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A composição metodológica tem por objectivo, conhecer quais os conteúdos que compõem a prelecção, sabendo de antemão que cada treinador poderá realizar uma metodologia diferente. No entanto, e previamente à abordagem dos conteúdos, é importante referir que a direcção da equipa expressa nesta situação (prelecção) deve estar sempre sustentada simultaneamente por dois grandes parâmetros. O primeiro consiste na preparação motivacional para o jogo, visando uma estabilidade psicológica dos jogadores para que os mesmos acreditem no seu valor e consigam expressar todas as suas competências técnico-tácticas, físicas e psicológicas em competição. O segundo parâmetro consiste na preparação teórica para o jogo, pois tal como Castelo (1996) refere, a prelecção tem um carácter fundamentalmente teórico abordando os

aspectos técnico-tácticos, psicológicos e organizativos relativos às duas equipas que se apresentam em competição.

Segundo um estudo realizado por Lázaro e Oliveira (2002), com 104 jogadores de futebol da 1ª Liga Portuguesa, com o objectivo de conhecer os seus comportamentos pré-competitivos, verificou-se que estes gostam de ser relembrados das estratégias para o jogo, acham importante a presença de planos detalhados para o jogo e consideram necessário a existência de um plano de jogo alternativo no caso dos jogos estarem a correr mal.

Para Nerin (1986), existem dois aspectos essenciais na preparação da instrução do treinador:

I. O aspecto formal, onde se enquadra as variáveis objectivas da competição, tais como o valor do adversário, pontos fortes, pontos fracos e o contexto do jogo, que compõem a intervenção técnico-táctica do treinador;

II. O aspecto informal, que enquadra as variáveis menos objectivas, tais como a motivação, a regulação do estado psico-emocional e os níveis de confiança dos jogadores.

Para o mesmo autor, o conteúdo da instrução na prelecção tem um papel fundamental na eficácia da mesma. Assim sendo, o autor refere dois tipos de instrução:

‰ Instrução técnica e psicológica – Esta instrução assenta sobre o conteúdo

técnico-táctico (plano táctico-estratégico) e simultaneamente sobre o conteúdo de domínio psicológico, ou seja, o discurso dos treinadores apresenta uma bipolariedade entre os aspectos relativos à forma como os jogadores deverão jogar e os aspectos relativos à regulação do estado psico-emocional dos jogadores.

‰ Instrução Psicológica e Motivacional – Esta instrução baseia-se somente na

regulação do estado psico-emocional dos jogadores, tendo em vista o aumento dos níveis de confiança e de segurança dos mesmos, pois estes, normalmente, encontram-se com elevados níveis de ansiedade, pretendendo-se assim colocá-los num estado psico-emocional ideal.

Segundo Pacheco (2002), deverá ser integrado nesta sub-divisão dos tipos de instrução, um terceiro tipo habitualmente utilizado pelos treinadores, que consiste na Instrução táctico-estratégica. Tal como o próprio nome indica, este tipo de instrução baseia-se somente na dimensão táctico-estratégica, apresentando assim uma dimensão exclusivamente cognitiva, com vista à explicitação da forma como os

jogadores deverão jogar. No estudo realizado por este autor, verificou-se que os treinadores de futebol incidem a sua instrução fundamentalmente na dominante táctico-estratégica, seguindo-se outras dominantes do rendimento desportivo e da dominante psicológica e por último, com muito poucas unidades de informação, a dominante técnica. É de salientar que os treinadores não apresentaram qualquer unidade de informação relativa à dominante física.

Importa agora apresentar uma composição metodológica adaptada de vários autores que realizaram diferentes obras de conhecimento científico específicas aos desportos colectivos e fundamentalmente ao futebol (Castelo, 1996 e 2000; Peseiro, 1998; Teodorescu, 1984), levando-nos a considerar que os conteúdos metodológicos da prelecção apresentam duas grandes dimensões:

1 – Dimensão Organizativa (todos os aspectos organizativos intrínsecos à competição)

2 – Dimensão Táctico-Estratégica (decomposição do plano táctico- estratégico previamente estabelecido pelo treinador)

Segundo Teodorescu (1994) e Castelo (1996; 2000), o início da prelecção deve ser ocupado com os aspectos organizativos (poderá ocupar até 10 minutos, para uma prelecção entre 30 e 45 minutos, no entanto habitualmente situa-se entre os 2 e os 5 minutos do tempo total) inerentes ao jogo, tais como: local e hora de partida para o jogo ou de concentração da equipa, meio de transporte utilizado na deslocação para o jogo, definição dos jogadores que ajudam a transportar o equipamento, bolas e outros materiais para o local do jogo (caso haja necessidade), horários das refeições e de descanso, organização dos tempos livres, distribuição dos quartos, outras informações pertencentes ao jogo e específicas do momento, saber junto do médico e dos jogadores se existe alguma debilidade física, possibilitar um espaço temporal para o levantamento de dúvidas dos jogadores relativamente a esta dimensão.

