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1.2 Processamentos de produção de resumos

1.2.4 Competência de produção de resumos

Para conceituar competência linguística, Noam Chomsky (1978) concentrou seus estudos na criatividade linguística, ou seja, a capacidade que o falante tem de entender e produzir sentenças originais. Para o autor a competência

linguística é o conhecimento tácito que o falante-ouvinte possui da estrutura da

língua e, ao lado desta noção de competência, estaria a noção de desempenho como sendo o uso concreto que se faz desses conhecimentos. As críticas que se fizeram sobre a teoria chomskyana repousam no fato de que ela se restringe ao uso da gramática gerativa e exclui elementos semânticos e pragmáticos que incidem sobre as atividades de produção linguística, como: a limitação da memória, efeitos de distração, desvios de atenção e interesse, afinidade com o produtor e o tema, entre outros. As idéias de Chomsky também estavam mais voltadas para a produção oral que para a escrita.

Del Hymes (1996) inseriu os elementos semânticos e pragmáticos em seus pressupostos, reestruturando o conceito de competência linguística e

constituindo um novo conceito: o de competência comunicativa. A esse conceito, ele insere as noções de exequibilidade, adequação contextual e aceitabilidade de

ocorrência. A utilização do conhecimento linguístico, na geração de sentenças

seria, para o autor, dependente de fatores psicolinguísticos como: a atenção, a memória e a concentração, por exemplo. As idéias de Hymes tornaram o conceito de competência mais abrangente, podendo, então, ser atribuído, também, à escritura de textos. A exequibilidade seria a capacidade de produzir sentenças que sejam inteligíveis e exijam menor esforço para o entendimento do leitor. Períodos com sentenças longas, com muitos conectores, podem causar um efeito negativo, tanto na empatia do leitor com o texto, como na possibilidade de compreensão. Este conceito está mais relacionado ao que se poderia considerar competência

linguística, mais propriamente, como propunha Chomsky. A adequação contextual,

como sugere a denominação, está relacionada às condições e objetivos do uso de determinadas sentenças, no que se refere às escolhas lexicais e seu arranjo sintático no contexto e situação de uso, hoje mais abordados pelas teorias do discurso. A aceitabilidade da ocorrência se refere às diferentes possibilidades de ocorrência de uma mesma sentença, num mesmo contexto, mas em situações diferentes. Nesse caso, a competência do produtor da sentença definiria se a situação é apropriada ou não para seu uso.

Entende-se, a partir do exposto, que o controle dos fatores descritos na teoria de Hymes é imprescindível na construção de um texto, não deixando descartada a proposta de Chomsky, no que se refere à aplicabilidade da gramática normativa na composição das sentenças. A competência de escritura envolve, então, todos os conhecimentos que abarcam a leitura e outros, que estão mais ligados a fatores extratextuais, como, por exemplo: a quem se dirige o texto, que uso o leitor vai fazer das informações adquiridas através dele, que relação de empatia se estabelecerá entre o leitor e o texto, que grau de conhecimentos sobre o assunto o leitor possui para compreendê-lo, entre outros. Remetendo à idéia de Smith (1991) de que o leitor deve ler o texto como um escritor, é necessário que o escritor também elabore o texto pensando como leitor, conduzindo de maneira adequada o seu discurso e organizando as informações de maneira inteligível para seu público alvo.

A competência discursiva supõe a capacidade de identificar os diferentes níveis discursivos do texto. O nível macroestrutural é composto por microestruturas hierarquizadas em cuja relação se estabelece a coerência e a coesão global do texto. Estas microestruturas temáticas, portanto, formam a trama do texto. (Dijk 1978, 1980). O escritor competente é capaz de elaborar o texto de modo que esses níveis estejam bem organizados com vistas a facilitar a fluência da leitura.

Honeycutt (2002), em sua tese de doutorado, explica a similaridade de processos cognitivos requeridos pelas duas atividades – leitura e escritura - e propõe esta similaridade como justificativa para a conjunção de ambas nos procedimentos pedagógicos para que haja desenvolvimento nestas áreas.

