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Recentemente, foram determinadas as estruturas cristalográficas do mutante ScGrx1-C30S nas formas reduzida e glutatiolada (códigos PDB: 2JAD e 2JAC, respectivamente; Håkansson & Winther, 2007). Realizamos, então, a comparação das estruturas de ScGrx1 e ScGrx2 com o intuito de identificar possíveis características estruturais destas enzimas que pudessem estar relacionadas à grande diferença de atividade observada.

ScGrx1 e ScGrx2 possuem enovelamentos muito similares, o que pode ser evidenciado pelos valores de rmsd resultantes dos alinhamentos de suas estruturas, mostrados na Tabela 14. Porém, há uma diferença clara entre as conformações adotadas pela Ser30 nas estruturas de ScGrx1-SG e ScGrx2-SG. Na estrutura de ScGrx1-SG, a cadeia lateral da Ser30 está voltada em direção a Cys27, enquanto na estrutura de ScGrx2-SG,a cadeia lateral da Ser30 está voltada para o lado oposto (Figura 38). De fato, a distância entre o oxigênio do grupo hidroxila da Ser30 e o enxofre da Cys27 é de 3,47 Å em ScGrx1- SGe de 5,14 Å em ScGrx2-SG. Assumindo que um resíduo de cisteína na posição 30 teria configuração similar à serina nos mutantes C30S em ambas estruturas, a Cys30 em ScGrx1- SG seria capaz de atacar a Cys27 e formar um dissulfeto intramolecular, enquanto a Cys30 em ScGrx2-SG estaria em uma conformação desfavorável ao ataque sobre o dissulfeto misto entre a Cys27 e glutationa. Se a formação do dissulfeto intramolecular é desfavorável em ScGrx2, a redução do dissulfeto misto ScGrx2-SG por um nucleófilo externo, como GSH, é, então, favorecida (ver Figura 3). Conseqüentemente, o mecanismo monotiólico, pelo qual a reação se processa no ensaio com HED, é favorecido.

Figura 38: Conformações das cadeias laterais de Ser30 nas estruturas dos mutantes C30S de ScGrx1 (branco) e ScGrx2 (azul claro), ligados à glutationa.

Corroborando a nossa hipótese, na estrutura de EcGrx3 na forma glutatiolada (código PDB: 3GRX; Nordstrand et al., 1999), a Ser14 (que substitui a cisteína C-terminal do sítio ativo no mutante EcGrx3-C14S) apresenta uma conformação mais enterrada, similar a apresentada pela Ser30 de ScGrx2. Em todas as demais estruturas de Grxs descritas na forma glutatiolada (todas obtidas com mutantes, nos quais a cisteína C-terminal do sítio ativo foi substituída por uma serina), incluindo EcGrx1-SG (Bushweller et al., 1994), a conformação desta serina é similar àquela encontrada na estrutura de ScGrx1-SG. A conformação mais enterrada da Ser30 na estrutura de ScGrx2-SG parece estar relacionada à interação com o grupo carboxilato do resíduo Glu52, mediada por duas moléculas de água. (Figura 38). A distância entre um dos átomos de O do grupo carboxilato do Glu52 e o grupo hidroxila da Ser30 é 5.02 Å na estrutura de ScGrx2-SG. EcGrx3 possui o resíduo Glu30, cujo grupo carboxilato tem um de seus átomos de O distante 5.74 Å da hidroxila da Ser14 na estrutura glutatiolada. O resíduo Glu30 de EcGrx3 não ocupa a mesma posição que o Glu52 ocupa em ScGrx2-SG, embora as distâncias entre seus grupos carboxilatos e as hidroxilas das Ser14 e Ser30, respectivamente, sejam próximas em ambas estruturas. Além disso, em ambas as estruturas, a Ser está voltada para o lado oposto em relação ao dissulfeto misto formado entre a cisteína N-terminal e glutationa, ao contrário do observado nas outras estruturas de Grxs glutatioladas. E, coincidentemente, EcGrx3 possui

atividade entre EcGrx1 e EcGrx3 seja de apenas duas vezes, e não quinze como observado entre ScGrx1 e ScGrx2.

Outras Grxs, como a Grx de porco (Katti et al., 1995) e HsGrx1 (Yang et al., 1998), possuem um resíduo de Asp na posição equivalente ao Glu52 de ScGrx2. Entretanto, nestas Grxs há um resíduo de Ile, que pode bloquear o contato (direto ou indireto) entre o Asp e a Cys C-terminal do sítio ativo. Em ScGrx2, na posição equivalente ocupada por esse resíduo de Ile das Grxs de mamíferos, existe o resíduo de Ala23 que, devido a sua cadeia lateral curta, não impede a interação entre a Ser30 e o Glu52 (Figura 38). EcGrx3 também não possui um resíduo volumoso que poderia impedir interações entre Ser14 e Glu30. ScGrx1 possui um resíduo de Gln52 substituindo o Glu52 de ScGrx2, entretanto a Gln52 estabelece ligações de hidrogênio com a hidroxila da Ser23 (em ScGrx2: Ala23) e não interage com a Ser30.

Em resumo, nossas análises sugerem que a conformação desfavorável da Cys30 de ScGrx2 ao ataque sobre o dissulfeto misto Cys27-SG pode estar relacionada a interações estabelecidas com o resíduo de Glu52, as quais são possíveis devido a não interferência da cadeia lateral da Ala23. Em contraste, a conformação favorável da Cys30 de ScGrx1 ao ataque sobre o dissulfeto misto Cys27-SG, possivelmente, se deve ao fato de que aquelas interações observadas em ScGrx2 não são possíveis em ScGrx1, devido à substituição da Ala23 de ScGrx2 pela Ser23 em ScGrx1, que forma uma ligação de hidrogênio com a Gln52, impedindo a interação entre Cys30 e Gln52.

Finalmente, uma diferença no sítio de ligação do J-GluGS poderia também contribuir para a diferença de atividade entre ScGrx1 e ScGrx2. Em ScGrx2-SG, o grupo hidroxila da Ser89 forma uma ligação de hidrogênio com o grupo D-amino do J-GluGS (Figura 32), enquanto em ScGrx1-SG, o carboxilato do Asp89 forma uma ligação de hidrogênio com o grupo D-amino do J-GluGS. Então ScGrx1 poderia apresentar uma atividade menor que ScGrx2, devido a repulsão entre as cargas negativas do carboxilato do J-GluGS e do carboxilato do Asp89, durante a aproximação do substrato ȕ-ME-SG. De fato, foi descrito para a Grx do bacterifago T4, que a substituição de um Asp por uma Ser nessa posição leva a um aumento da atividade como oxidorredutase da enzima (Nikkola et al., 1991).

IV.11 - Mutantes de ScGrx1 e ScGrx2