De acordo com Teodorescu (1994) e Castelo (1996; 2000), a dimensão táctico- estratégica ocupa maioritariamente a prelecção (25 a 35 minutos para uma prelecção de 30 a 45 minutos) pois contém todos os aspectos que deverão orientar o comportamento dos jogadores em competição. Os autores anteriormente referenciados sistematizam esta dimensão em 9 itens:

a) Importância e contextualização do jogo

Compete ao treinador introduzir a segunda parte da prelecção com uma contextualização do jogo (ex: jogo de campeonato com adversário em 1º lugar ou em último lugar, jogo da taça, final de um torneio, etc) de forma a que todos os jogadores

se sintonizem com a natureza do mesmo. Poderá também referir alguns comentários relativos à importância que este jogo acarreta em caso de vitória, empate ou derrota (ex: caso vença a equipa fica em 1º lugar, ou vence o campeonato, ou não desce de divisão; caso perca... etc, etc). Segundo Castelo (1996) este problema deverá ser retractado entre 2 a 3 minutos.

b) Caracterização da equipa de arbitragem do jogo

Embora o treinador não deva centrar-se exageradamente num factor externo ao rendimento da equipa e muito menos centrar a definição do resultado na futura prestação da equipa de arbitragem, Castelo (1996; 2000) considera importante em muito pouco tempo (1 a 2 minutos) referir alguns aspectos da personalidade do árbitro e dos seus auxiliares e a forma como eles interpretam habitualmente algumas situações do jogo (ex: faltas graves, grandes penalidades, protestos, etc) para que os jogadores possam intervir positivamente com os mesmos.

c) Caracterização da equipa adversária

De acordo com Peseiro (1998), quanto mais elevado for o nível competitivo da equipa, maior necessidade e possibilidade existe em conhecer aprofundadamente as características tácticas, técnicas, físicas e psicológicas do adversário, pois possibilitará uma melhor aplicação do plano táctico-estratégico que visa potenciar as qualidades da própria equipa e aproveitar as debilidades da equipa adversária. Como tal, em 3 a 4 minutos (Castelo, 1996) o treinador deve caracterizar a equipa adversária, expondo sucintamente as particularidades positivas e negativas individuais e colectivas. Mais especificamente, segundo Castelo (1996; 2000) e Peseiro (1998) a caracterização deverá passar pelos seguintes aspectos: sistema de jogo tipicamente utilizado e as possíveis variantes, método de jogo habitualmente utilizado perante o tipo e o local do jogo, a existência de coordenadores e/ou protagonistas da equipa adversária, esquemas tácticos mais usuais e que poderão ser extremamente perigosos, de forma a poderem ser anulados rapidamente, a forma como os jogadores da equipa adversária se relacionam durante o jogo em situação de vantagem e desvantagem no resultado, a disciplina e o “fair-play” dos jogadores e a forma como reagem às decisões da equipa de arbitragem, os aspectos morais e de respeito dentro do grupo e com os restantes elementos do jogo, a apreciação global resumida do real valor do adversário sem o subestimar ou valorizar excessivamente.

d) Plano Táctico-Estratégico

Segundo Castelo (1996), este item corresponde ao plano pré-definido pelo treinador para esta competição e poderá demorar entre 5 a 10 minutos, onde se insere vários conteúdos tácticos, entre os quais, o sistema de jogo predominantemente utilizado e também uma ou duas variantes previamente treinadas para possíveis aplicações em

jogo. Praticamente em simultâneo deve referir-se a composição da equipa, de seguida as funções/missões gerais e individuais dos jogadores intervenientes, alguns aspectos gerais relativamente à organização ofensiva e defensiva da equipa e por último o relembrar dos esquemas tácticos a utilizar, fundamentalmente os jogadores intervenientes e os aspectos-chave dos mesmos.

e) Comparação de forças entre as duas equipas

Segundo Teodorescu (1984), deve-se estabelecer a relação de forças de forma a verificar se esta é favorável ou desfavorável, pois em ambas as situações existem aspectos de índole psicológica que naturalmente desfavorecem o rendimento da própria equipa. Este aspecto, por vezes fundamental e segundo Castelo (1996) poderá ocupar 3 a 4 minutos.