A leitura e a escritura empregam os sistemas comuns de localização e recuperação da informação, compartilhando as estratégias cognoscitivas que utilizam os conhecimentos básicos e o contexto para criar o significado e requerem dos estudantes supervisionar e revisar suas estratégias para maximizar o êxito. Por outro lado, lendo e escrevendo compartilham algumas sub-habilidades básicas que são comuns a ambas as atividades – uso do vocabulário, idéias conectadas de compreensão e a detecção de falta de lógica. Sobre a leitura e escritura, não só estes, mas muitos outros fatores comuns, a maioria dos pesquisadores sugerem que combinar o ensino de leitura e escritura otimize o crescimento total em ambas as tarefas13 (Honeycutt, 2002:1).

A pesquisa de Honeycutt (2002) visou descobrir o porquê de alguns estudantes que demonstravam ser bons leitores, não eram bons escritores, como seria lógico supor, levando-se em conta a similaridade apontada anteriormente entre as atividades de leitura e escritura. O autor tentou criar um perfil geral que descrevesse os procedimentos estratégicos utilizados por estudantes durante

13 Both reading and writing employ common information location and retrieval systems, share

cognitive strategies that use background knowledge and context to create meaning, and require students to monitor and revise their strategies to maximize success. Moreover, reading and writing share some basic sub-skills that are common to both disciplines – using vocabulary, understanding embedded ideas, and detecting illogicalities.

Since reading and writing not only share these but many other common factors, most researchers suggest that combining reading and writing instruction will optimize overall growth in both disciplines. Honeycutt (2002:1)

ambos os processos, para explicar tal fenômeno. O resultado de seu trabalho demonstrou que os estudantes bons leitores que eram maus escritores apresentavam limitações no que se refere à compreensão: inabilidade de utilização de estratégias de reconhecimento esquemático do texto, o autocontrole metacognitivo e também a influencia de emoções negativas oriundas da forma como se vêem como escritores. Mesmo assim, a pesquisa não pôde responder como estes fatores se correlacionam.

Estes fatores podem trabalhar reciprocamente de maneiras complexas que merecem um estudo adicional usando metodologia qualitativa e quantitativa. Ainda que este estudo identifique a falta de conhecimento e o uso das estratégias específicas do esquema e da autorregulação, composto por emoções negativas, como as três variáveis primárias que explicam por que bons leitores são escritores deficientes, a pesquisa não pode explicar a natureza exata desta relação triádica14 (Honeycutt, 2002:130).

A investigação realizada por Honeycutt apontou resultados semelhantes à proposta de Bereiter y Scardamalia (1987), que propuseram que a diferença básica entre bons e maus escritores residia na capacidade de operacionalizar as habilidades cognitivas e metacognitivas, incluindo-se a geração e apresentação de idéias. Segundo os autores, a maturidade compositiva é medida segundo a capacidade de desenvolver a forma de escrever. Os escritores fluentes, para eles, são capazes de elaborar novas construções estruturais, bem organizadas, enquanto que os menos fluentes escrevem aleatoriamente o que vem à memória, construindo um texto mais acumulativo que coesivo (Fernández, 1992: 115; Koda, 2005: 204).

Considerando os parâmetros de conceituação de leitura e escritura atuais, pode-se supor que, quando uma atividade de escritura é posterior à leitura de um texto, como é quando se propõe a produção de um resumo, a construção do

14 These factors may interact in complex ways that merit further study using qualitative and

quantitative methodology. Although this study identifies lack of knowledge and application of specific schema and self-regulation strategies, compounded by negative emotions, as the three primary variables explaining why some good readers are poor writers, the research is unable to explain the exact nature of this triadic relationship. (Honeycutt, 2002:130)

significado da escritura se dá já na leitura, em leitores fluentes. Esta interpretação é já constituída, então, como texto neste momento. Em tese, a construção do significado da escritura pode coexistir com a construção do significado da leitura, numa relação de simultaneidade. Tais aspectos não seriam manifestados em leitores com dificuldades de manejo das estratégias cognitivas, pois suas deficiências seriam, possivelmente, encontradas ainda na compreensão leitora.

