.

Há ainda vários outros aspectos a serem considerados no Instrumental, entre eles o projeto de leitura para que esta tenha um objetivo (ele é fator importante no processo da compreensão) e principalmente para que ela não seja uma atividade esvaziada de sentido. A diversidade textual também é relevante para a sensibilização aos vários aspectos textuais

cap.itulo

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