Caso a comparação de forças seja favorável, Teodorescu (1984) refere que o treinador deverá mobilizar os jogadores para que eles obtenham um excelente comportamento e concretizem esta vantagem teórica, bastando para isso aplicarem aquilo que treinam e que realmente conseguem rentabilizar. Para além deste autor, Crevoisier (1985) refere igualmente que em situações deste tipo, o treinador deverá combater o excesso de confiança, lembrar que independentemente do adversário os pontos conseguidos são os mesmos, apelar veemente ao respeito pelos adversários, lembrando que respeitar o adversário é tentar vencê-lo pela maior diferença possível, exemplificar com outros jogos com uma relação de forças em tudo semelhante e onde a equipa foi surpreendida, errando comportamentos devido à excessiva confiança, explicitar muito bem os pontos fortes e as lacunas do adversário, concentrar os jogadores para os benefícios da vitória e diminuir o excesso de confiança, filtrando e desvalorizando as opiniões externas acerca do valor da equipa adversária (ex: comunicação social, dirigentes, amigos, etc).

Se a comparação de forças for desfavorável, Teodorescu (1984) refere que o treinador deverá evidenciar as características de ordem técnica, táctica, volitiva e eventualmente física, afim de possibilitar um equilíbrio de forças real de forma a pelo menos alcançar uma prestação meritória. Tal como atrás foi referido, Crevoisier (1985) menciona igualmente que em situações deste tipo, o treinador deverá caso a motivação seja muito elevada (ex: uma equipa de nível inferior jogar contra uma “potência” nacional ou internacional”) deverá regular-se para que haja um comportamento responsável e coerente durante todo o jogo, reduzir a carga emocional dos jogadores através de um bom clima (ex: boa disposição, piada, anedota, etc), desdramatizar a possível situação de derrota, colocando os jogadores totalmente à vontade para colocarem em prática todas as suas potencialidades, centrar toda a intervenção na própria equipa e não na equipa adversária, principalmente nas suas características mais positivas, ser o

primeiro a transmitir calma e tranquilidade, de forma a não criar estados de ansiedade nos jogadores e mobilizar energicamente toda a vontade, o querer, a garra e a determinação em campo.

Por vezes este aspecto metodológico pode ser considerado pouco importante pelo treinador, pois as equipas podem ser muito equilibradas (do ponto de vista teórico), ou os jogadores apresentarem um nível psico-emocional ideal, retirando assim a vantagem desta mesma intervenção.

f) Previsão de possíveis alterações no decorrer do jogo

Seguidamente, o treinador poderá relembrar as possíveis alterações na organização ofensiva e defensiva perante a evolução do resultado, ou perante outro tipo de alteração (ex: expulsão ou lesão de um jogador) e que devem estar previamente preparadas pelo treinador juntamente com a equipa durante o tempo que medeia a competição. Esta revisão poderá segundo Castelo (1996) ocupar cerca de 2 a 3 minutos.

g) Testar a interpretação dos jogadores face ao plano táctico-estratégico

Neste momento, importa dar espaço aos jogadores para questionarem sobre alguma dúvida que tenha ocorrido. O treinador, juntamente com os seus colaboradores, deverão esclarecer todas as dúvidas, certificando-se da eficácia da sua comunicação. Deverá ser estabelecido uma relação positiva entre receptor – emissor, possibilitando assim a colocação de sugestões da parte dos jogadores relativamente a algumas situações de jogo. Este momento poderá ocupar aproximadamente 2 a 3 minutos (Castelo, 1996).

h) Revisão das atitudes e comportamentos técnico-tácticos fundamentais

Praticamente a finalizar a prelecção, o treinador faz uma revisão rápida e simples pelas questões fundamentais relativamente ao comportamento individual e colectivo mais eficaz perante o adversário em causa (Castelo, 1996; Castelo, 2000; Teodorescu, 1984).

i) Aspectos morais e volitivos

Por último, cabe ao treinador, durante 1 a 2 minutos (Castelo, 1996), apelar ao respeito mútuo dentro da equipa, ao espírito desportivo com os adversários e ao respeito e disciplina perante as decisões da equipa de arbitragem. Simultaneamente, o treinador mobilizará novamente todos os jogadores, durante 1 a 2 minutos, para uma elevada aplicação da vontade e do prazer em jogar futebol, uma exemplar disciplina e respeito e uma inteligente organização táctica.

Para finalizar este capítulo, será importante referir que, embora não se encontre na literatura pesquisada uma receita para a prelecção ideal, a possibilidade de realizá-la

de uma forma planeada, estruturada, criteriosa, objectiva e com uma elevada qualidade informacional deverá ser uma tarefa determinante, para que os treinadores deixem de baralhar e passem a esclarecer a forma como atingir o melhor rendimento possível.