No caso do resumo, pode-se imaginar que um escritor proficiente pode ser também um leitor proficiente, tendo-se em conta sua dependência do texto fonte para produzir seu texto sumarizado. Caso o grau de independência seja pequeno, pode-se inferir que sua leitura foi proveitosa para a construção do rascunho, caso não recorra muitas vezes ao texto fonte. Em seguida, na produção do texto resumo, sua dependência do texto fonte, supõe-se, seria menor ainda, caso o texto resumo um protótipo do rascunho, com algumas modificações. O que ocorre, algumas vezes, é que mesmo tendo um rascunho, seja em forma de esquema ou em forma de texto, o resumidor continua recorrendo constantemente ao texto fonte. Esta dependência, em parte, pode ser resultado de problemas na memória de trabalho ou, por outro lado, pode significar dificuldades na operacionalização das informações na construção do novo texto. Isso pode ser decorrente das deficiências do leitor como resumidor.

Em conclusão a este tópico, pesquisas revelam que não se pode afirmar com veemência que fluência em leitura subentende fluência em escritura. O fato que parece justificar esta declaração é que, ainda que possa haver uma integração entre as duas atividades, cada uma é, em si, particular, no que tange às habilidades comunicativas e à competência lingüística. Ler é uma atividade de construção de significados a partir da compreensão da representação; escrever é uma atividade de construção de significados para a compreensão da representação. A primeira supõe percepção e aquisição de informações e a segunda produção de estímulos para captação e assimilação da informação. A

competência de produção de resumos supõe, então, a realização efetiva destas

duas atividades, em um espaço mínimo de tempo e com as qualidades descritas anteriormente, sintetizadas, neste trabalho, em quatro categorias: fidelidade,

categorias são utilizadas como critério de avaliação do produto final dos processamentos e abrangem o uso de macrorregras, a presença de coesão e coerência textual a partir de: a) o uso das macroproposições do texto fonte para construir a macroestrutura textual e a geração do contexto situacional (Dijk e Kintsch, 1983; Dijk, 1996b ), no âmbito discursivo; b) as características essenciais

do resumo (Charolles et al., 1986) e das habilidades no manejo de elementos

lexicais, representadas pelos conectores e pelos elementos redutores (substitutivos genéricos) (Vigner, 1991). O resultado desta avaliação pode indicar se as

estratégias cognitivas foram ou não bem articuladas.

Em relação à produção de resumos em AV, Brown (1983) descreve o procedimento “copy-delet”’, muito comum em resumos de estudantes, em qualquer nível. Os estudantes, ao realizarem a sumarização do texto copiam frases e suprimem outras, ou algumas palavras que crêem menos importantes. Para a autora, essa tática, ainda que plausível, pode impedir o desenvolvimento de estratégia mais maduras e representa um tipo de procedimento usual em leitores menos fluentes. Um leitor experiente busca estratégias mais refinadas e a rejeição de hábitos deste tipo, menos eficientes.

Solarz (2005), em acordo com a valoração que Brown (1983) atribui à estratégia copy-delet uma incapacidade de reconstrução da macroestrutura que é a interação entre os conhecimentos já consolidados na memória e os dados novos. Sendo assim, para estabelecer uma avaliação de resumos, em termos cognitivos, o quesito „produção‟, de base interpretativa, deve ser considerado. Supõe-se que na transcrição literal, mesmo que se façam inversões sintáticas ou se substituam alguns termos, mantendo a macroproposição com a mesma sintaxe, não há grandes esforços cognitivos.

Na seção seguinte, se propõe uma ampliação da discussão sobre a produção de resumos em ambos os ambientes investigados neste trabalho.